Acórdão nº 189/18.2T8GRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 06 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelBARATEIRO MARTINS
Data da Resolução06 de Novembro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório A (…), residente em (...) , (...) , instaurou a presente acção especial de convocação de assembleia de sócios contra L (…), S.A.

, com sede em (...) , em que pediu que seja “ordenada a convocação judicial da assembleia geral da sociedade, a realizar em dia, hora e local a designar, tendo como ordem de trabalhos a ratificação e confirmação das deliberações de 23 de Fevereiro de 2016[1], 10 de Março de 2016 e 16 de Março de 2016 e a revogação, por nulidade e anulabilidade, das deliberações do mesmo órgão de 18 de Março de 2016, 22 de Junho de 2016 e 3 de Fevereiro de 2017 [detalhadamente circunstanciadas no artigo 52.º do requerimento inicial, designando] para exercer a função de Presidente da Mesa da Assembleia Geral uma das três pessoa mencionadas no artigo 60.º, que deverá indicar como secretário pessoa da sua confiança, com expressa advertência de que existe impedimento de voto, relativamente a todos os pontos da ordem de trabalhos, de A (…) ou de quem se apresente a suceder-lhe na titularidade desse lote de acções e, bem assim, de que deve dar cumprimento a todas as formalidades relativas à convocação da assembleia, mediante a adequada publicação, com a necessária antecedência”.

Alegou, em síntese, que o Conselho de Administração (doravante, CA) da sociedade requerida, emitiu, nos dias 23 de fevereiro de 2016, 10 de março de 2016 e 16 de março de 2016, deliberações (constantes das actas juntas) que não foram impugnadas judicialmente, mas que foram posteriormente objecto de deliberações do CA da sociedade, ocorridas nos dias 18 de março de 2016, 22 de junho de 2016 e 3 de fevereiro de 2017, através das quais os membros de tal órgão procederam à anulação daquelas 3 anteriores deliberações, deliberações aquelas (as 3 deliberações “anulatórias”) que, segundo o requerente, são inválidas, o que determinou a instauração de acções de impugnação das referidas deliberações[2].

Mais alegou que, face às sucessivas e divergentes deliberações do CA, requereu, tendo em vista o esclarecimento da questão, em 28 de dezembro de 2017, ao presidente da mesa da assembleia geral (doravante, PMAG) da sociedade requerida a convocação de uma assembleia geral extraordinária para o dia 2 de fevereiro de 2018[3], pelas 14h30m, na sede social, tendo por ordem de trabalhos a ratificação e confirmação das sobreditas deliberações de 23 de Janeiro de 2016, 10 de Março de 2016 e 16 de Março de 2016 e a revogação, por nulidade e anulabilidade, das deliberações do mesmo órgão de 18 de Março de 2016, 22 de Junho de 2016 e 3 de Fevereiro de 2017; porém, o PMAG não convocou a reunião requerida, nem para a data apontada, nem para qualquer outra, não tendo justificado a não convocação da assembleia, motivo pelo qual, sendo detentor de acções representativas de mais de 5% do capital social, lhe assiste o direito de requerer a sua convocação judicial, razão pela qual pede que o tribunal nomeie pessoa para presidir à mesa da assembleia e que ordene as diligências indispensáveis à realização da assembleia.

Ouvida a requerida, veio esta invocar não estarem reunidos os pressupostos da convocação judicial da assembleia geral, alegando que a pretensão que o requerente dirigiu ao PMAG foi por este apreciada em decisão, fundamentada e justificada, enviada ao requerente e a que este não respondeu, tendo, ao invés, instaurado a presente acção, devendo, assim, o requerente, ao ter omitido tais factos, ser condenado como litigante de má-fé; ademais, tendo as deliberações em causa sido objecto de impugnação judicial, que se encontram pendentes em tribunal, não pode a assembleia geral substituir-se ao tribunal, uma vez que ocorre, segundo a requerida, uma inutilidade da lide, não podendo também apreciar-se o pedido de “impedimento de voto” da accionista A (...) , por tal contender com o objecto da causa.

“Respondeu” o requerente, mantendo o alegado na PI e opondo-se à sua condenação como litigante de má-fé.

Após o que, entendendo o Exmo. Juiz que os autos contêm todos os elementos de facto para uma decisão de mérito, passou de imediato a apreciá-la e a proferir sentença em que, a final, decidiu “(…) julgar a acção totalmente improcedente e, em consequência, absolver a requerida do pedido, condenando o requerente, como litigante de má-fé, na multa de 5 (cinco) UC.

Inconformado com tal decisão, interpõe o requerente o presente recurso de apelação, visando a sua revogação e a sua substituição por decisão que defira o por si requerido e que ordene a convocação da assembleia geral da requerida.

Terminou a sua alegação com as seguintes conclusões:

  1. A douta sentença violou o estabelecido pelo artigo 375.º, n.º 4 do código das sociedades comerciais e pelo artigo 224.º, n.º 1 e 2 do código civil.

  2. O presidente da mesa da assembleia geral é um órgão social, integrado na esfera da sociedade, distinto e diferenciado da pessoa física que ocupa o lugar e se encontra na sua titularidade e que, como tal, está domiciliado na respectiva sede social.

  3. O recorrente agiu correctamente ao remeter o pedido convocatório em 28 de dezembro de 2017 para o órgão social (e não para a pessoa física que é seu titular) e para a sede social (e não para o domicílio pessoal desse titular).

  4. Nos termos do estabelecido pelo n.º 1 e n.º 2 do artigo 224.º do código civil, a declaração recipienda não implica apenas a sua simples remessa, mas também a sua entrada na esfera da disponibilidade do destinatário, sem, todavia, reclamar o seu efectivo conhecimento, bastando a sua cognoscibilidade.

  5. Esta é traduzida na circunstância de lhe ser possível, segundo regras de probabilidade, que possa apreender o conteúdo da declaração, por haver chegado ao seu campo de conhecimento ou de controlo.

  6. No caso concreto, o pedido convocatório, pese embora apenas levantado pela sociedade no dia 9 de janeiro de 2018, foi avisado na sede social pelos respectivos serviços postais no dia 29 de dezembro de 2017, pelas 11h37m, e apenas não foi antes recepcionada por inércia ou desleixo da sociedade.

  7. Por conseguinte, o pedido convocatório entrou no círculo de controlo da sociedade naquele dia 29 de dezembro de 2017, pelo que o prazo de 15 dias havia-se completado no dia 15 de janeiro de 2018, com a consequente perfeita oportunidade e tempestividade da acção.

  8. De qualquer modo, é indiscutido que, em 9 de janeiro de 2018, o pedido convocatório chegou à sociedade e ao conhecimento directo do seu presidente do conselho de administração – facto provado 25 – e foi, em acto contínuo, redirecionado para o presidente da mesa da assembleia geral - facto provado 26.

  9. Deste modo, o pedido convocatório entrou no círculo de controlo da sociedade e dos seus órgãos pelo menos naquele dia 9 de janeiro de 2018, pelo que o apontado prazo de 15 dias se completou no subsequente dia 24 de janeiro de 2018, sem que a assembleia geral pedida houvesse sido convocada, pelo que, também neste caminho, a acção é oportuna e tempestiva.

  10. Não precisava o recorrente, ao contrário do que defende a douta sentença, de alegar e provar a data específica em que o presidente da mesa da assembleia geral tomou concreto conhecimento do pedido convocatório, a mediar entre 9 e 23 de janeiro de 2018.

  11. O que cabia ao recorrente alegar e provar era apenas que o pedido convocatório foi recebido na sociedade, entrando na esfera de controlo dos seus órgãos e, especialmente do presidente da mesa da assembleia geral.

  12. A douta sentença violou, ainda, o estabelecido pelo artigo 375.º, n.º 4 e 5 do código das sociedades comerciais.

  13. O pedido de esclarecimento do presidente da mesa da assembleia geral de 23 de janeiro de 2018 não tem a virtualidade de suspender ou interromper o prazo legalmente fixado para a prolação de decisão sobre o pedido convocatório.

  14. Quando a convocação é solicitada pelos accionistas, o presidente da mesa da assembleia geral, não deferindo o requerimento dos accionistas ou não convocando a assembleia, deve justificar por escrito a sua decisão, dentro do prazo de 15 dias, nos termos do nº 4 da mesma disposição legal e a omissão de tal comportamento confere aos accionistas o direito a lançarem mão da prerrogativa da convocação judicial constante do nº 5.

  15. Assim, em face do requerimento do accionista, o presidente da mesa da assembleia geral apenas pode optar por um de dois caminhos: (i) ou aceita o pedido convocatório com a ordem de trabalhos inclusa; (ii) ou recusa o pedido, expressando as razões subjacentes a tal tomada de posição.

  16. No caso concreto, o presidente da mesa da assembleia geral adoptou uma conduta intermédia, a qual consubstancia um verdadeiro “convite ao aperfeiçoamento” que não tem qualquer enquadramento legal.

  17. Dos termos em que foi formulado o pedido convocatório – factos provados 12 a 24 – decorre a existência de deliberações de cariz contraditório sobre a mesma matéria por banda do órgão de administração da sociedade; r) É sabido que existe uma sensível divergência na doutrina e na jurisprudência quanto à questão de saber se as deliberações do conselho de administração podem objecto de impugnação directa para os tribunais judiciais ou antes se exige prévio recurso à respectiva assembleia geral da sociedade e a formação de deliberação dos accionistas que as confirme.

  18. O que bem evidencia a necessidade e o interesse de que o assunto seja levado a deliberação dos accionistas, para que a assembleia geral possa ser chamada a tomar uma posição sobre a matéria de modo a esclarecer devidamente qual é a posição da maioria dos accionistas sobre a operação de anulação de acções e de aquisição de acções próprias e o exercício daquele direito de preferência que estão em causa naquelas deliberações do órgão de administração.

  19. A douta sentença violou, finalmente, o estabelecido pelo artigo 452.º, n.º 2 do código de processo civil.

  20. Valem aqui as razões já aduzidas, que mostram que a sua conduta não configura, de modo nenhum, qualquer violação de...

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