Acórdão nº 225/12.6 GCSCD. C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelISABEL VALONGO
Data da Resolução13 de Junho de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I - Relatório Pelo Tribunal Judicial da Comarca de VISEU - Instância Local de Santa Comba Dão – Sec. Comp. Gen. – J1, sob acusação do Ministério Público, foram submetidos a julgamento em processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, os arguidos: - A1, filho de --- e de --- , nascido a 19-06-1966, residente no Bairro -------, - A2, filho de --- e de ----, nascido a 25-09- 1974, residente na Rua ------, - A3, conhecido por “---”, solteiro, desempregado, filho de ---- e de ---, nascido a 06.02.1980, residente na Rua -----------, - A4, filho de --- e de ---, nascido a 04.08.1986, residente em Caminho --------------, - A5, solteiro, --, filho de ----- e de ---- , nascido a 21.07.1958, residente na Rua -----------, Imputando aos arguidos A1, A2, A3 e A4, a prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo artigo 204º, nº2 al. e) e 26º, todos do C.P E imputando ao arguido A5, a prática em autoria material de um crime de receptação, p. e p. pelo disposto no artigo 231.º, n.º 1 do C.P.

* Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal a quo, por sentença proferida a 11-07-2016, decidiu: “- Absolver os arguidos A2, A3 e A4, da prática em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo artigo 204º, nº2, al. e), do Código Penal; - Absolver o arguido A5, da prática como autor material de um crime de recetação, previsto e punido pelo art. 231º, nº1 do Código Penal.

- Julgar totalmente improcedente o pedido de indemnização civil deduzido por ASS, a fls. 248 e ss. e, consequentemente absolver do mesmo os demandados A2, A3, A4 e A5.”*Foi ordenada a separação do processo em relação ao arguido A1 - cfr acta da audiência de julgamento.

*Inconformada com a sentença dele interpôs recurso a assistente ASS, que por acórdão desta Relação foi julgado provido tendo sido declarada nula a sentença recorrida e determinada a sua substituição por outra que suprisse a nulidade apontada.

*Proferida nova sentença, com o mesmo desfecho, novamente inconformada com a decisão dela interpôs recurso a assistente ASS, concluindo a sua motivação do modo seguinte: “1. A recorrente discorda da decisão do Tribunal a quo que absolveu os arguidos A2, A3 e A4, da prática em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo artigo 204º, nº2, al. e), do Código Penal; absolveu o arguido A5, da prática como autor material de um crime de receptação, previsto e punido pelo art. 231º, nº1 do Código Penal e julgou totalmente improcedente o pedido de indemnização civil deduzido por ASS, a fls. 248 e ss. e, consequentemente absolver do mesmo os demandados A2, A3, A4 e A5.

  1. O Tribunal a quo não fez uma correcta qualificação jurídico-penal dos factos carreados para os autos, na medida em que, com o devido respeito, a correcta subsunção dos mesmos levaria à condenação dos arguidos.

  2. A recorrente põe em causa o julgamento das alíneas a) a v) da factualidade dada como não provada, assim como o julgamento dos pontos 12 e 19 da factualidade dada como provada, na medida em que considera que a prova carreada para os autos, foi idónea a provar que a recorrente provocou os danos no veículo da assistente.

  3. A apreciação da prova feita pelo tribunal, que conduziu à matéria provada e não provada, com especial relevo para a apreciação da prova constituída pelos autos de reconstituição do crime, na sua conjugação com os demais elementos de prova produzidos, deveria merecer uma diferente conclusão.

  4. Considerou o tribunal recorrido, em 11.07.2016, no que respeita à reconstituição do facto, que esta só teve lugar após a tomada de declarações aos arguidos, nessa qualidade e que a ser valorado na parte confessória era uma forma de ludibriar a proibição de prova pelo que não poderia ser atendido, nem valorado.

  5. Dessa sentença proferida, a recorrente interpôs o competente recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra onde, para além do mais, discordou da conclusão alcançada pelo tribunal a quo, mormente, sobre a validade probatória do auto de reconstituição juntos aos autos a fls 32 e ss., isto atendendo ao silêncio do arguido A3 em sede de audiência de julgamento.

  6. Foi proferido douto Acórdão, onde, para além do mais, foi decidido o seguinte: “Defendendo nós que os esclarecimentos prestados pelo arguido na reconstituição de facto são contribuições que se integram no meio de prova autónomo a que alude o art. 150º do C.P.P., com este se confundindo, e que nada obsta a que os órgãos de polícia criminal prestem depoimento sobre os termos e o modo como decorreu a reconstituição do facto, não podemos concordar com a parte da fundamentação da matéria de facto da sentença recorrida. A reconstituição do facto com a contribuição de alguém que assume ter praticado um crime, para poder ser considerada livre, deve ser realizada com a constituição dela como arguido – como foi – pois só assim está informado dos direitos que lhe assistem e que integram o seu estatuto processual. Impunha-se assim que o tribunal recorrido valorasse os autos de reconstituição de factos e por consequência valorasse os depoimentos prestados pelos elementos da GNR, - testemunhas GNR1, GNR2 e GNR3, em conjugação com as declarações da assistente e do arguido A5 e os autos de apreensão, o que não fez pela via da não valoração do meio de prova constituído pelos autos de reconstituição”, realizados nos termos do art. 150º do Código de Processo Penal. A não valoração daquele meio de prova, levou a desconsiderar a restante prova e consequentemente à aplicação do princípio in dubio pro reo. O que necessariamente vem a integrar uma omissão que acarreta a nulidade da sentença, nos termos do disposto no art. 379º nº 1 al. a) do CPP. Impõe-se que o tribunal recorrido reavalie toda a prova, conjugadamente, valorando os autos de reconstituição e elabore nova sentença.” 7. Os autos foram, novamente, apreciados pelo tribunal recorrido que, a nosso entender, incorreu, novamente – e com respeito se diga – teimosamente, no mesmo erro de não valoração do auto de reconstituição, o que, inevitavelmente, conduzirá a nova decisão de nulidade da sentença recorrida, pelo mesmo motivo.

  7. Isto porque, resulta da sentença, agora proferida – cujo conteúdo é o mesmo da anterior, com excepção de mais, extensas, considerações, ali, inseridas, quanto à apreciação do auto de reconstituição – o seguinte: “Ora do auto de reconstituição dos autos o que temos é o arguido, sem a presença de defensor, a descrever, a indicar aos agentes de autoridade o que ele fez, pelo que não podemos ter-se por bem elaborado e de acordo com o que refere o art. 150º, nº 1 do CPP esta diligência de reconstituição dos factos”.

  8. Quanto a este segmento de sentença, ter-se-á que referir que não se entende a consideração feita ao facto de o arguido não estar acompanhado de defensor, no acto de reconstituição de facto, quando em sede de questão prévia, precisamente, quanto à ausência de defensor, dando essa questão por ultrapassada, não sendo susceptível de por em causa a validade dessa diligência. Tendo sido feita essa consideração, não se entende a referência a esse facto, neste segmento.

  9. Analisando a sentença de que se recorre, o tribunal a quo mais não faz do que inserir na sentença mais considerações acerca do auto de reconstituição, mas que, resumidamente, embocam, novamente, no facto de considerar que dali resultam declarações do arguido, raciocínio com o qual não concordamos e que não vai de encontro ao Acórdão proferido do recurso interposto da “primeira” sentença.

  10. Aliás, o que, na sentença anterior, já havia sido, pelo tribunal, concluído, veja-se: “no caso em apreço a reconstituição teve por base as declarações prestadas pelo arguido A3 pelo que atento o disposto no art. 133º do C.P.P., não a podemos valorar.” 12. É, de facto, claramente insuficiente esta conclusão, alcançada pelo tribunal a quo, razão pela qual, demonstraremos a razão de o auto de reconstituição, junto ao autos, dever ser apreciado e valorado, como meio de prova, totalmente, independente das declarações prestadas pelo arguido, em sede de inquérito.

  11. E não se diga, como fez o tribunal a quo, que do auto de reconstituição retira-se somente indicações dadas pelo arguido. Na verdade, a realidade que dali resulta consubstancia a validade do auto de reconstituição do facto, uma vez que desta diligência se pretende retirar que determinada situação poderia, ou não, ter ocorrido de determinada forma.

  12. Tal foi traduzido na reportagem fotográfica que resultou dessa reconstituição e que, sem margem de dúvidas, é susceptível de demonstrar, e elucidar, que o furto aqui em causa era apto a ter ocorrido do modo e locais que resultam desse auto de reconstituição.

  13. Se por si só este auto de reconstituição é susceptível de demonstrar o envolvimento do arguido na participação do furto, a verdade é que este auto, conjugado com a demais prova, é passível de colocar os demais arguidos no caso em questão.

  14. Transpondo, agora, a posição que, nesta matéria assumimos, para o caso concreto, e observando o auto que documentou a diligência, bem como as fotografias que lhe seguem, constatamos que elas traduzem a repetição do caminho percorrido pelos arguidos, desde o local donde furtaram as peças em questão, até ao local onde as venderam, peças que, atendendo à sua dimensão e peso não eram susceptíveis de serem transportadas somente pelo arguido que participou no auto de reconstituição do facto.

  15. Na diligência em causa, o arguido interveniente não se limitou a fazer declarações, antes conduziu os elementos da GNR ao local específico de onde furtaram as peças do alambique, para onde as levaram e aonde, e a quem as venderam.

  16. Trata-se, pois, de auto de «reconstituição dos factos», um meio de prova legalmente permitido, nos termos definidos pelos artigos 125° e 126°, e processualmente admissível, a valorar, nos termos do artigo 127°, segundo as regras da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT