Acórdão nº 80/16.7GBFVN.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Maio de 2018
Magistrado Responsável | ORLANDO GONÇALVES |
Data da Resolução | 23 de Maio de 2018 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em Conferência, na 4.ª Secção, Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra.
Relatório Nos presentes autos de instrução que correm no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria – Juízo de Instrução Criminal de Leiria – Juiz 2, após realização do debate instrutório, o Ex.mo Juiz de Instrução, por despacho de 17 de novembro de 2017, decidiu não pronunciar o arguido AA, pela prática de um crime de furto, p. e p. pelo art.203.º, n.º1 do Código Penal e ordenar o arquivamento dos autos.
Inconformado com o douto despacho de não pronúncia dele interpôs recurso o assistente AS, concluindo a sua motivação do modo seguinte: 1. O Assistente apresentou queixa contra AA e realizadas as diligências de inquérito, foi proferido despacho de arquivamento.
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O Assistente requereu a abertura de Instrução e, realizado debate instrutório, foi proferido Despacho de não pronúncia.
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O Assistente entende que, da realização das diligências no âmbito dos autos, resultam suficientemente indiciados que: 1. O arguido AA esteve na casa do assistente AS na noite de 25 para 26 de Agosto de 2016; 2. Enquanto o assistente dormia, o arguido apropriou-se de uma máquina fotográfica de marca Sony modelo Cybershot DSCTX1P no valor de 289,00 €, uns óculos de sol no valor de 30,00 € e de uma mochila no valor de 35,00 €, pertencentes ao assistente, bem como uma cópia da chave da casa; 3. O arguido saiu da casa do assistente levando consigo a mochila, a máquina fotográfica de marca Sony modelo Cybershot D5CTX1P, os óculos de sol e a cópia da chave da casa, pertencentes a este último; 4. O arguido fez seus os mencionados objectos; 5. O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, com o intuito concretizado de fazer seus os objectos em causa, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam e que actuava sem o conhecimento e contra a vontade do respectivo dono, lesando o patrim6nio deste, o que representou; e 6. O arguido bem sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.
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Tais factos são suportados pela análise e apreciação conjugadas dos documentos dos autos, as declarações do Assistente, o depoimento da testemunha T1, Militar da GNR e o depoimento da testemunha T2.
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O Assistente imputa ao Arguido a prática do crime de furto baseando-se no facto de este ter sido encontrado, cerca de 3 meses (14 de Novembro) depois deste ter estado na casa daquele (de 25 para 26 de Agosto), na posse da mochila, sendo a sua imputação suportada pelas suas declarações e pelo depoimento da testemunha T2 que conhece a existência de um mochila de cor preta, de uma máquina fotográfica cor-de-rosa e de diversos óculos de sol ao Assistente.
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A versão dos factos apresentada pelo Arguido que alegou ter, por lapso, confundido a sua mochila com a do Assistente e que, por engano, tinha levado a mochila do Assistente na madrugada do dia 26 de Agosto, não é razoável ou credível.
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A versão dos factos apresentada pelo Arguido não é compatível com a posição do Assistente e não se coaduna com o facto de, até ser encontrado a usá-la com se fosse sua, não ter procedido à sua devolução no período entre 26 de Agosto e 14 de Novembro de 2016.
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A incongruência do comportamento do Arguido é suficiente para o indiciar pela prática do crime que o Assistente lhe imputa.
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Os indícios recolhidos permitem concluir pela forte probabilidade de condenação do Arguido, inexistindo dúvida séria sobre os acontecimentos, quer no que concerne à subtracção da mochila, quer no que diz respeito à máquina fotográfica, óculos de sol e cópia da chave e que o Arguido agiu dolosamente.
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A força dos indícios, relacionando e conjugando os elementos existentes nos autos, convencem da culpabilidade do Arguido, revelando a convicção de que este virá a ser condenado.
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Impõe-se uma Decisão de Pronúncia do Arguido pela prática como autor material de um crime de furto, previsto e punido pelo artigo 203°, do Código Penal.
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Pelo exposto, ao proferir Despacho de não pronúncia, o douto Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 283°, n.º 2 e 308°, ambos do CPP.
Termos em que, com os fundamentos supra expostos e sempre com o mui douto suprimento de VV. Exa.s, o douto Despacho a quo deve ser revogado e substituído por outro que pronuncie o Arguido pelos factos e crime imputados (autor material de um crime de furto, previsto e punido pelo artigo 203°, do Código Penal) e, decidindo de harmonia com as antecedentes conclusões, VV. Exa.s farão JUSTIÇA.
O Ministério Público no Juízo de Instrução Criminal de Leiria respondeu ao recurso interposto pelo assistente, pugnando pela improcedência do recurso e manutenção inalterada a douta decisão recorrida.
O Ex.mo Procurador-geral adjunto neste Tribunal da Relação emitiu parecer no sentido de que o recurso deverá improceder, confirmando-se a douta decisão recorrida.
Notificado deste parecer, nos termos e para efeitos do n.º 2 do art.417.º do Código de Processo Penal, o recorrente nada disse.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
Fundamentação O despacho recorrido tem o seguinte teor: «I. Iniciaram-se os presentes autos de instrução a requerimento do assistente AS, a fls. 107/108, inconformado com o despacho de arquivamento proferido pelo Ministério Público a fls. 96 a 100, sustentando dever ser proferido despacho de pronúncia do arguido AA pela prática de um crime de furto, p. e p. pelos artigos 203º, n.º 1, do C. Penal.
Aberta a instrução realizou-se apenas debate instrutório.
(…) IV. Feito este introito, analisemos então as questões colocadas nesta instrução.
Os assistentes entendem que o arguido deve ser pronunciado pela prática de um crime de burla qualificada com base na indiciação suficiente da seguinte factualidade: 1. O arguido AA pernoitou na casa do assistente AS na noite de 25 para 26 de Agosto de 2016.
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Enquanto o assistente dormia, o arguido apropriou-se de uma máquina fotográfica de marca Sony, modelo Cybershot DSCTX1P, no valor de € 289, de uns óculos de sol, no valor de € 30 e de uma mochila, no valor de € 35, pertencentes ao assistente, bem como de uma cópia da chave de casa deste.
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O arguido saiu da casa do assistente levando consigo tais objectos, que fez seus.
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Agiu de forma livre, voluntária e consciente, com o intuito concretizado de fazer seus os objectos em causa, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam e que actuava sem o conhecimento e contra a vontade do respectivo dono, lesando o património deste, o que representou.
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Bem sabia o arguido que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.
O assistente sustenta a imputação que faz ao arguido (cfr. fls. 3 a 5 e 29/30), sem que a mesma seja corroborada por qualquer prova, com excepção de o arguido se encontrar, em 14/11/2016, na posse da mochila do assistente (cfr. fls. 14 a 16, 18 e 19). O arguido justificou tal facto dizendo que tinha por lapso confundido a sua mochila com a do assistente e, por isso, tinha levado por engano a mochila errada na madrugada de 26/08/2016. Adiantou que, ao aperceber-se do lapso, tentou contactar o assistente, que nunca atendeu as chamadas feitas pelo arguido. Negou ter-se apropriado de qualquer câmara fotográfica ou óculos de sol do assistente (cfr. fls. 92/93).
É verdade que, como sustenta o assistente, a tese do “engano” não se compatibiliza harmonicamente com o...
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