Acórdão nº 274/13.7TASEI.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA JOSÉ NOGUEIRA
Data da Resolução12 de Setembro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório 1. No âmbito do PCC n.º 274/13.7TASEI do Tribunal Judicial da Comarca da Guarda, Guarda – JC Cível e Criminal – Juiz 3, em 15 de Janeiro de 2018, o Coletivo de Juízes proferiu o acórdão, cujo dispositivo se transcreve [transcrição parcial]: Pelo exposto, acórdão os Juízes que compõem este Tribunal Coletivo em julgar a acusação parcialmente procedente, e assim decidem: […] - condenar o arguido A pela prática, em autoria material e na forma consumada, quanto aos factos vertidos em B), de um crime de prevaricação, p. e p. pelos art.ºs 30º, do Código Penal, 3º, n.º 1, al. i), 3º - A, al. f), e 11º, da lei n.º 34/87, de 16.07, ex vi art.ºs 4.º, alíneas a), subalíneas i) a iii), b), subalíneas i) a iii), do Estatuto dos Eleitos Locais, art.º 9º e 34º, do Decreto-Lei n.º 196/89, de 14 de Junho, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 278/95, de 25-10, e ainda do art.º 13º, do RJUE na redação dada pela Lei n.º 4 –A/2003, de 19-02, na pena de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão, que suspende na sua execução, pelo mesmo período; - absolver os arguidos A (…) das penas acessórias de proibição do exercício de função e/ou de suspensão do exercício de função, previstos nos art.ºs 66º e 67º do Código Penal, assim como não se determina qualquer perda de mandato, que se não mostra sequer requerida (cfr. art.º 29º da Lei n.º 34/87, de 16.07); […] - absolver os arguidos A, B e C da pretensão de perdimento a favor do Estado e correspondente pagamento ao mesmo das quantias de € 10125,07 e € 107.530,00, alegadamente correspondentes à vantagem patrimonial decorrente da prática do aludido crime de prevaricação; […].

  1. Inconformado recorreu o arguido A, formulando as seguintes conclusões: 1 – Vem o presente recurso interposto do douto acórdão de fls que condenou o aqui arguido recorrente pela prática em autoria material e na forma consumada, quanto as factos vertidos em B), de um crime de prevaricação p. e p. pelos art.ºs 30º, do Código Penal, 3º, n.º 1, al. i), 3º - A, al. f), e 11º, da lei n.º 34/87, de 16.07, ex vi art.ºs 4.º, alíneas a), subalíneas i) a iii), b), subalíneas i) a iii), do Estatuto dos Eleitos Locais, art.º 9º e 34º, do Decreto-Lei n.º 196/89, de 14 de Junho, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 278/95, de 25-10, e ainda do art.º 13º, do RJUE na redação dada pela Lei n.º 4 –A/2003, de 19-02, na pena de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão, que suspende na sua execução, pelo mesmo período.

    2 – Entende o arguido aqui recorrente, séria e convictamente que deveria ser absolvido pelo crime porque vem acusado.

    3 – Ora, de acordo com a matéria de facto dada como provada no douto acórdão recorrido, designadamente nos pontos 16, 17, 18 e 35, é pois evidente que à data em que o arguido foi julgado, a sua atuação não está tipificada como crime, tomando em conta a alteração do PDM.

    4 – Quando o despacho foi proferido em 27/12/2005, data da prática do facto ilícito já que vigorava o então primeiro PDM ou seja o publicado no DR, I Série, n.º 169, de 24/07/1997 a que se faz referência no ponto 16 dos factos dados como provados.

    5 – Atenta a alteração do PDM a partir de 27/08/2015 data em que foi publicado o Aviso 9736/2015 no DR., II série, 167, de 27/08/2015, aquela zona passou a ser considerada zona urbana, não se tornando assim necessário qualquer parecer do PNSR atualmente ICNF.

    6 – Ora os PDM`s constituem lei, já que para o efeito são elaborados e publicados em Diário da República.

    7 – E, se é certo que o PDM enquanto lei, não é uma lei penal, a verdade é que, qualquer pessoa que viole qualquer norma inserida no PDM poderá incorrer na prática de um crime.

    8 – Ou seja, os vários preceitos normativos do PDM, ou pelo menos muitos deles, têm relevância e dignidade penal, porquanto a sua violação faz incorrer o infrator em consequências penais, o que foi o caso dos autos.

    9 – No caso em análise, foi a violação de uma regra ou preceito normativo inserida(o) no PDM que originou a prática de um crime de prevaricação por parte do arguido aqui recorrente.

    10 – Porquanto, as normas inseridas pelo PDM têm aplicação para efeito do disposto no artigo 2º nºs 2 e 4 do CP, sendo que no caso em análise existe uma sucessão de duas leis (com caráter e dignidade penal no tempo.

    11 – Ora se efetivamente assim é, não obstante o arguido ter cometido o crime (27/12/2005) na vigência do primeiro PDM (publicado no DR, I serie, n.º 169, de 27/07/1997) que vigorou de 24/07/1997 até 27/08/2015, a verdade é que quando o arguido foi submetido a julgamento, já estava em vigor o segundo PDM (publicado o aviso 9736/2015 no DR, II série, 167, de 27/08/2015), o qual ainda se encontra em vigor e teve o seu início em 27/08/2015.

    12 – É, pois indiscutível que “in casu” ocorre uma sucessão de leis que tem dignidade e consequências penais no tempo e que terão que ser analisadas e ponderadas, designadamente o primeiro PDM (publicado no DR, I série, n.º 169, de 24/07/1997) e o segundo PDM (publicado o aviso 9736/2015 no DR, II série, 167, de 27/08/2015), devendo aplicar-se o preceituado no artigo 2º, n.º 4 do CP, ou seja o princípio da retroatividade da Lei com dignidade penal mais favorável ao arguido.

    13 – Acontece que estamos perante uma sucessão de leis no tempo que posteriormente descriminalizou a atuação do arguido à data da prática dos factos.

    14 – Deveria o Tribunal “a quo” tomar em linha de conta tal situação, designadamente aquela sucessão de leis penais no tempo, de acordo com o princípio da interpretação extensiva a que acima se faz referência no artigo 27, no sentido do arguido aqui recorrente vir a ser absolvido.

    15 – Daí que a sentença recorrida incorreu em vício do art. 410.º, n.º 2 do CPP.

    16 – Não se tendo ocupado o douto acórdão recorrido desta questão, há uma omissão de pronúncia da sentença, o que acarreta a sua nulidade, nos termos do artigo 379º, nº 1, al. c) do Código de Processo Penal, nulidade essa que desde já se invoca para os devidos e legais efeitos.

    17 – Assim, em consequência da nulidade de omissão de pronúncia detetada, deve o acórdão ser substituído por outro que, completando-a, se pronuncie sobre a sucessão de leis no tempo, proceda à aplicação do regime concretamente mais favorável, alterando em conformidade com a matéria de facto dada como provada nos pontos 16, 17, 18 e 35, venha a aplicar o regime mais favorável ao arguido aqui recorrente, ou seja o segundo PDM (publicado o aviso 9736/2015 no DR, II série, 167, de 27/08/2015), no sentido de se vir entender que à data em que o arguido aqui recorrente foi julgado, os factos praticados já não constituíam crime, e o arguido venha a ser absolvido com as legais consequências.

    18 – A decisão jurídica violou ou não fez uma aplicação correta do disposto nos artigos 2º, n.ºs 2 e 4 do CP, artigo 379.º n.º 1 al. c), art. 410.º, n.º 2, art. 414º n.º 4 todos do CPP, e artigo 29.º n.º 4 da CRP.

    Termos em que, Tomando em conta a matéria invocada, e com o douto suprimento de V. Exas. deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta decisão nos termos expostos, com as legais consequências, devendo o arguido ser absolvido, ou quando assim se não entender deverá anular-se o julgamento e o processo baixar à primeira instância no sentido de se aplicar ao arguido o conceito do regime mais favorável, tomando em conta a matéria alegada no artigo 46 destas alegações.

    Decidindo-se em tal conformidade será feita JUSTIÇA! 3. Por despacho exarado a fls. 1843 foi o recurso admitido, com efeito suspensivo.

  2. Ao recurso respondeu a Digna Procuradora da República, concluindo: 1 - O arguido A foi condenado pela prática de um crime de prevaricação, p. e p. pelos artigos 30º do Código Penal, e 3º, n.º 1, al. i), 3º A, al. f) e 11º, da Lei n.º 34/87, de 16/7, ex vi art.ºs 4º, alíneas a), subalíneas i) a iii) e b), subalíneas i) a iii), do estatuto dos Eleitos Locais, art.º 9º e 34º, do Decreto-Lei n.º 196/89, de 14 de junho, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 278/95, de 25/10, e ainda pelo art.º 13º, do RJUE na redação dada pela Lei n.º 4-A/2003, de 19/2, na pena de dois anos e dois meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo.

    2 - Nos presentes autos, o arguido A foi condenado por, em 27.12.2005, ter deferido o pedido de construção da moradia da arguida C dentro da área do Parque Natural da Serra da (…) e fora da área urbana da mesma freguesia, nos termos que melhor constam da factualidade dada como provada nos pontos 10 a 13, 16 a 54, dos factos provados.

    3 - A alteração do PDM de (…) ocorrida em 2015, que excluiu da área do Parque Natural (…) e passou a definir como área urbana da freguesia de (…), o local onde o arguido, em 2005, deferiu o pedido de construção da moradia da arguida C, não consubstancia uma descriminalização da conduta do arguido.

    4 – O douto acórdão recorrido apreciou a questão da ulterior alteração do PDM tendo de forma fundamentada entendido que não está em causa uma descriminalização da conduta e que tal alteração não reveste uma importância decisiva na apreciação do crime em apreço.

    5 – Inexiste a nulidade invocada, prevista na alínea c), do n.º 1, do art. 379º, do Código de Processo Penal, uma vez que a douta decisão, a fls. 1797 a 1799, apreciou precisamente a questão suscitada pelo recorrente no presente recurso, da alteração do PDM ocorrida em 2015.

    6 – O douto acórdão recorrido não violou qualquer imperativo legal nem enferma de qualquer vício, pelo que, não merecendo censura deverá ser integralmente mantido.

    Termos em que deve o recurso interposto pelo arguido A ser julgado improcedente, nos termos acima expostos.

    Assim se fazendo Justiça.

  3. Na Relação o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de o recurso não merecer provimento.

  4. Cumprido o disposto no n.º 2 do artigo 417º do CPP, o recorrente não reagiu.

  5. Realizado o exame preliminar e colhidos os vistos foram os autos à conferência, cumprindo...

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