Acórdão nº 1333/06.8PBLRA-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Novembro de 2007

Data28 Novembro 2007
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência os Juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra.

Nos autos de inquérito acima identificados, que correm termos nos Serviços do Ministério Público da Comarca de Leiria é investigada a prática de factos susceptíveis de integrar o crime de roubo, previsto e punido pelo art.º 210º do Código Penal.

No âmbito do mesmo e sob promoção do Ministério Público, o M.mo JIC, por entender “imprescindível à investigação em curso, que seja disponibilizado o número de cartão de crédito/débito utilizado para efectuar pagamento daquele serviço, número de conta titulada e identificação do titular e entidade bancária, bem como último pagamento efectuado” (despacho de fls. 6/10), determinou que a SIBS remetesse ao Ministério Público tais elementos.

Mais tarde, e após diversas diligências relacionadas com tal apresentação, viria a Caixa Geral de Depósitos a remeter ao Tribunal um ofício cujo teor é o seguinte: “Em resposta à comunicação de V. Exas. Referendada em epígrafe, que nos foi remetida pela SIBS, vimos informar o seguinte: 1. Os elementos solicitados estão sujeitos a segredo bancário, nos termos do artº. 78°. Do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei no. 298/92, de 31 de Dezembro.

  1. Não se verificando, face aos dados fornecidos, nenhuma das excepções estabelecidas no artº. 79°. Do mencionado regime. Designadamente nas alíneas d) e e) do seu n.º. 2, não podemos fornecer os elementos solicitados, sob pena de violarmos o dever de segredo a que estamos legalmente vinculados.

    (…).” O Ministério Público promoveu então “que se dispense da obrigação de sigilo bancário a Caixa Geral de Depósitos relativamente à identificação das pessoas com poderes para movimentarem as contas bancárias através dos quais foram efectuados os carregamentos dos telemóveis referenciados na informação oportunamente enviada à Caixa Geral de Depósitos pela SIBS.

    ” Sobre esta promoção, despachou o M.mo Juiz o seguinte: “Verificando-se que os elementos pretendidos se encontram sob sigilo bancário invocado pela C.G.D., devolvam-se os autos aos serviços do M.P. no sentido de se esclarecer se se pretende o incidente previsto no art.º 135º ou se foi requerida a apreensão prevista no art.º 181º do C.P.P.” O Ministério Público promoveu no sentido de que se procedesse à apreensão dos elementos bancários que anteriormente solicitara.

    É nesta sequência que o M.mo Juiz profere o despacho recorrido e cujo teor se transcreve: “Investiga-se nos autos a prática, além do mais, factos susceptíveis de integrar, entre outros, o crime de roubo p. e p. pelo artº 210°, n.º 1 do Código Penal.

    A fls. 301 veio o DM do Ministério Público requerer a apreensão da documentação bancária ai referida com fundamento de ser imprescindível para a investigação em curso; Dispõe o art.º 181° do CPPenal que o juiz procede à apreensão em bancos ou outras instituições de crédito de documentos, títulos, valores, quantias e quaisquer outros objectos, mesmo em cofres individuais, quando tiver fundadas razões para crer que eles estão relacionados com um crime e se revelarão de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova, mesmo que não pertençam ao arguido ou não estejam depositados em seu nome; No caso concreto dos autos verifica-se que se torna necessário saber a identificação das contas bancárias utilizadas para efectuarem efectuaram os carregamentos bancários referidos a fls. 35.

    Assim por os elementos identificativos acima referidos aparece relacionados com a prática de um rime e por se revelarem de grande interesse para a descoberta da verdade e aquisição da prova, determino a apreensão do suporte documental de tais elementos devendo os mesmos serem remetidos a este tribunal no prazo de 10 (dez) dias; Um vez que os elementos bancários e respectivos suportes documentais já se encontram identificados não considero necessária a deslocação do juiz de instrução à entidade bancária.” Inconformada com este despacho, a Caixa Geral de Depósitos interpôs recurso desta decisão, apresentando as seguintes conclusões: 1. “O Tribunal a quo reitera anterior pedido de informação bancária efectuado pelo Tribunal de Leiria que é protegida pelo dever de segredo (o suporte documental relativo à identificação das pessoas com poderes para movimentarem as contas bancárias através das quais foram efectuados os carregamentos do telemóvel referenciado), nos termos do disposto nos artigos 78.° e 79.° do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF).

  2. A CGD, invocando o dever de segredo bancário ao qual está por lei obrigada, recusou a satisfação do anterior pedido.

  3. Nunca, no seu douto despacho, o Meritíssimo Juiz a quo se pronuncia sobre a legitimidade ou a ilegitimidade da recusa anterior, nem existe qualquer apreciação sobre a questão do sigilo bancário invocado; 4. Existe duplo desvio de legitimação quando o Meritíssimo Juiz a quo procede à apreensão, pois não sabe o que apreender, por um lado, e procura obter pela apreensão o que não consegue pelo estrito respeito do Direito aplicável.

  4. Assim, na parte que se refere à ordem de apreensão dos documentos bancários pretendidos, deverá o despacho ser anulado, pois tal actuação a acontecer, traduziria desvio de legitimação, por não ser legalmente admissível lançar mão de tal dispositivo para contornar uma recusa, legítima, de prestação de informações bancárias (Acórdão do STJ, de 4.11.1981, in BMJ n° 311, Dezembro de 1981, pp. 267 ss.).

  5. Porque se assim não se entender, resultará um outro efeito, altamente pernicioso, para o sistema jurídico: o Juiz estaria a declarar inaplicável e inútil, esvaziando-o de sentindo, o artigo 182° do Código de Processo Penal. O que, além do mais, violaria a injunção sistémica e principialista do artigo 9°, n.º 3, do Código Civil.

  6. Ao nem sequer declarar a dispensa de sigilo bancário, ao não tratar da questão invocada pelo banco, o sigilo bancário, o Juiz não demonstra que não existe lugar à sua invocação legítima. Como diz o Supremo Tribunal de Justiça no seu Acórdão de 27.01.2005, no proc. n° 04B4700 (www.dgsi.pt) «a recusa é legítima se o cumprimento do requisitado ou ordenado implicar violação do sigilo profissional» 8. O tribunal a quo viola o disposto no n.º 3 do artigo 135.°, no sentido em que é da competência do tribunal superior decidir da prestação de...

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