Acórdão nº 26/08.6EACTB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Abril de 2010

Magistrado ResponsávelPILAR DE OLIVEIRA
Data da Resolução28 de Abril de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório No processo comum colectivo nº 26/08.6EACTB do 2º Juízo do Tribunal Judicial de ... o arguido F...

    , devidamente identificado nos autos, foi submetido a julgamento mediante acusação pública da prática de: - Um crime de corrupção de substâncias alimentares ou medicinais p. e p. pelo artigo 282º, nº 1, alínea b) do Código Penal, com referência à alínea a), desse preceito; - Um crime de abate clandestino p. e p. pelo artigo. 22º, nº2, com referência ao nº 1, alínea a), desse preceito; - Um crime contra a genuidade, qualidade ou composição de géneros alimentícios e aditivos alimentares, p. e p. pelo artigo 24º, nº1, alínea c), ex vi do artigo 82º, nºs. 1 e 2, alínea c), todos do Decreto-Lei nº 28/84 de 20/1 .

    Por acórdão de 8 de Julho de 2009 foi decidido condenar o arguido F... pela prática, em concurso real e sob a forma consumada, de: 1. Um crime de corrupção de substâncias alimentares ou medicinais p. e p. pelo artigo 282º, nº1, alínea b) do Código Penal, com referência à alínea a) desse preceito na pena de um ano e seis meses de prisão; 2. Um crime de abate clandestino p. e p. pelo artigo 22º, nº 2, com referência ao nº 1, alínea a) desse preceito, do Decreto-Lei nº 28/84 de 20.1, na pena de seis meses de prisão e cinquenta dias de multa, à taxa diária de cinco euros, ou seja em duzentos e cinquenta euros de multa; 3. Um crime contra a genuidade, qualidade ou composição de géneros alimentícios e aditivos alimentares p. e p. pelo artigo 24º, nº 1, alínea c), ex vi do artigo 82º, nºs. 1 e 2, alínea c), ambos do Decreto-Lei nº 28/84 de 20.1, na pena de sete meses de prisão e cinquenta dias de multa, à taxa diária de cinco euros, ou seja, em duzentos e cinquenta euros de multa; 4. Operando o cúmulo jurídico das penas, condenar o arguido na pena única de prisão de dois anos, e na pena única de multa de setenta dias, à referida taxa diária, ou seja, em trezentos e cinquenta euros de multa; 5. Atenta a idade do arguido, as suas habilitações literárias, e as circunstâncias dos crimes, suspender, nos termos do artigo 50º nº 1 do Código Penal, a pena única de prisão por dois anos.

    1. Determinar o encerramento do estabelecimento por sete meses, nos termos do artigo 17º, nº 1 do Decreto-Lei nº 28/84, a perda dos bens apreendidos, em conformidade com o disposto no artigo 8º alínea a) e 9º nº 1, 22º nº 4 e 24º nº 3 do Decreto-Lei nº 28/84 e 109º nº 1 do Código Penal e a publicação do Acórdão, ao abrigo do disposto nos artigos 8º, nº 1, alínea l), 17º, nº 4, 22º, nº 5, e 24º, nº 4 do Decreto-Lei nº 28/84.

    Inconformado com esta decisão, dela recorreu o arguido, rematando a correspondente motivação com as seguintes conclusões: 1) Os artigos 15 e 3 al. h) do D.L. 274/2007, de 30/07, que instituiu a ASAE, são organicamente inconstitucionais, na medida em que criam um órgão de policia criminal com competências próprias para lavrar autos de noticia, matéria que de acordo com o artigo 164 al. d) e n) da constituição da República Portuguesa é de reserva especifica e absoluta da Assembleia da República e não do governo que, no caso concreto, legislou sobre tal matéria.

    2) Por assim ser, não podiam os Inspectores da ASAE ter efectuado a diligência e elaborado o auto de noticia, que assim se deve julgar como nulo, inexistente ou inválido, o que também constitui falta de inquérito, cominada pelo artigo 118 n° 3 do C.P.P. como nulidade insanável.

    3) O Tribunal recorrido socorreu-se de prova que não podia apreciar nem valorar para dar como provados os pontos 3 e 7 a 11 da factualidade dada como provada.

    4) Isto porque o auto de perícia de fls. 25 invocado para sustentar essa matéria de facto, foi elaborado por pessoas não ouvidas em audiência.

    5) Essas pessoas não têm a qualidade de peritos, por não terem prestado o respectivo compromisso, como determina o artigo 156 do C.P.P., pelo que o auto que elaboraram não tem o valor de prova pericial.

    6) Logo, tudo o que o auto reproduz e não foi confirmado por ninguém em audiência, não pode ser valorado nem dado como provado, em atenção ao disposto no artigo 355 do C.P.P.

    7) Os inspectores da ASAE ouvidos (D..., gravação no CD em 01/06/2009 com inicio às 15h45m52s e A..., gravação no mesmo CD e no mesmo dia com inicio às 16h16m48s) declararam que só a médica veterinária identificada no denominado auto de perícia é que podia explicar e confirmar que os alimentos apreendidos estavam avariados, corruptos e eram provenientes de abate clandestino.

    8) Como a acusação não arrolou essa testemunha nem o Tribunal ordenou que fosse inquirida, toda a factualidade dos pontos 3 e 7 a 11 dos factos provados foi incorrectamente julgada e dada como verificada.

    9) Também ninguém confirmou em audiência que o arguido foi notificado para nomear um consultor técnico, como impõe o artigo 155 do C.P.P., o que também inviabiliza que o auto em causa possa ser valorado como prova pericial, que, de resto, não dispensa que os peritos fundamentem as suas respostas ou conclusões, o que no caso não aconteceu.

    9) A sentença recorrida não fundamenta nem explica a razão pela qual dá como provado o facto do ponto 13, (também incorrectamente julgado), ou seja, que a carne de porco, cabrito, coelho, aves e espécies cinegéticas não apresentam qualquer marca ou sinal comprovativo da respectiva inspecção sanitária, o que constitui inobservância dos requisitos do artigo 374 n° 2 do C.P.P. e a nulidade prevista no artigo 379 n° 1 al. a) do mesmo diploma.

    10) Ninguém afirmou em audiência que o arguido destinava os produtos à venda ao público, não sendo suficiente o juízo de experiência decorrente das quantidades apreendidas e do local onde se encontravam, quer porque foram pesadas ou medidas "a olho", como afirmou o inspector D... (vide gravação já citada), quer porque há quantidades perfeitamente compatíveis com o consumo doméstico, quer porque o arguido vivia no Restaurante, guardando nas mesmas arcas produtos de consumo próprio e de venda ao público.

    11) Daí que também o ponto 14 da matéria de facto tenha sido incorrecta e precipitadamente julgado, incorrendo o Tribunal recorrido, neste caso particular, em erro notório na apreciação da prova.

    12) A sentença recorrida violou ou interpretou incorrectamente os artigos 164 al. d) e n) do CRP, 118 n° 3, 127, 155, 156, 355, 374 n° 2, 379 do C.P.P. e artigo 282 n° 1 al. b) do Cód. Penal e 22 n° 1 a) e 2 e 24 n° 1 al. c) do D.L. 28/84 de 20/01.

    Assim, Deve a mesma ser substituída por outra que julgue inconstitucionais os citados preceitos do D.L. 274/2007 e, em qualquer caso, absolva o arguido dos crimes por que foi condenado.

    Assim se fará JUSTIÇA!!!! Notificado, o Ministério Público respondeu ao recurso interposto, concluindo o seguinte: I. A ASAE não é uma força de segurança, possuindo antes a natureza de um serviço central da administração directa do Estado, dotado de autonomia administrativa, com a missão de, para além do mais, fiscalização e prevenção do cumprimento da legislação reguladora do exercício das actividades económicas.

  2. O D.L 274/2007 de 30/07, na parte em que atribui à ASAE poderes de autoridade e a define como órgão de polícia criminal, não é organicamente inconstitucional, por não se tratar de matéria de reserva legislativa absoluta da Assembleia da República.

  3. Os peritos que tiveram intervenção no auto de notícia foram a Autoridade de Saúde do Concelho de ... e o Médico Veterinário Municipal, sendo que tiveram intervenção na qualidade de funcionários públicos e no exercício das suas funções.

  4. Assim sendo, os mesmos, por força do preceituado no art.91 ° n°6 do Código de Processo Penal, estavam dispensados de prestar o compromisso, pelo que o auto de perícia terá, necessariamente, de ser considerado como tendo o valor de prova pericial.

  5. Resulta do auto de perícia constante nos autos que a advertência do disposto no art.155° do Código de Processo Penal foi feita e que tal auto foi assinado pelo arguido.

  6. Falece, pois, toda a argumentação expendida pelo recorrente sobre a não valoração da perícia enquanto tal, sendo, obviamente, desnecessária a audição dos peritos ou a inquirição de outras pessoas sobre o conteúdo de tal auto pericial VII. O tribunal "ad quo" valorou e ponderou adequadamente a prova produzida, fazendo-o com o respeito pelos critérios legais consagrados no nosso ordenamento jurídico, relatando na sentença proferida a forma como foram dados como provados e não provados os factos, não se vislumbrando que pudesse ter existido outra posição por parte do tribunal.

  7. Não se vislumbra a existência de falta de fundamentação do auto de perícia, uma vez que ali é explicado o modo como foi efectuado o exame, o resultado de tal observação e a conclusão a que chegaram os peritos.

  8. Analisando o teor da fundamentação do acórdão dúvidas não restam que aí é explicado o modo como o Tribunal fundou a sua convicção, não colhendo assim os considerandos expedidos pelo arguido, a este respeito, tendo-se, necessariamente, de concluir pela inexistência de nulidade do acórdão, pois o mesmo deu cumprimento às exigências contidas no art.374° n°2 do Código de Processo Penal.

  9. No caso sub judice, nenhuma das conclusões extraídas da prova J produzida em audiência de julgamento, e que permitiram alicerçar a convicção do Tribunal se mostram contrárias ao que efectivamente resultou provado e não provado, às regras da experiência ou à lógica corrente, não se vislumbrando a existência de erro notório na apreciação da prova.

  10. Pelo exposto, entendemos que falecem de razão todos os argumentos invocados pelo recorrente, não merecendo censura o acórdão proferido pelo tribunal "ad quo", o qual deverá ser mantido na íntegra e assim improceder o recurso.

    Admitido o recurso e remetidos os autos a esta Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto acompanhou a resposta do Ministério Público na 1ª Instância, emitindo, contudo, o seguinte parecer: QUANTO AO DIREITO.

    No que respeita ás considerações feitas quanto ao estatuto da ASAE como " força de segurança " e a reserva...

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