Acórdão nº 67/07.0IDCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Novembro de 2010

Magistrado ResponsávelPAULO GUERRA
Data da Resolução10 de Novembro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I - RELATÓRIO 1.

No Processo Comum Singular n.º 67/07.0IDCBR, no Tribunal Judicial de Condeixa-a-Nova, por sentença datada de 24 de Março de 2003, foi condenado o arguido J...

pela prática do crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelo n. ° 1 do artigo 6°, n. º 3 do artigo 7° e n.° 1 e n.º 4 e n.º 5 do artigo 105°, todos do R.G.I.T., na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa à taxa diária de EUR. 8,00 (oito) euros, perfazendo o montante global de EUR. 960,00 (novecentos e sessenta euros); Mais foi condenada a arguida "NS... CONSULTORIA E APOIO AOS NEGÓCIOS E GESTÃO UNIPESSOAL, LDA", pela prática do crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelo n. ° 1 do artigo 6°, n. º 3 do artigo 7° e n. ° 1 e n.º 4 e n.º 5 do artigo 105°, lodos do R.G.I.T., na pena de 250 (duzentos e cinquenta) dias de multa à taxa diária de EUR. 5,00 (cinco euros), perfazendo o montante global de EUR. 1.250,00 (mil duzentos e cinquenta euros).

2.

O ARGUIDO J... recorreu da sentença, assim concluindo o seu recurso (em transcrição): «a) As vendas a dinheiro relativas a 2005, emitidas em 2007 não foram na maioria recebidas como consta do doc. n.° 2, com 28 folhas junto à contestação, que se dá aqui como reproduzido; b)- As vendas a dinheiro e facturas relativas ao 4º Trimestre de 2005 cujos montantes não foram recebidos constam do doc. 3 junto à contestação e somam o imposto na quantia de 1.648.72€.

c)- Se a 9.046.00 € lhe subtrairmos estes 1 .648.72.€ temos 7.397.28€.

d)- Esta importância é inferior a 7.500.00€, logo está despenalizada.

e)- Mas se se verificar o documento de fls 1 c/7 fls, verificamos que foram oferecidos ao Serviço de Finanças de Coimbra 2, créditos no valor de 50.587.00€ , para pagamento de dívidas no montante de 30.000.00€, contudo, apenas foram cobrados 3.827.43€.

f)- Há que convir que a cobrança de receitas não é apenas difícil ou impossível para a administração fiscal. O mesmo se passa com os substitutos tributários.

g)- A omissão de liquidação de serviços prestados e do correspondente imposto não preenche o tipo legal de crime de abuso de confiança fiscal, por ausência dos respectivos elementos do tipo legal - cobrança e apropriação.

h)- Apenas fica sujeita a contra-ordenarão nos termos do Art.° 31 .° n.° 2 do R.G.I.T.

i)- A emissão de vendas a dinheiro imposta pelo Sr Inspector viola o prescrito no Art.°35.°, n.º 1 do Código do IVA; j)- O parecer exemplificativo emitido pela Técnica da DGI, P..., e que se encontra junto aos autos, não suporta uma motivação ou fundamento de imputação criminal.

k)- As exemplificações apenas podem suportar presunções e, estas podem fundamentar a tributação por avaliação indirecta.

l)- A avaliação indirecta é feita nos termos do Art. 87.° e 88.° da Lei Geral Tributária, sujeita a reclamação para a Comissão de Revisão nos termos do Art.° 91º do mesmo Diploma.

  1. — O parecer da Técnica e testemunha de acusação, P... baseado “ do que tinha dado a conhecer pelos colegas “, não pode servir de meio de prova (art.° 129.° do Código de Processo Penal).

    n)- A factualidade ora se diz respeitar ao 4.° Trimestre de 2005 ora se diz respeitar a 15 de Fevereiro de 2006.

  2. A sentença não clarifica, mas confunde o que é uma liquidação; uma cobrança, um envio de imposto aos Serviços do IVA.

    p)- Os factos relativos a omissão de facturação a empresas falidas e desaparecidas, remontam ao 4.° Trimestre de 2005, q)- No 4. Trimestre de 2005 a firma que laborava era a NS... U1. gerida por dois sócios J... e Bruno Rebelo; r) - A sentença não atribuiu os factos ao momento da sua prática para imputação de responsabilidades à gestão. Art.° 3.° do Código Penal.

    s)- O depoimento da testemunha Jorge Sá, inspector tributário, evidencia não ter certezas de nada, pois são constantes as expressões: Não tenho ti certeza; fiquei com a ideia que estavam a emitir recibos; alguns serviços/oram prestados gratuitamente; calculei o imposto com base judiciária, sobre como chegou ao montante liquidado disse.’ Terá sido; Dá uma ideia de verbas que terá recebido. E sempre difícil.

    t)- Sobre as vendas a dinheiro elaboradas por sua ordem e em face da relação extraída dos Serviços de Finanças com os nomes dos clientes que não haviam sido facturados os serviços prestados e IVA, respondeu: Não sei se me passaram pelas mãos...

    Não conferi.

  3. — Não conferindo as vendas a dinheiro, ainda que ilegalmente processadas, não pode depor com exactidão sobre o montante liquidado, recebido e entregue ao Estado.

  4. -- As testemunhas de defesa D... e P…, no seu depoimento responderam com segurança que foi o Sr. inspector que impôs a emissão de vendas a dinheiro pela NS... Unipessoal no ano de 2007( período da inspecção) relativas a 2005 e à NS... Lª.

  5. - A prova produzida não demonstra com segurança e certezas jurídicas o montante de imposto recebido, nem tão pouco o liquidado; x)- O recorrente e sociedade condenada, não se apropriaram de qualquer montante de imposto a entregar ao Estado, porque não foi feita a liquidação pela sociedade antecessora e seus gerentes; y)- A falta de liquidação não preenche o tipo legal de crime de abuso de confiança por lhe faltar os dois elementos do tipo legal de crime — Cobrança e apropriação de imposto; z)- O recorrente e sociedade arguida foram condenados por acção típica impossível.

    (…) Vossas Excelências absolverão o recorrente (…)» 3.

    O Ministério Público da 1ª instância respondeu a este recurso, defendendo a justeza do sentenciado, pedindo a final a negação de provimento a este recurso.

    4.

    Nesta Relação, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta deu o seu PARECER, defendendo a improcedência do recurso.

    5.

    Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, foram colhidos os vistos, após o que foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419.º, n.º 3, alínea c), do mesmo diploma.

    II – FUNDAMENTAÇÃO 1.

    Conforme jurisprudência constante e amplamente pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. artigos 119º, n.º 1, 123º, n.º 2, 410º, n.º 2, alíneas a), b) e c) do CPP, Acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória do STJ de 19/10/1995, publicado em 28/12/1995 e, entre muitos, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242 e de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271).

    Assim, balizados pelos termos das conclusões Diga-se aqui que são só as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas conclusões da respectiva motivação que o tribunal de recurso tem de apreciar (cfr. Germano Marques da Silva, Volume III, 2ª edição, 2000, fls 335 - «Daí que, se o recorrente não retoma nas conclusões as questões que desenvolveu no corpo da motivação (porque se esqueceu ou porque pretendeu restringi8r o objecto do recurso), o Tribunal Superior só conhecerá das que constam das conclusões») – Cfr. ainda Acórdão da Relação de Évora de 7/4/2005 in www.dgsi.pt.

    formuladas em sede de recurso, as questões a resolver consistem em · saber se há que modificar a matéria de facto apurada; · saber qual o relevo o facto de não ter sido recebida a maioria das vendas a dinheiro; · saber se a conduta do agente está despenalizada; · saber se há efeitos jurídicos nesta sede por conta da «mutação» da pessoa colectiva; · saber se se exige apropriação.

    2.

    DA SENTENÇA RECORRIDA 2.1. Na sentença recorrida, é este o rol de FACTOS PROVADOS (em transcrição): «1. A sociedade primeira arguida é uma sociedade por quotas.

    2. Enquadra-se para efeitos de I.V.A. no regime normal da periodicidade trimestral pelo exercício da actividade de "outras actividades consultoria, CAE 70220".

    3. O arguido J… é sócio e único gerente da sociedade “NS... Consultoria e Apoio aos Negócios e Gestão Unipessoal, Lda.”, desde 20/01/2006 até à presente data.

    4. A sociedade arguida, em conjunto com o arguido J…, na qualidade de gerente daquela sociedade, liquidou o I.V.A. por serviços prestados e pagos pelos seus clientes, durante os anos de 2005 e 2006.

    5. Actuou assim a primeira arguida, conjuntamente com o arguido J…, no exercício das suas funções e na qualidade de sócio gerente daquela, dando as instruções e ordens atinentes, nomeadamente, no que concerne à liquidação e cobrança do I.V.A. devido pela actividade que desenvolve para posterior entrega à Administração Fiscal.

    6. Porém, e no que diz respeito ao período tributário 05.12T, os arguidos jamais entregaram à Administração Fiscal a importância retida no prazo legal para entrega daquela prestação tributária, nem tão pouco nos 90 dias seguintes ao termo de tal prazo.

    7. A vantagem patrimonial global, decorrente da conduta descrita cifra-se em €9.046,85, relativamente ao IVA referente ao período de tributação 05.12T.

    8. Omitindo os pagamentos da quantia referida em 7), os arguidos actuaram com o intuito de obter, como conseguiram, benefícios patrimoniais que bem sabiam ser ilegítimos, tendo com tal conduta causado prejuízo ao Estado.

    9. Com efeito, os arguidos bem sabiam que as quantias cobradas a título de I.V.A. se destinavam ao Estado e que não estavam, por qualquer forma, legitimados a integrá-los no seu património ou no património social, como fizeram.

    10. Mais agiram com o conhecimento de que com a sua conduta ofendiam o erário estadual, bem sabendo que era sua obrigação entregá-la nos respectivos prazos.

    11. Agiram os arguidos de modo livre, voluntário e consciente, bem sabendo que a sua conduta era ilícita e criminalmente punível.

    12. O arguido não tem antecedentes criminais registados; 13. Pela sociedade arguida foram emitidas as vendas a dinheiro que constam de fls. 281 a fls. 306 dos autos; 14. É prestador de serviços de consultoria e contabilidade com vencimento de EUR.570,00.

    15. Recebe EUR. 600,00 pelo arrendamento do estabelecimento da empresa da qual é sócio-gerente; 16. Vive com a mulher que aufere vencimento de EUR.1.000,00 17. Despende EUR. 600,00 mensais com credito à habitação; 2.3...

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