Acórdão nº 25/09.0TAVGS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Julho de 2010
Magistrado Responsável | PAULO VALÉRIO |
Data da Resolução | 14 de Julho de 2010 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Em conferência na 5.ª secção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra 1- No juízo de média instância criminal de Vagos- Comarca do Baixo Vouga, no processo acima identificado, foi, a fls 38 sgs, proferido despacho judicial rejeitando a acusação do Ministério Publico contra um determinado arguido pela prática de um crime de desobediência, por se ter entendido que os factos acusados não podiam integrar aquele tipo legal.
2- O magistrado do Ministério Público na 1.ª instância recorre, concluindo deste modo : Decorre dos elementos carreados para os presentes autos que na sentença proferida nos autos de Processo Especial Sumário n.° 46/08.00AVGS, foi cominado com o crime de desobediência a falta da entrega da carta de condução pelo arguido, no prazo de dez dias após o trânsito, o qual ocorreu em 07/03/2008.
Com o trânsito em julgado da sentença dos autos de Processo Especial Sumário n.° 46/08.OGAVGS, consolidaram-se na Ordem Jurídica todos os efeitos penais dali decorrentes, nos termos do artigo 467°, n.° 1, do Código de Processo Penal.
Não devia o Tribunal considerar não ser legítima nem emanar de autoridade competente aquela cominação com a prática de um crime de desobediência, nos termos do art. 348°, n.° 1, alínea b), do Código Penal, pela falta de entrega da carta de condução no prazo de dez dias após o trânsito.
Não será de efectuar uma interpretação minimalista do artigo 348°, n.° 1, alínea b) do Código Penal, pois, caso contrário, estar-se-ia a esvaziar a norma nos casos em que a advertência é feita, como o foi na sentença condenatória proferida no Processo Especial Sumário n.° 46/08.OGAVGS, a fim de garantir o cumprimento da pena acessória por parte do arguido e, nessa medida, proteger a autonomia intencional do Estado de Direito.
O crime de desobediência consumou-se com a omissão do acto determinado, consubstanciada, in casu, com a falta de entrega da carta de condução pelo arguido no prazo de dez dias após o trânsito.
Se se entender que não é legítimo ao Tribunal cominar a falta de entrega da carta de condução com a prática do crime de desobediência, e se o arguido recusasse a entrega da carta perante a autoridade policial, nos termos do artigo 500°, n.° 3, do Código de Processo Penal, não haveria quaisquer consequências para o incumprimento.
Com efeito, se o Tribunal não puder, desde logo, no acórdão condenatório, cominar com a prática de crime a falta de entrega da carta de condução, também a autoridade policial, num segundo momento que viesse a ocorrer e na sequência do artigo 500°, n.° 3, do Código de Processo Penal, não poderia cominar com tal crime a eventual e reiterada falta de entrega daquele documento por parte do arguido perante as autoridades policiais.
A conduta do arguido de não entrega voluntária da carta e não se logrando proceder à apreensão daquele documento nos termos do artigo 500°, n.° 3, do Código de Processo Penal, cominaria na ausência de quaisquer consequências para a recusa do arguido em cumprir a pena acessória a que está obrigado.
A eventual recusa de o arguido cumprir com a pena acessória, traduzida na falta da entrega da carta de condução, parece-nos ser merecedora de suficiente dignidade a valorar em termos penais, pois, a assim não ser, equivaleria a admitir-se a possibilidade de deixar à consideração do arguido a decisão de cumprir ou não com tal pena acessória, ou de cumpri-la apenas quando entendesse.
A cominação com o crime de desobediência obsta à pretensão do arguido que pretenda subtrair-se ao cumprimento da pena acessória em que foi condenado por acórdão e reforça a confiança da comunidade na validade da norma penal violada.
Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se o douto despacho recorrido por violar o disposto nos artigos 348°, n.° 1, alínea b), do Código Penal e 311°, n.° 1, 2, alínea a) e 3, alínea d), do Código de Processo Penal, e ordenando-se a sua substituição por outro a determinar o recebimento da acusação e designação de data para a audiência.
3- O Exmo PGA nesta Relação pronuncia-se pela improcedência do recurso 4 - Foram colhidos os vistos legais e teve lugar a conferência.
5- O objecto do presente recurso, tal como vem definido nas conclusões do recurso traduz-se em saber se os factos narrados na acusação publica de fls 27 ss consubstanciam a prática de um crime de desobediência , p.p. pelo art. 348.º-1-b do CodPenal No que agora interessa, o despacho recorrido tem o seguinte teor : «(...) para a existência deste crime, para além do que se estabelece no corpo do n.º 1, é necessário que, em alternativa, se verifique ainda o condicionalismo de alguma das alíneas deste número – neste...
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