Acórdão nº 195/07.2GTCTB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 19 de Outubro de 2010

Magistrado ResponsávelMOURAZ LOPES
Data da Resolução19 de Outubro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I. RELATÓRIO.

No processo Comum singular n.º 195/07.2GTCBR, após acusação da primeira arguida e pronúncia de ambos, C e F melhor identificados nos autos, foram julgados em audiência publica tendo, a final o Tribunal deliberado: 1) - Absolver o arguido F da prática de: dezassete crimes de homicídio por negligência, p. e p, pelos artigos 137°, nº 1, e 30°, n.º 1, do C.Penal; três crimes de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelos artigos 148°, n° 1, e 30°, nº 1, do Código Penal; três crimes de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelos artigos 148°, n.os 1 e 3, por referência ao disposto no artigo 144°, alíneas b) e d), e 30°, n.º1, do Código Penal; das contra-ordenações p. e p. pelos artigos 13,°, n.º 1, e 39.°, n.ºs 1 e 2, do Código da Estrada.

2) – Absolver a arguida C da prática de: um crime de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelos artigos 148°, n.os 1 e 3, por referência ao disposto no artigo 144°, alíneas b) e d), e 30°, n.º1, do C.Penal; das contra-ordenações p. e p. pelos artigos 27º, , n.ºs 1 e 2, a) e 38º, n.ºs 1 e 2, ambos do C.Estrada.

3) – Condenar a arguida C pela prática de: dezassete crimes de homicídio por negligência, p. e p, pelos artigos 137°, nº 1, e 30°, n.º 1, do C.Penal, na pena de 5 meses de prisão para cada um; quatro crimes de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelos artigos 148°, n° 1, e 30°, nº 1, do C.Penal, na pena de 2 meses de prisão para cada um; dois crimes de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelos artigos 148°, n.os 1 e 3, por referência ao disposto no artigo 144°, alínea b), e 30°, n.º1, do C.Penal, na pena de 3 meses de prisão para cada um. Condenar a arguida na pena única de 4 anos e 4 meses de prisão, cuja execução se suspende, por igual período de tempo, sob regime de prova.

4) Sancionar a arguida pela prática de uma contraordenação p. e p. pelos artigos 38º, n.ºs 3 e 4, 146º, h) e 147º, todos do C. Estrada, e 17º, n.º 2, do Regime Geral das Contraordenações e Coimas, na coima de €220, 00, e na sanção acessória de inibição de conduzir, pelo período de 10 meses.

5) Condenar a arguida em taxa de justiça, que se fixa em 8 Ucs., acrescidas de 1%, e nas custas, com procuradoria mínima.

Não se conformando com a decisão, vieram o Ministério Público, a arguida e o assistente J interpôr recursos da mesma para este Tribunal, concluindo nas suas motivações nos seguintes termos: O Ministério Público: 1 - A arguida C foi condenada pela prática de: — Dezassete crimes de homicídio por negligência, p. e p. pelos art.°s 137°, n.° 1 e 30°, n.° 1 do CP numa pena de 5 meses de prisão por cada um desses crimes; — Quatro crimes de ofensa à integridade fisica por negligência, p. e p. p. pelos art.°s 148°, n.° 1 e 30°, n.° 1 do CP, numa pena de 2 meses de prisão por cada um; — Dois crimes de ofensa à integridade fisica por negligência p. e p. pelos art.°s 148°, n° 1 e 3, por referência ao disposto no art.° 144°, ai. b) e 30°, n.° 1 do CP, numa pena de 3 meses de prisão para cada um.

Em cúmulo jurídico foi condenado numa pena única de 4 anos e 4 meses de prisão, declarada suspensa na sua execução.

Foi ainda condenada na coima de 220,00 € e na pena acessória de inibição de conduzir pelos períodos de 10 meses.

2 — Todos os apontados crimes resultaram de um único acidente de viação que se traduziu num embate entre dois veículos e subsequente despiste, sendo certo que as vítimas eram todos passageiros do mesmo veículo.

3 - O tribunal considerou verificarem-se os pressupostos do concurso real de infracções, nos termos dos artigos 137° n.° 1, 148°, n.° 1 e 3 e 30°, n.° 1 todos do CP.

4 — A arguida ao agir da forma como consta da matéria provada, fé-lo de modo livre e voluntário, com a falta de cuidado a que estava obrigada e de que era capaz nas circunstâncias concretas, segundo os seus conhecimentos e capacidades pessoais, sem representar como possível a ocorrência do resultado morte dos passageiros identificados de fis. 20.1 21.17 e as lesões fisicas em, pelo menos, os passageiros identificados de 21 . 1 e 21 .6, e, em consequência disso, a realização de tipo legal de crime.

5 Embora pudesse e devesse fazer tal representação como possível.

6 — Numa acção negligente como a que resulta da matéria provada só pode ser imputado à arguida o resultado da acção ou omissão desde que o mesmo resultado fosse previsível ao tempo da acção, isto é, se a arguida pudesse ter configurado em concreto a possibilidade da existência de várias vítimas.

7 — À luz das regras da experiência comum não se pode afirmar que a arguida soubesse ou tivesse obrigação de saber quantos ocupantes iam no veículo com o qual embateu, para além do condutor.

8 — Estamos perante uma única resolução e mesmo perante uma única acção por parte da arguida.

9 — Existe, por outra parte, uma única violação do dever de cuidado, consubstanciada na violação de normas estradais.

10 — Não é, assim, possível imputar à arguida mais do que um único juízo de censura, sem estarmos a fundamentar-nos em elementos aleatórios que têm a ver com um número incerto e desconhecido para aquela, de ocupantes do veículo no qual embate, durante a ultrapassagem.

11 — Não sendo possível essa imputação e, ocorrendo resultados diversos da acção ou omissão criminosa, a determinação concreta da pena será agravada pelas suas consequências de acordo com o disposto no art.° 710, n.° 2 ai. a)do CP.

12— Ao decidir como o fez o douto acórdão, violou, o tribunal o disposto nos artigos 300, 137°, 148° e 71°, n° 1 e 2 ai. a) do CP, na sua interpretação conjugada e ainda o disposto no art.° 127 do mesmo diploma legal.

13 - Devendo o tribunal considerar apenas a existência de um único crime de homicídio por negligência, agravado pelos resultados, deverá a arguida ser condenada numa pena de prisão que se aproxime do limite máximo da moldura penal aplicável, no mais se mantendo o doutamente decidido.

A arguida:

  1. O relatório do IMTT não determina a causa do acidente alegadamente por falta de elementos, e, segundo o que foi referido pelos Srs Peritos em audiência, por não lhes ter sido pedida a averiguação da causa, enquanto o relatório da De… averigua e define tal causa, por tal lhe ter sido pedida, sendo por conseguinte complementar àquele B) O Tribunal Recorrido, conjugando o depoimento da testemunha I com o depoimento do Sr Eng S e do relatório por ele elaborado e junto aos autos, elementos que, aliados à reconstituição no local feita em sede de instrução, tinha que dar como provado que o pesado de passageiros invadiu a faixa esquerda de rodagem, no momento em que o ligeiro se encontrava a ultrapassá-lo, sendo tal invasão que determinou a arguida a desviar-se para a esquerda e a despistar-se, impondo- se outra resposta à dada no ponto 9 dos factos provados.

  2. O Tribunal Recorrido podia e devia determinar nova reconstituição do acidente no local, colocando desta vez o veículo pesado a circular de trás para a frente nos 26,8 metros que antecederam o embate do ligeiro na cava da roda traseira, e a descrever as “várias trajectórias possíveis” referidas pelos Peritos, até ao ponto em que deixa a marca de arrastamento do pneu no asfalto, marca essa obliquada da esquerda para a direita.

  3. A arguida não tem qualquer dúvida em afirmar que o veículo pesado invadiu a sua faixa de rodagem quando o ultrapassava, facto que percepcionou por visualização da lateral do autocarro muito próxima do seu veículo, e por ter a certeza absoluta de não ter desviado a sua trajectória até então.

  4. A conclusão dos Peritos do IMTT é a de que o autocarro pode ter circulado na faixa de rodagem do lado esquerdo , como pode não ter circulado, não lhes sendo possível a análise desta questão por falta de elementos objectivos, enquanto o relatório do Sr Eng S consegue determinar este elemento importante, ou seja a causa do acidente em si, utilizando o mesmo software de simulação computacional.

  5. Os relatórios são divergentes em vários pontos: 1° Os Srs Peritos, por falta de elementos objectivos, dizem não poder definir se o pesado invadiu ou não a faixa de rodagem esquerda, mas estranhamente já conseguem posicionar o ligeiro cinco metros atrás da perpendicular da traseira do autocarro quando inicia o despiste para a esquerda, o que, para conseguirem chegar a tal medida, tinham que posicionar o autocarro e o ligeiro a velocidades precisas e rigorosas sem margens de erro.

    1. O Sr Eng S , em demonstração animada em computador, posiciona o inicio do desvio do ligeiro para a esquerda quando este está em paralelo com o autocarro, posicionando o ligeiro com 20 cm da frente em paralelo com o autocarro, afirmando categoricamente o mesmo que o momento da invasão da faixa esquerda pelo autocarro é coincidente com o inicio do despiste do ligeiro para o lado esquerdo da faixa de rodagem..

    30 Refere o Sr Perito JC que não é possível dizer o que está por trás das marcas do veículo ligeiro antes do despiste, enquanto o Sr Eng S define o que está para trás através da curvatura da marca do pneu sobre a guia sonora.

  6. Ambos os Peritos e o Eng S coincidem num ponto, que é o autocarro estar a descrever uma trajectória para a direita quando sofreu oprimeiro embate, sendo uma verdade indesmentível é a de que, estando a descrever uma trajectória para a direita, vem necessariamente do lado esquerdo.

  7. Em julgamento, quando foram inquiridos pela primeira vez os Peritos do IMTT, afirmaram que não definiram a distância da marca de travagem do pneu do autocarro quer no seu começo quer no seu fim, tendo a instâncias do Tribunal, entregue tais medições por fax, e, para espanto de todos, tais medidas que entregaram e nas quais se basearam para fazer a simulação computacional, estão completamente erradas, viciando assim o resultado da simulação computacional que apresentaram, enquanto as medidas trazidas ao Tribunal pelo Sr Eng S, obtidas por medição com fita métrica um dia e meio depois do acidente, são coincidentes com as da GNR tiradas no dia...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT