Acórdão nº 258/08.7GDLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Maio de 2010

Magistrado ResponsávelORLANDO GONÇALVES
Data da Resolução12 de Maio de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Relatório Pelo 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, sob acusação do Ministério Público e acusações particulares, foram submetidos a julgamento em processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, os arguidos HH divorciado, nascido a 11 de… de 1959, filho de M e MJ, natural da freguesia … Leiria, residente na Rua …. Leiria, e MV, divorciada, operária fabril, nascida a 16-…-1960, filha de A e Z natural da freguesia…. Leiria, residente na Rua…, Leiria, imputando: - o Ministério Público, a cada um dos arguidos, a prática de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143.º, n.º 1 do Código Penal; - a assistente MV, ao arguido HH acompanhada pelo Ministério Público, a prática de um crime de injúrias na forma continuada, p. e p. pelo artigo 181.º do Código Penal; e - o assistente HH à arguida MV, não acompanhado pelo Ministério Público, a prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 252.º do Código Penal e ainda a prática de um crime de injúrias, p. e p. pelo artigo 181.º e 183.º do Código Penal.

O arguido/assistente HH deduziu pedido de indemnização civil contra a arguida, pedindo a sua condenação no pagamento de quantia não inferior a € 1.000,00, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros, à taxa legal.

A arguida/assistente MV, deduziu pedido de indemnização civil contra o arguido, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de € 2.500,00, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros, à taxa legal.

Realizada a audiência de julgamento – durante a qual foi comunicada ao Ministério Público e aos arguidos/assistentes uma alteração substancial dos factos, à qual foi respondido que não se opunham à continuação do julgamento pelos novos factos, nos termos do art.359.º, n.º3 do C.P.P. – o Tribunal Singular, por sentença proferida 13 de Janeiro de 2010, decidiu: - condenar o arguido HH , como autor material (art. 26.º do Código Penal) de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.º, n.º1, alínea a) e n.º 2. do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 9 (nove) meses de prisão, suspensa na execução por igual período; - condenar o arguido HH na pena acessória de proibição de contacto com a sua ex-mulher, a assistente, pelo período de 2 (dois) e 9 (nove) meses, bem como a frequência de programa específico de violência doméstica; - absolver a arguida MV da prática de um crime de ofensa á integridade física simples, p. e p. pelo art.143.º, n.º1 do Código Penal; - absolver a arguida MV da prática de um crime de injúria p. e p. pelo art.181.º do Código Penal; e - condenar o arguido no pagamento, à demandante, da quantia de 1.500,00€ a título de indemnização por danos não patrimoniais.

Inconformado com a douta sentença dela interpôs recurso o arguido HH , concluindo a sua motivação do modo seguinte: 1) O arguido praticou parcialmente os factos descritos na acusação; 2) Designadamente provocou à ofendida as lesões descritas nos autos embora a do braço e mão direitas por via indirecta.

3) A ofendida agrediu o arguido com um pau.

4) Por estes factos o arguido devia ser condenado pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples p.p. pelo art.143.º, n.º1 do C.P., na pena de multa e ser fixada uma indemnização civil de valor muito inferior ao fixado na sentença.

5) Não o tendo assim considerado cometeu a sentença um erro notório na apreciação da prova e na aplicação do direito ( art.410.º, n.º3 , do C.P.P.); 6) A matéria de facto dada como provada é insuficiente para condenar o arguido pelo crime de violência doméstica ( art.410.º, n.º 2, al.a) do C.P.P.); 7) E foram dados por provados os factos constantes dos n.ºs 8, 20, 21 e 22 ( este último respeitante à expressão “ com quem tinha sido casado” que não o deviam ter sido, nem que fosse por aplicação do princípio in dúbio pró reo. Na verdade, ao tempo ofendida e arguido eram casados), que deviam ser dados por não provados atenta a insuficiência da prova quer em termos de rigor quer de falta de imparcialidade, atentas as relações inamistosas da ofendida e testemunhas com o arguido. E as regras da experiência no que diz respeito às lesões apresentadas pela ofendida no nariz que não se coadunam com um murro dado naquela zona por um homem de estatura vulgar.

8) E devia ter sido dado por provado que ofendida e arguido ora não vivem juntos e o ponto 27 devia ser acrescido da expressão “renal”.

9) O crime de violência domestica é um crime que tutela a saúde enquanto bem jurídico complexo complexo e cuja prática pode conduzir a um impedimento ou dificuldade acrescida a desenvolvimento normal e saudável da personalidade ou que afectem a dignidade pessoal, tal como ensina o Prof. Américo Taipa de Carvalho e o douto acórdão desta mesma Relação de Coimbra supra citado..

10) Ora, os actos praticados pelo arguido, supra contextualizados, não se inserem neste enquadramento fáctico-legal não devendo por isso ter-se procedido á alteração dos factos provindos da acusação nem se devia ter procedido a esta qualificação jurídica.

11) Atento o facto de ofendida e arguido viverem em casas separadas não se justifica a frequência de qualquer curso de violência doméstica.

12) Os factos que devem ser dados por provados, quer por eliminação dos que erroneamente o foram assim considerados quer pelo aditamento de novos factos, impõem decisão diversa da recorrida, bastando para tal ouvir as gravações dos depoimentos da ofendida e dos filhos apara além da H e MF supra referidos e identificados e as regras da experiência.

l3) A não ter assim considerado a douta sentença recorrida violou os artigos 70.º,71.º,72.º, 143.º, e 152.º, n.º2 , do Código Penal; artigos 374.º,n.º2 e 410.º, n.º2, alíneas a) e c) do Código de Processo Penal 14) Face a todos os fundamentos expostos neste recurso, deve a sentença ser revogada e o arguido ser condenado pela prática do crime de ofensa á integridade física simples p.e p. pelo art.143.º, n.º 1, do CP em pena de multa, ou e, sem conceder, na pena mínima prevista no art. 152.º, n.º 2, do mesmo Código sem a imposição de frequência de qualquer curso e suspensa na sua execução por igual período. Deve a indemnização fixada ser substancialmente reduzida para o montante a fixar por V. Exas. Segundo juízos de equidade mas nunca superior a 500 euros atenta a diminuta gravidade dos ferimentos e a reciprocidade das ofensas físicas, requerendo nos termos do artigo 412.º, n.º 6 do CPP que se proceda a audição dos depoimentos da ofendida e testemunhas supra indicadas e às passagens indicadas pelo arguido.

Assim se fazendo a necessária e acostumada Justiça.

O Ministério Público na Comarca de Leiria respondeu ao recurso interposto pelo arguido pugnando pela improcedência deste e manutenção da sentença recorrida.

O Ex.mo Procurador-geral-adjunto neste Tribunal da Relação emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso e manutenção da sentença recorrida.

Foi dado cumprimento ao disposto no art.417.º n.º2 do Código de Processo Penal.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

Fundamentação A matéria de facto apurada e respectiva motivação constante da sentença recorrida é a seguinte: Factos provados Da culpabilidade 1 – Em 2008 HH e MV eram casados entre si e residiam na mesma casa, no entanto, não partilhavam, cama, mesa, ou vivências diárias.

2- No dia 18 de Maio de 2008, na residência de ambos, no momento em que a arguida/assistente se dirigia à porta para sair, o arguido/assistente seguiu atrás dela verbalizando expressões como “puta, já vais para o cabredo”.

3 – A arguida/assistente voltou-se para trás e fez um “pirete”, mantendo apenas o dedo médio da mão erguido.

4 – Nesse mesmo dia - 18 de Maio de 2008 - pelas 3.30H, junto da residência de ambos, na Rua da …. comarca de Leiria, e no momento em que a arguida/assistente estava a entrar pelo portão de sua casa, o arguido/assistente dirigiu-se à assistente/arguida e proferiu a expressão “faz piletes agora”; 3 – Seguidamente, deu-lhe um empurrão fazendo com que esta caísse.

4 – Na sequência do empurrão sofrido a arguida/assistente foi projectada contra a parede e caiu em cima de uns sacos que ali se encontravam.

5 – A arguida/assistente pegou num pau que ali se encontrava..

6 – Ao ver a arguida/assistente com o pau na mão o arguido/assistente voltou a empurrá-la.

7 – Seguidamente a arguida/assistente, desferiu-lhe uma pancada no braço direito.

8 - Acto contínuo, o arguido/assistente desferiu-lhe um murro no nariz.

9 – Com tal conduta o arguido/assistente provocou à arguida/assistente: a) No crâneo: equimose arroxeada no vértice do dorso do nariz, medindo um centímetro de comprimento por três milímetros de largura, sobre o qual assenta uma escoriação, recoberta de crosta sanguínea, linear, horizontal, medindo um centímetro de comprimento; b) No membro superior direito: escoriação, coberta de crosta sanguínea, na região tenar da mão direita, medindo dois milímetros de diâmetro, escoriação, recoberta de crosta sanguínea, na face plantar da 1ª falange do 5º dedo da mão direita, medindo três milímetros de diâmetro.

10 – Na sequência do acto referido em 7 a arguida/assistente provocou no arguido/assistente equimose tenuamente arroxeada, no terço médio da face posterior do antebraço direito com dois centímetros de diâmetro no membro superior direito, que foram causa directa e necessária de 5 dias de doença, três dos quais com afectação para o trabalho em geral e profissional.

11 - Em Maio de 2008, num sábado à noite, frente à sede do Grupo Desportivo da … o arguido/assistente, que seguia no seu carro de janela aberta, e com a cabeça de fora da janela, dirigiu à arguida/assistente, que circulava à sua frente no carro de F. e na companhia desta, as palavras “putas, cabras, coirões, vocês andam precisadas, vão para o putedo”.

12 – Proferiu tais expressões em voz alta, perante as pessoas que ali se encontravam, enquanto seguia de carro o carro em que seguia a assistente/arguida.

13 –...

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