Acórdão nº 1803/07-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Janeiro de 2008

Magistrado ResponsávelRICARDO SILVA
Data da Resolução14 de Janeiro de 2008
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em audiência, no Tribunal da Relação de Guimarães, I.

  1. Por sentença proferida no processo comum n.º 28/05.4TACBT, do Tribunal Judicial de Celorico de Basto, em 2007/06/21, foi condenado Artur V..., com os demais sinais dos autos, como autor material de um crime de desobediência, simples, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 13.º, 1ª parte, 14.º, n.º 1, 26º, 1ª proposição, e 348º, n.º 1, alínea b), todos do Código Penal, além do mais ora sem interesse, na pena de 100 (cem) dias de multa, à razão diária de € 3,50 (três euros e cinquenta cêntimos), no montante global de € 350,00 (trezentos cinquenta euros); 2. Inconformado com esta decisão, dela recorreu o arguido condenado.

    Terminou a motivação de recurso que apresentou com a formulação das seguintes conclusões: « 1. A notificação que foi efectuada e entregue ao arguido/recorrente continha, como cominação pela não apresentação dos documentos da viatura em juízo, o crime de desobediência qualificada, nos termos do n.º 2, do artigo 16º do Decreto-Lei 54/75 de 12 de Fevereiro; « 2. Crime que o arguido/recorrente não cometeu, sendo que nem do seu cometimento foi acusado; « 3. E bem, uma vez que aquela disposição só é aplicável aos casos do processo previsto no artigo 15° do mesmo diploma, e ainda quando haja uma ordem emanada do Juiz titular do processo; « 4. Optou, por seu lado, o Ministério Público por acusar o arguido pela prática em autoria material de um crime de desobediência (simples) p. e p. pela alínea b) do n° 1 do artigo 348° do Código Penal; « 5. Sendo que esse artigo configura um autêntico tipo não legal, conflituando com o princípio da tipicidade legal, especialmente com o seu corolário "nullum crimen, nulla poena sine legem scripta", ao criar uma fonte de incriminação e punição onde só existe uma decisão discriminatória de um agente da administração, « 6. Em todo o caso, para que se verifique o crime de desobediência, nos termos do artigo 348, n° 1, alínea b) do Código Penal, exige-se a falta da obediência devida a uma ordem que: seja legítima, tenha sido regularmente comunicada e emane de autoridade competente, mais se exigindo que se especifique ainda a moldura penal e o artigo do Código Penal que a conduta pode preencher (neste sentido o Ac. Rel Porto de 03/11/2004 que temos vindo a seguir na nossa exposição e o Ac. Rel. Porto de 11/02/2004 relatado pelo Desembargador Dias Cabral); « 7. Pelo que, inexistindo, como in casu inexiste, essa concreta e específica cominação da prática ou abstenção de um acto sob pena de incorrer no crime de desobediência (simples) p. e p. pelo artigo 348, n°1, alínea b), não se encontra preenchido o tipo legal, não podendo o arguido ser acusado e condenado pela prática desse crime; « 8. O agente da autoridade que emite a "ordem" ao recorrente com a cominação de "desobediência qualificada", fá-lo nos termos do artigo 16 n° 2 do Dec. Lei 54/75, sendo certo que tal apenas tem aplicabilidade aos casos referidos no artigo 15 do mesmo diploma legal; « 9. A "ordem" é ilegal e ilegítima e pelo que o arguido não pode ser condenado pela prática do crime de desobediência; « 10. A apreensão da viatura e dos seus documentos foi ordenada no âmbito de um processo de Execução Comum, que corre termos sob o n° 259/03.1TBCBT, no Tribunal Judicial de Celorico de Basto, no qual figura como único executado o, aqui, arguido/recorrente Artur V...; « 11. Sucede que a propriedade do dito veículo JS não pertence ao arguido/recorrente, mas a um terceiro, alheio ao mencionado processo de execução, encontrando-se aquele apenas com a sua posse; « 12. Estatui o artigo 821°, n° 2 do Código de Processo Civil, só podem ser penhorados bens de terceiro, nos casos especialmente previstos na lei, e sempre desde que a execução tenha sido movida contra ele, o que não é o caso, pelo que, no máximo, poderia ter sido penhorada a expectativa de aquisição; « 13. E se a penhora foi ilegal, também ilegal foi a notificação com a respectiva cominação do crime de desobediência qualificada, tanto mais que essa cominação sequer foi ordenada pelo Juiz titular do processo; « 14. Ainda que assim não se entenda, deve a pena ser sensivelmente atenuada em homenagem às debilidades financeiras do arguido/recorrente, que luta para sobreviver com uma reforma de cerca de € 270,00 (duzentos e setenta euros), auferindo a sua mulher de reforma de idêntico valor por se encontrar reformada por invalidez, com todos os encargos daí resultantes; Encerrou com o pedido de revogação da sentença recorrida e absolvição do recorrente, ou, se assim não se entender, de considerável redução da pena de multa em que foi condenado.

  2. Admitido o recurso, o...

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