Acórdão nº 2313/07-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelCRUZ BUCHO
Data da Resolução06 de Fevereiro de 2008
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em audiência, no Tribunal da Relação de Guimarães: *I- RelatórioNo 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Guimarães, no âmbito do Processo Comum Singular nº 150/05.7GFGMR, por sentença de 3 de Maio de 2007, o arguido João B..., com os demais sinais dos autos, foi condenado, pela prática de: a) um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo art.º 143º, n.º 1, 146º, n.ºs 1 e 2 e 132º, n.ºs 1 e 2, alínea j), todos do Código Penal, na pena de 200 (duzentos) dias de multa; b) um crime de injúria agravada, p. e p. pelo art.º 181º, n.º 1, 184º e 132º, n.ºs 1 e 2, alínea j), todos do Código Penal, na pena de 80 (oitenta) dias de multa; Em cúmulo jurídico, o arguido foi condenado na pena única de 250 (duzentos e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de 6 € (seis euros), no montante global de 1.500 € (mil e quinhentos euros).

*O pedido cível deduzido pela assistente Maria A... foi julgado parcialmente procedente por provado e, em consequência, o demandado/arguido foi condenado a pagar-lhe a quantia de setecentos e cinquenta euros (€ 750).

*Inconformado com tal decisão, o arguido dela interpôs recurso, rematando a sua motivação com as seguintes conclusões que se transcrevem: 1.ª Foi dado como provado que: 1- (...) tendo-lhe desferido, com uma das mãos, uma pancada no peito (. .. ) 3- Ao agir da forma descrita o arguido fê-lo consciente e livremente e com a intenção de magoar, vexar e humilhar a assistente, como o fez.

5- Mais sabia que, ao desferir-lhe uma pancada no peito a magoava.

6- Sabia também que, as expressões acima referidas, do modo como foram dirigidas à assistente, afectavam a estima que esta tem por si própria como pessoa e como docente, bem como a que os outros lhe atribuem enquanto tal.

7- Sabia finalmente que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal.

15- A assistente é pessoa conceituada e reputada no lugar onde exerce a sua actividade, sendo tratada e reputada como mulher honesta, de porte irrepreensível.

16- Sentiu dores durante a agressão e ficou acabrunhada e envergonhada, sentindo-se humilhada, vexada e triste.

17- (...) na presença de muitas pessoas, nomeadamente colegas de trabalho.

Não resulta dos autos nem do depoimento prestado pelas testemunhas inquiridas nos mesmos, nada que permita concluir pela verificação da matéria constante dos supra transcritos factos dados como provados. Nenhuma testemunha referiu tal, pelo que os mesmos terão de ser eliminados.

  1. constando expressamente do texto da decisão recorrida posições antagónicas e inconciliáveis mormente entre a matéria de facto dada como provada e constante dos n.ºs 1, 3, 6, 7, 15, 16, 17 e o que consta acerca da mesma em sede da fundamentação da da convicção do Tribunal.

  2. O vício da contradição insanável da fundamentação tanto pode respeitar à fundamentação da matéria de facto, como à contradição na matéria de facto, como também aos meios de prova que serviram para formar a convicção do juiz (artigo 374°, n.o 2 do Código de Processo Penal).

  3. Não obstante o principio da livre apreciação da prova, o oralidade e a imediação da prova, verifica-se no caso dos autos manifesto erro na apreciação da prova, 5.ª o que determinou a prova de factos que objectivamente não lograram obter qualquer prova: 1- (...) tendo-lhe desferido, com uma das mãos, uma pancada no peito(...) 3- Ao agir da forma descrita o arguido fê-lo consciente e livremente e com a intenção de magoar, vexar e humilhar a assistente, como o fez.

    5- Mais sabia que, ao desferir-lhe uma pancada no peito a magoava.

    6- Sabia também que, as expressões acima referidas, do modo como foram dirigidas à assistente, afectavam a estima que esta tem por si própria como pessoa e como docente, bem como a que os outros lhe atribuem enquanto tal.

    7- Sabia finalmente que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal.

    15- A assistente é pessoa conceituada e reputada no lugar onde exerce a sua actividade, sendo tratada e reputada como mulher honesta, de porte irrepreensível.

    16- Sentiu dores durante a agressão e ficou acabrunhada e envergonhada, sentindo-se humilhada, vexada e triste.

    17- (...) na presença de muitas pessoas, nomeadamente colegas de trabalho.

  4. Por outro lado, outros factos lograram ficar provados e o Tribunal Recorrido assim os não considerou, designadamente os seguintes factos: - (alteração do teor do facto 1) No dia 13 de Outubro de 2005, cerca das 15.30 horas, no recinto da Escola do 10 ciclo do Ensino Básico de Rendufe, em Guimarães, o arguido dirigiu-se à assistente Maria A..., professora dessa escola, para manifestar a sua discordância relativamente à circunstância de os alunos, alegadamente, lancharem em local que considerava inapropriado.

    - Pelo facto do arguido ter-se queixado da situação ao agrupamento de escolas a assistente empurrou o arguido para fora da sala onde se encontravam, sendo que para afastar tal agressão o arguido afastou a assistente de si.

    - A actuação do arguido sempre se efectivou na certeza de se estar a socorrer do meio necessário e único ao seu dispor para conseguir impedir a continuação das agressões por parte da assistente, e tendo-o feito na plena convicção de que desse modo deixariam de continuar a ser agredido.

    - O arguido chamou mentirosa à arguido por esta ter negado que os alunos lanchavam em local inapropriado (no chão), quando a mesma sabia que tal correspondia à verdade.

  5. Tais factos resultam clara e logicamente do teor dos factos dados como provados, bem como do depoimento prestado por todas as testemunhas, nomeadamente Maria F... e Francisco G... que referiram que o arguido foi agredido em primeiro lugar, bem como referiram que o arguido apenas chamou mentirosa à assistente por esta ter negado factos que sabia terem-se verificado.

  6. Não restam dúvidas que foi a assistente que iniciou a discussão bem as agressões na pessoa do arguido, tendo este último apenas procurado afastar tais agressões pelos meios que dispunha, e chamado mentirosa à Assistente por esta se encontrar efectivamente a mentir.

  7. Procedendo a conclusão de que houve erro na apreciação da prova e considerando-se provados os factos supra referidos é manifesta a verificação no caso sub judice da legitima defesa - artigos 31º, n.º 1 e 2, alínea a) e 32º do Código Penal.

  8. Sem prescindir, a pena aplicada ao arguido é manifestamente excessiva.

  9. Com efeito, para a determinação da medida da pena toma-se fundamental ter em conta a culpa do agente - artigo 71.º do Código Penal.

  10. Ora, quer na escolha da pena, quer na medida da mesma, o tribunal não considerou, como deveria, todo o circunstancialismo que envolveu este crime, já supra exposto.

  11. Desde logo, considerou a agravante do resultado, ignorando por completo todo o envolvente desse mesmo resultado, nomeadamente e conforme já supra exposto (dando-se aqui por integralmente reproduzido), o facto do arguido ter sido agredido, além do mais, diminuem consideravelmente a culpa do arguido.

  12. A este respeito o artigo 40º, n.º 2 do Código Penal impõe que "Em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa." 15.ª Dispõe o artigo 72.°, n.º 1 do Código Penal que. "O tribunal atenua especialmente a pena, para além dos casos expressamente previstos na lei, quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena." 16.ª Por tudo o referido, o acórdão referido viola o disposto nos artigos 40.°, n.º 2; 71.° e 72.° todos do Código Penal.

  13. Tendo em consideração toda a factualidade já exposta supra, é manifesto que tal pena única extravasa a culpa do arguido. Conforme refere o Doutor Maia Gonçalves: "Este artigo, ainda melhor que o originário art. 72°, mormente quando se leve em conta o princípio irrenunciável de que a pena não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa, agora expressamente formulado no art. 40° n.º 2, fornece o critério para encontrar medida concreta da pena (2ª fase referida), e ao mesmo tempo resolve as antinomias que se verificam entre os fins das penas. O limite máximo da pena, dentro da moldura abstracta, terá que se adequar à culpa, e não poderá ser ultrapassado por considerações de prevenção especial ou geral; porém, com o limite assim eventualmente encontrado em função da culpa, o juiz movimentar-se-á levando primordialmente em conta considerações de prevenção." 18.ª O presente recurso abrange também a decisão proferida acerca do pedido de indemnização civil.

  14. Sendo certo que, por ser fundamentado o pedido de indemnização civil formulado pela demandante na prática dos aludidos crimes por parte do arguido, merece que seja aqui dado por reproduzido tudo quanto se alegou anteriormente no presente recurso, pelo que provada que foi a legítima defesa terá de improceder o pedido de indemnização civil formulado pela Demandante.

  15. Sem prescindir, sempre o valor pelo qual o Recorrente foi condenado é manifestamente exorbitante, sendo certo que na sua fixação não foram contemplados todos os factos provados, e agressões sofridas pelo arguido, tudo com manifesta violação do disposto, além do mais, no artigo 494° do Código Civil.

  16. Não restam dúvidas que o arguido provou ser verdade a imputação de mentirosa por si efectuada à assistente, de forma legítima, pelo que a sua conduta não é punível (cfr. Artigos 181°, n.º 2 e 180°, n.º 2 do Código Penal), sendo certo que tal imputação em si só não é injuriosa.

  17. Pelo exposto, a sentença recorrida viola o disposto no artigo 374º, n.º 2 do Código de Processo Penal, o que consubstancia uma nulidade - artigo 379.° do Código de Processo Penal - violando ainda o disposto nos artigos 40.°, n.º 2 do Código Penal e 494° do Código Civil.

    Termina pedindo a revogação da sentença recorrida.

    *O recurso foi admitido, para o Tribunal da Relação de Guimarães, por despacho constante de fls. 246.

    *O Ministério Público junto do tribunal recorrido respondeu ao recurso, pugnando pela manutenção do...

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