Acórdão nº 2727/21.4T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelALDA MARTINS
Data da Resolução30 de Junho de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães
  1. Relatório A. S.

    intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra X SOCIEDADE CONSTRUTORA, LDA.

    , pedindo a declaração de ilicitude do despedimento promovido pela R. no dia 04/02/2020 e a condenação da mesma a pagar-lhe: a) 882,51 € a título de créditos salariais devidos durante a vigência do contrato de trabalho; b) 3.810,00 € a título de indemnização em substituição da reintegração, em dobro, devida pelo despedimento ilícito; c) as retribuições que o A. deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da sentença, sem prejuízo das deduções legais; d) 1.000,00 € a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos pelo A.; e) 40,81 €, a título de juros de mora vencidos respeitantes à alínea a); f) os juros de mora vincendos, à taxa legal, desde a data de vencimento de cada uma das obrigações da R. identificadas nas alíneas a), b) e d), até efetivo e integral pagamento.

    Alegou, em síntese, que foi admitido verbalmente ao serviço da R. em 16/12/2019, tendo exercido as funções de servente de construção civil, mediante a retribuição base mensal de 700 €, acrescida de 5,86 € por dia a título de subsídio de refeição, sendo certo que, em 04/02/2020, assinou um contrato de trabalho a termo certo, embora datado de 06/01/2020, e foi despedido verbalmente, numa altura em que se encontrava incapacitado para o trabalho em virtude de acidente de trabalho que havia sofrido em 21/01/2020. A R. apenas lhe entregou 180,00 € em numerário no dia 21/12/2019 e um cheque no valor de 237,88 € aquando do seu despedimento.

    A R. contestou, alegando, em síntese, que entre 16/12/2019 e 21/12/2020 o A. lhe prestou alguns serviços, como independente, apoiando-a na sua obra, sem horário de entrada ou saída, por forma a angariar algum rendimento para o período de Natal, situação a que a R. acedeu por solidariedade. Depois de ter sido confirmado pelo IEFP que o A. não era elegível para a medida “Contrato-Emprego”, a R. admitiu-o em 06/01/2020 mediante assinatura de contrato a termo. Quer a prestação de trabalho, quer o contrato de trabalho tiveram início nesta data, pelo que a duração do período experimental era de 30 dias. Caso se considere que o contrato teve início em 16/12/2019, deve entender-se que era por tempo indeterminado. Em qualquer dos casos, a denúncia do contrato de trabalho pela R., em 04/02/2020, verbalmente, foi no período experimental, sendo que a R. pagou ao A. o trabalho prestado de 06/01/2020 a 22/01/2020 e depois desta data o A. ficou com incapacidade temporária para o trabalho, competindo à Seguradora proceder ao pagamento da retribuição e subsídios respectivos.

    Realizada a audiência de julgamento, proferiu-se sentença, que terminou com o seguinte dispositivo: «Face ao exposto, julga-se a acção parcialmente procedente, em função do que se decide: 1. Declarar ilícito o despedimento do Autor A. S. promovido pela Ré “X SOCIEDADE CONSTRUTORA, LDA.” 2. E, consequentemente, condenar a Ré “X SOCIEDADE CONSTRUTORA, LDA.” a pagar ao Autor A. S. as seguintes quantias:

    1. As retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento (04/02/2020) até à data do termo do contrato (05/07/2020), no montante de € 3.196,27; b) A quantia de € 353,16, a título de proporcional de subsidio de Natal; c) A quantia de € 211,94 a título de compensação pela caducidade que também deixou de auferir por força do despedimento; d) A quantia de € 193,28, ainda em falta, relativamente à retribuição do mês de Dezembro de 2019; e) A quantia de € 206,48, ainda em falta, relativamente à retribuição do mês de Janeiro de 2020; f) A quantia de € 134,78 a título de subsídio de refeição ainda em falta relativamente aos meses de Dezembro de 2019 e Janeiro de 2020; Acrescidas dos juros de mora contados sobre as referidas quantias, a contar da data do respectivo vencimento (remunerações em falta, subsídio de refeição e subsídio de natal) e, quanto ao mais, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento (artigo 559.º, 804.º, 805.º e 806.º do Código Civil), Absolvendo-se a Ré do demais peticionado.

    Custas da acção a suportar pelo Autor e pela Ré na proporção do decaimento. (Cfr. Artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil)» A R. interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões: «1. Salva a devida consideração pelo Tribunal a quo, a douta sentença de que se recorre viola as disposições jurídicas vertidas nos artigos 53º da Constituição da República Portuguesa, art. 147º Código do Trabalho, art. 10º Código Civil, al. j) do art. 129º do Código do Trabalho, art. 139º do Código do Contrato de trabalho, art. 294º do Código Civil, art. 339.º do Código do Trabalho e art. 112º do Código do Trabalho, interpretando as mesmas de forma manifestamente contrárias à intenção do legislador e à coerência do sistema laboral, conforme infra se pretende demonstrar.

  2. O ora recorrente discorda em absoluto com a interpretação que o Tribunal a quo faz daquelas normas jurídicas, que considerou que que a celebração de um contrato de trabalho a termo certo durante a vigência de um contrato de trabalho por tempo indeterminado, como ocorrido nos presentes autos determinou a conversão do contrato de trabalho por tempo indeterminado em contrato de trabalho a termo certo. Adicionalmente, considerou que, ocorrendo a conversão do contrato de trabalho por tempo indeterminado em contrato de trabalho a termo certo, que a contagem do período experimental se inicia na data da celebração do contrato de trabalho a termo incerto e não na data da celebração do contrato de trabalho a termo certo, razão pela qual considerou que a denúncia do contrato de trabalho operada pela aqui Recorrente se deu para além do prazo do período experimental, considerando, assim, que ocorreu o despedimento ilícito do Autor.

  3. Assim, consideramos que a celebração de um contrato de trabalho a termo certo durante a vigência de um contrato de trabalho por tempo indeterminado não determina a cessação tácita do primeiro por tempo indeterminado (face ao regime da imperatividade da cessação contratual que não prevê esta modalidade de cessação contratual laboral nem tal intenção de cessação se pode retirar pelo mero facto de um trabalhador assinar aquele segundo contrato de trabalho); 4. Também consideramos que, não se extinguindo o primeiro contrato de trabalho por tempo indeterminado pelo facto de ser celebrado o segundo contrato de trabalho a termo certo, consideramos ainda que o contrato de trabalho por tempo indeterminado também não se converte em contrato de trabalho a termo certo, porquanto uma interpretação que permita a conversão de um contrato de trabalho por tempo indeterminado em contrato de trabalho a termo certo não tem qualquer respaldo legal.

  4. Com efeito, a figura da conversão contratual laboral apenas tem previsão legal nas situações precisamente inversas, isto é, de conversão de contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho por tempo indeterminado (art. 147º Código do Trabalho).

  5. Por outro lado, o eventual recurso à analogia (art. 10º Código Civil) para resolver a omissão legislativa também não se mostra adequado porquanto a intenção do legislador foi a de criar mecanismos formais e sancionatórios que previnam a precariedade, não de a abraçar e promover.

  6. Como consequências, não tendo cessado, por qualquer forma, o contrato de trabalho por tempo indeterminado, nem sendo possível a sua conversão em contrato de trabalho a termo certo, defendemos que o segundo contrato de trabalho a termo certo é nulo.

  7. Com efeito, por ter sido celebrado na pendência da vigência de um primeiro contrato por tempo indeterminado com o qual é manifestamente incompatível, sendo igualmente contrário a todas as disposições e princípios laborais respeitantes às relações laborais precárias, previstas na SECÇÃO IX (Modalidades de contrato de trabalho), SUBSECÇÃO I do Código do Trabalho (Contratos a termo resolutivo), que prevê e define mecanismos formais e sancionatórios que limitam a sua possibilidade da sua vigência (forma do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT