Acórdão nº 1363/20.7JABRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelFÁTIMA FURTADO
Data da Resolução10 de Outubro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

(Secção Penal) I. RELATÓRIO No processo de instrução nº 1363/20.7JABRG, do Juízo de Instrução Criminal de Braga - Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, foi em 03.03.2022 proferido despacho de rejeição, por inadmissibilidade legal, do requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente J. J., com os demais sinais dos autos.

*Inconformado, o assistente J. J. interpôs recurso, apresentando a competente motivação que remata com as seguintes conclusões: «1. A Meritíssima Juiz de Instrução do Tribunal a quo, ao rejeitar o requerimento do Assistente/Recorrente para a abertura da Instrução com fundamento na inadmissibilidade legal, violou o disposto no artigo 287.º, n.º 2 e 3 e o artigo 309.º n.º 1, ambos do CPP.

2. Tal despacho é uma evidente expressão de discricionariedade e uma evidente prevalência da forma, (e mal), em detrimento da verdade material, pela qual o Processo Penal, para não dizer toda a Justiça, sempre deve ser norteado.

3. Na sequência do despacho de arquivamento proferido pelo Ministério Público, o Assistente/Recorrente requereu a abertura da Instrução, na qual narrou os factos criminalmente censuráveis, identificou quem os cometeu, indicou as normas legais aplicáveis, e apresentou e requereu a correspondente produção de prova, cumprindo, assim, o disposto no artigo 287.º do CPP.

4. Com a Instrução requerida visa-se que sejam pronunciados o Guarda M. A. e o Guarda A. F., pelos factos denunciados nos autos no que respeita à adulteração do Auto de Notícia nº ...../20.220030454, e descritos no RAI, integradores de um crime de falsificação de documento, p.e p. pelo artigo 256.º, n.º 1, al. d), e de um crime de abuso de poder, p. e p. pelo artigo 382.º, todos do Código Penal.

5. Embora o inquérito tenha decorrido sem a investigação dos factos denunciados e os referidos factos não hajam sido transcritos no momento da apresentação da queixa, não há inadmissibilidade legal da Instrução, pois que, o Assistente/Recorrente, demonstrou expressamente a sua vontade de procedimento criminal contra o Guarda M. A. e o Guarda A. F., por determinado facto (in casu, por adulteração de um Auto de Notícia que juntou com a queixa apresentada e pela conduta dos Guardas da GNR).

6. No que se refere à possibilidade de se considerar que o Assistente/Recorrente deveria, in casu, ter seguido a via da reclamação hierárquica, o que apenas se concebe por mera cautela, urge referir que, à face do novo paradigma do sistema processual penal, não se pode dizer que o mesmo deveria ter seguido esta via, tanto mais que, a opção por tal caminho, implicaria a renúncia ao direito de requerer a instrução (1) – ónus pesado que não nos parece coadunar-se com o espírito do novo sistema (2).

7. Da mesma forma, o fundamento apresentado pela Meritíssima Juiz de Instrução do Tribunal a quo, relativo à nulidade da decisão instrutória por eventual alteração substancial dos factos, não justifica a inadmissibilidade legal da Instrução invocada, desde logo porque os factos descritos no RAI, além de não constituírem factos novos, não são passíveis de implicar uma alteração substancial dos factos, desde logo, porque os crimes denunciados são os mesmos pelos quais o Assistente/Recorrente visa que sejam pronunciados com a Instrução requerida.

8. Sem conceder, mesmo que os factos descritos no RAI fossem novos, “o assistente, ao requerer a abertura da instrução com base no arquivamento do processo pelo MP, deve carrear factos novos que não tenham sido considerados na fase de inquérito (3).”, pelo que, nem por esta via, determinaria a inadmissibilidade legal do RAI.

9. Sendo certo que, nos termos do artigo 309.º do CPP, só haveria nulidade da decisão instrutória, se houvesse pronúncia por factos que constituam alteração substancial dos descritos no requerimento para abertura da instrução, o que não é o caso.

10. Como referiu, os fundamentos invocados não são passíveis de determinar a inadmissibilidade legal do RAI, sendo errada a aplicação/interpretação daquelas normas legais, designadamente do n.º 2 e 3, do artigo 287.º, bem assim do artigo 309.º, n.º 1, ambos do CPP.

11. Ao decidir, como decidiu, o Tribunal a quo violou as disposições do n.º 2 e 3 do artigo 287.º, bem assim do artigo 309.º n.º 1, ambos do CPP.

12. O Tribunal a quo devia ter admitido a abertura da Instrução uma vez que a mesma foi devidamente elaborada pelo Assistente/Recorrente, nos termos do disposto no artigo 287.º do CPP e em pleno cumprimento de todos os requisitos legais.» *O recurso foi admitido para este Tribunal da Relação de Guimarães como regime e efeito adequados.

A Digna Magistrada do Ministério Público junto do Tribunal a quo e o arguido M. A. responderam, ambos pugnando pelo não provimento do recurso.

Nesta Relação, o Exmo. Senhor Procurador-Geral adjunto proferiu douto e fundamentado parecer, no qual conclui da seguinte forma: «Porque não poderá haver instrução se os factos vertidos no RAI não foram, efectivamente, objecto de inquérito, e estando em causa nos presentes autos uma situação o assinalado desenho, então, a requerida abertura da instrução efectuada pelo assistente deverá ser rejeitada por inadmissibilidade legal. O recurso deverá ser julgado sem procedência.».

Foi cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, na sequência do que o assistente apresentou resposta, reafirmando os argumentos invocados no recurso.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

*II. FUNDAMENTAÇÃO Conforme é jurisprudência assente, o âmbito do recurso delimita-se pelas conclusões extraídas pelo recorrente a partir da respetiva motivação, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer (4).

*1. Questão a decidir Face às conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, a questão a decidir é a de saber se é admissível o requerimento de abertura de instrução formulado pelo assistente J. J..

*2. A decisão recorrida tem o seguinte teor: «Requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente J. J.: Nos termos do artigo 286.º, n.º1 do Código de Processo Penal, a instrução visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a...

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