Acórdão nº 709/19.5T9BGC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelPAULO ALMEIDA CUNHA
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO 1.

Decisão recorrida No âmbito do processo n.º 709/19...., que corre os seus termos no Juízo Local Criminal ..., foi deduzida acusação pelo Ministério Público imputando ao arguido AA a prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo artigos 143.º, n.º 1, 145.º, n.º 1, al. a), e n.º 2, do Código Penal, por referência ao art. 132.º, n.º 2, al. m), do mesmo diploma legal.

Por seu turno, o assistente BB deduziu acusação particular contra o mesmo arguido imputando-lhe a prática de um crime de injúria, p. e p. pelo artigo 181.º, n.º 1, do Código Penal.

Este assistente deduziu também pedido de indemnização civil contra o referido arguido pedindo a respectiva condenação no pagamento da importância de € 1 500,00, a título de indemnização dos danos não patrimoniais emergentes da prática do crime de injúria.

O Ministério Público aderiu integralmente à referida acusação particular.

Findo o julgamento e antes da leitura da sentença, foi oficiosamente comunicada uma alteração substancial dos factos e da qualificação jurídica por referência aos factos descritos na acusação particular, a qual se traduziu no aditamento de novos factos a esta acusação e na imputação ao arguido da prática de um crime de injúria agravada, p. e p. pelos artigos 181.º e 184.º, do Código Penal.

Na mesma ocasião, porque requerido, o tribunal a quo concedeu ao arguido o prazo de 8 dias para se pronunciar sobre esta alteração dos factos e da qualificação jurídica.

O Ministério Público e o assistente concordaram com a consideração dos novos factos na sentença a proferir.

Por seu turno, o arguido reagiu, inicialmente, a estas alterações: a) arguindo a nulidade insanável prevista no art. 119.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Penal, traduzida na falta de promoção do processo pelo Ministério Público relativamente ao crime de natureza particular resultante das referidas alterações; e b) impugnando a prática dos novos factos aditados à acusação particular, sem requerer a produção de prova suplementar.

Mais tarde, sem desistir da arguição da referida nulidade, o arguido viria também a declarar expressamente que concordava com a consideração dos novos factos na sentença a proferir.

Posteriormente, foi proferida sentença, datada de 27.06.2022, que decidiu nos seguintes termos (transcrição): “(….) Questão prévia: (…) Termos em que se indefere a invocada nulidade insanável, p. e p. pelo artigo 119.º, al. b), do CPP.

(…) Da parte crime: 1. Julgar provada a prática pelo arguido AA, em autoria material e na forma consumada de um crime de ofensa à integridade física qualificado, previsto e punido pelos artigos 143.º, n.º1, 145.º, n.ºs 1 al. a) e 2, do Código Penal, por referência ao n.º 2 do artigo 132.º, n.º 2, al. m) e em consequência, condenar-se o mesmo na pena de prisão de 2 anos e 3 meses.

  1. Suspender a pena de prisão aplicada no ponto anterior, pelo mesmo período de tempo, subordinada ao pagamento pelo arguido da indemnização atribuída ao assistente/demandante pela prática do crime de injúria agravado, no prazo de 3 meses a contar da data do trânsito e julgado desta decisão.

  2. Julgar provada a prática pelo arguido AA em autoria material e na forma consumada de um crime de injúria agravado, p. e p. pelo artigo 181.º, n.º 1 e 184.º do CP e em consequência, condenar-se o mesmo na pena de multa de 130 dias à taxa diária de 6 euros, perfazendo um total de 780 euros.

    Da parte cível: 4. Julgar parcialmente procedente por parcialmente provado o pedido de indemnização cível formulado pelo demandante CC contra o arguido e em conformidade condenar este último a pagar àquele, a título de compensação de danos não patrimoniais sofridos pela prática do crime de injúria agravado, o valor de 700 euros.

    (…)”.

  3. Recurso Inconformado com esta sentença, arguido e demandado civil AA recorreu da mesma, tendo concluído a respectiva motivação nos seguintes termos (transcrição): (…) 1ª) A 07/06/2022 foi invocada a nulidade insuprível prevista no Artigo 119º, alínea b) do CPP, 2ª) Uma vez que no decurso da audiência de discussão e julgamento – antes da prevista leitura de sentença - foi comunicada ao Arguido a alteração substancial dos factos 3ª) E determinante de alteração da qualificação jurídica, que igualmente se comunicou: 4ª) Salvo melhor opinião, tal alteração substancial levou a que o crime imputado ao arguido passasse a ser um crime semi -público e não particular.

    1. ) Com o que, a legitimidade para promover o procedimento criminal contra o arguido (leia-se dedução de acusação), é do MP e não do assistente/ofendido.

    2. ) Razão pela qual cremos que a falta de promoção do processo pelo MP configura uma nulidade insuprível prevista no Artigo 119º, alínea b) do CPP, que se arguiu para todos os legais efeitos.

    3. ) Consequentemente, deveriam ter sido declarados nulos todos os atos praticados após o despacho que notificou o assistente para dedução de acusação particular, e 8ª) Declarada extinta a instância cível por impossibilidade superveniente da lide.

    4. ) A Mm.ª Juiz indeferiu a invocada nulidade e, salvo melhor entendimento, apesar de o arguido ter consentido no prosseguimento da audiência de julgamento, sempre o consentiu sem embargo da invocada nulidade, o que deixou bem patente em sede de audiência de julgamento.

    5. ) Devendo prosseguir a audiência apenas e só no que tange à apreciação do crime de ofensa à integridade física e, 11ª) No que concerne ao crime de injúria, a comunicação (da alteração substancial) deveria ter valido como denúncia para que o MP procedesse, caso assim entendesse, pelos novos factos nos termos do disposto no n.º 2 do Artigo 359º do C.P.P.

    6. ) Razão pela qual, salvo melhor opinião, a Mm.ª Juiz decidiu erradamente ao indeferir a invocada nulidade.

    7. ) O âmbito do recurso não se limita ao indeferimento da nulidade insanável que oportunamente foi invocada e que consubstancia a questão prévia.

    8. ) Também serve para impugnar a decisão sobre a matéria de facto dada como provada.

    9. ) Ora, salvo melhor opinião, mal andou a Mm.ª Juiz “a quo” ao dar como provados os factos que deu (de 1 a 5), da forma como o fez, e, bem assim, ao dar como não provado nenhum facto.

    10. ) Os factos constantes em 1. e 2. dos factos provados não o deveriam ter sido porque, contrariamente ao exposto na sentença, o depoimento do assistente não foi espontâneo, foi, isso sim, interessado, contraditório, incoerente e insuficiente e 17ª) Dele resultaram contradições com os depoimentos, entre outros, do arguido e das testemunhas DD e EE.

    11. ) Apenas o arguido, o assistente, e as testemunhas DD e FF estão presentes no local, no dia e hora dos factos, para além de outra testemunha arrolada pelo MP (GG), entretanto falecida.

    12. ) EE, à data dos factos estava a habitar outra cela a escassos metros da do assistente e da testemunha FF, pelo que lhe foi possível ouvir o que ali se passou.

    13. ) O depoimento de DD foi credível, coerente, verdadeiro e desinteressado pois nada teve a ver com os factos e/ou tem interesse quanto ao desfecho dos presentes autos.

    14. ) Também não pretendeu, em momento algum – ao contrário do que se alega na douta sentença – omitir ao tribunal quem era o chefe de serviço (graduado de serviço) no dia e hora dos factos.

    15. ) Revelou, isso sim, ausência de lembrança sobre quem seria pois, como é normal, qualquer guarda não memoriza nem sequer anota todos os graduados de serviço em todos os dias e a cada turno.

    16. ) Suscitou a hipótese de ser a Chefe HH por pertencerem à sua equipa, sendo essa a sua razão de ciência.

    17. ) Esclareceu ainda o tribunal sobre a existência de chefes (e o seu número) de comissário e de chefe principal.

    18. ) As declarações da testemunha DD estão gravadas a 25/02/2022 no sistema habilus em uso no tribunal de 12:10:21 a 12:29:36, (na parte que nos interessa) ao minuto 9:19.

    19. ) O depoimento da testemunha DD vem verdadeiramente, e em suma, corroborar as declarações do arguido, que 27ª) Nega a abertura da cela onde habitava o assistente e FF, e, por isso, impossibilitando qualquer agressão física como as descritas e confirmando, também a inexistência das injúrias.

    20. ) O que sucedeu e devia ter sido dado como provado foi que ambos se deslocaram a cela do assistente, no pavilhão de segurança, aquando de mais uma falha da luz e verificaram, pelo postigo, que era dali o chamado, alertam/advertem para a necessidade de tal não voltar a acontecer e, com o bastão, o arguido abre a tampa do disjuntor por cima da cela e, verificada que não era ali a falha, regressam ao gabinete e ligam a luz no quando ali existente.

    21. ) Quanto ao arguido, também nunca foi questionado sobre se era ele quem exercia as funções de chefe (graduado) de serviço no dia dos factos, nem aquando do seu depoimento nem posteriormente.

    22. ) Ora, tendo o Tribunal a direção da audiência e consequentemente toda a liberdade para questionar diretamente o arguido sobre este facto, optou por não o fazer e solicitar a informação diretamente ao EP ....

    23. ) Assim, não se pode assacar ao arguido - por uma opção exclusivamente do Tribunal - quer uma intenção propositada de omitir o que quer que seja, quer de falta de colaboração para a descoberta da verdade.

    24. ) Por seu turno, as declarações do assistente, gravadas a 25/02/2022 no sistema habilus de 11:33:22 a 12:04:08 foram imprecisas, incoerentes, falsas e necessariamente interessadas.

    25. ) Assim, apenas parcialmente devem ser valoradas, apenas e só na parte em que esclarece que estava no pavilhão de segurança porque tinha dívidas resultantes do consumo de estupefacientes.

    26. O assistente falsamente declara que: - internamente não deram seguimento à sua queixa quando, na verdade, a mesma deu origem ao processo de averiguações e posteriormente processo disciplinar juntos aos autos. Assim fez crer ao Tribunal (que erradamente disso se convenceu) que no EP existe uma política de protecionismo aos guardas e de...

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