Acórdão nº 4/22.2T9VRM.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA LEONOR CHAVES DOS SANTOS BARROSO
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO AA interpôs recurso da decisão judicial (art. 39º RGCLSS Regime Processual das Contra-Ordenações Laborais e da Segurança Social regulado na Lei 107/2009, de 14/09.

) que apreciou a impugnação judicial e confirmou a decisão da SEGURANÇA SOCIAL que lhe aplicou a coima de €30.000,00 e as sanções acessórias de encerramento administrativo do estabelecimento e interdição temporária do exercício, directo ou indirecto, de actividades de apoio social em quaisquer estabelecimentos de apoio social pelo período de 3 (três) anos, pela prática de duas contraordenações previstas no art. 39º-B al.

  1. do DL. nº64/2007 de 14 de Março, com a redacção introduzida pelo Dl. nº33/2014 de 4 de Março.

    A ARGUIDA FORMULA AS SEGUINTES CONCLUSÕES (412º CPP por remissão do art. 50º, 4 e 51º do RPCLSS): A. Vem o presente Recurso interposto da matéria de Direito que enforma a douta Sentença recorrida em virtude de no seu proferimento haver o Tribunal a quo interpretado e aplicado incorretamente o Direito.

    1. Inexistem os pressupostos fáticos da presunção judicial consistente em “a situação económica da arguida não pode ser valorada a seu favor. a arguida exercia uma actividade que sabia que era ilícita e recebia pelos seus serviços sempre em numerário, o que não permite conhecer com exatidão os seus rendimentos, mas permite saber que ocultava e não declarava uma parte dos rendimentos precisamente para que não fosse detectada. se a arguida ocultava uma parte dos seus rendimentos não pode agora socorrer-se do facto de a parte que era conhecida ser diminuta para obter uma diminuição do valor da coima.” C. Falece à supracitada presunção judicial os dois pressupostos básicos de que umbilicalmente depende: a existência do facto conhecido (facto base da presunção) para a partir dele, de forma sólida e bem fundamentada, por inferência lógico-dedutiva devidamente sustentada afirmar o facto desconhecido (facto presumido) para além de qualquer dúvida razoável ou margem para erro judiciário.

    2. Destarte, a citada presunção judicial enferma de ilogicidade e resulta de erro notório na apreciação da prova e da subsunção dos factos ao Direito, de onde ressalta a avassaladora ofensa, inter alia, das normas dos arts. 125º, 127º, 374º, nº 2 e 410º, nº 2, alínea c), todos do Código de Processo Penal e, bem assim, do art. 351º do Código Civil.

    3. Da matéria dada como provada no item nº 6 do elenco dos Factos Provados, resulta que “A arguida cobrava aos idosos uma mensalidade de € 260,00.” F. Tal facto está em diametral oposição/contradição com a sobredita presunção judicial transcrita na Conclusão B. supra e, bem assim, com as declarações de rendimentos do agregado familiar da Arguida juntas a fls. 167 a 192 dos autos que, aliás, não foram impugnadas pelo Ministério Público.

    4. A natureza de documento autêntico, com força probatória plena, das preditas declarações de rendimentos extraídas do sítio da internet do Portal das Finanças, não poderá deixar de ser valorada nos termos do art. 371º do Código Civil e 127º e 374º, nº 1, ambos do Código de Processo Penal, em conformidade com os factos tributários delas constantes.

    5. Não obstante se encontrar consignado a fls. 4 da Sentença recorrida que “O vereador da câmara municipal e o Presidente da Junta de Freguesia ... afirmaram que nunca haviam estado na moradia. Nos seus depoimentos, estas testemunhas limitaram-se a afirmar que ouviam dizer que a arguida exercia uma actividade de voluntariado no âmbito do apoio às pessoas idosas com dificuldades económicas”, não foram tais depoimentos objeto da devida análise crítica e valoração.

      I. Encontrando-se o Ministério Público onerado com a prova, nada foi requerido pela sua mui Digna Representante, nem oficiosamente ordenado pelo Tribunal a quo no concernente, nomeadamente, à inquirição das pessoas a quem a três supra identificadas testemunhas ouviram dizer que “que a arguida exercia uma actividade de voluntariado no âmbito do apoio às pessoas idosas com dificuldades económica.” J. O não exercício de tal poder-dever pelo Tribunal recorrido nos termos do art. 340º, nrs. 1 e 2, do Código de Processo Penal não consente que na Sentença hajam sido desconsiderados ou pelo menos desvalorizados, sem qualquer relevância probatória, tais depoimentos.

    6. Pese embora a fls. 3 da Sentença recorrida o Tribunal a quo haver consignado que “O tribunal fundou a sua convicção nas declarações da arguida, no depoimento das testemunhas ouvidas e nos documentos juntos aos autos”, encontra-se a Sentença, em violação do disposto no art. 374º, nº 2, do Código de ProcessoPenal, totalmente deserta da análise crítica das declarações da Arguida.

      L. Nada consta dos autos que permita concluir, como concluiu o Tribunal a quo que, por via do acolhimento de um reduzido número de pessoa idosas, entre as quais duas primas, sendo uma Maior Acompanhada pelo marido da Arguida, esta exercia uma atividade que lhe proporcionava qualquer tipo rendimento, tendo isso sim, sido demonstrado e provado que por razões filantrópicas e convicções de índole religiosa a Arguida, por todos conhecida na comunidade em que está inserida como “a mãe dos pobres” acolhia e apoiava, sem qualquer escopo lucrativo pessoas idosas, com parcos recursos económicos, social e comunitariamente isoladas, e as mais das vezes sem qualquer retaguarda familiar.

    7. Em face da factualidade carreada para os autos, é manifestamente violadora da norma do art. 39º-I, nº 1, do DL nº 64/2007, de 14 de março a conclusão do Tribunal a quo vertida a fls. 8 da Sentença consistente em “A coima e as sanções acessórias que foram aplicadas não merecem qualquer reparo, sendo inteiramente ajustadas.“ N. Viola o Direito substantivo (arts. 349º e 351º do Código Civil) o segmento da Sentença recorrida ínsito a fls. 9 da mesma consistente em “A situação económica da arguida não pode ser valorada a seu favor. A arguida exercia uma actividade que sabia que era ilícita e recebia pelos seus serviços sempre em numerário, o que não permite conhecer com exatidão os seus rendimentos, mas permite saber que ocultava e não declarava uma parte dos rendimentos precisamente para que não fosse detectada. Se a arguida ocultava uma parte dos seus rendimentos não pode agora socorrer-se do facto de a parte que era conhecida ser diminuta para obter uma diminuição do valor da coima.” (Sublinhado nosso).

    8. Em violação das normas dos arts. 127º e 374º, nº 2, do Código de Processo Penal, não logrou o Tribunal a quo quantificar, ainda que por estimativa, seja em termos nominais, seja em percentual, o suposto, porém meramente imaginário montante da alega da parte dos rendimentos da Arguida que, no seu entendimento, ainda que infundamentado, era objeto de ocultação “para que não fosse detetada”.

    9. Inexiste nos autos qualquer elemento indiciário sustentador da supra transcrita conclusão do Mmº Juiz a quo, nem tão-pouco foi tal matéria alegada ou produzida qualquer prova que com o mínimo de rigor, solidez e certeza jurídica a consinta.

    10. A inferência do Tribunal aquo consistente em “permite saber que ocultava e não declarava uma parte dos rendimentos” não encontra a mais pálida sustentação fática nos autos, sendo incorreto e desprovido do mínimo de solidez e de fundamentação o raciocínio lógico-dedutivo que lhe subjaz.

    11. Na determinação da medida da coima, manifestamente excessiva e violadora do princípio constitucional da proporcionalidade, o Tribunal a quo violou clamorosamente a norma do art. 39º-I, nº 1, do Decreto-Lei nº 64/2007, de 14 de março, desde logo por não haver atendido à real e concreta situação económica da Arguida e do seu agregado familiar, sobejamente provada nos autos.

    12. Outrossim, partindo do falso e indemonstrado pressuposto de que a Arguida exercia uma atividade geradora de rendimentos, supostamente com escopo lucrativo, o Tribunal a quo, incurso em erro de Julgamento, não relevou o facto de o acolhimento e...

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