Acórdão nº 632/22.6T8VRL-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelVERA SOTTOMAYOR
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social da Relação de Guimarães APELANTE: ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE PAIS E AMIGOS DO CIDADÃO DEFICIENTE MENTAL DE ... - ...

APELADA: AA Tribunal da Comarca ..., Juízo do Trabalho ... – Juiz ....

I - RELATÓRIO AA, residente na Rua ..., ... ... intentou a presente acção declarativa, emergente de contrato individual de trabalho contra ... - ..., com sede no ... ... e pede o seguinte: a) ser todo o processado disciplinar declarado nulo/invalido, pelo facto da Nota de Culpa e o relatório final que lhe adveio) não conter a descrição circunstanciada dos factos imputados ao trabalhador, o que implica a nulidade/invalidade da nota de culpa ao abrigo do artigo 286.º e sgs. do C.C., e nulidade/invalidade do respectivo procedimento nos termos do art.º 382º, n.º 2, alíneas a) e c), do Código do Trabalho.

b) Ser declarada a nulidade da prova obtida, consubstanciada no relato de evidência a fls. 1 dos autos, nos termos do art.º 129.º do C.P.P., aplicável por força do artigo 1.º, n.º 2, al. c), do CPT, a qual foi produzida em desrespeito dos requisitos legais impostos.

c) Considerar-se que a A. não praticou qualquer infracção disciplinar, tendo a A. respeitado todos os seus deveres, impostos pelas alíneas c) e f) do n.º 1 do artigo 128º e n.º 1 do artigo 126º do Código do Trabalho, e bem assim todas as cláusulas do DDPD ou do seu contrato de trabalho.

d) Devendo a sanção dela decorrente e aplicada à A. ser considerada uma Sanção Abusiva, nos termos como é definida no Art.º 331º, n.º 1 al. d) e n.º 2 do Código do Trabalho; e e) Por conseguinte, fazer-se operar o dispositivo do número 5 desse mesmo preceito, o que desde já se reclama, ou seja, ser a R. condenada a pagar à A. a quantia correspondente a 10 vezes a sanção aplicada correspondente ao montante aproximado de €4.110,53 a título de indemnização o trabalhador, acrescidos de juros de mora, à taxa legal; f) Caso os pedidos das alíneas c), d) e e) não sejam procedentes, o que por mera hipótese se coloca, deverá a sanção disciplinar aplicada à A. ser declarada desproporcional; g) Por último, deverá ser a R. condenada a pagar à A. a quantia de 2.000,00€, a título de danos morais tutelados pelo direito, tudo acrescido dos juros de mora à taxa legal desde a citação até integral e efectivo pagamento, o que se pede e no que a R. deve ser condenada a pagar à A.

h) Ser a Ré condenada nas custas e procuradoria.

A Ré apresentou contestação e deduziu pedido reconvencional, no qual pede a condenação da Autora a pagar-lhe a quantia de €1.250,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais.

A Ré fundamenta o seu pedido nos seguintes termos: “11 - Como se referiu, consta dos factos provados praticados pela Autora que esta sabia e tinha plena consciência que não podia divulgar os dados pessoais dos utentes nem impedir que os mesmos exercessem o seu direito de voto e apesar de saber e tendo plena consciência que tal lhe era proibido, cedeu a terceiros dados pessoais dos utentes da Empregadora e dos quais apenas tinha conhecimento em razão das suas funções profissionais nesta Instituição, desse modo causando à Empregadora um dano irreparável na sua imagem sobre a expectável privacidade dos seus utentes e respectivas famílias e um consequente prejuízo económico incalculável.

  1. - Os factos praticados pela Autora ocorreram em local público e perante diversas pessoas.

  2. Os factos praticados pela Autora consubstanciam um ilícito criminal previsto no Art. 48.º do RGPD.

  3. Com a conduta da Autora, a Ré viu a sua imagem publicamente denegrida, sendo vista como uma instituição incapaz de proteger a privacidade dos seus utentes e respectivas famílias.

  4. Desse modo, a Autora causou à Ré um dano patrimonial incalculável, que só ao longo dos anos se poderá manifestar conforme a maior ou menor procura pelos seus serviços.

  5. Todavia, certo é que a Ré, na pessoa dos seus órgãos sociais sentiram por via disso, vergonha, humilhação, tristeza e abalo psicológico.

  6. Tais danos são indemnizáveis, nos termos do Art.º496.º do CC.

  7. Indemnização que se calcula como ajustada se fixada em montante de € 1250,00..” A A. responde ao pedido reconvencional concluindo pela rejeição do pedido reconvencional por inadmissibilidade.

Seguidamente foi proferido despacho saneador, que apreciou da admissibilidade do pedido reconvencional, dele se fazendo constar o seguinte: “Veio a ré, em sede de contestação, deduzir pedido reconvencional, peticionando a condenação da autora no pagamento da quantia de 1250,00€, porque, na pessoa dos seus órgãos sociais sentiram vergonha, humilhação, tristeza e abalo psicológico, sendo, na sua perspectiva, tais danos são indemnizáveis, nos termos do art.º 496.º do Código Civil.

Respondeu a Autora, defendendo, em síntese, que deverá ser indeferido o pedido reconvencional deduzido pela Ré, por ausência de pressupostos legais e por poder uma pessoa colectiva indemnizada a título de danos não patrimoniais (na ausência de pedido de indemnização por danos patrimoniais), sendo que os danos peticionados referem-se às pessoas dos órgãos sociais que não são parte na acção.

Apreciando.

A reconvenção é uma figura processual não admitida de forma indiscriminada no processo civil português (vd. por todos, Colaço Canário, A Reconvenção e a Compensação no Processo Civil Português, AAFDL, 1983, pag. 7 ss.).

Regulam esta matéria os arts. 93º, 266º e 583º, do Cod. Proc. Civil.

Com ela verifica-se um enxerto na acção proposta pelo autor, de uma acção proposta pelo réu . Dir-se-á que ela traz "à apreciação do Tribunal uma nova relação jurídica" (Gama Prazeres, Da Alteração do Próprio Pedido do Autor e da Reconvenção no actual Código de Processo Civil, Livraria Cruz, Braga, 1964, pag. 17) .

No que ao processo de trabalho diz respeito regem, para além dos preceitos (legais) supra referidos, o disposto no art. 30º do Código de Processo do Trabalho.

Dispõe esta disposição legal que “1 - Sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 98.º-L, a reconvenção é admissível quando o pedido do réu emerge do facto jurídico que serve de fundamento à ação e nos casos referidos na alínea o) do n.º 1 do artigo 126.º da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, desde que, em qualquer dos casos, o valor da causa exceda a alçada do tribunal. 2 - Não é admissível a reconvenção quando ao pedido do réu corresponda espécie de processo diferente da que corresponde ao pedido do autor.”.

O citado art.º 126.º da Lei n.º 62/2013, de 26/08 define a competência em matéria cível dos tribunais de trabalho e estabelece na sua alínea p) que compete aos tribunais de trabalho conhecer das "questões reconvencionais que com a acção tenham relações de conexão referidas na alínea anterior, salvo no caso de compensação em que é dispensada a conexão." Na alínea anterior - aliena o) - referem-se: "questões ... emergentes de relações conexas com a relação de trabalho, por acessoriedade, complementaridade ou dependência ....".

Necessário é, contudo, que se verifiquem os requisitos nela previstos, a saber: a) que entre a acção e a reconvenção exista a relação de conexão ou seja que o pedido reconvencional esteja relacionado com o pedido do autor por acessoriedade, complementaridade ou dependência; b) ou que o Réu se proponha obter a compensação.

Como se refere no Acórdão do STJ de 22.11.06 (in www.dgsi.pt, Acórdãos do STJ, Proc. 06S1822), a relação de acessoriedade e a relação de dependência pressupõem que haja um pedido principal (uma relação principal). Tanto o pedido acessório como o dependente estão objectivamente subordinados a esse pedido (principal). A...

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