Acórdão nº 570/09.8TAVNF-G.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 29 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelCÂNDIDA MARTINHO
Data da Resolução29 de Abril de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Desembargadora Relatora por vencimento: Cândida Martinho Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães.

  1. Relatório 1.

    No processo comum 570/09.8TAVNF que corre termos Tribunal da Comarca de Braga Juízo Central Criminal de Guimarães – Juiz 4, em que é arguido F. C., foi proferido despacho em 4/5/2018 que indeferiu o pedido por este formulado de que fosse reconhecida a prescrição do procedimento criminal, declarando-se extinta a sua responsabilidade.

    1. Não se conformando com tal indeferimento, veio o arguido recorrer do despacho, extraindo da motivação as conclusões que a seguir se transcrevem: Conclusões: «A- Primeira causa de prescrição do procedimento criminal I.

    O arguido invocou, nos presentes autos, a prescrição do procedimento criminal; sendo, pois, esta a temática que se discute no presente recurso.

    II.

    O juiz a quo decidiu do seguinte modo: "No caso concreto, o último acto de execução do crime, de acordo com os factos provados, remonta a 03.01.2003. Compulsados os autos, com relevância para a decisão, constata-se que o arguido foi constituído como tal no dia 30 de Junho de 2009 (cfr. fls. 137) e foi notificado da acusação por via postal simples, por carta depositada, no dia 10 de Fevereiro de 2011 (cfr. fls. 616). Como bem sublinha o Ministério Público, ocorreram duas causas de interrupção da prescrição do procedimento criminal (em 30 de Junho de 2009 e em 15 de Fevereiro de 2011) e uma causa de suspensão (igualmente em 15 de Fevereiro de 2011, o que significa que, desde a consumação do crime, não decorreu o prazo de 15 anos, descontando neste o prazo de suspensão (3 anos), pelo que não se mostra extinto o procedimento criminal. Pelo exposto decido indeferir o requerido." III. A fundamentação aduzida pelo arguido no seu requerimento apresentado em 29/04/2018 assentou na interpretação normativa do acórdão do TRP, proferido no processo 0741311, relatado pelo Desembargador Cravo Roxo; e, cujo sumário é o seguinte: "a suspensão da prescrição do procedimento criminal, iniciada com a notificação da acusação, termina com a abertura da instrução ou com a notificação do despacho que designa dia para julgamento".

  2. O acórdão, supra citado, do TRP constitui "acórdão fundamento", segundo o qual - inequivocamente - o procedimento criminal dos presentes autos encontra-se prescrito.

  3. A decisão do tribunal a quo assentou, tão só, na apreciação abstracta das datas relevantes, para a apreciação da prescrição do procedimento, a saber: i) data da prática do último acto (supostamente) criminoso (03/01/2003); ii) data da primeira interrupção do procedimento criminal (a constituição de arguido - 30/06/2009), cuja notificação da acusação se verificou a 10/02/2011; iii) data da segunda causa de interrupção da prescrição (notificação do despacho que designa dia para a audiência - 15/02/2011).

  4. O tribunal a quo também aplicou de forma abstracta o desconto de 3 anos, resultante do prazo de suspensão, adicionado aos 15 anos do prazo de prescrição (cfr. art. 118, al. b) e 120º, n.º 2; ambos do C.Penal).

  5. Concedemos que, se a contagem do prazo for efectuada da forma como efectuou o tribunal a quo, o crime (não cometido, mas, aqui em apreço), só prescreveria a 03/01/2021.

  6. .Mas se aplicarmos - ao caso concreto - o "acórdão fundamento", supra citado, do TRP: "a suspensão da prescrição do procedimento criminal, iniciada com a notificação da acusação, termina com a abertura da instrução ou com a notificação do despacho que designa dia para julgamento"; o procedimento criminal iá se encontra - efectivamente - prescrito.

  7. Segundo o referido acórdão, a suspensão da prescrição tem um início - com a notificação da acusação - e tem um fim, em alternativa: 1) ou, a abertura de instrução; ii) ou, a notificação do despacho que designa dia para a audiência.

  8. As regras da prescrição do procedimento criminal foram bastante alteradas na revisão do CPP de 2013; sendo que, esta revisão revelou-se mais desfavorável aos arguidos em geral.

  9. No caso concreto, ter-se-á de aplicar a legislação em vigor, à data da prática dos factos, supostamente criminosos; isto é, a lei substantiva penal que vigorava nos anos de 2002 e inícios de 2003, pois que o último facto foi praticado em Janeiro de 2003 (redação do C. Penal, pela Lei 65/98 de 2 de Setembro).

  10. Se a fonte legal tem de ser aferida pela Lei positiva em vigor à data dos factos (porque mais favorável ao arguido), também é natural que a fonte jurisprudencial seja aquela que, ao tempo, era vigente; razão por que invocamos como "acórdão fundamento", o supra citado acórdão.

  11. Naquela altura, o art. 117º, n.º 1 do C.P., cuja epígrafe é "prazos de prescrição", na sua alínea b), lia-se o seguinte, depois do proémio: "o procedimento criminal extingue-se, por efeito da prescrição, logo que sobre a prática do crime sejam decorridos os seguintes prazos: al. b) 10 anos quando se trate de crime a que corresponde a pena de prisão com o limite máximo igual ou superior a 5 anos, mas que não exceda 10." (previsão semelhante à actual).

  12. O início da contagem do prazo ocorre nos termos do n.º 2 do art. 118º do C.P., alínea b): "nos crimes continuados, ... desde o dia da prática do último acto criminoso" - no caso concreto, 03 de Janeiro de 2003.

  13. O art. 120º, n.º 3 do C.P. (versão da Lei 65/98 de 02 de Setembro), estatui o seguinte (no que tange à interrupção da prescrição): "a prescrição do procedimento criminal terá sempre lugar quando, desde o seu início, e ressalvado o tempo da suspensão, tiver decorrido o prazo normal da prescrição acrescido de metade". (Portanto, são 15 anos, a contar da prática do último facto, ressalvada a suspensão da prescrição).

  14. Tendo em consideração que o último facto foi praticado no dia 03 de Janeiro de 2003; volvidos 15 anos (art. 120º do C.P., versão da Lei 65/98 de 02 de Setembro), o processo teria prescrito no dia 03 de Janeiro de 2018, ressalvado o prazo de suspensão, conforme a citada Jurisprudência orientadora da interpretação a extrair do referido normativo.

  15. Na circunstância (seguindo a jurisprudência citada), a "suspensão máxima" durou entre a data da notificação da acusação (cuja carta foi expedida a 09/02/2010, com ref. 2776516) e o despacho de abertura da instrução (o qual ocorreu em 26/05/2010, com ref. 2937121).

  16. Nesta conformidade, a suspensão máxima seria de 3 meses e 16 dias.

  17. Por consequência, e segundo a dita jurisprudência, tendo em consideração que a prática do último acto (supostamente) criminoso, ocorreu a 03/01/2003; adicionando-lhe 3 meses e 16 dias, o procedimento criminal encontra-se prescrito desde 19/04/2018.

    B - De qualquer modo e em quaisquer circunstâncias, sempre o procedimento criminal encontra-se prescrito, conforme subsidiariamente infra concluímos.

  18. Conforme, supra referimos, perante o requerimento formulado pelo arguido, o tribunal a quo despachou tal pedido, com um indeferimento e com a argumentação constante no respectivo despacho, objecto do presente recurso.

  19. O tribunal recorrido, não aceitou a argumentação do arguido, assente no acórdão TRP, proferido no processo 0741311 relatado pelo Desembargador Cravo Roxo, disponível em dgsi.pt.

  20. Seja como for - em quaisquer circunstâncias - o procedimento criminal encontra-se prescrito.

  21. No fundo, a única questão que obstou o tribunal a quo a reconhecer a prescrição do procedimento criminal, foi o facto de ter adicionado, ao prazo de 15 anos, decorrente do art. 121º, n.º 3 do C.P., outro prazo de 3 anos, correspondente ao desconto do cômputo máximo de suspensão da prescrição, até ao trânsito em julgado.

  22. Todavia, a interpretação do art. 120º, n.º 3 do C.P. (na versão da Lei 65/98 de 02 de Setembro) terá de ser efetuada para além da (mera) letra, tendo em consideração o elemento teleológico da Lei.

  23. Prazo de suspensão de 3 anos, que corresponde ao prazo normal considerado razoável para que uma causa seja julgada.

  24. Mas, então, devemos proceder a uma interpretação teleológica (e não só baseada no elemento literal da Lei escrita); isto é, compreende-se que se adicione tal prazo de 3 anos, nos casos em que, por razões objetivas - estranhas ao procedimento do próprio processo -, o tribunal teve de despender o referido prazo suspensivo de 3 anos, não tendo podido concluir o julgamento - dentro daquele cômputo do termo de 15 anos.

  25. Todavia, o que não podemos aceitar - de modo algum - é que se adicione - o prazo de 3 anos de suspensão do procedimento criminal, ao prazo máximo de 15 anos, quando o julgamento já decorrera dentro do prazo normal dos 15 anos. Pois - cessada a causa (do tempo para julgamento) deve cessar o efeito (contar mais 3 anos).

  26. Se assim não fosse, estaríamos a admitir que uma causa que deixou de ser relevante prejudicaria as regras de certeza e segurança jurídicas, que tutelam direitos fundamentais do arguido.

  27. E, realce-se que o arguido nunca contribuiu para uma qualquer "chicana processual" ou atraso dos autos; muito embora tenha encetado uma defesa enérgica, porque se considera injustamente condenado.

  28. Para atestar o afirmado, o arguido chegou mesmo a consignar nos autos que "não se opunha que o seu processo fosse tramitado em concomitância em 3 instâncias distintas (no STJ, no TRP e na 1ª Instância), tudo com vista a imprimir celeridade processual aos autos" (esta declaração ocorreu por altura do primeiro semestre de 2014); como, aliás, agora ocorre.

  29. As circunstâncias factuais que sustentam a afirmação do arguido acham-se descritas nos itens 41 a 77 das alegações; cujos factos foram alegados sem a possibilidade da consulta física dos autos; e, com base em alguns apontamentos pessoais do mandatário principal do processo (Dr. D. F.); e que - com toda a certeza - os Venerandos Desembargadores poderão constatar através da Certidão, requerida pelo arguido, para instruir o presente recurso, tramitado em separado, na qual se indicam as peças processuais que objetivamente demonstram o atraso provocado na tramitação do...

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