Acórdão nº 268/11.7TTBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelVERA SOTTOMAYOR
Data da Resolução24 de Abril de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães APELANTE: X – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.

APELADO: F. T.

F. S.

Comarca de Braga, Juízo do Trabalho de Braga – Juiz 2 I – RELATÓRIO Frustrada a tentativa de conciliação, F. S.

, por si e em representação dos seus filhos menores E. R.; D. R. e J. M., residente na Rua …, freguesia de ..., Vila Verde, instaurou a presente ação especial emergente de acidente de trabalho contra X – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.

, com sede na Rua …, em Lisboa e F. T., empresário em nome individual com domicílio profissional na Av. …, freguesia de ..., Vila Verde, pedindo que se condenem as Rés, na medida das suas responsabilidades a pagar: a) à Autora F. S. a pensão agravada, anual e vitalícia de 3.274,95 €, com início em 08/03/2011; b) a cada um dos 2º, 3º e 4º AA, a pensão anual agravada de 1.637,47 €, com início em 08/03/2011, até perfazerem 18 ou 22 ou 25 anos, enquanto frequentarem, respectivamente, o ensino secundário ou curso equiparado ou o ensino superior; c) à Autora F. S.: a. a quantia de 3.689,12 €, a título de despesas de funeral; b. a quantia de 24,00 €, a título de despesas de transporte em deslocações ao Tribunal; c. a quantia de 2.766,84 €, a título de subsídio por morte; d) a cada um dos filhos, a quantia de 922,28 €, a título de subsídio por morte; e) para um dos AA., a quantia de 25.000,00 e, a título de dano moral; f) a todos os AA., a quantia de 10.000,00 €, pelos danos sofridos pelo sinistrado nos momentos que precederam a sua morte; g) a todos, a quantia 50.000,00 €, a título de indemnização pela privação do direito à vida de seu marido e pai; e h) juros de mora sobre as quantias peticionadas até efectivo e integral pagamento.

Tal como se alega em síntese na sentença recorrida no dia 07/03/2011, quando o sinistrado, J. D. (marido e pai dos Autores, respectivamente), se encontrava ao serviço do 2º Réu, no estaleiro de uma obra adjudicada àquele, desempenhando as funções de trolha de 2ª, ao operar uma máquina de cortar/dobrar ferro, foi vítima de uma descarga eléctrica proveniente do toque da lança da grua montada no estaleiro com uma linha eléctrica de média tensão aérea, descarga essa que percorreu a grua, o gerador e a máquina que operava, o que foi causa directa e necessária da sua morte por electrocussão. Mais alega que o sinistrado auferia a retribuição base mensal de 497,00 € x 14 meses/ano, acrescida de 111,76 € x 11 meses/ano, a título de subsídio de alimentação, sendo que aquele empresário havia transferido para a 1ª Ré a responsabilidade infortunística por acidentes de trabalho pela retribuição mencionada.

Regularmente citados, os Réus contestaram.

A Ré seguradora alega que o acidente ocorreu única e exclusivamente por inobservância pelo 2º Réu e seus representantes das específicas regras de segurança no trabalho, designadamente das constantes dos artigos 272.º, 273.º, 275.º e 278.º do Código do Trabalho de 2003, 7º, alínea d) e 11º, nº 1, alínea f) e nº 2 do DL nº 273/2003, de 29 de Outubro, 6º, nº 1 do DL nº 50/2005, de 25 de Fevereiro e 5º da Portaria nº 101/96, de 3 de Abril, pedindo que lhe seja reconhecido o direito de regresso.

O Réu empregador nega qualquer responsabilidade no desfecho do acidente que vitimou o sinistrado, por considerar que não foram por ele violadas as regras de segurança, em virtude de o local onde aquele operava apresentar suficientes e adequadas medidas de prevenção. Alega ainda que não recaia sobre si o dever de prevenção de determinados riscos especiais, nomeadamente os que envolviam a proximidade da linha de média tensão, uma vez que o plano de higiene e segurança que lhe foi facultado pelo dono da obra não previa esses riscos. Por fim, refere que tinha sido assegurada a ligação à terra na máquina que o sinistrado manobrava no momento do acidente. Conclui pela sua absolvição do pedido, por se encontrar transferida para a 1ª Ré a responsabilidade pela reparação do sinistro.

*Os autos prosseguiram os seus ulteriores termos tendo por fim sido proferida sentença, a qual terminou com o seguinte dispositivo: “Em face do exposto, julgo a acção parcialmente procedente, por parcialmente provada, e consequentemente: 1. condeno a Ré, “X – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A” a pagar: a. à Autora viúva, F. S.: i. a pensão anual e vitalícia de 2.456,21 € (que passará para 3.274,94 € ao perfazer a idade de reforma por velhice), com início em 08/03/2011 (dia seguinte ao da morte do sinistrado), actualizável nos termos legais, a ser paga adiantada e mensalmente até ao 3º dia do mês a que respeitar, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão anual e sendo os subsídios de férias e de Natal pagos, respectivamente, nos meses de Maio e Novembro; ii. a quantia de 1.500,00 €, a título de despesas de funeral; iii. a quantia de 2.766,85 €, a título de subsídio por morte; iv. a quantia de 24,00 €, referente a despensas em transportes nas deslocações que teve de efectuar a Tribunal; e v. os juros de mora sobre as referidas prestações, à taxa legal de 4% ao ano, desde 08/03/2011 até integral pagamento.

  1. a cada um dos AA, E. R., D. R. e J. M.: i. a pensão anual e temporária de 1.364,56 €, com início em 08/03/2011 (dia seguinte ao da morte do sinistrado) até perfazer 22 ou 25 anos de idade enquanto frequentar, respectivamente, o ensino secundário, ou equiparado, ou curso superior, ou sem limite de idade, quando afectada de doença física ou mental que a incapacite sensivelmente para o trabalho, a ser paga adiantada e mensalmente até ao 3º dia do mês a que respeitar, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão anual, sendo os subsídios de férias e de Natal, de montante igual à pensão mensal, pagos, respectivamente, nos meses de Maio e de Novembro; ii. a quantia de 922,28 €, correspondente a 1/3 de metade do valor do subsídio por morte atribuído; iii. os juros de mora à taxa legal desde 08/03/2011 até integral pagamento.

    1. absolvo a Ré seguradora dos demais pedidos: e 3. absolvo o Réu, F. T., de todos os pedidos.

    Custas a cargo das Ré seguradora, na proporção do respectivo decaimento, uma vez que os AA. gozam de apoio judiciário.

    Valor da causa: 80.399,28 €.

    Registe e notifique.” Inconformada com esta decisão, dela veio a Ré X- Companhia de Seguros, S.A. interpor recurso para este Tribunal da Relação de Guimarães, apresentando alegações que terminam com as seguintes conclusões: I.

    A sentença recorrida não pode manter-se, uma vez que não consubstancia a justa e rigorosa apreciação da prova produzida.

    II.

    A sentença a quo padece de erro na determinação da entidade responsável pela produção do acidente.

    III.

    O Tribunal a quo julgou – incorrectamente – a matéria de facto da alínea m) dos factos dados como provados, nomeadamente, deu como provado que “Com efeito, a dado momento, por causas não apuradas, os cabos de elevação da auto-grua, provenientes do carrinho, entraram em contacto directo com a linha de média tensão.” IV.

    Resulta da prova produzida, que a grua foi deficientemente montada nunca chegou a ser concluída, daí que não estivesse travada e se tivesse movimentado sozinha V.

    Ademais, a grua foi montada num local indevido, em face da proximidade de um cabo de média tensão que ali se encontrava.

    VI.

    Por estas razões, não foi “por causas não apuradas” – conforme consta da factualidade dada como provada – que a grua se movimentou, mas sim devido ao local onde foi instalada, assim como à sua deficiente e inacabadas instalação e montagem.

    VII.

    O Tribunal a quo baseia a sua decisão na presunção de que “os cabos eléctricos não eram visíveis para quem estivesse no estaleiro”, concluindo que, não sendo os cabos visíveis, não era exigível ao Réu empregador tê-los visto, e como tal, ter procedido à montagem da grua num outro local.

    VIII.

    A ilação retirada pelo Tribunal não tem suporte nos factos apurados, razão pela qual nunca o Tribunal se poderia ter baseado nesta conclusão infundada.

    IX.

    O que decorre da prova produzida é precisamente o contrário: os cabos eram perfeitamente visíveis por um homem médio e para quem estivesse no estaleiro.

    X.

    E mais, sobre o Réu Empregador – em face da experiência e conhecimentos que detêm na área – impendia um dever acrescido de os prever aquando da instalação da grua.

    XI.

    A sentença a quo padece de erro de julgamento quanto à matéria de facto, na medida em que o tribunal a quo não considerou, conforme devia, o acórdão proferido pela 1ª secção Criminal da Instância Central de Braga, no âmbito do processo que correu termos sob o n.º 177/11.0GBVVD (cuja certidão foi junta ao processo), que condenou o Réu F. T. pela prática de um crime de infracção e regras de construção, previsto e punível pelo art.º 2777.º, n.º 1, alínea a) e n.º 3 do Código Penal.

    XII.

    Nos presentes autos estão em discussão os mesmos factos que foram julgados no âmbito daquele processo-crime.

    XIII.

    E do referido acórdão resulta como provada a inobservância das regras de higiene e segurança por parte do aqui Réu F. T..

    XIV.

    “A fixação dos factos em processo-crime, no quadro de uma condenação definitiva, vale directamente numa posterior acção cível na qual se discutem relações jurídicas dependentes dos factos que alicerçaram a afirmação da prática da infracção penal.

    XV.

    O tribunal a quo desconsiderou, por completo, e ao arrepio do disposto nos artigos 413.º e 623.º do Código do Processo Civil, o valor probatório do acórdão-crime, que constitui um meio de prova fundamental nos presentes autos.

    XVI.

    Impõe-se, pois, a consideração dos factos apurados no processo-crime.

    XVII. Por outro lado, a sentença a quo não consubstancia uma correcta e rigorosa aplicação do direito ao caso sub judice.

    XVIII. Desde logo, em face da matéria de facto dada como provada nas alíneas p) e q) dos factos provados, o tribunal a quo não poderia ter concluído conforme concluiu, pela inexistência de inobservância das regras de higiene e segurança por parte da entidade empregadora, pois os aludidos factos dados como provados permitem-nos, por si só, concluir e...

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