Acórdão nº 1414/18.5T8CHV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA JOÃO MATOS
Data da Resolução10 de Outubro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães.

*I – RELATÓRIO 1.1.

Decisão impugnada 1.1.1. (…) (aqui Recorrente), com residência fiscal na Rua de (…) em Vila Nova de Famalicão, propôs a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra (..) (aqui Recorrida), com sede na Rua de(…) ), em Lisboa, pedindo que · a Ré fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 39.856,93 (sendo € 14.000,00 a título de indemnização por danos morais, € 10.000,00 a título de indemnização por perda de capacidade de ganho, € 13.104,00 a título de indemnização por perdas salariais, € 238,61 a título de indemnização por despesas hospitalares, médicas e medicamentosas, € 594,34 a título de indemnização pelo custo de reparação de veículo motorizado, e € 1.919,98 a título de indemnização por prejuízos resultantes de mora no pagamento de indemnização de danos patrimoniais assumidos pela Ré), acrescida de juros de mora, calculados à taxa supletiva legal, contados desde 28 de Junho de 2013 até integral pagamento.

Alegou para o efeito, em síntese, que, no dia 08 de Agosto de 2009, pelas 15.45 horas, na R 311 km, em …, quando o motociclo que conduzia se encontrava parado num sinal de stop existente na via, foi embatido por uma veículo automóvel ligeiro de mercadorias, seguro na Ré, por o respectivo condutor circular de forma imprudente, descuidada e desatenta.

Mais alegou que, em virtude do embate referido, e da sua posterior queda no solo, registou diversos danos, nomeadamente: materiais no seu motociclo, no valor de € 3.172,15, assumidos posteriormente pela Ré, à excepção da quantia de € 594,34, correspondente a danos num dos seus tubos de escape; lesões físicas e sofrimento psicológico (v.g. medo, angústia, ansiedade, dores, incómodos, preocupação, e desassossego); perdas salarias enquanto esteve incapacitado, no valor de € 13.104,00; diminuição da sua capacidade de ganho; e despesas hospitalares, médicas e medicamentosas, no valor de € 238,61.

Alegou ainda o Autor que, não lhe tendo a Ré pago oportunamente o custo da reparação do motociclo, foi ele próprio demandado judicialmente pela oficina que a realizara (primeiro em acção declarativa - onde fez intervir a Ré, como interveniente acessória -, e depois em acção executiva), tendo suportado um prejuízo por aquela mora de € 1.919,98 (remanescente da quantia total de € 6.997,78, que pagou para extinguir a dita acção executiva, deduzido do posterior pagamento indemnizatório da Ré, de € 3.172,15).

1.1.2.

Regularmente citada, a Ré (X Seguros - Companhia de Seguros de Ramos Reais, S.A.) contestou, pedindo que: fosse julgada procedente a excepção peremptória de prescrição, sendo ela própria absolvida do pedido; e, subsidiariamente, a acção fosse julgada totalmente improcedente, sendo ela própria igualmente absolvida do pedido.

Alegou para o efeito, em síntese, encontrar-se prescrito o direito do Autor a demandar, uma vez que teriam decorrido mais de três anos desde a data do acidente invocado (08 de Agosto de 2009) e a data da sua citação nos autos (12 de Setembro de 2018).

Mais alegou desconhecer, quer a forma como o acidente de viação ocorreu, quer os eventuais danos dele resultantes (assim impugnando o alegado a propósito pelo Autor); e defendeu ainda serem excessivos os montantes indemnizatórios peticionados.

Por fim, a Ré reconheceu que, em 20 de Agosto de 2009, assumiu extrajudicialmente a responsabilidade pela produção do acidente, por a ter como cabendo ao condutor do veículo cuja circulação fora por si garantida.

1.1.3.

O Autor (J. R.) respondeu à excepção de prescrição, pedindo que a mesma fosse considerada improcedente.

Alegou para o efeito, sempre em síntese, consubstanciar a conduta do condutor do veículo que embateu no seu motociclo um crime de ofensa à integridade física por negligência, sendo de cinco anos o prazo de prescrição pelo respectivo procedimento criminal; e aplicar-se este prazo, mais longo, aos autos.

Mais alegou ter a prescrição sido interrompida, quer pela citação da Ré, em 27 de Janeiro de 2012, na acção declarativa que foi movida a ele próprio pela oficina reparadora do seu motociclo (quando nela a fez intervir, como interveniente acessória), quer pelo pagamento realizado pela Ré, em Junho de 2014, da quantia de € 3.172,15, a título de custo de reparação do seu veículo motorizado, quer ainda pelo reconhecimento que fez do seu direito de indemnização, por carta de 20 de Agosto de 2009.

1.1.4.

Em sede de audiência prévia, o Tribunal a quo anunciou o seu propósito de conhecer de imediato do mérito da causa, tendo as partes sido então ouvidas sobre essa possibilidade e para, querendo, produzirem alegações, o que fizeram (reiterando, cada uma delas, as respectivas pretensões já expressas nos seus articulados).

1.1.5.

Foi depois proferido saneador-sentença, julgando a acção totalmente improcedente, lendo-se nomeadamente nessa decisão: «(…) DECISÃO Pelo exposto, decide-se julgar a presente acção totalmente improcedente, por se verificar a excepção de prescrição dos direitos que o A. J. R. pretende fazer valer e, em consequência, absolver a R. X Seguros – Companhia de Seguros de Ramos Reais, S.A. de todos os pedidos formulados pelo Autor.

Custas pelo Autor (art. 527º nº 1 do C.P.C.).

Registe e notifique.

(…)»*1.2. Recurso 1.2.1. Fundamentos Inconformado com esta decisão, o Autor (J. R.) interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que fosse revogada a sentença recorrida, sendo substituída por decisão julgando improcedente a excepção de prescrição e ordenando o prosseguimento dos autos.

Concluiu as suas alegações da seguinte forma (aqui se reproduzindo as respectivas conclusões ipsis verbis): A - Vem o presente recurso interposto da Douta Sentença proferida pelo Meritíssimo Tribunal "a quo" que, dando provimento à excepção da prescrição invocada pela aqui Seguradora Recorrente, julgou a acção totalmente improcedente; B - Salvo o devido respeito, o Recorrente não pode concordar com os fundamentos que sustentam a douta decisão recorrida.

C - O âmbito do presente recurso resume-se, pois, à apreciação das interrupções da prescrição invocadas pelo Recorrente e à excepção da prescrição alegada pela Recorrida; D - Não tendo o Tribunal a quo se pronunciado em concreto sobre o prazo de prescrição aplicável, se o de três anos (de curto prazo), previsto no art. 498º, nº 1 do C.C., se o de cinco anos (prazo mais longo), previsto no art. 498º, nº 1 daquele diploma. Entende o Recorrente, considerando a descrição da dinâmica do acidente e deste ter resultado lesões corporais para o Recorrente, provocadas pela conduta ilícita do condutor do veículo automóvel segurado da R., para além da invocação da prática de um ilícito criminal (crime de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelos artigos 148º, nº 1 do Código Penal) por parte do condutor do veículo automóvel segurado da R., ser de aplicar o prazo de cinco anos previsto no nº 3 do citado art. 498º do C.C.

E - Tendo o acidente dos autos ocorrido a 8 de Agosto de 2009, a prescrição ocorreu a 8 de Agosto de 2014.

F - Todavia, a prescrição admite excepções, designadamente, os casos de interrupção previstos nos arts. 323º e 325º do C.C.

G - A primeira das interrupções ocorridas acontece a 20 de agosto de 2009, através da remessa ao A. do documento que consta a fls. 20 dos autos H - De tal missiva constando, entre outros, os seguintes dizeres: «(…) Reportamo-nos ao sinistro em referência. Serve a presente para informar que pelos elementos que constituem o nosso processo, nomeadamente auto de polícia, é nosso entendimento que a total responsabilidade pela produção do acidente pertence ao condutor do veículo que garantimos por infracção do artigo 24º do Código da Estrada (…). (…) Para podermos prosseguir com a regularização dos danos materiais resultantes para V.Ex.ª é necessário que nos autorize, conforme solicitado na nossa correspondência datada de 10-08-2009 (…). (…) Quanto dano corporal, solicitamos nos indique se tem alguma despesa ou quantia a reclamar e em caso afirmativo nos indique qual, bem como nos habilite com os comprovativos para análise»; I - A supra referida missiva, dirigida (em fase extrajudicial) ao ora Recorrente e titular do direito de indemnização, revela, sem qualquer margem para dúvida, designadamente de natureza interpretativa, conduta factual que reconhece o direito de indemnização, assim como o assumir dessa obrigação e a vontade de lhe dar cumprimento.

J - Reunindo, a dita missiva, “(…) os requisitos de confissão extrajudicial em documento particular, dirigida à parte contrária, atribuindo-lhe a lei força probatória plena “, neste sentido o douto Ac. do TRP, de 09-09-2013, in www.dgsi.pt K - Estatui o artigo 358.º, nº2 do C. C.: “A confissão extrajudicial, em documento autêntico ou particular, considera-se provada nos termos aplicáveis a estes documentos e, se for feita à parte contrária ou a quem a represente, tem força probatória plena“.

L - A R. companhia seguradora não impugnou tal missiva (declaração confessória), alegando quanto a esta, a item 25º da sua, douta, contestação, o seguinte: “Apesar disso, diga-se que a Ré, em 20 de Agosto de 2009, entendeu assumir extrajudicialmente a responsabilidade pela produção do acidente como pertencente ao condutor do veículo por si garantido, valendo para esse efeito.

“ M - A dita comunicação consubstancia sem a menor dúvida, o reconhecimento pela R. do direito à indemnização por parte do Recorrente, N- Tal reconhecimento, efectuado perante o respectivo titular (o ora Recorrente), pela R. companhia seguradora, tem eficácia interruptiva da prescrição – art. 325º, nº 1 do C.C.

Provocando novo inicio de prazo de contagem da prescrição, reiniciando-se esta no dia seguinte àquele a que se reporta a data que dela consta (21.08.2009), O - A supra mencionada missiva (doc de fls. 20 dos autos), tendo natureza de confissão extrajudicial e reveste força...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT