Acórdão nº 10/17.9GEGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelMÁRIO SILVA
Data da Resolução11 de Março de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes da Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório 1. Em processo comum (tribunal singular) com o nº 10/17.9GEGMR, a correr termos no Tribunal Judicial da comarca de Braga – Juízo Local Criminal de Guimarães – Juiz 3, foi proferida sentença, datada de 16/10/2018 e depositada no mesmo dia, com a seguinte decisão (transcrição): “Pelo exposto, julga-se a acusação pública procedente e consequentemente decide-se: 1.

Condenar a arguida M. C., pela prática de um crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108º nº 1 do DL 422/89, de 2 de Dezembro, na pena de 3 (meses) de prisão e 70 (setenta) dias de multa, substituindo-se aquela pena de prisão por igual dias de multa, isto é, 90 dias, no que resulta na pena única de 160 (cento e sessenta) dias de multa, à razão diária de €6,00 (seis euros).

  1. Condenar a arguida nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 03 (três) UCs.

  2. Declarar perdida(s) a favor do Estado a(s) máquina(s) apreendida(s), e sua oportuna destruição, bem como o dinheiro nelas existente a favor do Fundo de Turismo, ao abrigo do disposto nos artigos 109º, nº 1, do Código Penal e 116º e 117º, do DL 422/89.

    ***Notifique.

    Após trânsito remeta boletim à DSIC.

    Proceda ao depósito – artigo 372º nº 5 do CPP.” *2 – Não se conformando com a decisão, a arguida interpôs recurso oferecendo as seguintes conclusões (transcrição): “1ª- Independentemente do respeito - que é muito - que o mesmo lhe merece, não pode o Recorrente conformar-se com o mui douto Acórdão proferido pelo Ex.mo Tribunal a quo, no caso dos presentes autos, pois, para além de padecer de notória insuficiência da decisão da matéria de facto, a mui douta Sentença recorrida está manifestamente viciada de erro notório na apreciação da respetiva prova e, ainda, de inadequada interpretação e aplicação do direito; 2ª- Foi julgada incorretamente como provada a seguinte matéria de facto constante do “II. Fundamentação, 1- Factos Provados” sob os itens 1, 2, 17, 18 e 19; 3ª- O Ex.mo Tribunal a quo não efetuou, pelo menos no que se refere aos factos pelos quais o Recorrente foi condenado, uma criteriosa e cuidada apreciação da prova produzida nos autos, sendo que – se tal sucedesse – a prova referida na conclusão antecedente somente poderia (como deveria e ainda deve) ser julgada como não provada; 4ª- Salvo o devido respeito por diferente entendimento, em sede de julgamento, não foi produzida prova cabal, segura e inequívoca que a Recorrente explorasse a máquina apreendida nos autos e, por via desta, tivesse tido praticados os factos em apreço nos autos, designadamente os que foram erroneamente julgados como provados sob os itens 1, 2 17, 18 e 19 todos do ponto “II. Fundamentação, 1. Factos Provados” e que parecem ter motivado a, injusta e infundada, condenação da Recorrente pela alegada, mas inexistente, prática do crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108º do DL. Nº 422/89, de 02/12, já que: 5ª- No respeitoso entendimento da Recorrente não se concebe como é que o Ex.mo Tribunal Recorrido concluiu que a Arguida efetuava a exploração do equipamento apreendido nos autos, uma vez que a dita exploração não resulta de nenhum meio de prova recolhido em sede de inquérito ou sequer produzido na audiência de julgamento realizadas nestes autos; 6ª- Na verdade, nenhuma das testemunhas inquiridas nos autos refere que era a arguida que fazia a exploração do equipamento apreendido nos autos no que tange ao alegado desenvolvimento dos jogos de fortuna e azar: o militar da GNR P. O., cujo depoimento, segundo a ata da audiência de julgamento de fls. … e seguintes, se encontra gravado na aplicação em uso no Tribunal, no ficheiro 20181004144352_5461357_2870588 com a duração de 00:28:29, mas no suporte fornecido à Recorrente tem a referência 20181004151742_5537392_2870588, apenas se limitou a declarar que a arguida se apresentou como “responsável pelo café” denominado “Café T.” e como exploradora do estabelecimento, não tendo, contudo a identificada testemunha ter efetuado qualquer testemunha para apurar tal facto e desconhecendo se a Recorrente era, na verdade, “a gerente do café”, cliente ou há quanto tempo lá estava a gerir o identificado estabelecimento (dos 17 min e 00 seg. aos 19 min e 02 seg.

    ); 7ª- Mais acresce que do depoimento prestado pela identificada testemunha e demais prova produzida nos autos também nada resulta quanto ao alegado - mas, no nosso respeitoso entendimento, não comprovado - conhecimento por parte da Arguida da invocada natureza ilícita do jogo desenvolvido por tal máquina apreendida, pois quer a identificada testemunha ou qualquer outra testemunha inquirida nos autos nada adiantaram; 8ª- No que tange à matéria da apreciação das características do jogo, através do depoimento da testemunha P. O., Militar da GNR, também não foi possível apurar se a Recorrente tinha efetivo conhecimento que a exploração de tal máquina de jogo apreendida lhe estava vedada e era apenas permitida nos casinos existentes nas zonas de jogo autorizadas, mediante licenciamento da entidade competente; 9ª- No que concerne à prova documental valorizada nos autos, designadamente o auto de apreensão de fls. 07 e seguintes e o relatório pericial de fls. 45 a 49, do mesmo meio de prova nada resulta que possa sustentar, como provada, a factualidade dos factos constantes nos itens 1, 2, 17, 18, e 19; 10ª- Por tudo supra exposto, face a toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento e dada a ausência de prova segura e inequívoca nos termos supra melhor descritos, a factualidade vertida nos citados pontos itens 1, 2, 17, 18 e 19 do ponto “II-Fundamentação, 1. Factos Provados” não deveria ter sido, como erroneamente foi, dada como não provada; 11ª- Mesmo que assim senão entenda, o que se não concebe e por mera hipótese de trabalho se acautela, o Ex.mo Tribunal a quo nunca poderia ter condenado a Recorrente nos termos em que o fez, já que, no caso concreto não verificam os legais requisitos, objetivos e/ou subjetivos, dos tipos de ilícitos pelos quais o Recorrente foi, injustamente condenada, porquanto: 12ª- Para se verificar a prática de um crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108, Nº 1, com referência aos artigos 1º, 3º, e 4º, Nº 1 al. g), do D.L. Nº 422/89, de 02/12, é necessário que o seu agente, por qualquer forma, faça a exploração ilícita de jogos de fortuna ou azar fora dos locais legalmente autorizados; 13ª- O artigo 1º do identificado diploma legal define como “jogos de fortuna ou azar” “aqueles cujo resultado é contingente por assentar exclusiva ou fundamentalmente na sorte”; 14ª- Na esteira da mui douta decisão proferida nos autos de processo comum que correram termos, sob o Nº 546/15.6GEGMR, no Juízo Criminal de Guimarães – Juiz 2, Comarca de Braga, com a previsão e punição do identificado tipo de ilícito “pretende-se acautelar a integridade das explorações dos jogos de fortuna e azar, circunscrevendo-as a zonas de jogo legal e devidamente autorizadas”, cujo conceito “trata-se de um tipo totalmente aberto, cujo núcleo essencial corresponde a uma autêntica cláusula geral, que tem vindo a suscitar sérias dificuldades interpretativas, quando se pretende distinguir este ilícito criminal dos ilícitos contra-ordenacionais que correspondem a modalidades afins dos jogos de fortuna e azar e outras formas de jogo quando estas não se encontrem autorizadas, da previsão do art.º 159º e 160.º”.

    15ª- A “jurisprudência não tem sido uniforme ao estabelecer os critérios diferenciadores dos ilícitos de natureza criminal e os de natureza contra-ordenacional”, por referência ao Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto em 21/05/2008, disponível em www.dgsi.pt, e o Acórdão de Fixação de Jurisprudência N.º 4/2010 do Supremo Tribunal de Justiça - publicado em 08-03-2010 na 1ª Série do DR – sustentam-se os seguintes critérios: a) pelo carácter totalmente aleatório do resultado; b) pela natureza pecuniária dos prémios atribuídos; c) pelo tipo das operações oferecidas ao público; d) pela pré-determinação do subsequente prémio; e) pela temática do jogo ou pela natureza dos prémios e f) pela temática do jogo; 16ª- No que se refere a este determinado tipo de máquinas, “o AFJ n.º 4/2010, veio fixar jurisprudência no sentido de que «Constitui modalidade afim, e não jogo de fortuna ou azar, nos termos do artigo 159º, nº 1, 161º, 162º e 163º do Decreto-Lei nº 422/89 de 2 de Dezembro, na redacção do Decreto-Lei nº 10/95 de 19 de Janeiro, o jogo desenvolvido em máquina automática na qual o jogador introduz uma moeda e, rodando um manípulo, faz sair de forma aleatória uma cápsula contendo uma senha que dá direito a um prémio pecuniário, no caso de o número nela inscrito coincidir com algum dos números constantes de um cartaz exposto ao público»; 17ª- Como refere o identificado Acórdão Uniformizador “O critério para se distinguirem os dois tipos de ilícito – ilícito criminal e ilícito de mera ordenação social – não pode deixar de ser material, no sentido de que se há-de partir das próprias categorias legais, em que assumem, quanto aos tipos legais de crime, relevo especial, na respectiva interpretação, o critério teleológico, fundamentalmente ligado à protecção de um bem jurídico, como expressão do princípio da legalidade, não só na sua feição formal, mas também na sua vertente material (nullum crimen sine lege, certa et prior) e a que estão associados princípios de matriz constitucional tão importantes como os da dignidade penal, de carência de pena e de máxima restrição penal. Destes princípios decorre que, traduzindo-se a estatuição da pena numa limitação mais ou menos grave da liberdade, a sanção só se justifica quando esteja em causa a necessidade de protecção de um relevante valor com ressonância ético-social, prévio à constituição do tipo legal de crime, ao contrário do que sucede com as contra-ordenações, que são ético-socialmente indiferentes e em que a...

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