Acórdão nº 1760/16.2T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Maio de 2019
Magistrado Responsável | MARGARIDA SOUSA |
Data da Resolução | 30 de Maio de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO: J. F. instaurou contra COMPANHIA DE SEGUROS "X SEGUROS, S.A." ação condenatória declarativa comum pedindo que, na procedência da mesma, seja a Ré condenada a pagar-lhe: I - a indemnização global líquida de 51.916,00 €, acrescida de juros de mora vincendos, contados à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da propositura da presente acção, até efectivo pagamento; II - a indemnização que, por força dos factos alegados nos artigos 165°. a 176° da p.i., vier a ser fixada em decisão ulterior (artigo 564°., n", 2, do Código Civil), ou, segundo outro entendimento, a indemnização que vier a ser liquidada em execução de sentença (artigos 358°., nºs. 1 e 2 e 609°., n", 2, do Código de Processo Civil).
Alegou para tanto, e em síntese, a ocorrência de um acidente de viação de que foi vítima, e do qual lhe advieram danos patrimoniais e não patrimoniais, reclamando da Ré: a) danos de natureza não patrimonial, no montante de 20.000,00 €; b) ITA de 7 meses - trabalho agrícola 1.400,00 €; c) IPP de 05,00% - 05,00 Pontos, no mínimo 30.000,00 €; d) despesas efetuadas 516,00 €.
num total líquido de 51.916,00 €.
Mais reclamou danos futuros, alegando que ainda não se encontra completamente curado das lesões sofridas.
A Ré contestou, aceitando a responsabilidade do seu segurado pela ocorrência do acidente, mas impugnando os factos relativos às suas consequências (porque, segundo ela não correspondem à realidade ou traduzem inexatas considerações e pretensões, especificadamente, impugnou os artigos 65º, 67º, 77º, 158º 159º, 162º, 165º, 166º, 179º e 180º da P.I. como falsos; e, por desconhecer, não tendo obrigação de conhecer nem se tratando de factos que lhe sejam pessoais, se é ou não verdadeiro o alegado nos artigos 43º, 44º, 45º, 66º, 68º, 70º a 76º, 79º a 81º, 91º a 125º, 128º a 135º, 137º a 157º, 163º e 167º a 176º, sempre inclusive, todos da P.I., impugnou-os nos termos do disposto no nº 3 do Art. 574º CPCiv).
Procedeu-se a audiência de discussão e julgamento e, seguidamente, foi proferida sentença a julgar parcialmente procedente a ação e a condenar a Ré: a) a pagar ao A. a quantia de € 22.606,00 (vinte e dois mil, seiscentos e seis euros), sendo €15.106,00, a título de danos patrimoniais e €7.500,00 a título de danos não patrimoniais; b) a pagar ao A. os juros à taxa de 4% (Portaria 291/03, de 8Abr): • de mora desde a citação até integral pagamento, sobre o montante relativo aos danos patrimoniais; • desde hoje até integral pagamento, sobre o montante relativo aos danos não patrimoniais.
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No mais, julga-se a acção improcedente, absolvendo a R. do restante peticionado.
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Custas por A. e Ré na proporção do respectivo decaimento.
Inconformada, a Ré interpôs recurso, apresentando as seguintes conclusões: 1 – Entende a Apelante que, salvo o devido respeito, ocorreram vários erros na decisão da matéria de facto.
2 – O Ponto 8 dos Factos Provados em que se diz “O proprietário do veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula XS – C. M. – não havia accionado o sistema de segurança de abertura das portas do referido veículo automóvel, nem mantinha as portas traseiras do veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula XS trancadas e bloqueadas, por forma a não poderem ser abertas, pelo interior ligeiro de passageiros de matrícula XS, pelo seu filho menor” tem que passar a dar-se como não provado – já que não se produziu qualquer prova quanto ao mesmo.
3 - Do mesmo modo, o Ponto 19 dos Factos Assentes em que se diz “Permaneceu internado na Unidade Local de Saúde do ..., EPE – ULS…, EPE -, de ..., ao longo de um período de tempo de quarenta e oito (48) horas – dois (2) dias, findo o qual obteve alta hospitalar, tendo regressado à sua casa de habitação, com o seu membro superior esquerdo imobilizado e pendurado ao peito, e onde se manteve, doente, combalido e retido no leito, ao longo de um período de tempo de três (3) semanas” tem que ser dado como parcialmente NÃO PROVADO, passando antes a dar-se como PROVADO, apenas, que “Permaneceu internado na Unidade Local de Saúde do ..., EPE – ULS..., EPE -, de ..., ao longo de um período de tempo de 24 horas, tendo tido alta para casa no dia 13/10/2014 sendo que se manteve, doente, combalido e retido no leito, ao longo de um período de três dias.
4 - Também o Ponto 34. Dos Factos Provados em que se diz “Em consequência das sequelas de que ficou portador o A. passou a praticar ciclismo – que praticava, sem qualquer limitação, antes do acidente -, mas com grande limitação e com um permanente sentimento de receio e de medo, na circulação, deve ser dado como NÃO PROVADO.
5 - Em sentido contrário, o Ponto 11 dos Factos Não Provados, em que se diz “Já antes do acidente o A. era um homem cuja integridade física e capacidade de trabalho estavam seriamente afectadas” deve ser dado como PROVADO, e até com a expressa especificação de que o A. se encontrava já afectado de uma IPP de 80%, nos exactos moldes atestados em certificado/atestado multiusos que o próprio juntou aos autos.
6 - O ponto 8 dos Factos Provados da Douta sentença deve passar a ser dado como NÃO PROVADO pois que, como consta da fundamentação da decisão em crise, não existiu produção de qualquer tipo de prova quanto à dinâmica do acidente e, muito menos ainda, quanto à marca e modelo do veículo XS ou suas características técnicas, designadamente, se o mesmo dispunha de facto de qualquer sistema de segurança de abertura das portas do referido veículo automóvel que permitisse manter as mesmas trancadas e bloqueadas por forma a não poderem ser abertas do interior do veículo.
7 - Não existe qualquer prova documental, pericial ou sequer testemunhal quanto às características técnicas e sistemas de segurança do mesmo e, muito menos, se um eventual sistema de trancagem de portas estava ou não activo ou sequer operacional aquando do acidente.
8 - Tem, por isso, tal ponto dos FACTOS PROVADOS que ser eliminado, transitando para os FACTOS NÃO PROVADOS.
9 - Também o ponto 19 dos FACTOS PROVADOS, em que é dito que o A. permaneceu internado na Unidade Local de Saúde do ..., EPE, ao longo de um período de tempo de quarenta e oito (48) horas – dois (2) dias, findo o qual obteve alta hospitalar, tendo regressado à sua casa de habitação, (…) onde se manteve, doente, combalido e retido no leito, ao longo de um período de tempo de três (3) semanas tem que ser alterado, passando apenas a dar-se como PROVADO, em obediência à prova pericial - exame médico-legal junto a fls. 188 ss, que “o A. Permaneceu internado na Unidade Local de Saúde do ..., EPE – ULS..., EPE -, de ..., ao longo de um período de tempo de 24 horas, tendo tido alta para casa no dia 13/10/2014 sendo que se manteve, doente, combalido e retido no leito, ao longo de um período de três dias.” 10 - Quanto ao Ponto 34. dos Factos Provados, em que se diz que “Em consequência das sequelas de que ficou portador o A. passou a praticar ciclismo – que praticava, sem qualquer limitação, antes do acidente -, mas com grande limitação e com um permanente sentimento de receio e de medo, na circulação.”deve passar a dar-se como NÃO PROVADO.
11 – Tal nexo de causalidade é negado desde logo pelo relatório pericial de fls. 188 ss., de que resulta que as únicas sequelas de que o A. ficou afectado foram a dismorfia como sequela de luxação acrómio clavicular e ombro doloroso (Mf 1202 e Mf 1205).
12 – Além disso, esmagador no sentido de que tal nexo de causalidade e factualidade não podem ser dados como PROVADOS o depoimento da testemunha E. L., cujas declarações se encontram gravadas num sistema de gravação digital - H@bilus Media Studio -, das 15:42:27 às 16:04:28.
13 – Tal testemunha, vizinho e amigo do A. e seu companheiro de ciclismo é ainda médico e esclareceu o Tribunal, nos excertos assinalados no corpo das presentes alegações, que o facto de o A. deixar de ir para a estrada de bicicleta, passando preferencialmente a circular em circuitos fechados/vedados ao tráfego automóvel decorreu de uma opção racional sua, da percepção de que existe um risco enorme para um transplantado do rim e do pâncreas em fazer ciclismo de estrada.
14 – Ou seja, do depoimento desta testemunha resulta que o A., por mera opção, não quis continuar a correr o risco de lesionar-se e comprometer o débil estado de saúde que, só com o duplo transplante, conseguiu num acidente de bicicleta.
15 – Por outro lado, já em sentido contrário, entende a Apelante que tem que se passar a dar como PROVADOS o ponto 11 dos Factos Não Provados, ponto este no qual se refere que “Já antes do acidente o A. era um homem cuja integridade física e capacidade de trabalho estavam seriamente afectadas.” 16 – Para além do reconhecimento no relatório da perícia médico-legal ao transplante renal e ao transplante hepático de que havia sido objecto o A., tal estado clínico é confirmado pelos excertos do depoimento da testemunha E. L., que igualmente refere a diabetes e os transplantes renal e hepático efectuados ao A..
17 – Além disso, não só tal factualidade resulta do documento junto pelo A. aos autos com a PI – certificado de incapacidade multiusos de fls., que ninguém impugnou como foi até expressamente aceite pela R., designadamente, no Art. 41º da sua contestação.
18 - De tal atestado Médico de Incapacidade Multiuso resulta que, já antes do acidente dos autos – pelo menos desde 05/06/2013, data de emissão de tal atestado, o A. padecia de uma Incapacidade Permanante Global de 80%, valorada pelos seguintes itens da TNI: Cap. VII – Pneumologia – Grau 1.1., ou seja, que determina já dispneia objectivável por taquipneia na marcha acelerada em plano ou numa ligeira subida.
Cap. VIII – Nefrologia/Urologia – 1.1 d) – insuficiência renal crónica que implica hemodialise regular em fase avançada .
Cap. XIV – Endocrinologia – Grau 5.1 – Diabetes regularmente equilibrada com o emprego de insulina.
19 – Ao não dar a factualidade e teor de tal documento como provados o Tribunal a quo violou o...
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