Acórdão nº 17853/19.1YIPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Dezembro de 2019
Magistrado Responsável | JORGE DOS SANTOS |
Data da Resolução | 05 de Dezembro de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO (…) S.A., apresentou requerimento injuntivo contra (…) pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia global de € 231,11. Alegou para o efeito, e em síntese, que forneceu à Ré os serviços públicos essenciais de água e saneamento constantes das faturas que identifica, cujo pagamento se encontra alegadamente em falta.
Foi apresentada oposição em que, para além do mais, foi arguida a incompetência material do Tribunal, invocando como efectivamente competente para o efeito a jurisdição administrativa e fiscal.
Os autos foram remetidos à distribuição.
Foi proferido despacho convidando a Autora a pronunciar-se quanto a tal excepção, o que a mesma fez.
Foi dada a oportunidade para exercício do contraditório quanto a tal questão.
O tribunal a quo proferiu sentença, na qual decidiu julgar verificada a excepção dilatória de incompetência material, e, em consequência, absolveu a Recorrida da instância.
Inconformada com tal decisão, veio a Autora recorrer da mesma, para o que formula as seguintes conclusões: - A. A Recorrente assume a exploração e a gestão do sistema de águas da região do Noroeste, em resultado da celebração de um Contrato de Parceria entre o Estado Português (Administração Central) e os Municípios de Amarante, Arouca, Baião, Celorico de Basto, Cinfães, Fafe, Santo Tirso e Trofa.
- B. A pela Recorrida em regime de parceria, nos termos da na alínea c), do n.º 2 do Decreto-Lei n.º 90/2009, de 9 de abril e do Contrato de Parceria e do Contrato de Gestão.
- C. Os Municípios, supra mencionados, delegaram no Estado, as respectivas competências municipais relativas à gestão e exploração dos serviços públicos de abastecimento de água para consumo público e saneamento de água residuais urbanas aos utilizadores finais.
- D. O Município de Fafe outorgou o Contrato de Parceria Pública com a Recorrente para a exploração e gestão dos serviços de água, que compreende a distribuição de água para o consumo humano público e a recolha de águas residuais urbanas aos utilizadores finais, nos termos da Clausula 1.ª, n.º 1 e Cláusula 5.ª, n.º 1, ambas do Contrato de Gestão e da Cláusula 1.ª, n.º 1 do Contrato de Parceria, na qualidade de entidade gestora parceria e não na qualidade de concessionária.
- E. Apenas os Municípios de Fafe, Santo Tirso e Trofa, enquanto durar a concessão dos seus sistemas municipais de abastecimento de água para consumo público, agregam exclusivamente os sistemas municipais de saneamento de águas residuais urbanas, nos termos da Cláusula 1.ª, n.º 5 do Contrato de Parceria e do nos termos do disposto no n.º 8, da cláusula 4.ª Contrato de Gestão, celebrados entre o Estado Português e a Recorrente.
- F. A Recorrida outorgou, com o Município de Fafe, à data entidade gestora dos serviços de abastecimento de água para o consumo público e recolha de águas residuais urbanas.
- G. Ao abrigo deste contrato a Recorrente prestou os serviços de recolha de águas residuais urbanas no domicílio do Recorrido, que os aceitou e nunca os recusou.
- H. O contrato de prestação de serviços de fornecimento de água e recolha de águas residuais se rege pela Lei n.º 23/96 Lei dos Serviços Públicos Essenciais.
I. O contrato de fornecimento de água e recolha de águas residuais é um contrato de consumo regulado no âmbito do direito privado, de uma relação de consumo, que não se celebra em substituição de qualquer ato administrativo.
- J. A presente ação que tem por objeto a simples cobrança de divida civil, por uma empresa privada, regulada pelas regras do direito privado, no pagamento de valores constantes de faturas, acrescido de juros.
- K. Tem, assim, a acção por base uma relação jurídica de direito privado, que se consubstancia numa situação de incumprimento das obrigações contratualmente assumidas pela Recorrida.
- L. Obrigações que tendo natureza civil, regem-se, pelas normas dos contratos civis, estando em causa a apreciação de pressupostos da responsabilidade e do incumprimento e mora contratuais nos termos da lei civil artigo 762.º e seguintes, artigo 806 do código civil.
- M. Pelo que, não se aplica o artigo 4.º, n.º 1, alínea d) do ETAF.
- N. A alínea f), do n.º 1 do artigo 4.º, do supra mencionado diploma, apenas atribui competência à jurisdição administrativa para apreciar litígios sobre a interpretação, validade e execução de contratos objeto passível de ato administrativo, contratos especificamente a respeito dos quais existam normas de direito público.
- O. A sujeição à jurisdição civil face do incumprimento contratual é similar à que resulta da falta de pagamentos de uma fatura de eletricidade ou de uma fatura emitida por operadora de telemóveis ou de comunicações eletrónicas Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, Lei dos Serviços Públicos Essenciais.
- P. As tarifas são fixadas no âmbito dos poderes da Comissão de Parceria de fiscalização, direção, autorização, aprovação e suspensão dos atos da Entidade Gestora de Parceria, ora Recorrente.
- Q. Á pari , os pedidos de aprovação das tarifas são submetidos para pronúncia da entidade reguladora ERSAR.
- R. A Recorrente não fixa tarifas aos particulares, porque estas são aprovadas pela Comissão de Parceria, com a pronúncia da ERSAR, na qualidade de entidade gestora da Parceria, no exercício do direito privado.
- S. Estabelece o n.º 1, do artigo 211.º, da Constituição da República Portuguesa, que “os tribunais judiciais são tribunais comuns em matéria cível e criminal que exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais”.
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E por sua vez, o n.º 3, do seu artigo 212.º, que “compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das ações e recursos contencioso que tenham por objeto dirimir litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais”.
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Dispõe o artigo 64.º, do Código de Processo Civil que são “da competência dos tribunais administrativos as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional”.
V. Foram, assim, violados os artigos 64.º, 96.º, 97.º n.º 2, 99.º, n.º 1, 278.º, n.º 1, alínea a) , 576.º n.º 2, 1.ª parte, 577.º, n.º 1, alínea a), todos do Código de Processo Civil, bem como o artigo 1.º, n.º 1 do ETAF, e ainda os artigos 211.º, n.º 1 e 212.º, n.º 3 da Constituição Portuguesa.
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Posto isto, o Juízo Local Cível de Fafe tem competência material para decidir a presente ação.
Pretende assim a revogação da decisão recorrida, julgando materialmente competente o Juízo Local Cível de Fafe.
Não houve contra-alegações.
Colhidos os vistos legais...
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