Acórdão nº 858/15.9T8VNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS
Data da Resolução05 de Dezembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

  1. RELATÓRIO Recorrente: Condomínio RuA (..) – Lote 3, Recorrida: (…) Condomínio Rua (…) – Lote 3, instaurou execução para pagamento de quantia certa contra (..), visando a cobrança coerciva da quantia de 6.138,87 euros, acrescida de juros de mora e dando à execução a ata da assembleia de condomínio n.º 36, de 22/02/2014, alegando o seguinte em sede de requerimento executivo: “(…) 4- …enquanto proprietária da fração “A”, conforme melhor consta da ata de condomínio n.º 36, de 02 de fevereiro de 2014 – doc. 1, atualizada pela conta corrente que foi remetida à executada com referência a 30 de outubro de 2014, a executada é devedora ao exequente da quantia de 4.615,23 euros, acrescida dos juros legais vencidos à taxa de 4% ao ano, no valor de 369,22 euros, que corresponde à medida da dívida ao longo do tempo, de acordo com os documentos 1 e 2.

(…) 6- Acresce que, de acordo com o Regulamento do Condomínio em vigor, do conhecimento da executada, no seu artigo 30º, “O condómino que não pagar os seus recibos no prazo previsto no artigo 7º deste regulamento fica sujeito ao pagamento de uma multa correspondente a vinte e cinco por cento do valor do recibo ou recibos em cobrança, no mínimo de cinco euros, acrescida dos juros à taxa de desconto do Banco de Portugal – Doc. nº 3, que se dá por reproduzido.

7- Assim, a tal título, uma vez que há anos que não vem cumprindo as obrigações sob a presente execução, resulta da ata – doc. n.º 1, deve a executada ao exequente, 1.153,83 euros.

8- No total, a dívida exequenda é de 6.138,37 euros (…).

(…)” A executada deduziu oposição à execução mediante embargos invocando: a- a exceção da compensação, alegando que a exequente tem perfeito conhecimento que a executada, pelo menos, desde março de 2011, ficou totalmente impossibilitada de habitar e utilizar o seu apartamento devido ao entupimento dos tubos da rede de saneamento das águas sujas domésticas e dos WCs das frações dos pisos inferiores do edifício; No início de 2011, a cave do apartamento da executada foi, por diversas vezes, inundada com águas sujas e detritos, em todas as suas divisões, na sequência do que o apartamento daquela ficou repleto de moscas e mosquitos; Em consequência dessas inundações, o apartamento da executada sofreu vários estragos, assim como os equipamentos e utensílios existentes nas suas divisões e na cave, que ficaram destruídos; Realizada perícia, a Companhia de Seguros X, seguradora do edifício, constatou que a rede de escoamento das águas residuais domésticas do prédio contrariava as disposições regulamentares e declinou a responsabilidade quanto ao último entupimento dos esgotos; Apesar de aceitar e se comprometer a reparar integralmente os estragos e a ressarci-la por todos os prejuízos sofridos, a exequente ainda não o fez, estando por realizar as obras na cozinha, substituir e/ou reparar as portas e paredes danificadas, pintar com primário e com, pelo menos, três demãos as paredes da cave; Muito embora não seja possível à embargante calcular os prejuízos sofridos da responsabilidade da exequente, certo é que aquela é credora em relação à última de montante muito superior ao reclamado na execução, pelo que invoca a compensação de créditos; b- a inexigibilidade da penalização ou multa, sustentando que esta não lhe pode ser aplicada porque inexiste mora de sua parte atento os fundamentos atrás mencionados, além de que a mesma desconhecia a existência da ata em referência e o regulamento do condomínio, dado que ninguém a havia informado a propósito da existência dessa ata e regulamento, sequer conheceu qualquer comunicação verbal ou escrita das deliberações aí tomadas e aprovadas.

Conclui pedindo que se julgue extinta a execução e, subsidiariamente, que se opere a compensação de créditos.

A exequente contestou, concluindo pela improcedência da exceção da compensação, sustentando que as obrigações em jogo não são da mesma espécie e qualidade; Invocou a exceção da caducidade dos direitos indemnizatórios reclamados pela apelante e que esta pretende ver compensados com o crédito exequendo, nos termos da al. a), do n.º 1 do art. 847º do CC; Invocou a exceção da ilegitimidade passiva em relação aos créditos indemnizatórios invocados pela embargante, sustentando que como esta invoca a intervenção da seguradora do edifício, referindo que esta seguradora concedeu ao embargado a quantia de 1.322,20 euros, que até hoje “pouco ou nada fez”, esta é parte ilegítima para só por si ser demandado nesta sede a propósito daquele crédito indemnizatório que pretende deter e que pretende ver compensado com o crédito exequendo; Impugnou praticamente todos os factos alegados pela embargante; Conclui pela improcedência dos embargos.

Fixou-se o valor da ação, proferiu-se despacho saneador tabelar, conheceu-se dos requerimentos de prova apresentados pela partes e designou-se data para a realização de audiência final.

Por requerimento entrado em juízo em 04/04/2019, a embargante apresentou o requerimento de fls. 70 a 73, requerendo que, ao abrigo do disposto no art. 734º, n.º 1 do CPC, se declare que não existe título executivo, e em consequência se declare extinta e execução.

Sobre este requerimento veio a recair o seguinte despacho: “A embargante/executada, por requerimento de 04 de abril de 2019 veio requerer que o tribunal aprecie a falta de título executivo.

Neste caso concreto a questão da inexistência do título executivo deveria ter sido suscitada no momento processual próprio que radica no articulado da oposição à execução, sendo certo que a questão suscitada no requerimento que se aprecia, por parte da embargante/executada, trata-se inequivocamente de uma questão de direito, razão pela qual o requerimento em apreço se afigura processualmente inadmissível.

Com efeito, finda a fase dos articulados é possível deduzir articulado superveniente quanto a factos que lhe sejam posteriores.

Sucede que a questão ora suscitada é eminentemente jurídica, pelo que o momento processual próprio para argui-la seria o articulado de oposição à execução.

Em face do exposto, o requerimento ora apresentado pela embargante/executada é processualmente inadmissível (cfr. artigo 195º, n.º 1 do Código de Processo Civil), pois que se trata de ato que a lei não admite e que pode influir no exame ou na decisão da causa.

Razão pela qual o requerimento em apreço padece de nulidade, ordenando-se assim que o mesmo seja desentranhado e devolvido à apresentante e no que respeita ao processo eletrónico que o requerimento em apreço seja ocultado da consulta pública, tendo em vista, efetivamente que não influencie no exame da causa.

Condena-se a embargante/executada nas custas do incidente que se fixam em 1 UC nos termos do disposto no artigo 7º, n.ºs 4 e 8, do Regulamento das Custas Processuais”.

Realizada a audiência final, proferiu-se sentença julgando procedente a oposição à execução por embargos e determinando a extinção da execução, constando essa sentença da seguinte parte dispositiva: “Nestes termos, julga-se procedente a presente oposição à execução deduzida pela embargante/executada Maria e, em consequência, absolve-se a mesma da execução instaurada pelo embargado/exequente “Condomínio Rua …- Lote 3-A.

Em conformidade, determina-se a extinção da execução.

*Custas a cargo do embargado/exequente (cfr. artigo 527º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil), do presente apenso e da ação principal, sem prejuízo do direito a proteção jurídica de que (eventualmente) beneficie”.

Inconformada com o assim decidido, veio a exequente/embargada interpor o presente recurso de apelação, em que formula as seguintes conclusões: 1- Salvo o devido e merecido respeito, o recorrente discorda da decisão proferida pelo tribunal a quo, que julgou procedente a oposição à execução deduzida pela embargante/executada e determinou a extinção da execução.

Vejamos:

  1. Decisão em oposição com despacho anteriormente proferido: 2- Nos embargos de executado a embargada/executada não invocou a inexistência de título executivo.

    3- Ao longo do processo, nos despachos proferidos, o tribunal a quo não conheceu oficiosamente da inexequibilidade do título executivo.

    4- A embargante/recorrida, no dia 04.04.

    2019, antes da audiência de julgamento, apresentou requerimento, com a referência na plataforma citius n.º 8480417, no qual veio suscitar, pela primeira vez, a falta de título executivo.

    5- Consequentemente, na audiência de julgamento do dia 04.04.

    2019, o tribunal a quo proferiu despacho em que declarou que o momento processual para ser arguida a inexistência de título executivo era no articulado de oposição à execução, ou seja, o conhecimento da questão suscitada estava dependente de arguição pela parte, sendo o momento processual para o fazer o articulado de oposição à execução.

    6- Contrariamente ao despacho proferido, na douta sentença o tribunal a quo oficiosamente conclui que a ata oferecida à execução não constitui título executivo.

    7- O Tribunal a quo ao decidir oficiosamente que a ata oferecida à execução não constitui título executivo, em contradição com a decisão anterior, no qual fez depender a sua invocação, pela parte, em sede de oposição à execução, violou o princípio do caso julgado – artigo 625º, n.º 2 do CPC.

  2. Da decisão-surpresa/violação do princípio do contraditório: 8- O tribunal a quo, ao tomar conhecimento oficioso da inexequibilidade da ata oferecida à execução, errou, pois que, a solução jurídica apresentada na decisão não foi, ao longo do processo, equacionada e colocada em discussão às partes, sendo a decisão final uma surpresa.

    9- Atentos os despachos proferidos ao longo do processo, designadamente o saneador e o proferido em audiência de julgamento do dia 04.04.

    2019, não era plausível o conhecimento oficioso da questão da inexiquibilidade da ata oferecida à execução na decisão final.

    10- O artigo 3, º, n.º 3 do CPC consagra o princípio do contraditório, designadamente, através da proibição...

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