Acórdão nº 1252/21.8T9BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 22 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelFÁTIMA SANCHES
Data da Resolução22 de Novembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes da Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO 1.

No processo de contraordenação com o n.º 431/2020, a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR), por decisão de 09-11-2020, determinou a cassação do título de condução n.º BR-....

, de que é titular N. M.

.

  1. Não se conformando com essa decisão administrativa, o arguido impugnou-a judicialmente, dando origem aos autos com o NUIPC1252/21.8T9BRG, tendo sido negado provimento ao recurso, com a consequente manutenção da decisão nos seus precisos termos, por sentença datada de 19-05-2021.

  2. Mais uma vez inconformado, o arguido interpôs o presente recurso, concluindo assim a respetiva motivação (transcrição): «III - CONCLUSÕES a. A sentença proferida nos autos de contraordenação improcedeu o recurso apresentado pelo ora recorrente, mantendo a decisão administrativa proferida pelo Presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, de cassação do título de condução nº BR-.....

    b. O presente recurso tem como objeto a reapreciação da matéria de direito, pretendendo evidenciar o que, no seu entendimento e, salvaguardando o devido respeito por melhor opinião, existem, erros na fixação da matéria de direito.

    c.

    Não se pode olvidar que o Recorrente, nos factos que deram origem ao processo de cassação confessou integralmente e sem reservas os factos pelos quais estava acusado.

    d. A aplicação da cassação do título de condução resulta da condenação do Recorrente por 2 (Dois) crimes de condução sob o efeito do álcool.

    e. Em virtude das condenações nos processos supra identificados viu serem-lhe retirados 12 (doze) pontos no título de condução – cfr. art.º148 nº2 do Código da Estrada, doravante, CE.

    f. Em consequência de tais condenações, ficou o Recorrente inibido de conduzir pelo período total de 9 (nove) meses.

    g. Tendo, por decisão do Senhor Presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, decidido pela aplicação da cassação do título de condução.

    h. O aqui Recorrente ver-se-á privado de aquisição de novo título pelo período de2 (Dois) anos.

    i. O Recorrente já cumpriu penas acessórias de inibição de conduzir veículos a motor por um período total de 9 (Nove) meses.

    j. Ao ficar privado, pelo período de 2 (Dois) anos de aquisição de novo título de condução, em virtude da prática dos mencionados crimes, o Recorrente vê-se duplamente condenado! k. Posição não atendida pelo Tribunal de primeira instância.

    l. Entende o Recorrente que a sentença aqui em causa, está a aplicar-lhe uma dupla penalização.

    m. A cassação do título de condução seguirá os trâmites do art.º148 do Código da Estrada, mas não deixa de ser classificada como uma medida de segurança não privativa da liberdade- cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, processo 1525/19.OT9STB.E1 de 03-12-2019.

    n. Podendo a mesma ser fixada entre 1 (um) e 5 (cinco) anos – cfr. art.º101 nº5 e art.100 nº2 do CP o. A aplicação da medida de segurança de cassação de título de condução não poderá ser aplicada cumulativamente com a sanção acessória de inibição de conduzir como já foi o aqui Recorrente condenado! – cfr. nº7 do art.º69 do CP p. A norma prevista no art.º69 do CP vê a sua aplicação condicionada pela não aplicabilidade de outra norma – art.º101 do CP – só se aplicando a norma subsidiária quando a outra não se aplique, ou seja, a norma prevalecente de certo modo o funcionamento daquela que lhe é subsidiária, aplicando-se a primeira se a segunda não se aplicar.

    q. Tendo sido já aplicada a norma do artigo 69º do Código Penal, não pode agora ao Recorrente ser aplicada a cassação do título de condução e interdição da concessão do título de condução, que na prática tem o mesmo conteúdo da pena prevista no artigo 101º do CP. – cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 04/05/2016 r. O Recorrente já cumpriu 9 (Nove) meses de inibição de conduzir e agora, na prática, pretende-se aplicar mais 24 meses da mesma pena (já que não poderá obter novo título por esse período), retirando-lhe o título de condução.

    s. A decisão de cassação do título de condução viola a norma prevista no nº7 do referido art.º 69 do Código Penal.

    t. Não entende o Tribunal que se mostram verificados os pressupostos para que seja decretada uma redução do período para obter novo título de condução, ou então, um desconto do período já cumprido anteriormente pelo Recorrente (9 (nove) meses).

    u. Possibilidade prevista na Lei, nomeadamente nos artigos 101 nº5 e art.º100 nº2 do CP.

    v. O Tribunal a quo que ao Recorrente não lhe é aplicada uma nova penalização sobre os mesmos factos.

    w. Cassação que é feita em virtude das condenações sofridas pelo Recorrente! x. Cassação do título de condução que mais não é que uma clara violação do princípio ne bis inidem! y. Refere o Tribunal a quo que: “tal não se verifica porque o que está na origem da sanção administrativa de cassação é a perda de pontos por factos relativos ao exercício da condução”.

    z. Factos esses, pelo exercício da condução, pelos quais o Recorrente já foi condenado! aa. A cassação do título de condução não é mais que consequência direta das sentenças dos processos já identificados e já transitados em julgado.

    bb. Afirmando o Tribunal a quo que “o que está na origem da sanção administrativa de cassação é a perda de pontos por factos relativos ao exercício da condução”, confirma que a génese de tal cassação sãos os processos pelos quais o Recorrente já cumpriu o período de inibição de conduzir.

    cc. A aplicação de tal medida de segurança mostra-se altamente desproporcional.

    dd. Menciona o Tribunal a quo que “encontra justificação num comportamento que representa uma perigosidade acrescida do agente no exercício da condução (...) ”.

    ee. No âmbito dos 2 (dois) processos crimes, a sua conduta deveu-se única e exclusivamente a problemas de saúde familiares.

    ff. Sendo que não desculpa, no entanto, desde então não mais foi o Recorrente condenado e/ou multado por qualquer crime e/ou contraordenação rodoviária.

    gg. O que reflete uma mudança substancial no comportamento do Recorrente.

    ii. Devendo, por tudo o exposto, não ser o Recorrendo impossibilitado, pelo período de 2 (anos) de obter novo título de condução, ou, caso assim não se entenda, ver o Recorrente descontado aos 24 (vinte e quatro) o período de 9 (nove) meses já cumprido em virtude das sentenças no âmbito dos referidos processos.» 4.

    A Exma. Magistrada do Ministério Público junto da primeira instância respondeu à motivação do recorrente, pugnando pela manutenção da decisão recorrida, porquanto, na parte relativa à invocada violação do disposto no artigo 69º nº7 do Código Penal e do princípio ne bis in idem, conforme acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 03-12-2019 (invocado pelo próprio recorrente) cujo sumário transcreve, são institutos jurídicos completamente distintos, a cassação da carta de condução ao abrigo do disposto no artigo 101º do Código Penal, enquanto medida de segurança e a cassação do título de condução prevista no artigo 148º do Código da Estrada, em que está em causa uma sanção administrativa à qual não são aplicáveis as regras do Código Penal. Reforçando esta posição, cita e transcreve parte do acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 23-03-2021, para concluir que não se verifica qualquer violação do princípio ne bis in idem consagrado no artigo 29º nº5 da Constituição da República Portuguesa (CRP).

    Finalmente, e no que se refere ao pedido de desconto do tempo de pena acessória de proibição de conduzir sofrido pelo recorrente, no período de dois anos de cassação do título de condução, considera não ter o mesmo qualquer fundamento legal, devendo, também, improceder.

  3. Nesta instância, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de o recurso não merecer provimento, pelas razões com base nas quais o Ministério...

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