Acórdão nº 902/18.8JABRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Julho de 2021

Magistrado ResponsávelPEDRO CUNHA LOPES
Data da Resolução13 de Julho de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

1 – Relatório Por Acórdão de 15 de Julho de 2 020, foi o arguido F. S.

condenado, nos seguintes termos: - um crime de violação agravada, p. e p. pelos arts.º 164º/1, a), 177º/1, a) e n.º 6), C.P.

– pena de 5 (cinco) anos e 2 (dois) meses de prisão; - um crime de violação agravada, p. e p. pelos arts.º 164º/1, a), 177º/1, a), e n.º 5), C.P.

– pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão; - um crime de violação agravada, p. e p. pelos arts.º 164º/1, a), 177º/1, a) e n.ºm 5), C.P.

– pena de 4 (quatro) anos e 9 (nove) meses de prisão; - em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 7 (sete) anos e 4 (quatro) meses de prisão; - foi ainda o arguido e demandado condenado a pagar a D. A.

, sua filha e ofendida, a quantia de 20 000€ (vinte mil euros), a título de danos não patrimoniais, com juros de mora, desde a data da decisão e até integral pagamento.

Discordando da decisão proferida, da mesma interpôs recurso o arguido F. S., apresentando no mesmo, as seguintes conclusões: “1. O douto acórdão impugnado condenou o Recorrente pela prática de: um crime de violação agravado, p. e p., à data da prática dos factos, pelos arts 164°, n° 1, al. a), e 177°, n° 1, ai. a), e n° 6, do GP, na pena (parcelar) de 5 (cinco) anos e dois (dois) meses de prisão; um crime de violação agravado, p. e p., à data da prática dos factos, pelos arts, 164°, n°1, al. a), e 177 n° 1, ai. a), e n° 5, do GP, na pena (parcelar) de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão; e um crime de violação agravado, p. e à data da prática dos factos, pelos arts. 164°, no 1.aLa),e177°,n°1,al. a),e n°5, do Q, na pena (parcelar) de 4 (quatro) anos e 9 (nove) meses de prisão.

  1. Em cúmulo jurídico de penas de prisão, condenou o Recorrente na pena única de 7 (sete) anos e 4 (quatro) meses de prisão.

  2. Condenou-o, ainda, a pagar a quantia de 20.000,00€ (vinte mil euros), por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a decisão até integral pagamento, à Assistente D. A..

  3. Entre outros, o Tribunal recorrido considerou provados os factos 4, 9, 10, 11, 14, 19,22,23e24.

  4. Tais factos não estão assentes na prova produzida em audiência de julgamento e, por isso, incorreu o Tribunal num erro de apreciação da prova.

  5. Em momento algum é referido pela Assistente ou resulta de qualquer outra prova produzida em audiência de julgamento a razão da sua ausência de S. S. descrita no facto provado 4, sendo que a fundamentação do douto acórdão é completamente omissa quanto aos elementos de prova em que se baseia este facto.

  6. Sem prejuízo disso, o Tribunal deu como provado que, nesse dia, não concretamente apurado, S. S. teria saído de casa para trabalhar.

  7. Deve, por isso, ser o facto provado 4 alterado e do mesmo deixar de constar o motivo de ausência de S. S., porque assim o impõe as declarações da Assistente acima transcritas a partir da respetiva gravação.

  8. Também não resulta das declarações da Assistente ou de qualquer outra prova produzida que nas situações de dezembro de 2008 e a segunda situação do ano de 2009 o Recorrente, tenha ejaculado no decurso da relação sexual.

  9. É, aliás, referido pela Assistente não saber se houve ejaculação ou não.

  10. Independentemente disso, o Tribunal dá como provado que ocorreu ejaculação, mesmo contra as declarações da Assistente.

  11. Por esta razão, devem os factos provados 11 e 23 ser alterados e dos mesmos deixar de constar que o Arguido ejaculou, porque assim o impõem as declarações da Assistente, acima transcritas.

  12. Nos factos provados 14 e 24, o Tribunal de primeira instância dá como provado que o Recorrente obrigou a Assistente a tomar a pilula do dia seguinte.

  13. Mais uma vez, tal conclusão está despida de prova, na medida em que a Assistente — cujas declarações, mais uma vez, são o único elemento de prova existente a tal respeito — disse desconhecer que comprimido lhe terá sido entregue pelo Recorrente.

  14. Razão pela qual, devem os factos provados 14 e 24 ser alterados e dos mesmos deixar de constar que o Recorrente obrigou a Assistente a tomar a pilula do dia seguinte, porque assim o impõem as declarações da Assistente, acima transcritas a partir das respetivas gravações.

  15. O facto provado 19 deve, também, ser alterado, uma vez que, nunca foi referido pela Assistente a houve “introdução do pénis na vagina daquela”.

  16. Não tendo a Assistente referido tal acontecimento nem tendo sido questionada quando a ele, não pode este constar dos factos provados, porque assim o impõem as declarações da Assistente.

  17. O Tribunal incorreu em erro ao considerar provados os factos supra transcritos que estão assentes em meras considerações que não permite nem consente as ilações que, a partir dela, retirou.

  18. As conclusões do Tribunal estão fundamentadas em meras associações injustificadas.

  19. Incorreu, em suma, o Tribunal num erro notório de apreciação na prova, violando os limites impostos ao artigo 127° do Código de Processo Penal, o que determina a anulação do decidido em sede de matéria de facto provada, para, sem necessidade de reenvio do processo e por mero efeito do princípio in dubío pro reo considerar não provados os excertos supra transcritos dos pontos 4, 11, 14, 19, 23 e 24 do douto acórdão.

  20. O Tribunal incorreu no vício de nulidade ao considerar provados os factos 9, 10, 11, 19, 22 e 23 que deram origem à decisão de condenação, sem que os mesmos estejam fundamentados.

  21. Tal falta completa de fundamentação implica a nulidade prevista nos artigos 379 n° 1 alínea a) e 374, n°2 do Código de Processo Penal.

  22. Eliminando dos factos provados, como se propugna, os segmentos que ficaram assinalados quantos aos factos descritos nos números 9, 10, 11,19, 22 e 23, o que deles resta não permite considerar preenchido os requisitos típicos do crime de violação p. e p. pelo artigo 164° do Código Penal.

  23. Tais factos integrariam, no limite, o crime de coação sexual, p. e p. pelo artigo 163° do Código Penal.

  24. A violação é um crime de execução vinculada: tem que ser cometido por meio de violência, ameaça grave ou ato que coloque a vítima em estado de inconsciência ou impossibilidade de resistir.

  25. A parte restante dos factos atinentes, não descreve a violência (n°s 9, 10, 11, 22 e 23) nem a cópula (n° 19).

  26. Assim sendo, o Recorrente não poderia ter sido, como foi, condenado pela autoria material do crime previsto no artigo 164° do Código Penal..

  27. O Recorrente impugna, pelas razões que expressou, a pena parcelar de 4 anos e 6 meses de prisão adstrita ao crime de violação agravada, que sustenta não corresponder ao melhor enquadramento do caso (segunda situação relatada no douto acórdão).

  28. E defende que, pelo diverso crime de coação sexual, não deve sofrer pena superior a dois anos.

  29. A merecer provimento, como se espera, esta modificação do substrato em que assenta o cálculo da moldura penal, ela balizar-se-á, nos termos do artigo 77°n°2 do Código Penal, com as respetívas agravantes, entre o mínimo de 1 (um) ano e 6 (meses) e o máximo 12 (doze) anos.

  30. Ponderando a conduta do arguido à luz dos critérios legais de fixação da pena concreta, nos exatos termos em que a pondera e aplica o douto acórdão em mérito (que numa moldura penal de 4 anos a 13 anos e 4 meses de prisão aplica 4 anos e 6 meses de pena), não deverá ser-lhe imposta uma pena não superior a 2 (dois) anos pelo crime de coação sexual (em que a moldura penal é de 1 ano e 3 meses a 10 anos e 6 meses de prisão).

  31. Na ponderação da medida das penas aplicadas, o Tribunal de primeira instância considerou que o grau de ilicitude do Recorrente é elevado e para o justificar, entre outros, utiliza o facto de o arguido, ter ejaculado e ter dado à Assistente a pílula do dia seguinte.

  32. Tais factos não podem ser valorados na ponderação da medida da pena.

  33. O Tribunal não considerou e deveria ter considerado na medida das penas aplicadas que tais condutas ocorreram há mais de dez anos e que desde 2018 que o Recorrente não tem qualquer contacto com a Assistente, nunca a tendo procurado.

  34. Além disso, o Recorrente não tem antecedentes criminais por crimes da mesma natureza.

  35. Conforme consta do relatório social junto aos autos, o Arguido sempre foi uma pessoa trabalhadora e inserida socialmente.

  36. O cumprimento de uma pena de prisão, mais de dez após os factos, não contribuirá para uma interiorização do desvalor da conduta, mas sim, para um completo desligar da vida em sociedade.

  37. O Recorrente tem 49 anos, apresentar uma trajetória de vida estável e conta com o apoio constante da sua família 39. Sempre se dirá que o cúmulo jurídico aplicado ao Recorrente é elevado.

  38. Seguindo os elementos enunciados, a pena única adequada ao concurso dos crimes punidos, não deve exceder os cinco anos, cuja execução deve ser suspensa, nos termos aplicáveis do artigo 50º n° 1 do Código Penal, por se verificarem todas as finalidades da punição.

  39. O Tribunal a quo condenou, ainda, o Recorrente a pagar à Assistente D. A. a quantia de 20.000,00€ (vinte mil euros) a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a decisão até integral pagamento.

  40. O valor de indemnização atribuído à Assistente é manifestamente elevado.

  41. Tal valor deve obedecer a critérios de equidade e proporcionalidade.

  42. É certo que a compensação por danos não patrimoniais deve constituir uma efetiva possibilidade compensatória que tem que ser significativa.

  43. No entanto, tem também que ser adequada às condições económico-financeiras do Arguido e realista.

  44. Face às condições económico-financeiras do Recorrente, que constam do douto acórdão, é impossível que este consiga pagar o valor da indemnização a que foi condenado.

    O M.P.

    apresentou contra-alegações. Nas mesmas, refere em síntese, que os factos foram todos corretamente fixados, a fundamentação da matéria de facto é lógica e racional, os crimes foram corretamente imputados e que as penas parcelares e única foram doseadas de forma justa. Sustenta pois que deve ser negado provimento ao recurso do arguido...

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