Acórdão nº 184/18.1T9VLN.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelPAULO SERAFIM
Data da Resolução13 de Setembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes desta Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães: I – RELATÓRIO: ▪ No âmbito do Processo Comum (Tribunal Singular) nº 184/18.1T9VLN, do Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo - Juízo de Competência Genérica de Valença, por sentença proferida no dia 25.01.2021 e depositada no mesmo dia (fls. 157 a 166/ref. 46387797 e fls. 168/ref.46388915), foi decidido: “Condenar o arguido P. C.

pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de insolvência dolosa, p. e p. pelo artigo 227.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, na pena de 300 (trezentos) dias de multa, à taxa diária de 5,00 € (cinco euros), o que perfaz o montante global de 1.500,00 € (mil e quinhentos euros).” ▬ ▪ Inconformado com tal decisão, dela veio o arguido P. C. interpor o presente recurso, que, na sua motivação, culmina com as seguintes conclusões e petitório (fls. 170 a 172/ref. 3068352): A) O arguido atuou com absoluta falta de consciência de ilicitude, quando vendeu os veículos mencionados nos autos, sendo que o primeiro o foi antes da apresentação à insolvência e o segundo o foi para comprar outro, que incorporou no seu património e foi vendido em favor da massa insolvente; B) O Tribunal recorrido não considerou, como devia tê-lo feito, as datas e considerandos das vendas, nos termos apostos em conclusão A); C) O arguido atuou com manifesta falta de consciência de ilicitude, inexistindo, em toda a linha, o elemento subjetivo do crime pois não houve intenção de prejudicar a massa insolvente, como a Lei estatui como pressuposto de punição; D) Sem prescindir ao que atrás se conclui, o arguido foi punido com um alcance e uma força e determinações exacerbados, quase emitindo o Tribunal recorrido, com este caso em concreto, uma sentença profilática e exemplar.

E) O Tribunal recorrido violou, com a prolação do normativo do qual se recorre, as disposições conjugadas do nº 1, al. a) do Código Penal e 368º, nº 2, al. d) do Código de Processo Penal, porquanto deveria ser declarado o arguido como tendo atuado com absoluta falta de consciência de ilicitude; F) O aresto recorrido deverá ser substituído por outros no qual seja o arguido absolvido dos crimes cometidos ou, no limite, e entendendo-se ser de o condenar, que a pena a aplicar ao arguido leve em conta os montantes irrisórios pelo mesmo percebidos e ainda, para se atuar no limite da justiça, ser de valorar o comportamento do mesmo arguido, ao adquirir uma viatura que, porque desconhecia a forma de agir em insolvência, teve que pagar duas vezes, sendo uma dela à massa insolvente.

Assim farão Vossas Excelência, a devida e usual Justiça.» ▪ Na primeira instância, a Digna Magistrada do MP, notificada do despacho de admissão do recurso apresentado pelo arguido, nos termos e para os efeitos do artigo 413.º, n.º 1 do CPP, apresentou douta resposta em que sustentou a manutenção da sentença recorrida (fls. 174 e 175/ref. 3113306).

Formulou as seguintes conclusões: «1.ª O arguido limita-se a dizer que actuou com falta de consciência de ilicitude, no entanto, não impugna a matéria de facto, a qual se deve ter por totalmente assente.

  1. Atentos os factos dados como provados, dúvidas não restam que o arguido praticou o crime de insolvência dolosa pelo qual foi acusado.

  2. A medida concreta da pena determina-se em função da culpa do arguido e das exigências da prevenção geral e especial das penas, atendendo-se a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele (artigo 71.º, n.os 1 e 2 do Código Penal).

  3. A pena há-de servir para realizar as finalidades que a lei lhe assinala: a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, ou seja, as chamadas finalidades de prevenção geral e especial (artigo 40.º, n.º 1 do Código Penal).

  4. A pena aplicada de 300 (trezentos) dias de multa revela-se adequada e proporcional, por ter sido criteriosamente definida em função das disposições referidas, tendo em consideração, nomeadamente, a culpa do arguido que se mostra elevada, atento o dolo direto, sem esquecer que o arguido negou em parte os factos e não interiorizou o desvalor da sua conduta.

  5. A douta decisão recorrida não violou qualquer preceito legal devendo, consequentemente, a mesma ser mantida na sua íntegra.» ▪ Neste Tribunal da Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer em que pugna igualmente pela improcedência do recurso (fls. 179/ref. 7468319).

Cumprido o disposto no Artº 417º, nº 2, do C. P. Penal, não foi deduzida resposta ao sobredito parecer.

▪ Efetuado exame preliminar e colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos à conferência, cumprindo, pois, conhecer e decidir.

*II – ÂMBITO OBJETIVO DO RECURSO (QUESTÕES A DECIDIR): É hoje pacífico o entendimento doutrinário e jurisprudencial de que o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação, sendo apenas as questões aí inventariadas (elencadas/sumariadas) as que o tribunal de recurso tem de apreciar, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, designadamente dos vícios indicados no Artº 410º, nº 2, do Código de Processo Penal (ulteriormente designado, abreviadamente, C.P.P.) (1).

Assim sendo, no caso vertente, as questões que importa decidir são as seguintes: A) Da invocada falta de consciência da ilicitude/elemento subjetivo do crime de insolvência dolosa; B) Da peticionada redução da pena aplicada.

*III – APRECIAÇÃO: A – Sobre a alegada falta de consciência da ilicitude e do elemento subjetivo do crime de insolvência dolosa: Em primeira linha, o arguido escora o recurso por si deduzido na alegação de que atuou com falta de consciência de ilicitude quando vendeu os veículos mencionados nos autos, sendo que o primeiro o foi antes da apresentação à insolvência e o segundo o foi para comprar outro, que incorporou no seu património e foi vendido em favor da massa insolvente, inexistindo o elemento subjetivo do crime pois não houve intenção de prejudicar a massa insolvente, que a Lei estatui como pressuposto de punição [conclusões A), B) e C)].

Estatui o art. 227º, nº1, al. a), do Código Penal que: “O devedor que com intenção de prejudicar os credores (...) Destruir, danificar, inutilizar ou fizer desaparecer parte do seu património (…) é punido, se ocorrer a situação de insolvência e esta vier a ser reconhecida judicialmente, com pena de prisão até 5 anos ou com pena de multa até 600 dias.” [redação...

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