Acórdão nº 3470/14.6TBLRA-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelPAULO REIS
Data da Resolução30 de Setembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. Relatório N. M.

instaurou providência tutelar cível contra P. C.

, por apenso ao processo de Regulação das Responsabilidades Parentais, n.º 3470/14.6TBLRA do Juízo de Competência Genérica de Vila Pouca de Aguiar, visando a alteração do regime da regulação das responsabilidades parentais anteriormente acordado e estabelecido relativamente à filha menor de ambos, C. C., nascida a ..

-09-2011.

Pede a alteração do regime relativo à regulação das responsabilidades parentais no sentido de a criança ficar entregue ao pai, exercendo este total e unicamente as responsabilidades parentais da criança, ficando a mãe com visitas, nos termos que o pai tinha à data do pedido de alteração, assim como o regime de férias e dias festivos.

Alega, no essencial, que a filha está em situação de perigo junto da mãe, e que esta não lhe consegue atribuir estabilidade, organização, controlo, o que motivou a intervenção da Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ), a qual deliberou remeter o processo aos Serviços do Ministério Publico de Vila Pouca de Aguiar, por incumprimento reiterado do acordo de promoção e proteção oportunamente homologado em sede de CPCJ, necessitando de intervenção e apoio familiar estruturantes, que o requerente alega poder facultar à criança.

A requerida foi citada para alegar, nos termos do artigo 42.º, n.º 3, do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, aprovado pela Lei n.º 141/2015, de 8 de Setembro (RGPTC), e veio apresentar alegações, defendendo a improcedência da pretensão deduzida.

Foi realizada conferência de pais, após o que teve lugar audição técnica especializada junto da competente equipa da Segurança Social, pelo período de dois meses.

Designada data para continuação da conferência de pais, não foi possível obter o acordo dos progenitores quanto à alteração suscitada.

Foram solicitados relatórios/informações sociais no sentido de determinar as condições de cada um dos progenitores e respetivos agregados familiares, entretanto juntos aos autos.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, na qual compareceram e foram ouvidos requerente e requerida, tendo ainda sido inquiridas testemunhas que foram arroladas. Na mesma sessão foi ouvida em declarações a criança, C. C., a qual se foi acompanhada nessa diligência pelo técnico nomeado para o efeito, o psicólogo, Dr. V. M.

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Encerrada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, a qual se transcreve na parte dispositiva: «(…) Pelo supra exposto, julga-se a vertente ação de alteração do exercício das responsabilidades parentais totalmente procedente e, consequentemente, decide-se:

  1. Atribuir aos progenitores N. M. e P. C. o exercício das responsabilidades parentais referentes às questões de particular importância para a vida da criança C. C.; B) Atribuir ao progenitor N. M. a guarda/residência da criança C. C., bem como o exercício das responsabilidades parentais relativas aos atos da vida corrente da mesma; C) Fixa-se o seguinte regime de convívio da progenitora P. C. com referência à sua filha C. C.: 1) A mãe poderá contactar com a criança via telefone, telemóvel ou skype, ou qualquer outro meio de comunicação à distância com imagem; 2) A mãe poderá ter a filha consigo todos os fins-de-semana, a partir das 21 horas de sexta-feira e até às 18 horas de domingo; 3) O local de entrega da C. C. à mãe ocorrerá em casa da mesma.

    4) A C. C. passará com a mãe metade das respetivas férias escolares: Natal, Páscoa e Verão.

    D) A progenitora P. C. contribuirá com a quantia mensal de 100,00€ (cem euros) a título de prestação de alimentos referente à sua filha C. C., que será atualizada, anualmente, em função dos índices dos preços ao consumidor, a publicar pelo INE, sendo que a quantia deverá ser depositada em instituição bancária a indicar pelo progenitor, ou enviada por cheque ou vale postal, até ao dia 10 de cada mês.

    Custas imputadas à Requerida, sem prejuízo do apoio judiciário, fixando-se o valor da acção em 30.000,01€ (art.º 11.º do Regulamento das Custas Processuais e art.º 312.º/1 do Código de Processo Civil).

    *Registe e notifique».

    A requerida/progenitora veio, então, interpor recurso da sentença proferida, pugnando no sentido de ser revogada e substituída por outra que julgue o pedido de alteração improcedente.

    Terminou as respetivas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem): «I) A decisão em crise proferida pelo Tribunal de 1ª Instância padece do vício de nulidade por contradição da fundamentação com a decisão (art. 615º, nº1, al. c), do Cód. Proc. Civil), II) Igualmente padece de vício de erro de julgamento, porquanto a mesma não ajuizou correctamente o caso vertente – não fazendo a devida avaliação da matéria de facto – uma vez que não avaliou correctamente todos os meios probatórios produzidos nos autos, bem como, ainda, não fez a adequada interpretação e aplicação dos preceitos legais aplicáveis ao caso sub judice; III) Face à natureza dos presentes autos - Jurisdição Voluntária - o âmbito do presente recurso, não se apresenta limitado à fundamentação e às conclusões da Recorrente, pelo que, ao Tribunal ad quem cabe a obrigação de suprir as deficiências existentes na decisão em crise que violam o superior interesse da menor C. C.; IV) Da análise da fundamentação da sentença recorrida constata-se que a mesma padece do vício de nulidade por se encontrar em manifesta contradição com a decisão, atento o preceituado no art. 615º, nº 1, al. c), do CPC, uma vez que os fundamentos invocados pelo Meritíssimo Juiz do tribunal a quo deveria, necessariamente, ter conduzido não ao resultado expresso na decisão (fixação da residência da C. C. com o progenitor), mas sim a um resultado oposto (manutenção da residência da C. C. com a progenitora), pois as premissas de facto e de direito que o Tribunal de 1ª Instância teve por apuradas, obrigatoriamente levariam a essa mesma decisão; V) O Tribunal a quo, ao longo dos cerca de 2 (dois) anos que os autos se arrastaram até prolação da decisão em crise, teve o completo e exaustivo conhecimento da conduta do Requerente que desde o primeiro momento secundarizou a filha C. C., colocando os seus próprios interesses e caprichos pessoais em primeiro plano, tudo fazendo para a desenraizar a filha C. C. do seu "mundo", das rotinas e das relações de amizade que mantinha, tão só, com o único e exclusivo propósito de afastar a menor da progenitora mãe e restantes familiares maternos, os quais, ao longo de todo esse tempo, com elevados prejuízos pessoais e financeiros, tudo fizeram para compensar a menor C. C. do desgaste a que tem vindo a ser sujeita devido ao refinado egoísmo do seu progenitor; VI) Dado que a decisão se apresenta em contradição com a respectiva fundamentação, a sentença em crise apresenta-se nula, nos termos do art. 615º, nº 1, al. c), do CPC, devendo, desde já, tal nulidade ser conhecida; VII) O Tribunal a quo, não efectuou, convenientemente, o exame crítico das provas, assim violando o estatuído no art. 607º, nº 3, do Cód. Proc. Civil; VIII) Na fundamentação relativa aos factos provados, não foram incluídas as expressas declarações prestadas pela Menor C. C. em sede de audiência de julgamento, (registo áudio da audiência de julgamento de 15-04-2021, com início 10.03:18` e fim 10.38:44`) na qual a menor C. C. expressamente declara ao Meritíssimo Juiz que: “(…) gosta muito da mãe, gosta muito de viver com a mãe e que quer muito manter-se em Vila Pouca de Aguiar, pois aí estão todos os seus amigos (…)”,fazendo referência também aos seus gatos, aos quais está muito ligada.

    IX) Para além disso, tem uma relação de afetividade com a irmã A. C., que importa preservar.

    X) Como consta, ainda, do registo integral das declarações prestadas pela menor C. C., a instância do Meritíssimo Juiz, a mesma Menor, de modo calmo, sem qualquer tipo de constrangimentos ou reserva, em momento algum exprimiu de forma espontânea a sua expressa e convicta vontade de querer viver com o progenitor pai na cidade de Leiria; XI) A menor C. C. foi negativamente pressionada pelo Requerente/progenitor, que deliberadamente condicionou a vontade da mesma aquando da sua avaliação pela mesma Perita.

    XII) Tendo-se presente quer as declarações da menor C. C. no dia 15-04-2021 perante o Meritíssimo Juiz, quer o que consta do relatório pericial, ressalta claro que a criança revelou encontrar-se sujeita uma pressão psicológica efectuada em resultado do seu progenitor não aceitar a sua pretensão de se manter em Vila Pouca de Aguiar onde, de resto, estabeleceu laços de convívio na sua comunidade escolar e familiar; XIII) Da apreciação de todos os sobreditos depoimentos resulta que o Tribunal a quo deveria ter considerado a desajustada vivência que a menor C. C. foi sujeita, em razão das exclusivas e interesseiras decisões do Requerente, o qual em momento algum ponderou no superior interesse da sua filha, expondo a C. C. a um elevado desgaste, o qual condiciona o seu normal crescimento físico e intelectual, pois vive permanente triste, retraída e angustiada, com o intuito de não contrariar os adultos e, muito em particularmente, o seu progenitor que a pressiona de forma sistemática e reiterada, o que é corroborado pelo Relatório de Psiquiatria de 06.05.2020, segundo o qual “(…) contribuirá para um aumento da instabilidade psicomotora nos dias seguintes ao regresso da casa do pai(…)”.

    XIV) Desses mesmos sobreditos depoimentos tornou-se possível avaliar do quanto a especial relação afectiva que a menor C. C. nutre pela progenitora mãe, bem como pelos seus avós maternos.

    XV) Os sobreditos depoimentos provam todos os sacrifícios e privações (pessoais e financeiros) que a Progenitora Mãe e seus familiares mais próximos têm vindo a fazer ao longo destes 6 (seis) anos no sentido de amenizar e compensar a menor C. C. do desgaste e das carências afectivas a que veio a ser sujeita em resultado do egoísmo do Requerente/progenitor que em momento algum colocou...

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