Acórdão nº 1188/03.4TBBCL-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelROSÁLIA CUNHA
Data da Resolução05 de Novembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em conferência na 1ª seção cível do Tribunal da Relação de Guimarães: RELATÓRIO S. L.

veio suscitar o incumprimento da regulação do exercício das responsabilidades parentais relativas a D. L., nascida a -.2.2000, contra V. C.

, no que toca ao pagamento da pensão de alimentos e despesas médicas e escolares.

Alega, em síntese, que requerente e requerido são os pais de D. L. cujas responsabilidades parentais foram reguladas por acordo, devidamente homologado por decisão judicial.

Nos termos dessa regulação, o progenitor encontra-se obrigado a pagar uma pensão de alimentos no valor mensal atualizado de € 153 e a comparticipar em metade do valor das despesas extraordinárias escolares e de saúde.

O requerido incumpriu o acordado, não tendo pago parte da pensão de alimentos, o que sucede desde outubro de 2018, não tendo também efetuado o pagamento da sua comparticipação nas despesas escolares e de saúde.

D. L. vive com a progenitora e não aufere qualquer rendimento, tendo efetuado exames de melhoria do 12º ano a fim de se candidatar ao ensino superior.

*O requerido foi citado e alegou que pagou a pensão de alimentos referente aos meses de abril, maio e junho de 2019 e que só tem pago € 100 mensalmente porque a filha deixou de estudar. Refere ainda que pagou algumas despesas de saúde.

*A requerente pronunciou-se quanto à resposta do requerido informando, entre outras situações, que D. L. se encontra a frequentar o curso de Engenharia Biomédica, na Universidade do ….

*Realizou-se a conferência de pais, na qual não foi possível alcançar acordo entre os progenitores e houve recusa de recurso à mediação, tendo sido determinada a suspensão da conferência para audição técnica especializada.

*Retomada a conferência de pais que tinha sido suspensa não foi novamente possível alcançar acordo entre os progenitores, tendo os mesmos sido notificados para alegarem o que tivessem por conveniente.

*O requerido apresentou alegações nas quais invocou a ilegitimidade da requerente para suscitar o incumprimento pois, à data em que o requerimento foi apresentado, mais concretamente em 1.7.2019, D. L. já era maior desde -.2.2018, altura em que completou 18 anos.

As prestações que são peticionados em sede de incumprimento referem-se a períodos posteriores a 28.2.2018, ou seja, quando D. L. já tinha atingido a maioridade, pelo que só ela teria legitimidade para suscitar o incumprimento.

Pronunciou-se ainda relativamente às prestações que são pedidas e terminou pedindo que o incumprimento seja julgado improcedente.

*A requerente apresentou alegações pugnando pela sua legitimidade para suscitar o incumprimento e concluiu no sentido de o requerido ter incumprido o pagamento da pensão de alimentos e despesas escolares e de saúde, estando em dívida os valores que peticionou.

*Foi proferido despacho que julgou procedente a exceção de ilegitimidade invocada e, em consequência, absolveu o requerido da instância, o qual tem o seguinte teor: “A incapacidade dos menores é suprida pelo poder paternal (artigos 124.º e 1877.º, ambos do Código Civil), cujo exercício, conteúdo e titularidade vêm regulados nos artigos 1877º e seguintes do Código Civil.

A pessoa singular atinge a plena capacidade de exercício quando se supõe ter a maturidade social suficiente para dirigir a sua pessoa e os seus bens.

A lei nacional ficciona que tal maturidade é atingida aos 18 anos de idade (artigos 122º, 129º e 130º, todos do Código Civil).

Da análise dos autos verifica-se que a Jovem D. L. atingiu a maioridade em ..-02-2018.

Nessa data cessaram os poderes de representação de S. L. sua mãe e a intervenção do Ministério Público relativamente àquela.

A requerente sustentou a sua legitimidade ao avançar com o presente incidente, atendendo, nomeadamente, aos pressupostos do nº. 3 do artº. 989 do CPC, que resultou da Lei 122/2015 de 1 de Setembro e nos artigos 41º. e 48º. da Lei nº. 141/2015, de 08 de Setembro.

Porém, conforme refere o requerido à data da dedução do presente incidente a jovem D. L. tinha atingido a maioridade em -/02/2018.

Acresce que as prestações de alimentos e despesas reclamadas nos autos referem-se a lapsos temporais em que a jovem D. L. já tinha completado 18 anos, ou seja, vencidas depois da sua maioridade, passando a própria a ser credora das quantias peticionadas.

Pelo exposto, a requerente carece de legitimidade para, por si só, intervir em juízo em representação da sua filha maior.

A ilegitimidade é uma exceção dilatória que conduz à absolvição da instância – cfr. artºs. 577º., alínea e), 578º. e 278º., nº. 1 alínea d), todos do Código de Processo Civil (CPC).

Decisão: Pelo exposto, atentas as considerações tecidas e os preceitos legais citados julgo procedente a exceção invocada e, em consequência, absolvo o R. da instância.”*No referido despacho foi ainda fixado à causa o valor de € 30 000,01.

*A requerente não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões: “1. Vem o presente recurso interposto da Douta Sentença proferida a 23.06.2020 e que julgou procedente a excepção de ilegitimidade invocada pelo requerido, absolvendo-o da instância.

  1. Salvo o devido respeito, a Douta Sentença recorrida julgou mal, porquanto postergou e violou normas do direito processual e do direito substantivo, julgando de forma infundada a requerente parte ilegítima.

  2. Com a alteração introduzida no artigo 1905.º do Código Civil, mediante o aditamento do n.º 2 pela Lei n.º 122/2015, de 01 de setembro, os filhos passam a ter automaticamente direito à pensão de alimentos que lhes foi fixada durante a menoridade, e até que completem 25 anos, salvo se o respectivo processo de educação ou formação profissional estiver concluído antes daquela data.

  3. Havendo pensão fixada na menoridade, como é o caso dos autos, a sua manutenção na maioridade e até aos 25 anos de idade do beneficiário é automática, se a sua formação académica ou profissional não estiver completada.

  4. O artigo 989.º do Código de Processo Civil dispõe, nos seus n.ºs 1 e 2, que, nos casos dos artigos 1880.º e 1905.º do CC, é aplicável, com as necessárias aplicações, o regime previsto para os menores e que, tendo sido fixada pensão ou estando o respectivo processo a decorrer, a maioridade não impede que o processo se conclua e que os incidentes de incumprimento sejam intentados por apenso.

  5. Para possibilitar a concretização desta modificação ao regime substantivo, a referida Lei n.º 122/2015 procedeu à correspondente alteração no âmbito processual, atribuindo agora ao progenitor que suporta o encargo de pagar as despesas dos filhos maiores a legitimidade para exigir do obrigado a alimentos a respectiva contribuição, através da inovação então introduzida com o aditamento do n.º 3 ao artigo 989.º do Código de Processo Civil.

  6. “O artigo 989.º, n.º 3, do CPC, na redacção da Lei n.º 122/2015, de 1.09, reconhece essa legitimidade (ao progenitor com quem o filho maior coabita), quando se torne necessário providenciar judicialmente (seja para prosseguir, no confronto com o outro progenitor, a acção destinada à fixação da pensão iniciada durante a menoridade, seja para, depois desta, intentar acção com a mesma finalidade ou recorrer aos procedimentos necessários à efectivação do direito anteriormente acertado) sobre alimentos aos filhos maiores que ainda não concluíram a sua formação profissional”. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 12.03.2013, Proc. 458/18.1T8BCL.G1, pelo Relator Margarida Sousa, disponível in www.dgsi.pt.

  7. No mesmo sentido, veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 20.09.2018, Proc. 4345/15.7T8LRS-A.L1-6, pelo Relator Teresa Pardal, disponível in www.dgsi.pt. de cujo sumário decorre o seguinte: “A progenitora que provém ao sustento do filho maior, cujo direito a alimentos se mantém nos termos do artigo 1905.º, n.º 2 do CC, tem legitimidade para intentar contra o outro progenitor o incidente de incumprimento deduzido ao abrigo do artigo 41.º do RGPTC e do artigo 989.º, n.º 3 do CPC.“ 9. Acrescenta ainda este último Acórdão que “Sendo assim, não há dúvida de que o artigo 989º nº3 do CPC atribui legitimidade para um dos progenitores intentar contra o outro incidente de incumprimento ao abrigo do artigo 41º do RGPTC, sendo certo que, provendo ao sustento do filho maior, o progenitor tem interesse directo em demandar e, consequentemente, legitimidade, nos termos do artigo 30º do CPC, para demandar o outro progenitor a contribuir para o mesmo sustento.” Posto isto, 10. A jovem D. L., nascida a -.02.2000, conta actualmente 20 (vinte) anos de idade.

  8. Conforme resulta alegado nestes autos, a jovem D. L. vive à guarda e cuidados da mãe, ora recorrente, com quem coabita e reside.

  9. Que lhe dispensa com carinho e afecto, todos os cuidados de saúde, higiene, asseio, alimentação, vigilância e educação.

  10. E que suporta antecipadamente todas as despesas e encargos da jovem, sejam de saúde, educação ou quaisquer outras.

  11. A jovem D. L. não completou ainda a sua formação profissional, encontrando-se, no presente ano lectivo, matriculada e a frequentar o 1.º ano da Licenciatura em Engenharia Biomédica, na Universidade do …, em Braga, conforme de resto resulta também alegado nos autos.

  12. Dúvidas não soçobram que estão alegados nos autos os pressupostos da legitimidade da recorrente.

  13. A recorrente (progenitora convivente da filha maior) tem, por isso...

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