Acórdão nº 135/20.3YRGMR de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelPAULO REIS
Data da Resolução12 de Novembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. Relatório Nos autos de reclamação de créditos, por apenso ao processo de Insolvência com o n.º 707/19.9T8VNF, do Juízo de Comércio de Vila Nova de Famalicão - Juiz 1, respeitante a Instituto Empresarial X, pelo Administrador Judicial (AI) foi apresentada relação de créditos reconhecidos e não reconhecidos, nos termos do artigo 129.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE).

Da relação de créditos reconhecidos e não reconhecidos consta, além do mais, como não reconhecido o crédito de F. J.

, pelo montante reclamado de € 25.625,00 por entender ter havido despedimento com justa causa, indicando os seguintes motivos justificativos: «Não se reconhece o crédito reclamado por F. J. no valor de € 25.625,00, a título de indemnização por despedimento ilícito, uma vez que o trabalhador foi despedido pela insolvente com justa causa, em 30/11/2018. Para tanto, atente-se a nota de culpa e a decisão final de despedimento (aqui dadas por integralmente reproduzidas), enviadas pela devedora ao reclamante na qual consta que a licença de vencimento requerida por aquele foi renovada por um período de 6 meses, o qual findava em 10/08/2018. Após esse período o trabalhador deveria apresentar-se e regressar ao seu posto de trabalho, o que não se verificou, motivo pelo qual a devedora desencadeou o respectivo procedimento disciplinar e consequente despedimento com justa causa, obedecendo a todas as formalidades legalmente previstas, e que aqui se dão por integralmente reproduzidos.

O reclamante intentou acção de impugnação de despedimento, a qual foi extinta por inutilidade superveniente da lide devido à declaração de insolvência da devedora, por sentença proferida em 07/03/2019».

O reclamante F. J. apresentou impugnação à lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos, este na parte em que considerou não reconhecido o crédito que reclamou. Não aceita a exclusão do seu crédito, por entender que o despedimento do impugnante é ilícito, tanto por via da caducidade do procedimento disciplinar como por não corresponder à verdade o que é alegado na nota de culpa, sustentando não existir fundamento para o despedimento, requerendo que se considere reconhecida a exceção de caducidade do procedimento disciplinar ou a falta de fundamento de despedimento com justa causa e declarado ilícito o despedimento do impugnante, devendo ser reconhecido e verificado o crédito reclamado, correspondente à indemnização calculada nos termos do disposto no artigo 391.º do Código do Trabalho, no montante de €25.625,00€ e graduado no lugar que lhe competir.

Responderam à impugnação o devedor/insolvente, Instituto Empresarial X e o AI, ambos pugnando pela improcedência da impugnação e pela manutenção do não reconhecimento do crédito reclamado por F. J..

Realizada audiência preliminar, na qual foi tentada a conciliação, sem êxito, proferiu-se despacho-saneador, após o que se procedeu à identificação do objeto do litígio e à enunciação dos temas da prova.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento.

Foi, então, proferida decisão autónoma, em 26-03-2020, julgando improcedente a impugnação apresentada pelo credor pelo credor F. J. à lista de créditos não reconhecidos.

Inconformado, o credor F. J., apresentou-se a recorrer, pugnando no sentido da revogação da sentença, terminando as respetivas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem): «1. O presente recurso de APELAÇÃO tem por objecto a douta sentença proferida pelo MM julgador, a fls.., do Apenso B (de reclamação de créditos) que considerou não assistir razão ao aqui recorrente, julgando improcedente, in totum, a impugnação deduzida, não atendendo à sua pretensão de inclusão do seu crédito na lista de créditos reconhecidos.

2. É desta sentença que se recorre, quer quanto ao julgamento da matéria de facto, quer quanto à matéria de direito, nos termos que se expuseram supra; 3. Entende o recorrente que o Tribunal a quo decidiu mal, incorrendo em erro na apreciação da matéria de facto e deficiência e insuficiência quanto à matéria de facto dada como provada; 4. Por regra, os poderes cognitivos do juiz estão limitados pela matéria de facto alegada pelas partes, dentro do funcionamento dos ónus de alegação que sobre cada uma impendem.

5. A decisão da matéria de facto controvertida, normalmente apoiada no princípio da liberdade de julgamento, consagrado no art. 607.º, n.º 5, do Código de Processo Civil (CPC), deve refletir o resultado da conjugação dos vários elementos de prova que na audiência ou em momento anterior foram sujeitos às regras da contraditoriedade, da imediação e da oralidade, pelo que as respostas dadas aos quesitos devem traduzir, assim, aquilo que efetivamente se apurou, após uma análise objetiva, imparcial e desinteressada da prova produzida ao longo de todo o processo.

6. No caso vertente, por força do disposto na legislação laboral, o juiz não está limitado pela alegação das partes e a amplitude do poder-dever constante do art. 72.º importa evidente reforço do inquisitório de forma que o juiz só deve terminar o julgamento quando estiver esclarecido da verdade dos factos que se afigurem necessários à solução do litígio, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, ou quando se mostrarem esgotadas todas as diligências ao seu alcance na procura dessa verdade, 7. A reação ao não uso ou ao uso indevido, pelo juiz da 1.ª instância, do poder-dever constante do art. 72.º, n.º 4, poderá, apenas, ocorrer por via de recurso a interpor pela parte prejudicada, seja suscitando a omissão, no elenco dos factos provados, de factos alegados, discutidos e relevantes – a impor, à parte, o cumprimento dos ónus constantes do art. 640.º, n.º 1, do CPC –, seja suscitando a ausência de elementos probatórios que sustentem os factos tidos por provados.

8. Entende o recorrente que resulta evidenciada à saciedade a existência de elementos probatórios carreados para os autos impõem decisão diversa nos termos que se passam a expor, ex vi do disposto no art. 640.º, do CPC; 9. O exercício dos poderes-deveres contidos no art. 72.º, n.º 1, está circunscrito à 1.ª instância, sendo que à Relação apenas é consentida a reapreciação dos meios de prova que conduziram à prova ou não prova dos factos sobre os quais incida o recurso da matéria de facto ou ordenar a ampliação da matéria de facto quando repute serem essenciais factos para a decisão que não mereceram da 1.ª instância qualquer pronúncia, mas que estejam alegados. (sublinhado nosso); 10. No desenvolvimento da instância foram alegados factos pelo impugnante absolutamente relevantes para a decisão da causa que deveriam ter sido dado como provados, mas perante os quais MM julgador não se debruçou no julgamento da matéria de facto, não merecendo da parte deste uma resposta quer positiva, quer negativa que fosse.

11. Face ao depoimento da testemunha R. F., cujos pontos concretos de passagem gravados foram relatados supra, e à Ata da Reunião da Direção da Insolvente de 29/05/2019, teria que ser necessariamente dado como provado que “A empresa não contratou outro trabalhador para o exercício da gestão/execução dos vários projectos durante o período das faltas do mesmo, mas sim que a pessoa em causa foi contratada durante parte do período de ausência do impugnante, quando este gozava da licença sem vencimento, para outras funções.” 12. Com base no depoimento de parte do recorrente, cujos pontos concretos de passagem gravados foram relatados supra, aliada à ausência, ao silêncio de 04 meses de qualquer resposta por parte da insolvente que contrariasse a aceitação e a concordância verbal feita pelo Presidente da Direção ao pedido de renovação submetido pelo recorrente, pelas regras do senso comum, apelando às regras da lógica e da experiência comum, teria que ser necessariamente dado como provado que “Posteriormente, ainda antes de completar um ano, no dia 06/02/2018, o ora impugnante volta a solicitar renovação da licença sem vencimento até final do exercício do cargo, sendo que a ora insolvente, tendo confirmado verbalmente, através de um dos seus directores, decide enviar carta a comunicar a autorização, 4 meses depois, em 18/06/2018 e por apenas seis meses, contrariamente ao que havia antes dito verbalmente ao impugnante”, 13. De acordo com o depoimento de parte do recorrente, cujos pontos concretos de passagem gravados foram relatados supra, aliada à ausência de resposta da insolvente, ao silêncio, enquanto valor declarativo, de 04 meses de qualquer resposta por parte da insolvente que contrariasse ou reprovasse o pedido de renovação submetido pelo recorrente, conjugado com a prova documental junta com a impugnação de créditos sob o docs. n.ºs 5 a 7 (pedidos renovação dirigidos ao Coordenador Operacional, ao Presidente da Direção e a resposta da insolvente), pelas regras do senso comum, apelando às regras da lógica e da experiência comum, teria que ser necessariamente dado como provado que “O impugnante, porque estava a trabalhar na mesma entidade para cujo exercício de funções pediu a primeira licença, entendeu que o silêncio da insolvente era o de aceitação e aceitou nova nomeação”; 14. Atento o depoimento de parte do recorrente e, principalmente, ao depoimento das testemunhas R. P. e R. F., cujos pontos concretos de passagem gravados foram relatados supra, conjugado com o que consta do Relatório do Sr. AI, teria que ser necessariamente dado como provado que “A insolvente sabia que não havia trabalho suficiente para ocupar o impugnante, que estava em situação de insolvência técnica, pré-insolvência, era público o envolvimento da insolvente em processos-crime, que a empresa atravessava grandes dificuldades económicas, que havia trabalhadores que já se tinham ido embora como a trabalhadora S. M., da parte financeira” 15. Por meras razões de economia processual dão-se aqui como integrados e reproduzidos para os efeitos de dar como provado os factos...

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