Acórdão nº 4376/18.5/8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Julho de 2020
Magistrado Responsável | FERNANDO FERNANDES FREITAS |
Data da Resolução | 08 de Julho de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES
-
RELATÓRIO I.- M. N., viúva, e Outros, todos residentes em Esposende, intentaram a presente acção, com processo comum, contra a “X – Companhia de Seguros, S.A.”, com sede em Lisboa, pedindo que esta seja condenada a pagar-lhes a quantia de € 197.907,25, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento.
Fundamentam alegando ter o seu marido e pai, A. C., sido atropelado pelo veículo automóvel de matrícula ...YY, segurado na Ré, tendo do atropelamento resultado a morte daquele. Pretendem ser ressarcidas dos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes do acidente, liquidando a indemnização pelo montante peticionado.
A Ré contestou, excepcionando a prescrição do direito invocado pelos Autores e arguindo a ilegitimidade dos mesmos. Impugnou ainda os factos invocados, relativos ao acidente e à responsabilidade do condutor do referido veículo e, bem assim, aos montantes indemnizatórios peticionados.
O Instituto da Segurança Social, I.P. deduziu pedido de reembolso no valor de € 15.548,69 respeitante a subsídio por morte (€ 1.257,66) e a pensões de sobrevivência (€ 14.291,03) que pagou aos Autores, vindo, posteriormente, a requerer a ampliação do pedido para o valor global de € 16.407,82, ampliação que foi admitida.
No prosseguimento normal dos autos veio a proceder-se ao julgamento que culminou com a prolação de douta sentença que (julgando procedente a excepção da prescrição) julgou totalmente improcedentes os pedidos formulados pelos Autores, e de reembolso, formulado pelo “Instituto de Segurança Social, I.P.”, deles absolvendo a Ré.
Inconformados, trazem os Autores o presente recurso, pedindo a revogação da supratranscrita decisão, e a sua substituição por acórdão que decida em conformidade com as conclusões que apresentam.
Contra-alegou a Ré propugnando para que se mantenha o decidido.
O recurso foi recebido como de apelação, com efeito devolutivo.
Colhidos, que foram, os vistos legais, cumpre decidir.
**II.- Os Apelantes/Autores formulam as seguintes conclusões (omissis quanto ao que se considerou irrelevante para a enunciação e enquadramento das questões a apreciar).
2) O tribunal NÃO devia ter dado como provado o facto 5) da sentença.
3) Mais devia ter dado como PROVADOS os seguintes factos não provados, com a redacção, a saber: e) O veículo ...YY invadiu com a sua lateral esquerda a faixa de rodagem de sentido contrário, circulava a uma velocidade sempre superior a 60Km/h e não guardou a distância de segurança de forma a evitar qualquer obstáculo existente na via.
-
O condutor do ...YY ignorou os avisos de obstáculo na via, através de sinais de luzes, dados por outro condutor que circulava em sentido contrário ao por si levado.
-
A morte de A. C. foi consequência do referido em 6º dos factos provados devido ao ...YY ter embatido no peão fora da faixa de rodagem do ...YY.
-
Quando a equipa do Instituto Nacional de Emergência Médica – INEM chegou ao local do sinistro, apurou que o A. C. se encontrava vivo, em estado muito grave, tendo sido assistido no local pelo médico do Instituto Nacional de Emergência Médica.
4) Em função da não prova e prova destes factos é insofismável que os Apelantes ainda estavam em tempo para exercer o seu direito e que o mesmo não prescreveu.
5) Na verdade, da audição integral do depoimento da testemunha M. M. não resulta que tenha presenciado o acidente, cfr. minutos 11:44:04 a 11:47:23 da gravação; 6) O que resulta do depoimento desta testemunha é que o seu veículo circulava à retaguarda do veículo atropelante ...YY; 7) Ora, como resulta da fotografia 22 a 27 do relatório pericial junto aos autos elaborado pela testemunha V. L. e da fotografia Doc. n. 2 da contestação, a altura da caixa refrigerada do ...YY não permitia a visibilidade para a frente, nem no sentido da faixa de rodagem em que circulavam ambos os veículos, nem na faixa de rodagem de sentido contrário, por onde caminhava o peão atropelado; 8) Destarte, ainda que assim não fosse, mas é, esta testemunha refere a minutos 12m e 51s e a 21m e 11s da gravação que não viu o acidente, era Fevereiro, muito escuro..., seguia atrás do camião.... e que apanhou o corpo com a roda esquerda do camião...; 9) Do depoimento desta testemunha transcrito no relatório final da perícia realizada pelo NICAV, junto na sessão de julgamento realizada no dia 06/12/2029, e prestado no âmbito do processo crime, ou seja, em tempo muito mais próximo do acidente, em que a memória da depoente em relação ao que aconteceu ou viu naquele dia era mais fresca, esta refere “… no momento do acidente tanto a depoente como o veiculo interveniente circulavam a uma velocidade moderada, recordando-se que alguns metros antes o veiculo pesado tinha ultrapassado antes das bombas de combustível ali existentes e que nessa altura pensa que circulava a uma velocidade de cerca de 60Km/h e que o camião não passou por si com muita mais velocidade”…; 10) Este depoimento devia ter sido muito mais valorizado do que o depoimento prestado pela testemunha em audiência de discussão e julgamento porque muito mais próximo dos factos, cerca de 5 anos antes; 11) Ademais, resulta do depoimento da testemunha, ao contrário do preconizado pelo tribunal, que o condutor do ...YY circulava em excesso de velocidade; 12) Se a velocidade máxima permitida no local são 50Km/h e a testemunha refere que circulava a cerca de 60km/h e foi ultrapassada “… com pouco mais velocidade…”, logo o ...YY circulava em contra-ordenações das normas estradais, em excesso de velocidade não devagarinho; 13) Por outro lado, o ...YY não tomou as medidas necessárias a evitar o acidente!; 18) Circulando o ...YY com as luzes dianteiras acesas: em médios ou máximos, estas iluminam a via a pelo menos uma distância de 30m ou 100m, respectivamente; 19) Logo, a ilação a retirar destes factos é que tudo indica que o condutor do ...YY ou circulava distraído ou desatento ao trânsito e condições da via ou em excesso de velocidade; 20) Como tal, sempre se diga como em sede de Petição Inicial e Resposta se aduziu que o condutor do veículo ...YY ao provocar com negligência grosseira a morte do peão constituiu-se autor moral e material do crime de homicídio por negligência, previsto e punido pelo art.º 137.º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal; 21) Assim, atentas as disposições conjugadas do art.º 118.º, n.º 2, alínea c) do Código Penal que estipula que o prazo de prescrição do procedimento criminal é de cinco anos, se aplique, in casu, o disposto no art.º 498.º, n.º 3 do Código Civil.
22) Pelo exposto, o direito à indemnização decorrente do acidente de viação em apreço prescreve no prazo de 5 anos a contar do conhecimento do direito, terminando no dia 08 de Fevereiro de 2018, cfr. Jurisprudência autorizada do STJ, 23/05/2002, in www.dgsi.pt e Ac. do STJ, em CJSTJ, Ano II, Tomo I, pág. 126; 23) Sem prejuízo, e por mera cautela de patrocínio ainda se invoca que, o acidente sub juditio foi objecto do competente procedimento criminal, cujo inquérito viria a ser arquivado por despacho datado de 07/01/2014, junto aos autos como Doc. n.º 2 d PI; 24) Pelo exposto, o finado pai e marido dos Apelantes ainda que tivesse sido dado como provado que se encontrava deitado na estrada quando foi colhido pelo condutor do veiculo ...YY e não foi, cujo condutor não travou, nem efectuou qualquer manobra de evasão de forma a evitar o obstáculo: o peão ou qualquer outro objecto ou embaraço violou com negligência grosseira os seus deveres de cuidado e atenção ao trânsito e aos obstáculos na via, confundindo o peão com um saco plástico de cor preta; 25) Causando-lhe a morte, porque, atravessou por cima do tórax e dos membros inferiores com os rodados da viatura por si dirigida, quando o infeliz A. C. estava vivo; 26) Isto porque no momento do embate, como refere a testemunha Dra. B. R., médica do IML, Minho/Lima e resulta do relatório do CODU o traumatismo ocorreu em vida dado que há marcas de sangue no cadáver que só existem se o embate tiver ocorrido em vida, cfr. minutos 06:32s da gravação; 27) Vê-se, do exposto, que só o condutor do veículo ...YY, deu causa ao descrito acidente, não só por agir com imperícia, inconsideração, falta de cuidado e atenção, negligência grosseira, mas ainda por circular a velocidade ilegal e inadequada às circunstâncias, colocando em perigo de vida, não travando, nem adoptando uma velocidade adequada a evitar obstáculos ao seu sentido de trânsito, com o que violou, entre outros, o disposto nos seguintes preceitos legais do Código da Estrada: • art.º 3º n.º 2 (o peão é um utilizador vulnerável); • art.º 23.º, n.º 3, “a contrario senso” (o condutor do ...YY não...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO