Acórdão nº 709/16.7T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 01 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelPAULO REIS
Data da Resolução01 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. Relatório Nos autos de ação declarativa de condenação, sob a forma comum, do Juízo Central Cível de Braga - Juiz 3 - do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, que X - Gestão de Interesses, Lda.

, instaurou contra A. C.

, efetuada conta de custas n.º .........19 da responsabilidade do réu, veio este apresentar reclamação da mesma, pedindo que tal conta seja revogada e substituída, por não respeitar os normativos legais aplicáveis, nomeadamente o artigo 14.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais (RCP), na redação anterior à conferida pela Lei 27/2019, de 28-03, e condenando o réu apenas e só ao pagamento do remanescente da taxa de justiça devida pelo seu próprio impulso processual, imputando à autora o valor do remanescente da taxa de justiça devida pelo respetivo impulso processual; subsidiariamente, caso se considere que o artigo 14.º, n.º 9, do RCP, com a redação dada pela lei 27/2019, de 28-03, é aplicável in casu, revogar e substituir a conta elaborada após apurada a percentagem de decaimento de cada uma das partes, imputando-se o pagamento do remanescente de taxa de justiça de forma proporcional com esse decaimento.

Em contraditório, veio a autora pronunciar-se no sentido de ser negado provimento à reclamação apresentada e mantida a condenação do réu no pagamento da totalidade da taxa de justiça devida, defendendo, no essencial, que o teor da conta de custas reclamada se enquadra no que as partes quiseram fazer constar do n.º2 da transação celebrada.

Após ter sido elaborada informação pelo Escrivão contador no sentido de que a conta reclamada foi devidamente elaborada, e tendo o Ministério Público promovido o indeferimento da reclamação, veio a ser proferido o despacho de 3-09-2019 julgando a conta elaborada de acordo com a sentença homologatória da transação na parte respeitante à condenação em custas e com as respetivas normas aplicáveis, indeferindo a reclamação apresentada.

É desse despacho que o réu vem agora recorrer apresentando no final das suas alegações de recurso, agora corrigidas quanto ao lapso material evidenciado e devidamente sintetizadas nos termos do artigo 639.º, n.º3, do Código de Processo Civil (CPC), as seguintes conclusões (que se transcrevem): «I - Objeto do Recurso.

1- O presente recurso tem por objeto o douto despacho proferido pelo Tribunal a quo, relativamente à reclamação da conta processual elaborada a 03/06/2019, notificada ao ora recorrente a 04/06/2019, que vem indeferir a reclamação apresentada pelo ora recorrente, mantendo a mesma – e, por conseguinte, imputando ao ora recorrente o pagamento do remanescente da taxa de justiça devida pelo ora recorrente e pela autora, no valor, respetivamente, de 5.610,00€ e 6.630,00€ - sendo certo que o recorrente não se pode com ela conformar, por diversas razões de facto e de direito, que passamos a descrever.

Vejamos, II- Contextualização Prévia.

2- Quanto a esta matéria, remetemos para o corpo da motivação, uma vez que se trata de uma pequena contextualização prévia.

III- Da errónea aplicação do novo artigo 14º, nº9 do Regulamento das Custas Processuais.

3- Na conta em causa, verifica-se, na segunda tabela do ponto intitulado “Taxas Aplicáveis”, que é imputado ao réu o pagamento do remanescente da taxa de justiça devida pelo impulso processual da autora, com a observação “artº 14º, nº9, do RCP (actual redacção)”.

4- O anterior nº 9 do artigo 14º do Regulamento das Custas Processuais – o que estava em vigor à data da propositura da ação, note-se – regia do seguinte modo: “Nas situações em que deva ser pago o remanescente nos termos do n.º 7 do artigo 6.º e o responsável pelo impulso processual não seja condenado a final, o mesmo deve ser notificado para efectuar o referido pagamento, no prazo de 10 dias a contar da notificação da decisão que ponha termo ao processo.” Posto isto, 5- Em primeiro lugar, o ora reclamante não pode concordar com a aplicação deste recém-promulgado preceito à elaboração da conta do presente processo.

6- Desde logo, na referida Lei 27/2019, de 28 de Março, não se encontra nenhuma disposição especial relativamente à aplicação da mesma no tempo, excetuando-se o nº11 in fine¸ relativo somente às execuções fiscais (que, portanto, não cumpre aqui analisar).

7- De acordo com o artigo 12º, nº1 do Código Civil, “A lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular.” 8- Transpondo para o caso em concreto, verifica-se que a ação deu entrada em 15/02/2016.

9- Bem assim, verifica-se que autora e réu chegaram a um acordo para pôr termo ao processo no dia 28/01/2019, com sentença homologatória datada de 29/01/2019.

10- Isto é, meses antes desta nova lei ter entrado em vigor, já o processo em si estava materialmente findo, faltando, apenas, a parte final atinente à elaboração da conta e respetivas reclamações, sendo certo que o processo foi remetido à conta pela primeira vez também ainda antes da entrada em vigor do diploma ora em causa.

11- Aliás, o próprio Sr. Oficial de Justiça que elaborou a conta já anteriormente se tinha pronunciado quanto a esta questão – vide cota de 29/03/2019, que aqui se considera integralmente reproduzida por questões de economia processual e cujo excerto relevante já transcrevemos na motivação supra.

12- O Ministério Público também se pronunciou em sentido concordante com a informação prestada pelo Oficial de Justiça contador – vide Vista do M.P. de 01/04/2019, que aqui se considera integralmente reproduzida por questões de economia processual.

13- Ora, independentemente das reclamações e requerimentos posteriores, a verdade é que, tendo em conta o despacho proferido a 17/05/2019, a nova conta a ser elaborada deveria ser praticamente igual à conta inicial (datada de 18/03/2019), apenas com a exclusão do valor do remanescente da taxa de justiça devida pelos recursos interpostos por autora e réu.

14- Assim, a lei aplicável à realização da conta neste processo é a lei que vigorava quando foi proferida sentença de homologação do acordo celebrado entre as partes – pois era esta a lei que as partes tiveram em conta quando transigiram.

15- Por outro lado, o réu só celebrou a transação suprarreferida porque teve a legítima expetativa de que tal transação iria estar sujeita à disciplina do Regulamento das Custas Processuais vigente à época, não podendo ser tal expetativa ser frustrada por uma lei nova que não prevê efeito retroativo.

16- Esta circunstância fere ainda, de forma grave, os princípios da confiança e da segurança jurídicas, que resultam do Estado de Direito Democrático previsto no artigo 2º da Constituição da República Portuguesa, o que resulta numa patente inconstitucionalidade, que expressamente se invoca.

17- Nesta conformidade, verifica-se que a conta ora em causa não respeita os normativos legais aplicáveis, nomeadamente o artigo 12º, nº1 do Código Civil, o artigo 2º da Constituição da República Portuguesa e o artigo 14º, nº9, na redação dada pelo Decreto-Lei 126/2013, de 30 de Agosto (imediatamente anterior à Lei 27/2019, de 28 de Março), pelo que deverá a mesma ser revogada e substituída, condenando o réu apenas e só ao pagamento do remanescente da taxa de justiça devida pelo seu próprio impulso processual e impute à autora o valor do remanescente da taxa de justiça devida pelo impulso processual da autora.

Sem prescindir, IV- Dos erróneos pressupostos tomados em consideração na elaboração da conta, para os efeitos do artigo 14º, nº 9, na versão da Lei 27/2019.

18- Mesmo que se considere que o artigo 14º, nº9, com a redação dada pela lei 27/2019, de 28 de Março, é aplicável in casu, o que não se concede e apenas se concebe por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá que aquela norma refere expressamente que o pagamento do remanescente devido pelo responsável pelo impulso processual “que não seja condenado a final” é “imputado à parte vencida”.

19- No caso, as partes chegaram a um acordo de modo a pôr fim ao presente litígio, acordo esse em que chegaram a um “meio termo” mediante o qual a autora abdicou de uma parte daquilo que tinha peticionado e o réu aceitou pagar uma outra parte.

20- Na verdade, ao contrário do que refere o despacho recorrido, ambas as partes cederam mutuamente – embora não em proporções exatamente iguais - pelo que não se pode dizer que o réu foi a única parte vencida.

21- Assim, antes de se proceder a uma imputação global de todo o valor ao ora réu, seria necessário apurar em que medida é que o réu e a autora ficaram vencidos e, a partir daí, imputar o pagamento dos remanescentes devidos pelos impulsos processuais em proporção desse vencimento.

22- Uma vez que a nova redação deste normativo nada diz quanto a esta questão, parece-nos que esta será a solução mais equitativa, tendo em conta todas as normas aplicáveis.

23- Nesta conformidade, fica demonstrado que a conta ora em causa não foi corretamente elaborada, pois não respeita devidamente o disposto no novo artigo 14º, nº9 do Regulamento das Custas Processuais, com a redação dada pela lei 27/2019 de 28 de Março, motivo pelo qual deverá ser revogada e substituída, após apurado a percentagem de decaimento de cada uma das partes, imputando o pagamento do remanescente de taxa de justiça de forma proporcional com esse decaimento.

Ainda sem prescindir, V- Da transação celebrada entre as partes e da sua interpretação.

24- Cumpre ainda abordar a questão levantada no despacho recorrido, relativa à alegada assunção da responsabilidade do réu relativas às custas processuais remanescentes.

25- Importa explicar que quando o réu celebrou a transação nestes termos, apenas se referia às custas processuais que, eventualmente, se verificassem – perícias, diligências processuais, etc.

26- O que está aqui em causa é o remanescente da taxa de justiça devida pelo impulso processual da autora – isto é, trata-se...

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