Acórdão nº 3170/19.0T8VCT-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Janeiro de 2020
Magistrado Responsável | LÍGIA VENADE |
Data da Resolução | 23 de Janeiro de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I RELATÓRIO.
“XFOGO, Lda.” e H. S. vieram interpor providência cautelar não especificada contra J. C. e “FT., Unipessoal, Lda.” pedindo que se ordenasse a entrega aos Requerentes dos bens elencados no artigo 84 do requerimento inicial e quaisquer outros que tenham base de dados/informações da 1ª Requerente, ou a designação “XFOGO”, que se encontrem nas moradas dos Requeridos, o que veio a ser decretado sem prévia audiência destes últimos.
Para tanto alega: . o 2º A. é o único sócio e gerente da 1ªA; . o 1º R. foi sócio e gerente da 1ª A., tendo cessado funções de gerência em 3/7/2019 e cedido a sua quota ao 2º A. em 5/8/2019, desvinculando-se da 1ª A. nesta data; . isso deu-se na sequência de transação realizada no processo n.º 1735/19.0T8VCT que correu termos neste Juízo de Comércio a qual foi homologada por sentença; . nos artigos 9 a 30 do requerimento inicial, o modo de funcionamento da gerência da 1ª A. até 3/7, e os atos do 1º R. que alegou naquele processo de suspensão ou destituição de titulares de órgãos sociais e que aí serviam de fundamento ao pedido contra o 1º R., . os termos da transação são estes que aqui se reproduzem: “Cláusula Primeira O Requerido J. C. é titular de uma quota no valor nominal de 25.000,00 (vinte e cinco mil euros), que possui na sociedade “XFOGO, LIMITADA”, sociedade comercial por quotas, com sede na Rua …, nº …, freguesia de …, concelho de Viana do Castelo, com o capital social de cinquenta mil euros, com o NIPC …, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de ….
Cláusula Segunda O Requerido J. C. obriga-se a ceder ao Requerente H. S., a referida quota no valor nominal de 25.000,00 (vinte e cinco mil euros), que é o correspondente à totalidade da quota que possui na sociedade “XFOGO, LIMITADA”.
Cláusula Terceira O preço da cessão é de 350.000,00 Euros (trezentos e cinquenta mil euros).
Cláusula Quarta A título de sinal e princípio de pagamento, recebeu já, nesta data, do Requerente a quantia de € 40.000,00 (quarenta mil euros), titulada pelo cheque nº 6358132296 do Banco …, e da qual dá inteira e plena quitação.
Cláusula Quinta A restante parte do preço, ou seja, a quantia de € 310.000,00 (trezentos e dez mil euros) será paga na data da celebração do contrato definitivo correspondente ao contrato prometido.
Cláusula Sexta O contrato definitivo correspondente ao contrato prometido será celebrado até ao dia cinco de Agosto de 2019, ficando a sua marcação a cargo do Requerente, que deverá avisar o Requerido com um dia de antecedência.
Cláusula Sétima A presente cessão de quotas é cedida expressamente com todos os direitos e obrigações a ela inerentes e com a cedência todos e quaisquer direitos que o Requerido J. C. detém na referida sociedade, assumindo o Requerente todos os direitos e todas as responsabilidades relativamente à sociedade.
Cláusula Oitava O Requerido J. C. renuncia expressamente à gerência da sociedade com efeitos a partir da presente data.
Cláusula Nona O Requerente obriga-se a emitir, em representação da referida sociedade, nota de crédito relativa ao valor dos veículos de matrícula VJ, marca Mitshubishi Outlander e BMW de matrícula VI.
Cláusula Décima O Requerente obriga-se, ainda, até à data da celebração do contrato definitivo exonerar o Requerido de todas e quaisquer responsabilidades para com a sociedade, nomeadamente, a de fiador.
Cláusula Décima-Primeira Por Requerente e Requerido, foi dito: Que, no caso de incumprimento pontual ou tempestivo do presente contrato ou de qualquer das suas cláusulas, concedem em reconhecer expressa e reciprocamente a faculdade de obter sentença que produza os efeitos da declaração negocial dos faltosos, recorrendo portanto à execução específica, sem prejuízo da indemnização pelos demais danos que resultem dessas faltas de cumprimento voluntário ou tempestivo, e que, relativamente ao eventual incumprimento por parte do Requerente e/ou Requerido, desde já se fixa no montante de 50.000,00 euros, (cinquenta mil euros).
Cláusula Décima-Segunda Para garantia do pagamento da quantia relativa ao remanescente do preço ora acordado, o Requerente constitui voluntariamente penhor sobre a quota detida na sociedade correspondente a 50%, a favor do Requerido.
Cláusula Décima-Terceira O Requerido obriga-se a manter sigilo sobre os procedimentos, práticas e segredos da sociedade XFOGO, e não usar ou ceder a terceiros a base de dados da empresa.
Cláusula Décima-Quarta O Requerido obriga-se a fornecer ao Requerente todas as palavras passe, nomeadamente, as relativas aos acessos ao servidor e sistema de videovigilância como administrador, no dia de hoje.
Cláusula Décima-Quinta Com o cumprimento do presente acordo ambos declaram que nada mais têm a reclamar um do outro.
Cláusula Décima-Sexta Até à data da assinatura do contrato definitivo o Requerente permite ao Requerido o acesso ao e-mail da empresa ficando sem acesso ao mesmo a partir daquela data e o Requerido compromete-se ainda a requerer junto da operadora a portabilidade do número de telemóvel que usa actualmente para o seu nome pessoal.
Cláusula Décima-Sétima O Requerente e Requerido prescindem do prazo de recurso da decisão que homologa o presente acordo.” – sublinhado nosso. – Cfr. doc.02 que ora se junta e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.”; . a cessão de quotas foi outorgada em 05 de agosto de 2019; . constando também do referido documento que: “Os primeiros outorgantes obrigam-se a manter sigilo sobre os procedimentos, práticas e segredos da sociedade XFOGO, e não usar nem ceder a terceiros a base de dados da empresa.” . 1º Réu veio incumprir o acordo celebrado; apesar de várias vezes ter sido interpelado para o efeito pelo A., o R. vem incumprindo a obrigação de fornecer todas as palavras passes necessárias ao funcionamento da XFOGO, violando a cláusula décima-quarta da supra referida transação; para além disso, o Réu acedeu indevida e abusivamente ao sistema informático da XFOGO (servidor), apenas e só com o intuito de dele retirar informações confidenciais e essenciais da empresa, para o seu próprio uso e para a ceder a terceiros, e assim prejudicar a empresa, e apesar de ter expressa e livremente renunciado à gerência da XFOGO na cláusula oitava da referida transação de 03 de julho de 2019, o 1º R. continuou a praticar atos próprios de gerente; matérias desenvolvidas nos artigos seguinte; . o 1º R. praticou atos abusivos em prejuízo da empresa, retirou bens e informações da mesma que usou ilicitamente, conforme pontos 40 a 43 e 44 e seguintes; . o R. vem reiteradamente violando as obrigações que assumiu nas clausulas oitava, décima-terceira e décima-quarta da “supra” transcrita transação judicial; . em 9/7/2019 foi criada a 2ª R. que desenvolve a mesma atividade no mesmo espaço geográfico que a 1ª A., sendo o 1º R. só cio e gerente da mesma; . este desvia clientela usando bens e informações da 1ª A. que continuam na sua posse; . pratica atos de concorrência ilícita e proibida e viola a obrigação de não concorrência a que estava vinculado (cfr. artº.s 311º, nº. 1, do Código da Propriedade Industrial e o artº. 242º do Código das Sociedades Comerciais); . o 1º R. mantém na sua posse bens (os quais têm informações) –que descrimina- que são da 1ª A. e que aquele tinha enquanto gerente da mesma, e que usa em proveito próprio; . o 2º A. confiou que o 1º Réu manteria uma conduta de acordo com a boa-fé, a lealdade e os costumes que se encontram subjacentes à celebração dos negócios jurídicos; o que não veio a suceder; . conclui que face à conduta ilícita, desleal, contrária não só às normas e usos honestos de qualquer ramo de atividade, mas também contrária à boa fé e aos costumes subjacentes à celebração dos negócios jurídicos, dos RR., a presente ação mostrasse o único meio de ainda em tempo evitar a perda de clientela da A. XFOGO, salvaguardando a sua integridade económica e financeira e evitando perdas económicas elevadas para o A. H. S.; . pede a entrega dos bens que se encontram na posse dos requeridos e que pertencem à requerente e que contém bases de dados e informações a ela respeitantes, como forma de impedir mais prejuízos.
*O Tribunal decidiu decretar a providência requerida sem contraditório prévio dos requeridos.
*Citados os R.R., além do mais invocaram em sede de oposição a exceção de incompetência absoluta em razão da matéria do Juízo de Comércio para apreciação dos presentes autos.
Dizem os Requeridos, e vistos os termos da previsão do art.º 128.º da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, concretizado o pedido, em termos estritos, nada mais se vislumbra do que uma providência cautelar comum para entrega de bens, revestindo natureza puramente civil e não se subsumindo a nenhuma das matérias cuja competência exclusiva se relega para o Juízo de Comércio.
Em resposta, vieram os Requerentes pugnar pela improcedência da exceção, defendendo que sendo o objeto da ação principal a propor (de que a presente providência depende) que serve de critério determinador da competência do Tribunal, e visando aquele, além do mais, a condenação do Requerido J. C.
a abster-se de praticar atos ilícitos e contrários aos princípios da boa fé e costumes comerciais que consubstanciam, entre outros, concorrência ilícita e proibida, apropriação de bens da empresa, em total desrespeito pelo acordo celebrado no Processo n.º 1735/19.0T8VCT que correu termos neste Juízo de Comércio, será também este materialmente competente para a presente providência, para como para a ação principal.
Em sede de audiência final e preliminarmente à produção de prova o Tribunal julgou-se materialmente competente.
Inconformados os requeridos interpuseram recurso apresentando alegações com as seguintes -CONCLUSÕES- I. Destina-se o presente recurso a impugnar a decisão/despacho proferido pelo Tribunal de Primeira Instância, na pretérita data de 12-11-2019, que julgou improcedente a...
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