Acórdão nº 71/14.2GBVNF.G3 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelMÁRIO SILVA
Data da Resolução10 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes da Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório 1. No processo de instrução com o nº 71/14.2GBVNF, a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga – Juízo de Instrução Criminal de Guimarães – Juiz 1, foi proferida decisão de pronúncia e de não pronúncia, datada de 01/03/2019, do seguinte teor (transcrição): “7. Decisão Face ao exposto, decido: - não pronunciar a arguida A. R. e determino, quanto a esta arguido, após transito, o arquivamento dos autos; - por total ausência de prova dos factos supra referidos quanto ao RAI do assistente J. M., julgo improcedente os seus fundamentos e determino, após transito, o arquivamento dos autos quanto aos arguidos M. F. e A. C.; - a fim de ser julgado em processo comum, com intervenção do Tribunal Colectivo, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 308.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, pronuncio J. M., casado, reformado, nascido a -.08.1939, filho de … e de …, natural da freguesia de ..., concelho de Vila Nova de Famalicão e residente na Travessa …, Braga, porquanto os autos indiciam suficientemente que: 1. O arguido J. M. e a ofendida C. M. são irmãos, residindo esta, à data dos factos adiante descritos, na Avenida..., Vila Nova de Famalicão e tendo, nessa altura, 82 anos de idade.

  1. Em data não concretamente apurada, mas situada cerca de 3 anos antes da situação abaixo descrita, o arguido J. M. começou a insistir com a ofendida C. M. para que a mesma encontrasse alguém para viver consigo e lhe fazer companhia.

  2. No seguimento de tais insistências, o arguido J. M. apresentou à ofendida a arguida A. R., pessoa conhecida daquele e que se encontrava na disposição de lhe fazer companhia na sua habitação, ao que a ofendida acedeu, tendo então aquela passado a residir com a mesma.

  3. Acontece que, alguns meses depois, a ofendida C. M., por ter ficado desagradada com algumas situações que se passavam com a arguida A. R. e com o arguido J. M., comunicou a este que já não pretendia a companhia da arguida A. R., tendo-se o mesmo comprometido a arranjar um local para onde esta pudesse ir viver, o que veio a ocorrer alguns dias depois.

  4. Em data não concretamente apurada, mas situada no dia seguinte àquele em que a arguida A. R. saiu da habitação da ofendida C. M., o arguido, porque ficara desagradado com a atitude da ofendida, dirigiu-se à habitação da mesma sita na morada acima indicada, arrancou-lhe algumas plantas que esta tinha no quintal e disse-lhe, em tom sério e ameaçador: “ estas duas mãos hão de te matar e ninguém há-de saber “.

  5. Alguns meses depois da situação acima descrita e concretamente, cerca das 08:30 horas do passado dia 04.03.2014, terça-feira de Carnaval, a arguida J. R. – irmã da arguida A. R. – deslocou-se a casa da ofendida C. M. e disse que a pretendia visitar, tendo entrado na cozinha da habitação, local onde esta se encontrava sentada à mesa a tomar o pequeno-almoço e numa altura em que ainda aí se encontrava uma jovem que, nessa altura, aí residia com a mesma.

  6. Depois de alguns minutos de conversa, a dita jovem saiu da habitação para ir para o seu local de trabalho e a ofendida C. M. pediu à arguida J. R. que abandonasse a casa.

  7. Perante um tal pedido, a arguida J. R. efectuou uma chamada telefónica no âmbito da qual disse: “ está livre, podes entrar “, tendo então, o arguido J. M. entrado na cozinha da habitação, com uma máscara de Carnaval a cobrir-lhe o rosto e umas luvas de cabedal a cobrirem-lhe as mãos e logo se dirigiu à ofendida C. M., agarrou-a, empurrou-a para cima de um sofá que se encontrava ali próximo, colocou-se sobre ela e apertou-lhe o pescoço com as duas mãos.

  8. Como a ofendida C. M. se tentou defender, o arguido J. M. tirou uma das mãos do pescoço da mesma e logo a agarrou pelos cabelos, puxou-lhos e arrancou-lhe alguns deles.

  9. Quando o arguido se encontrava a apertar o pescoço da ofendida C. M. e num momento em que esta já se encontrava prestes a sufocar, chegou junto da habitação a filha da mesma, a ofendida M. F., que tinha sido alertada para a presença de uma pessoa estranha na casa da sua mãe pela dita jovem que aí residia na altura e que, por isso, para aí se dirigiu de imediato, na companhia do seu ex-marido.

  10. Junto ao portão exterior da casa, a ofendida M. F. deparou-se então com uma das arguidas, a quem, perguntou o que estava ali a fazer, tendo a mesma gritado “ está aqui “.

  11. Posto isso, a ofendida M. F. entrou na habitação da sua mãe, tendo-se deparado com outra das arguidas no corredor da entrada, com uma máscara de Carnaval a cobrir-lhe o rosto, tendo-lhe desferido um empurrão e retirado a máscara da mesma.

  12. De seguida, a ofendida M. F. entrou na cozinha da habitação e logo viu o que se estava ali a passar com a sua mãe, tendo então pegado numa cadeira e batido com a mesma nas costas do arguido J. M., o que fez com que este se voltasse para si.

  13. Nessa altura, a ofendida M. F. conseguiu tirar a máscara que o arguido J. M. tinha colocada sobre o rosto e logo reconheceu o mesmo.

  14. Em face do exposto, o arguido J. M. largou a ofendida C. M. e logo empurrou a ofendida M. F. contra a parede e uma banca que ali existia, tendo esta gritado pelo marido, o que fez com que o arguido tivesse despido o casaco, pegasse numa bengala e num canivete que trazia consigo, com o qual tentou atingi-la, tendo-lhe ainda provocado alguns cortes no casaco de cabedal que a mesma tinha vestido.

  15. De seguida, o arguido J. M. colocou-se junto da porta da cozinha e, quando o ex-genro da ofendida C. M., o ofendido A. C., aí entrou, logo o arguido o atingiu com a bengala na cabeça e com o canivete no rosto, ao que aquele reagiu, tendo-o imobilizado e lhe retirado o canivete da mão e ainda uma navalha que o mesmo também trazia consigo.

  16. Após o exposto, foi solicitada a presença de uma patrulha da GNR no local, tendo sido apreendida a dita navalha e o canivete, bem como, as máscaras de Carnaval que os arguidos traziam consigo e as luvas que o arguido J. M. trazia vestidas.

  17. Na altura foram ainda encontrados no interior do casaco que o arguido J. M. trazia vestido, um rolo de fita-cola larga, um cordel e uma tesoura.

  18. O arguido actuou forma supra descrita, com a intenção de por fim à vida da ofendida C. M., irmã do arguido J. M. e na altura com 82 anos de idade, aproveitando-se do facto de a mesma ter ficado sozinha em casa e de ser pessoa especialmente debilitada, desde logo atenta a idade avançada que já tinha.

  19. O arguido agiu desse modo pela circunstância de estar descontente com o facto de a ofendida C. M. não pretender que a arguida A. R. continuasse a viver consigo e apenas não concretizou as suas intenções atenta a pronta intervenção da filha e do ex-genro daquela e assim por motivos alheios à sua vontade.

  20. Para além do exposto, ao agir do modo acima descrito em relação aos ofendidos C. M., M. F. e A. C., o arguido J. M. atingiu os mesmos na sua integridade física, o que, quanto ao terceiro, concretizou mediante o uso do canivete que trazia consigo, objecto que sabia ser especialmente perigoso e poder provocar ferimentos graves.

  21. Com efeito, o arguido J. M. provocou: - na ofendida C. M. uma escoriação na região malar direita, edema no 5º dedo da mão direita e traumatismos e dores na cabeça, face, pescoço e mãos, lesões essas que motivaram tratamento médico, logo no dia em que ocorreram os factos e no Centro Hospitalar do Médio Ave – Unidade de Vila Nova de Famalicão e das quais resultaram, directa e necessariamente, 10 dias de doença, sem afectação da capacidade para o trabalho; - no ofendido A. C. uma escoriação no couro cabeludo e ferida superficial no supracílio direito, lesões essas que motivaram tratamento médico, logo no dia em que ocorreram os factos e no Centro Hospitalar do Médio Ave – Unidade de Vila Nova de Famalicão, onde foi suturada a ferida do supracílio direito e das quais resultaram, directa e necessariamente, 7 dias de doença, todos com afectação da capacidade para o trabalho geral e 2 deles com afectação da capacidade para o trabalho profissional; - na ofendida M. F. edema na face dorsal da mão esquerda e traumatismo e dores no braço direito, lesões essas que motivaram tratamento médico, logo no dia em que ocorreram os factos e no Centro Hospitalar do Médio Ave – Unidade de Vila Nova de Famalicão e das quais resultaram, directa e necessariamente, 7 dias de doença, todos com afectação da capacidade para o trabalho geral e 2 deles com afectação da capacidade para o trabalho profissional.

  22. Acresce ainda que, as palavras referidas em 5., dirigidas pelo arguido J. M. à ofendida C. M., assim anunciando a sua intenção de atentar contra a vida da mesma, constituíram meio adequado a provocar nesta intranquilidade e medo de que aquele viesse efectivamente a concretizar uma tal intenção, o que o arguido bem sabia e, aliás, pretendia.

  23. Tinha o arguido perfeito conhecimento de que as suas condutas eram proibidas e punidas por Lei.

    Pelo exposto, cometeu: - o arguido um crime de homicídio qualificado na forma tentada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 22º, 23º, 131º, 132º, nºs. 1 e 2, al. c) e e) do Código Penal; - o arguido J. M., em concurso real de infracções com a acima enunciada, ainda: um crime de ofensa à integridade física, p. e p. pelo disposto no artº 143º, nº 1 do Código Penal, na pessoa da ofendida M. F.; um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo disposto no artº 143º, nº 1 e 145º, nº 1, al. a) e nº 2, por referência ao disposto no artº 132º, nº 2, al. h), todos do Código penal, na pessoa do ofendido A. C. e um crime de ameaça agravada, p. e p. pelo disposto no artº 153º, nº 1 e 155º, nº 1, als. a) e b) do Código Penal, na pessoa da ofendida C. M..

    ***Prova: A indicada na acusação pública.

    *Estatuto processual dos arguidos.

    O arguido aguardará os ulteriores trâmites processuais sujeitos a termo de identidade e residência, medida adequada, proporcional e suficiente às exigências cautelares do...

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