Acórdão nº 3606/12.1T8BBRG-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2020
Magistrado Responsável | ALCIDES RODRIGUES |
Data da Resolução | 17 de Dezembro de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório M. B. intentou o presente recurso extraordinário de revisão do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães em 6 de novembro de 2014, na parte que decidiu manter a sentença proferida pelo Tribunal Judicial de Braga, antiga Vara de Competência Mista, fundamentando-o na alínea b) do art. 696º do Código de Processo Civil, visando a alteração da decisão proferida no processo principal, no qual detinha a qualidade de Ré, aduzindo as seguintes conclusões: «1. O presente recurso de revisão vem interposto do douto acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, proferido em 6 de novembro de 2014, e transitado em julgado em 9 de dezembro de 2014, na parte em que decidiu manter a sentença proferida pelo Tribunal Judicial de Braga, antiga Vara de Competência Mista.
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Para fundamentar tal decisão este Tribunal da Relação de Guimarães, e anteriormente o Tribunal de Primeira Instância, consideraram que a recorrente engendrou um plano para adquirir a propriedade da totalidade dos bens deixados pelo pai de ambos, o Eng. P. B..
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Da leitura do acórdão revidendo, resulta ainda que o tribunal criou também a convicção que nunca foi vontade do pai do A. e da R. que a mesma ficasse com o quinhão hereditário do primeiro, já que, alegadamente não queria beneficiar a R., e ainda que o A. só celebrou a escritura de cessão do quinhão hereditário porque não tinha consciência dos seus efeitos jurídicos, já que, nunca foi sua intenção abrir mão da sua parte na herança.
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Estes factos foram dados como provados essencialmente com base no depoimento da testemunha V. M., pois, apesar de naquele acórdão também se fazer referência ao depoimento da testemunha A. F. e C. D., a verdade é que, da leitura dessa decisão, constata-se que o depoimento destas testemunhas foi um mero complemento do depoimento da referida testemunha V. M., pois, nem a testemunha A. F., nem a testemunha C. D., acompanharam a escritura de cessão de quinhão hereditário, nem tampouco o acordo celebrado entre as partes antes da sua celebração, sendo certo que, a convicção das próprias testemunhas sobre a realidade dos factos efetivamente ocorridos teve por base a história que lhes foi relatada pela testemunha V. M. aquando da reunião havida entre eles antes da instauração desta ação.
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Na sentença proferida em Primeira Instância, para a qual o acórdão revidendo remete, refere-se expressamente que a testemunha V. M. foi sem margem para dúvidas uma testemunha essencial ao convencimento do tribunal face à proximidade com a R. e o seu pai aquando dos factos em discussão nos presentes autos.
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Nessas decisões consta também que, sem qualquer ressentimento eventualmente decorrente da separação da R., a testemunha V. M. descreveu de forma clara, perentória e convincente que o relacionamento existente entre a R. e o A. era nulo, que aquela só se aproximou do irmão após o falecimento do pai de ambos, que até à data da realização da cessão da quota hereditária nunca se apercebeu que o A. ia vender ou abdicar do quinhão hereditário a favor da sua irmã, de forma gratuita, só se tendo apercebido naquele ato da razão da reaproximação e manipulação sentimental da R. junto do irmão, motivo pelo qual, aquando da outorga da cessão ficou a testemunha surpresa quando, durante a leitura da escritura na parte relativa ao preço da cessão, o A. a ele se tentou dirigir, manifestando estranheza, ainda dizendo o seu nome, como que a pedir-lhe explicações, porém a R. cortou-lhe a palavra dizendo-lhe que se não fosse assim perdiam os bens para o fisco.
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Nessas decisões consta ainda que a testemunha V. M. supôs que a R. fosse cumprir as obrigações exaradas na escritura, e que só após a ter confrontado com a situação e esta lhe ter dito que não ia pagar nada, que nunca teve intenção de pagar nada ao irmão, é que se apercebeu do logro em que o A. tinha caído; que o A. desconhecia ir realizar-se a cessão do quinhão hereditário, quer pelo que disse na hora, quer pela forma como o mesmo reagiu no seu decurso, por um lado, por não ter a exata noção do que ia fazer e das suas consequências, embora soubesse que se tratavam de assuntos da herança, e por outro lado, por a testemunha estar presente, porque o falecido Eng. P. B. havia dito ao A. para confiar nele, o que conferiu solenidade ao ato.
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Da apreciação da decisão revidenda resulta que, a convicção do Tribunal da Relação de Guimarães e do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, antiga Vara de Competência Mista, plasmada nas suas respectivas decisões, assentou essencialmente no depoimento prestado pela Testemunha V. M., pois, o depoimento prestado pelas outras testemunhas foi um mero complemento do depoimento da mencionada testemunha, não sendo aqueles suscetíveis de formar a convicção do tribunal no sentido da decisão proferida.
9 No âmbito do processo que, com o n.º 563/14.3TABRG.S1, correu termos no Tribunal da Relação de Guimarães - Secção Penal, no qual figurou como queixosa a aqui recorrente e como arguido a testemunha V. M., em 16 de maio de 2017 foi proferido acórdão, posteriormente confirmado na íntegra pelo Supremo Tribunal de Justiça em 18 de janeiro de 2018, e transitado em julgado em 1 de fevereiro de 2018, que julgou procedente a pronúncia e, consequentemente, condenou o ali arguido V. M. pela prática do crime de falsidade de testemunho, previsto e punido pelo artigo 360.º n.º 1 e n.º 3 do Código Penal.
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Naquele processo, tanto o Tribunal da Relação de Guimarães como o Supremo Tribunal de Justiça, entenderam que o ali arguido, repete-se, a testemunha V. M., cujo depoimento foi essencial para a formação da convicção do tribunal, e, consequentemente, para ser proferida a decisão que se pretende que seja revista, na audiência de julgamento de 19 de setembro de 2013 – deste processo n.º 3606/12.1TBBRG – quando interveio na qualidade de testemunha do A. quis, e efetivamente declarou factos e respondeu às perguntas que lhe foram formuladas em contrário da verdade que bem conhecia, pois, apesar de bem saber que o pai do A. e da R. pretendia encontrar uma solução para que o A. recebesse uma renda vitalícia, que não pudesse ser penhorada, e tivesse assegurada uma casa decente, que também não fosse suscetível de penhora, daí a constituição do direito de uso e habitação, que o património ficasse preservado de atos de prodigalidade daquele, e conhecendo também o que ficou convencionado entre o A. e a R. quanto à cessão do quinhão hereditário, cuja minuta da escritura e os termos da mesma foram por si determinados, relatou outra realidade ao tribunal, criando a convicção de que a R. engendrou um plano para se apropriar da quota da herança que pertencia ao A.
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No âmbito deste processo, o Tribunal da Relação de Guimarães e o Supremo Tribunal de Justiça também não tiveram qualquer dúvida de que o ali arguido, a aqui testemunha V. M., faltou deliberadamente à verdade como forma de vingança por a R. ter rejeitado as suas tentativas de reatar a relação marital que os uniu durante alguns anos e da qual nasceu um filha.
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É assim manifesto que a testemunha V. M., cujo depoimento foi determinante para a prolação da sentença do Tribunal da Comarca de Braga, antiga Vara Mista, confirmada pelo acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, mentiu.
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No caso concreto encontra-se verificado o requisito de falsidade cuja lei exige para o recurso de revisão, pois, o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, que já transitou em julgado, atestou que a testemunha V. M., quando prestou depoimento nestes autos, faltou à verdade, sendo ainda certo que, tal depoimento foi determinante para a prolação da decisão revidenda.
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Está também verificado, no caso concreto, o requisito do trânsito em julgado do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que confirmou o Acórdão anteriormente proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães que condenou a testemunha V. M. pela prática do crime de falsidade de testemunho, previsto e punido pelo artigo 360.º do Código Penal, e ainda que o acórdão que se pretende que seja revisto, proferido em 6 de novembro de 2014, também já se encontra transitado em julgado.
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O recurso revidendo só transitou em julgado em 9 de dezembro de 2014, pelo que, não decorreu o prazo de caducidade de cinco anos a que alude o n.º 1 do artigo 697.º do Código de Processo Civil.
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O acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, que manteve a decisão anteriormente proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães, que condenou a testemunha V. M. pela prática do crime de falsidade de testemunho, previsto e punido pelo artigo 360.º n.º 1 e n.º 3 do Código Penal, foi notificado à R. em 22 de janeiro de 2018, pelo que, também não se encontra ultrapassado o prazo de 60 dias para interposição do recurso.
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Este recurso é interposto perante este tribunal, em cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 697.º do Código de Processo Civil, pois, foi o acórdão proferido por esta Relação que transitou em julgado.
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Considerando a existência de considerando a existência de falsidade no depoimento da testemunha V. M., que esse depoimento falso foi determinante para a decisão a rever, esta questão não foi suscitada no processo, o recurso foi apresentado atempadamente, e, nos termos do disposto no artigo 698.º n.º 1 do Código de Processo Civil, a recorrente alegou os factos constitutivos do fundamento do recurso, deverá o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães em 6 de novembro de 2014, na parte que decidiu manter o decidido pelo tribunal de primeira instância, nomeadamente, quanto à anulação da cessão do quinhão hereditário celebrada a 22 de outubro de 2010, ser revisto, e, consequentemente, alterado por outro que, depois de devida e novamente instruída e julgada a causa, declare totalmente improcedente a pretensão do A., pois, os factos provados acima referidos – alíneas a) a q) – foram obtidos com base num depoimento falso».
*Por despacho datado de 10/04/2018, o...
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