Acórdão nº 956/14.6TBVRL-T.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelSANDRA MELO
Data da Resolução10 de Setembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Exequente e apelada: Administração do Condomínio do Edifício sito na Rua …, Lugar …., Vila Nova de Gaia Executada e apelante: Massa Insolvente de x Imobiliária, Lda., com sede no Bairro …, Vila Real Autos de: apelação em separado em ação executiva para pagamento de quantia certa com forma ordinária Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I- Relatório O exequente, apresentando como título executivo várias atas de assembleias de condóminos, veio cobrar a quantia global de € 71.147,37, sendo a quantia de 44.472,19 € referente a quotizações de agosto de 2014 a 30 de março de 2019, a quantia de 2.612,06 € referente a juros liquidados, a quantia de 23.542,12 € referente a penalizações por acionamento e o restante referente a certidões (275,00 €) e honorários de advogado (246,00 €).

A executada apresentou embargos que vieram a ser rejeitados por intempestividade. Veio, já em requerimento autónomo remetido à execução, invocar várias exceções, entre elas a da falta de título executivo, tendo o exequente pugnado pela inadmissibilidade de tal arguição e pela sua improcedência.

Foi proferido despacho, ora sobre recurso, no qual se decidiu: “Assim sendo, o exequente não dispõe de título executivo em relação a essas quantias para custear despesas de contencioso, motivo pelo qual não as pode exigir à executada deste modo, tendo que recorrer à apresentação da respetiva nota ao abrigo do disposto nos arts. 25º e segs., do Regulamento das Custas Processuais, o que leva à consequente extinção da execução nesta parte; determinando-se o prosseguimento da execução relativamente ao demais.” É desta decisão que a Recorrente apela, formulando, para tanto, as seguintes conclusões: “a) Toda a execução tem por base um título pelo qual se determinam o fim e os limites da ação executiva – cfr. n.º 5, artigo 10º, do Código Processual Civil.

  1. A ata da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte – cfr. n.º 1, do artigo 6º, do De-creto-Lei n.º 268/94 de 25 de outubro.

  2. O título executivo é “o documento pelo qual o requerente dê realização coativa da prestação, demonstra a aquisição de um direito a uma prestação, nos requisitos legalmente prescritos” – cfr. RUI PINTO, Manual da Execução e Despejo, Coimbra Editora, edição 2013, página 143.

  3. No caso em concreto, as Atas das Assembleias de Condóminos n.ºs 1 de 06/08/2010 (doc. 03); 3 de 31/01/2011 (doc. 04); 1 de 24/04/2015 (doc. 08); 2 de 30/04/2015 (doc. 09); 8 de 16/06/2017 (doc. 10); 9 de 05/07/2017 (doc. 11); 10 de 21/09/2017 (doc. 12) e 11 de 19/09/2018 (doc. 13), não constituem título executivo – cfr. alínea d), do nº 1, do artigo 703º, do Código Processual Civil, por força do n.º 1, do artigo 6º, do Decreto-Lei 268/94, de 25 de Outubro.

  4. O motivo pelo qual a recorrente entende que as atas das assembleias não constituem título executivo, é pelo simples facto de nenhuma delas trazem em seu teor a indicação dos montantes das contribuições devidas ao condomínio, o prazo de pagamento e a fixação da quota-parte que caberia ao condómino, aqui recorrente.

  5. Com a falta dos pressupostos indicados na letra e), as atas referenciadas não constituem título executivo, e não havendo título executivo, a ação executiva é nula.

  6. Como diz RUI PINTO “o título executivo ao demonstrar a aquisição de um direito a uma prestação, nos termos legalmente tabelados, constitui o direito à execução: somente a demonstração da aquisição do direito a prestação segundo a forma / formalidades fixadas na lei permite a dedução de um pedido executivo” (Manual da Execução e Despejo, Coimbra Editora, edição 2013, página149).

  7. Não se estando, in casu, perante um ato que satisfaça os requisitos do disposto no n.º 1, do artigo 6°, do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25 de Outubro, tal implica que estejamos então perante a “ausência de uma verdadeira condição da ação, porque o título não possui um dos requisitos necessários à exequibilidade.” - cfr. Acórdão do STJ, de 04-04-2006, Relator JOAO CAMILO.

  8. O despacho recorrido conclui que “...não assiste razão à executada quanto ao valor das contribuições devidas, porque tendo sido deliberadas um determinado valor em dívida e não tendo a deliberação sido impugnada (art. 1433.° do Código Civil), o Executado/Embargante está vinculado a essa deliberação, existindo título executivo para exigir o pagamento desse valor...”, desta forma, o Tribunal a quo está a retirar de um juízo sobre a existência da dívida um juízo de verificação sobre a condição de exequibilidade do título (rectius: condição de ação), o que não deve ser aceito.

  9. Assim, entende a recorrente que o despacho recorrido deve ser revogado quando ali se declarou “... determinando-se o prosseguimento da execução relativamente ao demais”, que salvo melhor opinião, os documentos que servem de base à execução não constituem títulos executivos, por isto, o Tribunal a quo deveria decidir que a execução é nula por falta de título.

  10. O despacho recorrido violou, com a sua decisão e pelas razões supra apontadas, a norma do n.º 1, do artigo 6.°, do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25 de Outubro conjugada com o n.º 5, do artigo 10.° e alínea d), do n.º 1, do artigo 703.°, ambos do Código de Processo Civil, pois que fez uma errada interpretação e aplicação destes preceitos legais.

  11. Concluindo, não existem nas atas de assembleia de condóminos apresentadas com o requerimento executivo a fixação dos montantes das contribuições devidas ao condomínio, o prazo de pagamento e a fixação da quota-parte, posto isto, não podem ser consideradas títulos executivos, e, em consequência, não havendo título a ação executiva é nula.” Também a executada e embargante alegou, em resposta, com as seguintes conclusões: “I-Da extemporaneidade da invocação da falta de título executivo I. A própria decisão recorrida é aliena à normal marcha do processo e, em boa verdade, deveria ter sido decidida de forma diversa, declarando a inadmissibilidade e extemporaneidade do requerido II. Com efeito, foi a execução em que se enquadra a decisão recorrida autuada com processo comum ordinário, obrigando a apreciação liminar, onde a alegada questão da inexistência de título deveria ser apreciada (art. 726º, nº2 do CPC) – e, acaso a ora recorrente se inconformasse com o então decidido (que pressupunha a existência de título executivo) deveria, então, ter recorrido do despacho liminar (art. 4º CPC; art 853º, nº3 do CPC) – mas não o fez.

    III. Poderia, outrossim a questão ser suscitada em sede de oposição por embargos (cfr art. 728 º, 731º e 729 dº CPC), por ser um dos fundamentos legalmente previstos – mas os embargos foram apresentados a destempo, e indeferidos.

    IV. Se, como defende a recorrente, a questão da existência ou inexistência do título é de conhecimento oficioso, deveria ter sido interposto recurso da douta decisão sobre os embargos, arguindo a nulidade por omissão de pronúncia (Cfr. art. 615º, nº1 d) e nº 4 do CPC) – mas não o fez V. E porque não interpôs recurso – onde a questão poderia ter sido suscitada - deixou de o poder fazer mais tarde, tendo em conta o carácter preclusivo dos prazos (art. 139º, nº3 do CPC).

    VI. Se alguma crítica merece a douta decisão recorrida, a mesma deverá ser encontrada na violação do disposto no art. 613º, nº1 do CPC, dado ser patente que o tanto o despacho liminar como a douta sentença que incidiu sobre os embargos resultaram em esgotamento do poder jurisdicional do tribunal “ a quo”, nomeadamente sobre a questão da existência de título executivo, e subsistência da pretensão do ora recorrido com base no mesmo.

    VII. Tal poderia é fundamentar recurso do ora recorrido, que do mesmo abdicou, por razões práticas – VIII. O processo é um concatenamento não arbitrário, ordenado e previsível de actos jurídicos, em ordem a um determinado fim, e informado por princípios de auto-responsabilidade dos intervenientes processuais, e de oportunidade (cfr. a esse propósito o douto acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12-03-2015, no processo 756/09.5TTMAI.P2.S1, disponível em http://www.dgsi.pt) – pelo que, aquilo que não foi feito no seu tempo e no seu modo, não pode ser depois objecto de improvisação.

    IX. A existência de um catálogo legal de meios de defesa contra a execução não comporta, sob pena de se comprometerem princípios estruturantes como a boa-fé, cooperação e lealdade processuais, e a celeridade processual, a dedução da questão de inexistência de título por requerimento avulso, e exauridos ou não utilizados os meios de defesa X. Tal entendimento é contrário à noção de segurança jurídica, pelo que a interpretação dos art. 726º e 734º do CPC, no sentido que é sempre lícito, ao executado invocar, e ao tribunal conhecer, a inexistência de título executivo, após o deferimento liminar da execução, ainda que os embargos, tendo sido julgados improcedentes, não tenham visto a respectiva decisão objecto de recurso, é violadora do princípio da igualdade de armas e do direito a um processo equitativo, sendo materialmente inconstitucional, por ofensa aos artigos 2º, 13º e 20º, nº 4 da CRP, tendo de ser desaplicada, o que – reiterando o que já se fez nos autos - se invoca XI. A admissão de tal expediente violaria, ademais, o disposto no art. 6º do RCP, na medida em que permitiria, na prática, a oposição à execução sem pagamento da respetiva taxa de justiça.

    XII. Em suma, a crítica que merece a douta decisão recorrida, é que a mesma não tenha ido no sentido de recusar qualquer pronúncia sobre a pretensão da recorrente, por não ser nem o modo, nem o tempo XIII. Pelo que, até por isso, não poderá o recurso proceder XIV. Contrariamente ao sustentado pela recorrente, em todas as actas aparecem aprovados os...

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