Acórdão nº 461/08.0 GBGMR. G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 03 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelPAULO FERNANDES DA SILVA
Data da Resolução03 de Maio de 2011
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães: --- I.

RELATÓRIO.

--- Em autos de processo comum, com julgamento em Tribunal Singular, o 3.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Guimarães, por sentença datada de 09.12.2010, depositada no mesmo dia, condenou o arguido Joaquim S...

, além do mais, --- «pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo disposto no artigo 152°, n°s. 1, a) e 2, do Código Penal, na pena de 20 (vinte) meses de prisão» cuja execução suspendeu «pelo período de 20 (vinte) meses, subordinada à condição e, em cinco dias, proceder à entrega da quantia de € 1.000,00 (mil euros) à Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV)»; --- «pela prática de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo disposto no artigo 86, n.° 1, c), da Lei n.° 5/2006, na pena de 250 (duzentos e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros)» Cf. volume II, fls. 344 a 363. --- Do recurso para a Relação.

--- Inconformado com a referida decisão, em 11.01.2011 o arguido dela interpôs recurso para este Tribunal, concluindo a respectiva motivação nos seguintes termos: (transcrição) --- «1) O recorrente não pode conformar-se com a sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz a quo, motivo pelo qual interpôs o presente recurso.

2) A sua discordância tem a ver com a qualificação jurídica que o Tribunal a quo fez da interpretação dos factos dados como provados e aceites pelo ora recorrente.

3) O Tribunal a quo, ao condenar o arguido pelo crime de violência doméstica p. e p. pelo art. 152.°, n.° 1 do CP, entendeu que a conduta do arguido revestiu suficiente gravidade para integrar o crime de violência doméstica, o qual era imputado ao arguido na acusação.

4) Assim, ao interpretar os factos dessa forma, qualificou-os a sentença recorrida erradamente, pois estamos perante um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143.°, n.° 1 do CP.

Senão Vejamos: 5) Segundo o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 17/11/2010: “Integra, tão só a prática de um crime de ofensa à integridade física simples p. e p. pelo art. 143.°, n.° 1 do CP, e não um crime de violência doméstica p. e p. pelo art. 152., n.° 1, a agressão com duas bofetadas na cara...não sendo comportamento reiterado, e não revelando uma intensidade, ao nível do desvalor, da acção e do resultado, que seja suficiente para lesar o bem jurídico protegido - mediante ofensa da saúde psíquica, emocional ou moral, de modo incompatível com a dignidade da pessoa humana.” 6) Assim sendo, e da análise dos factos dados como provados, o arguido, agrediu a ofendida, em dois momentos - dias 31 de Maio e 1 de Junho de 2008, 7) No entanto, o crime de violência doméstica visa a protecção da pessoa individual e da sua dignidade humana, sustentando Taipa de Carvalho (in Comentário Conimbricence do Código Penal, Parte Especial, Tomo 1, pág. 332), que o bem jurídico aqui protegido é a saúde – bem jurídico complexo que abrange a saúde física, psíquica e mental, bem jurídico este que pode ser afectado por toda a multiplicidade de comportamentos que afectem a dignidade pessoal do cônjuge.

8) Assim, na descrição típica da violência doméstica, recorre-se, em alternativa , às ideias de reiteração e intensidade, para esclarecer que não é imprescindível uma continuação criminosa.

9) De salientar ainda que, no que respeita à intensidade, ao nível do desvalor, da acção e do resultado, as situações de violência têm de ser aptas para lesar o bem jurídico protegido - mediante ofensa da saúde psíquica, emocional ou moral, de modo incompatível com a dignidade da pessoa humana.

10) Assim, e na linha orientadora do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, não sendo o comportamento do arguido reiterado - o que não foi - efectivaram-se em dois episódios, a agressão em causa não revela uma intensidade, ao nível do desvalor, da acção e do resultado, que seja suficiente para lesar o bem jurídico protegido - mediante ofensa da saúde psíquica, emocional ou moral, de modo incompatível com a dignidade da pessoa humana.

11) Por conseguinte, e na ausência da reiteração e intensidade nas acções levadas a cabo pelo arguido, deveria o mesmo ter sido condenado pelo crime de ofensa à integridade física simples p. e p. pelo art. 143.°, n.° 1 do CP.

12) Desta forma, o Tribunal a quo, ao condenar o arguido pelo crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.°, n.° 1 e 2 do CP, e não condenar o arguido pelo crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143.°, n.° 1 do CP, violou esta norma jurídica.

13) Entende o arguido que a sentença aplicada pelo Tribunal a quo, não teve em consideração, circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, beneficiam o arguido, nomeadamente: a) A ausência de antecedentes criminais; b) A confissão livre dos factos de que vinha acusado, no que concerne às ofensas perpetradas nos dias 31 de Maio e 1 de Junho de 2008; c) O facto de o arguido e a ofendida se encontrarem divorciados; d) O facto de o arguido se encontrar a trabalhar em Espanha desde 2006.

e) O facto de não ter surgido notícias de quaisquer queixas, designadamente por comportamentos violentos; f) O facto da ofendida, ter, inclusivamente expressado a vontade de não prosseguir com o procedimento criminal.

14) Posto isto, tais circunstâncias não foram tidas em consideração pelo Tribunal a quo.

15) A sentença proferida pelo Tribunal a quo é manifestamente prejudicial, e no caso concreto não conseguirá prosseguir os fins a que se propõe, por não fazer corresponder o tipo legal de crime aos factos dados como provados.

16) Sem desconsiderar e a admitir que o arguido tenha praticado os factos dados como provados, mesmo assim, sempre se dirá ser excessiva a pena aplicada ao arguido.

17) Assim sendo, sempre se dirá que, face a tudo quanto resultou provado em audiência de discussão e julgamento, bem como de tudo quanto consta da douta sentença, a decisão e consequente condenação na pena que em concreto foi fixada ao arguido se mostra erradamente aplicada, 18) decisão essa que deveria ser substituída por uma diferente qualificação jurídica, isto é, ao invés do arguido ter sido condenado pelo crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.°, n.° 1 e 2 do CP, deveria o mesmo ter sido condenado pelo crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143.°, n.° 1 do CP, 19) E, uma vez mais, deverá a sentença ora recorrida ser alterada, condenando-se o arguido pelo crime de ofensa à integridade física simples p. e p. pelo art. 143., n.° 1 do CP, e em pena que reflicta este novo enquadramento penal e esta diferente perspectiva dos factos.

20) E, se assim não se entender, diminuir a pena aplicada ao arguido para o mínimo previsto na lei para o crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.°, n.° 1 e 2 do CP, e sem subordinação a nenhuma condição.

Nestes termos e nos mais de direito (…) se requer a alteração da qualificação jurídica do crime de violência doméstica p. e p. pelo art. 152.°, n.° 1 e n.° 2 do CP, pelo crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143.°, n.° 1 do CP, e se assim não se entender, deverá ser diminuída ao mínimo a pena aplicada ao arguido, pelo crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.°, n.° 1 al. a) e n.° 2, sem subordinação a nenhuma condição, com o que V. Exas. Farão, como sempre, um acto de Justiça» Cf. fls. volume II, fls. 364 a 395. ---. --- Notificado do indicado recurso, o Ministério Público respondeu ao mesmo, tendo concluído no sentido de que deve ser mantida a decisão recorrida Cf. fls. volume II, fls. 412 a 414. ---. --- Neste Tribunal, na intervenção aludida no artigo 417.º, n.º 1, do Código...

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