Acórdão nº 50/11.1GBGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 03 de Maio de 2011
Magistrado Responsável | PAULO FERNANDES DA SILVA |
Data da Resolução | 03 de Maio de 2011 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães: --- I.
RELATÓRIO.
--- Nestes autos de processo sumário, o 1.º juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Guimarães, por sentença de 12.01.2011, depositada no mesmo dia, condenou o arguido Manuel F...
, além do mais, --- «pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art. 292°, n° 1, do CP, na pena de 110 (cento e dez) dias de multa, à razão diária de € 7,00 (sete euros), o que perfaz a quantia global de € 770,00; - Nos termos do art. 69°, n.° 1, al. a), do CP, (…) [n]a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período 10 (dez) meses».
Naquela sentença, ficou ainda consignado que --- «O arguido deve entregar a sua carta de condução, no prazo de dez dias a contar do trânsito em julgado da presente sentença, na secretaria do Tribunal ou em qualquer posto policial sob pena de incorrer na prática de um crime de desobediência e da carta ser apreendida (art. 500°, n.° 2, do CPP), advertindo-se ainda o arguido de que não vai receber qualquer outra notificação, nomeadamente via postal, para o efeito» Cf. fls. 22 a 26. ---. --- Do recurso para a Relação.
--- Inconformado com a referida decisão, em 31.01.2011 o Ministério Público dela interpôs recurso para este Tribunal, concluindo a respectiva motivação nos seguintes termos: (transcrição) --- «1.ª- Não se conforma o Ministério Público com a Douta Sentença proferida nos autos, que condenou o arguido, discordando da medida concreta das penas aplicadas, da pena principal e da acessória, R. que tais penas sejam agravadas dada a intensidade da ilicitude retratada no facto, ilicitude “gritante” ( como refere a Sentença ), derivada da elevada TAS.
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- No caso, devia ter sido imposta ao arguido a pena de 4 meses de prisão, suspensa na sua execução por um período de 1 (um) ano, o que se R.
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- No caso, o arguido tinha uma TAS elevadíssima (2,66 gr/litro), sendo significativas as exigências de prevenção geral positiva, as quais fixam o patamar mínimo da pena.
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- A sanção acessória devia ter sido fixada no período de 12 meses, o que se R.
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Não se conforma o Ministério Público com o facto de se ter cominado o incumprimento do dever de entregar a sua carta de condução, no prazo de dez dias a contar do trânsito em julgado da presente sentença, na secretaria do Tribunal ou em qualquer posto policial, com a prática do crime de desobediência.
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- Essa ordem não é legítima e não tem fundamento legal, tendo sido efectuada em momento processual anterior àquele a que alude o art 500.º 2 CPP.
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- O preceito que regula a execução da proibição de conduzir não sanciona com o crime de desobediência a falta de entrega da carta de condução; a notificação que é feita ao arguido para no prazo de 10 dias a contar do trânsito em julgado da sentença, entregar o título de condução, tem apenas um carácter informativo, não integrando uma ordem; não há, nem pode haver, qualquer cominação da prática de crime de desobediência.
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- A entrega da carta de condução pelo condenado na inibição deve ser efectuada em duas fases distintas, a fase de cumprimento espontâneo e a fase do cumprimento coercivo.
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- O cumprimento espontâneo consiste na possibilidade de o inibido de conduzir entregar a carta de condução durante o período a que se refere o art° 500°, n° 2 do CPP.
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- Após o decurso daquele cumprimento espontâneo sem que o inibido de conduzir entregue a carta, segue-se o cumprimento coercivo no qual a autoridade deve notificar aquele inibido de conduzir para entregar a carta de condução com a cominação de que não o fazendo incorre na prática do crime de desobediência, p. e p. pelo art° 348°, n°1, al. b) do Código Penal, procedimento aliás previsto no art° 160°, n° 3 do Código da Estrada, revisto e republicado pelo DL n° 44/2005 de 23/02.
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A sentença contém, salvo o devido respeito, ordem ilegal e desproporcional, devendo-se ter essa cominação como ineficaz e inoperante.
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A douta sentença violou os arts 70.º, 71.°, 47.°, 50.°, 69.°, 1 a) e 292.° do CP, art 500.°, 1 e 2 CPP, arts 348º e 353° CP, e 160.º, n.° 3 CE e deve ser revogada nos termos propostos, já que as disposições citadas foram incorrectamente interpretadas.
R. se dê provimento ao recurso, revogando-se a Douta Sentença impugnada, impondo-se as penas propostas, o que se R. e declarando-se ineficaz ou inoperante a aludida advertência e cominação contida na sentença.
Deste modo farão V.ªs Ex.cias, como habitualmente, Justiça» Cf. fls. 29 a 56. ---. --- Notificado do indicado recurso, o arguido respondeu ao mesmo, tendo concluído nos seguintes termos: (transcrição) «1 - A Douta Sentença recorrida entendeu como suficiente e adequada a aplicação da pena de multa de 110 dias, no valor global de € 770, e da sanção acessória de dez meses de inibição de condução, considerando que o arguido é primário, está integrado em sociedade, confessou os factos e mostrou arrependimento.
2 - Com efeito, ficou provado que o arguido, que tem a 3.ª classe de escolaridade, vive com os seus pais e irmã. É pedreiro e aufere mensalmente a quantia de € 600, e paga a título de prestação para aquisição do ciclomotor identificado nos autos, a quantia mensal de € 100.
3- Assim, a pena de multa no valor de € 770, em que o arguido foi condenado será para si um sacrifício pagar, e servirá de intimidação suficiente saber que, acaso a não consiga pagar terá de cumprir pena de prisão.
4 - O arguido é primário, confessou os factos e mostrou-se arrependido.
5 - Está integrado em sociedade, e já sente as consequências dos seus actos em forma de censura familiar e social.
6 - E como só aufere € 600 mensais, o arguido será obrigado a abdicar de certos bens para poder pagar a multa de € 770.
7- O arguido, que tem somente a 3.ª classe de escolaridade, é uma pessoa simples e humilde e a mera possibilidade de ter de cumprir pena de prisão acaso não consiga pagar a multa, é motivo de receio e vergonha.
8 - Para além disto, ao logo de dez meses, o arguido terá de encontrar soluções alternativas de transporte. Pelo que, durante cerca de 300 dias, todos os dias da semana, o arguido dependerá de terceiros para ir para o seu local de trabalho, ou estará limitado pelos horários de transportes públicos, o que servirá de tempo suficiente para reflexão sobre os seus actos e prevenção de futuras práticas.
9 - Assim, e salvo melhor entendimento, as penas aplicadas pela Douta Sentença recorrida, satisfazem as finalidades de punição servindo de censura suficiente e eficaz, pelos factos perpetrados.
10 - Pelo que, deverá manter-se nos seus precisos termos.
Fazendo assim, V.ªs Ex.ªs, como sempre, a melhor Justiça» Cf. fls. 59 a 64. ---. --- Neste Tribunal, na intervenção aludida no artigo 417.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, o Ministério...
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