Acórdão nº 4068/07.0TDPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Dezembro de 2010

Magistrado ResponsávelCRUZ BUCHO
Data da Resolução14 de Dezembro de 2010
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães: * No 3º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Guimarães, no âmbito do Processo Comum Singular nº 4068/07.0TDPRT. o arguido Hugo G..., com os demais sinais dos autos, foi acusado da prática, em autoria material, de um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelos art.os 137.º, n.º 1 e 15.º, al. b), do Código Penal e uma contra-ordenação, prevista nos artigos 13.°, 19.°, 24.°, 25.°, al. f), 133.° e 145.°, n.º 1. al. e), todos do Código da Estrada*Os ofendidos Manuel R... e Maria E... deduziram pedido de indemnização civil contra a Companhia de Seguros X, pedindo a condenação desta no pagamento da quantia global de € 202.156,50, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

Realizado o julgamento foi proferida sentença, em 1 de Fevereiro de 2010, a qual, para além do mais, decidiu condenar o arguido pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio por negligência p. e p. pelo art.º 137.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 15 (quinze) meses de prisão; suspensa na sua execução pelo período de 15 (quinze) meses, com a condição, no prazo de 6 meses a contar do trânsito em julgado da decisão, entregar nos Bombeiros Voluntários de Guimarães a quantia de € 1.200,00, devendo comprovar no processo e naquele prazo tal entrega; No que concerne ao pedido de indemnização civil foi, para além do mais, decido (transcrição): A. Julgo parcialmente procedente, por parcialmente provado, o pedido de indemnização civil formulado pelos demandantes Manuel R... e Maria E... Maria A... e, em consequência, condeno a demandada Companhia de Seguros X a pagar-lhes: 1. a quantia de € 2.156,50 referente às despesas suportadas com o funeral, acrescida de juros à taxa legal, desde a notificação do pedido; 2. a quantia global de € 140.000,00, por danos não patrimoniais, acrescida de juros à taxa legal, contados a partir da data da presente sentença.

*Inconformada com tal decisão a demandada Companhia de Seguros X dela interpôs recurso rematando a sua motivação comm as seguintes conclusões que se deixam transcritas: «i. O recurso ora interposto é apresentado na firme convicção de que a matéria de facto apurada nestes autos impunham ao Tribunal a quo a adopção de uma decisão diferente da proferida.

ii. Salvo o devido respeito, que é muito, a Apelante entende que a Meritíssimo Juiz a quo fez uma incorrecta aplicação do direito aos factos dados como provados no que respeita à responsabilidade da ofendida na produção do sinistro.

iii. O acidente dos autos ocorreu na Estrada Nacional 207 ao km 67,800, na localidade de Arosa, no local em que a referida estrada é composta por duas hemi-faixas de rodagem, uma para cada sentido de trânsito, com uma largura total de 5,9 metros.

iv. O veículo 38-FB-41, segurado na Apelante, circulava na referida via pela sua hemi-faixa de rodagem, no sentido Fafe-Porto D' Ave.

  1. Atento o sentido de marcha do FB, o traçado no local do embate descreve uma curva à direita, com inclinação descendente, precedida de uma recta numa distância não apurada.

    vi. Momentos antes do acidente, no lado direito do sentido de marcha daquele, na parte final da curva supra descrita, a vítima, Kathy R..., iniciou a travessia da hemi-faixa de rodagem por onde circulava o FB (cfr. artigos 7. o da matéria de facto dada como provada).

    vii. Sendo que o fez no local em as duas hemi-faixas de rodagem estão delimitadas por uma linha longitudinal continua, fora de uma passagem especialmente sinalizada para esse efeito, sem previamente se certificar de que o podia fazer sem perigo de acidente e sem se assegurar de que não circulavam quaisquer veículos na referida via, in casu o FB.

    viii. A infeliz vítima, com a conduta supra descrita, interpôs-se na linha de trânsito FB, violando o disposto nos artigos 99.º e 101.º do Código da Estrada.

    ix. Sendo que, imediatamente antes do embate, e quando o veículo FB terminou de descrever a curva à sua direita, o mesmo se deparou com a sinistrada totalmente atravessada na hemi-faixa de rodagem, a cerca de 1,90 metros do limite direito da hemi-faixa de rodagem daquele.

  2. Pelo exposto, entende a ora Apelante que a conduta descuidada da infeliz, Kathy R..., concorreu para a ocorrência do acidente, em proporção que se valoriza em 50%.

    xi. Por tudo isto, entende a ora Apelante que deveria o Tribunal a quo ter ponderado a divisão de responsabilidades na produção do acidente e, sempre, o grau de culpa da lesada na produção ou agravamento dos danos.

    xii. Pelo que, sempre com o devido respeito, a ora Apelante entende que a indemnização concedida pelo Tribunal a quo deverá ser reduzida, tudo nos termos e para os efeitos do artigo 570.º do Código Civil.

    xiii. Pelo exposto, a douta sentença recorrida deve, por conseguinte, ser revogada e substituída por um outra em que se pondere a culpa de ambos os intervenientes no acidente, em idêntica proporção de 50% para cada um deles.

    Mais se refira que, xiv. A douta decisão recorrida condenou a Apelante pagar aos Apelados, pela privação do direito à vida da sinistrada, a quantia de € 75.000,00 (setenta e cinco mil euros).

    xv. Tomados em consideração os factos dados como provados, entende a Apelante que esse valor é excessivo.

    xvi. Ora, atendendo que o prejuízo para todos os seres humanos é mesmo a indemnização deve ser a mesma para todos.

    xvii. Assim, e atendendo aos padrões que são adoptados pela nossa jurisprudência, a Apelada entende que será justo e equilibrado fixar esse montante indemnizatório em C 50.000,00 (cinquenta mil euros) e, por conseguinte, a douta sentença recorrida deverá ser revogada e substituída por uma outra em que se reduza para C 50.000,00 (cinquenta mil euros) a indemnização devida aos Apelados a título de dano vida.

    Acresce que, xviii. A sentença recorrida fixou em € 50.000,00 (cinquenta mil euros) a indemnização a arbitrar aos Apelados pelos danos morais com a morte da filha; contudo a ora Apelante entende que o montante arbitrado pelo douto Tribunal a quo, salvo melhor opinião, é manifestamente excessivo.

    xix. Assim, e ponderando a tendência jurisprudencial, a ora Apelante considera ajustada a atribuição aos Apelados duma indemnização no montante de € 30.000,00 (trinta mil euros).

    xx. Assim sendo, a douta sentença deve, por conseguinte, ser revogada e substituída por uma decisão em que se reduza para C 30.000,00 (trinta mil euros) a indemnização devida aos Apelados a título dos danos morais por si sofridos.

    Face a todo o exposto, xxi. O acidente, salvo o devido respeito por opinião contrária, também se deu por culpa grave da lesada, porquanto a sua conduta concorreu determinantemente para ocorrência do acidente.

    xxii. A indemnização concedida pelo Tribunal a quo deverá ser reduzida, tudo nos termos e para os efeitos do artigo 570.° do Código Civil.

    xxiii. E por conseguinte a douta sentença recorrida deve ser revogada e substituída por um outra em que se prepondere as culpas de ambos os intervenientes no acidente.

    Sem prescindir, xxiv. A douta sentença viola o disposto nos artigos 483.º e seguintes, 496.°, 562.° e seguintes e 473.º e seguintes todos do Código Civil.» *Os demandantes responderam ao recurso, pugnado pela manutenção do julgado.

    *O recurso foi admitido, para o Tribunal da Relação de Guimarães, por despacho constante de fls. 626.

    *Colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência.

    * II- Fundamentação 1.

    É a seguinte a factualidade apurada no tribunal a quo: A) Factos provados (transcrição) 1) No dia 06 de Agosto de 2007, pelas 17H00, o arguido conduzia o veículo ligeiro de passageiros, de matrícula 38-...-41, na Estrada Nacional 207, Km 67,800, Arosa, área desta comarca de Guimarães, no sentido Fafe/Porto D'Ave; 2) A referida E.N. é composta por duas hemi-faixas de rodagem, uma para cada sentido de trânsito, delimitadas de quando em vez por linha longitudinal contínua; 3) Cada hemi-faixa de rodagem, por sua vez, é marginada com berma ou valeta contígua, sem passeio; 4) Atento o sentido de marcha do arguido (Fafe/Porto D'Ave), o traçado da via no local do embate descreve uma curva à direita, com inclinação descendente, precedida de uma recta numa distância não apurada, encontrando-se o pavimento de asfalto betuminoso em estado regular de conservação; 5) Nas circunstâncias de tempo e lugar referidas em 1), no início da localidade de Arosa, atento o sentido de marcha do veículo conduzido pelo arguido, e a cerca de 550 metros do local do embate, existia sinalização vertical de proibição de exceder a...

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