Acórdão nº 181/08.5GTBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Dezembro de 2010
Magistrado Responsável | PAULO FERNANDES SILVA |
Data da Resolução | 14 de Dezembro de 2010 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães: --- I.
RELATÓRIO.
--- Nestes autos de processo comum, com julgamento em Tribunal Singular, o 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Barcelos, por sentença datada de 18.05.2010, depositada no dia subsequente àquele, condenou a arguida Laurinda B...
, além do mais, --- - «Pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelo art° 137°, n° 1 do Cód. Penal, em concurso aparente com as contra-ordenações p. e p. pelos art°s 35° e 44° do Cód. da Estrada, na redacção decorrente do Dec L. n° 44/2005, na pena de 6 [seis] meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 [um] ano»; --- - «Na sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 8 [oito] meses, nos termos das disposições conjugadas dos art°s 136°, n°s 1 e 3, 138°, n° 1, 145°, n° 1, al. f) e 147°, n°s 1 e 2 do CE, na redacção decorrente do Dec. L. n° 44/2005». --- Nos termos da referida sentença, o pedido de indemnização civil formulado por Manuel C... e Maria C... contra a Z... — Companhia de Seguros S.A.
, foi julgado parcialmente procedente e, em consequência, aquela seguradora foi condenada a pagar àqueles a quantia global de € 111.993,00 [cento e onze mil, novecentos e noventa e três euros], acrescida de juros de mora, à taxa legal, a contar da notificação para contestar a correspondente pretensão e até efectivo e integral pagamento» Cf. volume II, fls. 408 a 444 dos autos. ---. - Do recurso para a Relação.
--- Inconformados com a referida decisão, a arguida e a demandada cível Z... interpuseram recurso para este Tribunal, concluindo a respectiva motivação nos seguintes termos (transcrição): --- - Quanto à arguida: --- «1.º A arguida levou a efeito a manobra de mudança de direcção (para a sua esquerda).
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Fazendo-o após accionar o sinal pisca-pisca, indicativo dessa pretendida manobra.
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No momento em que a iniciou circulava, em sentido contrário ao seu veículo, o motociclo matricula ...-34-UR, a cerca de 600 metros.
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A arguida quando executava a manobra em causa foi embatida com a frente do motociclo verificando-se o embate a 120 km/hora (velocidade do motociclo).
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A arguida devia acautelar-se mais cuidadosamente, pese embora a distância do motociclo, quando iniciou a manobra de mudança de direcção.
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Verdade é que o mesmo motociclo circulava dentro de uma localidade, devidamente sinalizada e com imposição de não exceder os 50 km/hora.
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Se tais dados fossem respeitados, e pese embora a conduta da arguida, o acidente não teria ocorrido ou ocorreria sem as consequências que advieram.
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Como consequência, a arguida foi condenada nos termos constantes da douta sentença, com pena suspensa na sua execução.
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Sendo-lhe porém, aplicada a sanção de inibição de conduzir pelo período de oito meses.
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A mesma arguida é delinquente primária, colaborando inteiramente com a justiça para a descoberta da verdade.
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Carece da carta de condução para granjear no seu dia a dia o sustento do agregado familiar.
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O acidente não ocorreu por forma a que a censura e ameaça da situação praticada lhe não cheguem para que no dia a dia da estrada passe a ter mais cuidado.
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Ou seja, não se podendo esquecer que melhor conduta poderia eventualmente ter verificado, a verdade é que a 600 km/hora um motociclo podia e devia circular dentro das mais elementares regras do Código da Estrada.
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Erro de cálculo ou confiança na execução da manobra, que se não podem de todo aceitar, mas a mesma certeza de que a vítima teria galgar 600 metros naquela a via (matéria aceite) e ela arguida, apenas 6 metros e 50 centímetros, (largura da faixa de rodagem).
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O que soi dizer que à arguida legítima é requerer, que lhe seja igualmente suspensa aquela pena de oito meses de inibição de conduzir.
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O que lhe é facultado ante o preceituado no artigo 69° n° 1 al. a) do Código Penal, como diploma principal que não a natureza administrativa do artigo 141° do Código da Estrada.
Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, e a douta sentença recorrida ser alterada na parte em que condena a arguida em 8 meses de inibição de conduzir, alterando-a por outra decisão que suspenda a mesma pena acessória por tempo que o Digno Tribunal melhor o entenda e será feita Justiça» Cf. volume II, fls. 453 a 460. ---. --- - Relativamente à demandada Z...: --- «1 - Perante a Factualidade Assente (cc, dd, hh, c e d, a, e, f, g, h, i, bb, j e n), o acidente ficou a dever-se exclusivamente ao excesso de velocidade a que circulava o motociclo.
2 - Este veículo, sendo proibido ao seu condutor exceder a velocidade de 5Okm/h, circulava numa recta plana com a extensão de 1.500 m, no interior de localidade, a velocidade compreendida entre os 126 km/h e os 142 km/h e colidiu com o veículo ...-69-SI, conduzido pela arguida, à estonteante velocidade de l2Okm/h.
3 - A arguida iniciou a manobra de mudança de direcção à esquerda quando o motociclo distava do veículo por si tripulado, no máximo, 61,5 metros.
4 - O condutor do motociclo, falecido no acidente, percepcionou a execução de tal manobra, tendo accionado os seus órgãos de travagem a 28,5 metros de distância do ponto onde ocorreu o embate.
5 - Antes de accionar os travões, o condutor do motociclo teve tempo de reflexo ou de reacção, o qual está calculado em 3/4 de segundo.
Por isso, à distância de travagem referida na conclusão 4 deve aditar-se a distância percorrida nesse tempo pelo motociclo à velocidade de 126 Km/h e à de 142 Km/h.
6 - À velocidade de 126 Km/h a distância percorrida naquele tempo é de 26,25m e à de 142 Km/h é de 29,58m.
7 - Por consequência, o condutor do motociclo percepcionou o veículo SI a executar a manobra de mudança de direcção à esquerda à distância de 54m ou de 58 metros, consoante se considere a velocidade de 126 Km/h ou a de 142 Km/h.
8 - E, mesmo assim, colidiu o motociclo no ligeiro de mercadorias à velocidade de 120 Km/h.
9 - Se o motociclo circulasse à velocidade legal de 50 Km/h e circulando o ligeiro de mercadorias, quando realizava a manobra de mudança de direcção à esquerda, à velocidade de 12,5 Km/h, o motociclo teria percorrido a distância de 54 metros em 3,96s e em igual tempo o ligeiro de mercadorias teria percorrido 13,75m.
Quer dizer que o veículo SI já circularia na via entroncante quando o motociclo atingisse a zona do entroncamento.
10 - E estando o veículo SI, quando a arguida iniciou a manobra de mudança de direcção à esquerda, à distância de 61,50 metros do motociclo, mais dentro da via entroncante estaria o SI se o motociclo circulasse à velocidade de 50 Km/h.
11 - O excesso de velocidade a que circulava o motociclo - mais do dobro e quase o triplo da legal - foi a causa exclusiva pela produção do acidente.
12 - Se circulasse à velocidade de 50 Km/h teria o seu condutor conseguido imobilizá-lo, ainda antes do embate. Aliás, face às conclusões 3, 4 e 5, nem sequer precisava de o imobilizar.
13 - O condutor do motociclo circulava imprudentemente, com excesso de velocidade e velocidade excessiva, desadequada para o local.
14 - Circulava deliberadamente a uma velocidade compreendida entre os 126/142 Km/h e sabia que transitava numa localidade e em troço de estrada assinalada com os sinais verticais de proibição de exceder a velocidade máxima de 50 Kmn/h.
15 - O Código da Estrada, o seu Regulamento e a prudência exigiam-lhe que conduzisse a não mais que 50 Km/h.
16 - Por seu lado, a arguida não foi responsável pelo acidente. Não viu o motociclo e não imobilizou o SI, por isso. O que tem uma explicação. O motociclo aproximou-se num ápice do SI, dada a alta velocidade a que rodava e por a visão da arguida ao direccionar para a esquerda estar mais dirigida para esse lado do que para o do sentido Barcelos/Braga.
17 - Nenhuma testemunha disse que a arguida conduzia de forma descuidada, nem esta o afirmou.
18 - Também ninguém se referiu ao que consta sob as alíneas aaa e bbb da Factualidade Assente.
19 - Por isso, se impugna, nos termos do art° 412°, 3, do Cód. Proc. Penal, tal factualidade, bem como a factualidade constante sob a alínea ii.
20 - De todo o modo, se se entender que a arguida conduzia de forma descuidada e em violação do disposto nos arts. 35°, 1, e 44° do Cód. da Estrada, há-de ter-se como bem mais elevada a culpa do condutor do motociclo, por isso que, circulando a uma velocidade compreendida entre os 126/142 Km/h, desencadeou o acidente.
21 - A sua conduta é muito mais censurável que a da arguida; a circunstância de ter o motociclo colidido com o SI à velocidade de 120 Km/h e ter deixado, antes do embate, no pavimento da estrada, 28,50 metros de rastos de travagem, foi, de resto e também, causa de agravamento das respectivas consequências.
22 - A ter havido concorrência de culpas a parcela a atribuir à arguida não deve ser superior a 20%.
23 - Quanto à indemnização pela perda do direito à vida a mesma, segundo orientação preconizada na portaria n° 377/2008, de 28 de Maio, não passaria de 40.000€.
24 - E, olhando para tal portaria, os danos morais sofridos pelos demandantes não deveriam ser compensados por montante superior a 12.500€ para cada um.
25 - Sobre aquela indemnização e estas compensações incidiriam juros legais, mas só a partir da data da decisão, por isso que tais montantes estão actualizados.
26 - Quanto à atribuição de indemnização de 5.000€ não há fundamento para a mesma.
27 - A douta sentença recorrida violou o disposto nos arts. 25°, 1, c), 27°, 1, ambos do Cód. Estrada, 24°, C13 do RST aprovado pelo Dec. Reg. 22-A/98, de 1 de Outubro, 483°, 505° e 570° do Cód. Civil e 410°, 2, c, e 412°, b, do Cód. Proc. Penal.
Deve ser revogada a douta sentença recorrida, absolvendo-se a ora recorrente do pedido ou, então, entendendo-se que a arguida também contribuiu com culpa para a produção do acidente, julgar-se atendendo às Conclusões 20 a 26, supra. Assim se fará Justiça» Cfr. volume II, fls. 466 a 478. --- Notificado dos recursos, o Ministério Público a ele respondeu...
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