Acórdão nº 430/15.3T9LAG.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelMOREIRA DAS NEVES
Data da Resolução24 de Janeiro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

I – RELATÓRIO a. No 2.º Juízo (1) Local de …, do Tribunal Judicial da comarca de …, procedeu-se a julgamento em processo comum de AA, nascido a … de 1970, com os demais sinais dos autos, a quem foi imputada a prática, como autor, de um crime de falsas declarações, previsto no artigo 348.º-A, § 1.º e 2.º do Código Penal (CP)

Realizada a audiência de julgamento o Tribunal veio a ser proferida sentença, pela qual se condenou o arguido pela prática de um crime de falsas declarações, previsto no artigo 348.º-A, § 1.º e 2.º CP, na pena de 200 dias de multa, à razão diária de 5€

b. Inconformado com o decidido o Ministério Público apresentou recurso, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões: «2. O Ministério Público não se conforma com a pena aplicada na douta sentença condenatória, por entender que a sentença é nula por existir contradição insanável entre a fundamentação e a decisão nos termos do disposto no artigo 410.º, n.º 1 e 2 b) do CP

  1. O Tribunal a quo deu como provados todos os factos constantes da acusação pública, assim como o teor do Certificado de Registo Criminal do arguido

  2. Destarte, aquando da sua fundamentação da matéria de Direito, o mesmo Tribunal a quo, entendeu que “no caso ajuizado, cumpre destacar que não obstante os antecedentes criminais conhecidos ao arguido importa ter presente que as condenações averbadas no seu registo criminal o foram (todas elas) por crimes de diferente natureza ao que o arguido ora se mostra incurso. Além disso, verifica-se que as condenações averbadas no registo criminal do arguido remontam aos anos de 1991, 1992, 1999, 2005, 2006, 2009 e 2010, o que face à Lei n.º 37/2015, de 5 de maio, não poderá ser valorado.” 5. Ora, segundo o Tribunal a quo se por um lado os antecedentes criminais do arguido são todos dados como provados, por outro lado não podem ser valorados, incorrendo, claramente, em contradição insanável entre fundamentação e decisão, sendo a sentença nula

  3. Dispõe o artigo 40.º, n.º 1, do Código Penal, que a aplicação de penas visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade. As finalidades das penas, na previsão, na aplicação e na execução, são, assim, na filosofia da lei penal, a proteção de bens jurídicos e a integração do agente do crime nos valores sociais afetados

  4. Por seu lado, a finalidade de reintegração do agente na sociedade há de ser em cada caso prosseguida pela imposição de uma pena cuja espécie e medida se mostre adequada e seja exigida pelas necessidades de ressocialização do agente, ou pela intensidade da advertência que se revele suficiente para realizar tais finalidades, de forma a que tal pena seja um instrumento de atuação preventiva sobre o agente do crime, com o fim de evitar que ele cometa novos crimes

  5. Na graduação da pena deve olhar-se para as funções de prevenção, quer de ordem geral – com o objetivo de confirmar os bens jurídicos violados –, quer de ordem especial – tendo em vista gerar condições para a readaptação do agente do crime, de modo a evitar que este volte a violar tais bens –, mas sem se perder de vista a culpa do agente – com atendimento das circunstâncias estranhas à tipicidade –, que a medida da pena tem como base e limite

  6. No caso concreto, as exigências de prevenção geral são muito elevadas, pois o arguido, com a sua conduta, atingiu valores fundamentais e imprescindíveis à vida em comunidade, uma vez que se coloca em causa a autoridade de que foram investidos os OPC e a descredibilização das suas funções, sempre que as mesmas não são respeitadas, antes usadas para fins ilícitos

  7. Os nossos tribunais não podem descurar as elevadas exigências de prevenção geral, na medida em que esta incriminação carece de um maior enraizamento na consciência comunitária, sendo premente a proteção do bem jurídico em causa, através da revalidação e consolidação desta norma incriminadora

  8. Relativamente às necessidades de prevenção especial, que relevam ao nível da necessidade da pena, enquanto medida dissuasora da prática de novos ilícitos, são, também, acentuadas, pois o arguido já conta com vários antecedentes criminais no seu Certificado de Registo Criminal, existindo penas que não se encontram extintas, encontrando-se inclusivamente a cumprir pena de prisão atualmente

  9. Perante este quadro, entendemos que a pena de multa de 200 dias é desajustada e não satisfaz as prementes necessidades de prevenção geral e as elevadas exigências de prevenção especial que, no caso, se fazem sentir, afigurando-se justo condenar o arguido numa pena prisão, eventualmente suspensa na sua execução e, de medida não inferior a um ano, que não vai além da culpa, e será adequada a dar satisfação às exigências de prevenção que no caso se fazem sentir

  10. Nestes termos, há também clara violação das disposições conjugadas nos artigos 40.º, 70.º, 71.º e 348.º-A do CP

    TERMOS em que deve ser dado provimento ao recurso, sendo revogada a sentença condenatória e substituída por outra que, acolhendo o entendimento expresso neste Recurso condene o arguido pela prática do crime de falsas declarações, previsto e punido, nos termos do disposto no artigo 348-º-A, n.ºs 1 e 2 do CP, numa pena de prisão, eventualmente suspensa na sua execução e em medida não inferior a um ano, fazendo-se, desta forma, a desejada e costumada justiça.» c. O recurso foi recebido, não tendo o arguido a apresentado resposta ao mesmo

    d. Subidos os autos o Ministério Público junto deste Tribunal da Relação pronunciou-se manifestando a sua total adesão aos fundamentos constantes das alegações de recurso

    e. No exercício do contraditório relativamente ao aludido parecer o arguido - que não havia contra-alegado - veio manifestar a sua discordância relativamente ao mesmo

    Efetuado exame preliminar e colhidos os vistos legais, cumpre agora, em conferência, apreciar e decidir

    II – FUNDAMENTAÇÃO 1. Delimitação do objeto do recurso O objeto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraiu da respetiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (artigos 403.º, § 1.º, 410.º, § 2.º e 412.º, § 1.º CPP). E, nessa sequência, verificamos que o recurso suscita as seguintes questões: - vício da decisão recorrida (contradição insanável entre a fundamentação e a decisão); - erro do julgamento de direito quanto à da espécie de pena

  11. Na sentença recorrida julgaram-se provados os seguintes factos: «1. No dia 20 de Março de 2015, pelas 21h35m, na Avenida …, junto ao Posto de Combustíveis da …, em …, quando o Agente da PSP, BB se encontrava no exercício das suas funções de Agente de Trânsito, devidamente fardado, identificado e em viatura policial caracterizada, abordou o condutor do veículo automóvel de matrícula …, da marca …, azul, em virtude de tal veículo ter sido detetado em circulação pelo sistema informático PAGIS - Polícia Automático que equipa a viatura de trânsito da PSP, encontrando-se penhorado para garantia do pagamento de dívidas fiscais no âmbito do processo de execução fiscal nº …, do Serviço de Finanças de …, e circulava sem seguro de responsabilidade civil obrigatório; 2. Quando abordou o condutor desse veículo, este declarou não ser portador de qualquer documento de identificação e identificou-se como sendo: CC, nascido em …1978, solteiro, canalizador, de momento desempregado, filho de DD e de EE, nascido em França, residente no Bairro …, no …; 3. Estes elementos de identificação foram confirmados no sistema informático da PSP, os quais já se encontravam ali...

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