Acórdão nº 0116/22.2BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelANÍBAL FERRAZ
Data da Resolução18 de Janeiro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa; # I.

A autoridade tributária e aduaneira (AT), com cobertura do disposto pelos artigos (arts.) 25.º n.ºs 2 a 4 e 26.º do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAMT).) e 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), interpôs, para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, recurso, objetivando uniformização de jurisprudência, da decisão proferida, no âmbito de pedido de pronúncia arbitral, formulado no processo nº 587/2021-T, do Centro de Arbitragem Administrativa (caad), que, além do mais, decidiu julgá-lo totalmente procedente e anular “as liquidações em crise” (“liquidações adicionais de IRS n.º 2021 ..., relativa ao contribuinte número ..., n.º 2021..., relativa ao contribuinte número ..., n.º 2021..., relativa ao contribuinte número ... e n.º 2021..., relativa ao contribuinte número ..., todas referentes ao ano de 2019, bem como as liquidações de juros compensatórios”.).

Aponta-lhe contradição/oposição, com o decidido no acórdão, do STA, datado de 16 de setembro de 2020, proferido no processo nº 2256/19.6BEBRG.

A recorrente (rte) apresentou alegação, finalizada com as seguintes conclusões: «

  1. Vem o presente recurso por oposição de acórdãos interposto do acórdão arbitral de 26/07/2021, proferido no Proc. 587/2021-T (CAAD), que anulou os atos de liquidação visados na impugnação arbitral, com fundamento na falta de fundamentação da notificação que, em processo de divergências, transmitiu aos Recorrentes a decisão de correção dos valores declarados em sede de IRS (liquidações oficiosas).

  2. A decisão arbitral recorrida está em oposição com o acórdão, já transitado em julgado, proferido pelo STA, a 16/09/2020, Proc.º 2256/19.6BEBRG (publicado em http://www.dgsi.pt), no que se refere à interpretação do nº 1 do art. 37º do CPPT e aos efeitos legais da validade e eficácia da notificação, decorrentes do uso, ou não, da faculdade aí prevista.

  3. Ambas as decisões – recorrida e fundamento – pronunciam-se expressamente sobre a aplicação do nº 1 do art. 37º do CPPT, a uma matéria de facto similar, perfilhando interpretações opostas quanto às consequências legais da notificação, no caso do contribuinte não recorrer da faculdade prevista no nº 1 do art. 37º do CPPT para suprir deficiências de fundamentação.

  4. O art. 37º, nº 1 do CPPT permite ao contribuinte requerer a notificação dos elementos que não lhe foram facultados em devido tempo. Ou seja, perante uma notificação que não integra todos os elementos necessários ao exercício de defesa do contribuinte, este, nos termos daquele preceito legal, pode requerer esses elementos em falta, sem ficar prejudicado o prazo para reclamação, recurso ou impugnação.

  5. Sobre o cumprimento do dever de fundamentação da AT, sindicado nas notificações remetidas aos ora Recorrentes, em sede de processo de divergências, nas quais foi transmitida a decisão de correção das liquidações de IRS/2019, veio a decisão recorrida a pronunciar-se, concluindo pela violação do mencionado dever de fundamentação, debruçando-se, face ao expendido pela AT, sobre a aplicação do art. 37º do CPPT. Lê-se no Sumário da decisão: “3. O art. 37.º do CPPT concede ao contribuinte uma faculdade para os casos em que a comunicação do acto enferme de algumas deficiências; não lhe impõe um comportamento com vista a permitir à AT fundamentar a posteriori um acto que não esteja devidamente fundamentado.

    ” f) Com o antecedente fundamento, e tendo entendido que as notificações continham uma fundamentação insuficiente, o tribunal arbitral concluiu pela ilegalidade das correções/liquidações transmitidas por aquelas mesmas notificações.

  6. Para a decisão arbitral o recurso ao art. 37º do CPPT, apenas pode ter efeitos na validade das notificações (permitindo à AT suprir as deficiências da notificação) se o contribuinte fizer uso da faculdade aí prevista. Caso contrário, e porque é uma mera faculdade, a deficiência da fundamentação da notificação não é suprida, com as consequências legais daí advindas para o ato notificado – no caso, a anulação das liquidações por vício de falta de fundamentação, como foi o caso.

  7. O acórdão fundamento foi proferido em sede de apreciação de um recurso apresentado contra uma sentença que julgou improcedente a impugnação de uma decisão de derrogação do sigilo bancário, e na qual o tribunal a quo ao apreciar uma alegada falta de fundamentação da notificação de prorrogação do prazo do procedimento inspectivo entendeu que essa falta de fundamentação, a existir, poderia ter sido suprida pelo contribuinte ao abrigo do nº 1 do art. 37º do CPPT. Se o contribuinte não fez uso dessa faculdade, as irregularidades da notificação ficaram sanadas.

  8. Delimitando as questões a dirimir, o acórdão fundamento sobre a primeira questão tratada, “se teve lugar a caducidade do procedimento inspetivo, em especial por falta de fundamento legal para a respetiva prorrogação”, face ao invocado erro de julgamento sobre a alegada falta de fundamentação da notificação que comunicou essa prorrogação, veio dizer o seguinte: “III. Julgamos que não assiste razão à Recorrente.

    Desde logo porque, tendo-se verificado uma irregularidade de notificação e podendo aceder ao teor completo do despacho de prorrogação do procedimento inspectivos e seus respectivos fundamentos – valendo-se da faculdade que lhe assiste nos termos do artigo 37.º do CPPT – optou a Recorrente por não o fazer.

    (…) Ora, se é certo que a Recorrente – como a própria reconhece – não é obrigada a socorrer-se à faculdade do mencionado artigo 37.º, tão pouco faz sentido que se possa valer do vício da, por si alegada, mas manifestamente inexistente, falta de fundamentação (que é, na verdade, uma mera deficiência de notificação – uma vez que a Recorrente parece confundir o ato a notificar e o acto de notificação) daquela decisão de prorrogação que podia ser, por esta via, facilmente suprido. Tem, assim, lugar uma sanação da mencionada falta de notificação, como bem sublinha JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e Processo Tributário – Anotado, Volume I, 6.ª edição, 201, p. 352: “Por isso, a única interpretação que confere sentido útil à inclusão daquelas referências à reclamação e á impugnação, parece ser a de que se, não for requerida a notificação dos requisitos omitidos, no prazo referido no n.º 1, a omissão deixa de ser relevante para afectar a produção de efeitos do acto de notificação e, consequentemente, ficará assegurada a eficácia do acto notificado.” No mesmo sentido veja-se SERENA CABRITA NETO ET AL., Contencioso Tributário, Volume I, 2017, p. 297: “se o destinatário do acto não utilizar o mecanismo previsto no artigo 37º do CPPT sana-se a irregularidade da notificação. ... Sanados os vícios do acto de notificação, não se poderá alegar a ineficácia do acto notificado ou a notificar.

    ” j) Entende-se, e muito bem, no acórdão fundamento que se o contribuinte não lançar mão da faculdade prevista no art. 37º do CPPT as deficiências da notificação ficam sanadas, sem consequências, portanto, no ato notificado.

  9. Não está em causa que o legislador, no nº 1 do art. 37º do CPPT, deu ao contribuinte a opção/faculdade de poder, ou não, requerer à administração tributária, os elementos que não constavam da notificação.

  10. Contudo, se o contribuinte não requerer os elementos que não lhe foram facultados na notificação “originária”, a deficiência da notificação fica sanada sem consequências, por esse motivo, na legalidade do acto notificado.

  11. No caso dos autos arbitrais, os Recorrentes invocaram a falta de fundamentação das notificações e o tribunal arbitral veio a dar procedência ao pedido com o argumento que consta do Sumário ao Acórdão arbitral de que o nº 1 do art. 37º do CPPT não lhe impõe um comportamento com vista a permitir à AT fundamentar a posteriori um acto que não esteja devidamente fundamentado – em confronto com a interpretação sustentada no acórdão fundamento.

  12. Face ao exposto, requer-se a admissão do presente recurso e o seu conhecimento de mérito, com a procedência do mesmo e a anulação da decisão arbitral, com as devidas consequências legais.

    Nestes termos, e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá o presente recurso por oposição de acórdãos ser admitido, por se verificar uma contradição entre o acórdão arbitral e o acórdão fundamento quanto à mesma questão fundamental de direito, devendo o recurso ser julgado procedente com as devidas consequências legais.

    » * Por despacho do relator, foi o recurso admitido, liminarmente, com efeito suspensivo, nos termos do art. 26.º n.º 1 do RJAMT.

    * Os recorridos (rdos) contra-alegaram e concluíram: « A. As presentes contra-alegações de recurso vêm apresentadas na sequência do recurso interposto pela AT da decisão proferida pelo Tribunal arbitral, fundamentando-se este recurso na alegada oposição entre a decisão proferida nos autos do processo arbitrai n.º 587/2021-T (a Decisão Recorrida) e o acórdão proferido por este douto Tribunal no processo n.º 2256/19.6BEBRG, em 16/09/2020 (o Acórdão Fundamento); B. A Decisão Recorrida dá por assente que não existe qualquer fundamentação dos atos contestados que lhes seja contemporânea, tendo salientado que, no caso concreto, não tendo a AT colocado em causa a efetiva realização das obras pelos Recorridos, então, e à luz do artigo 51.º, n.º 1...

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