Acórdão nº 02357/18.8BEBRG-R1 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelSUZANA TAVARES DA SILVA
Data da Resolução12 de Janeiro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1 – AA, com os sinais dos autos, recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo do acórdão do TCA Norte de 18.06.2021, que indeferiu a «reclamação» por ele apresentada e, por via disso, manteve a decisão sumária — de 01.03.2021 — pela qual o Relator rejeitou — por inadmissibilidade legal — a «reclamação» do despacho proferido no TAF de Braga — de 01.11.2020 — que não admitiu o recurso da sentença de 14.05.2020, por intempestivo, e ainda do despacho do mesmo tribunal —de 17.11.2020 — que — em face de informação prestada pela «secção» — entendeu nada ser de ordenar, nomeadamente, no sentido de ser anulado o despacho anterior.

2 – O Recorrente apresentou alegações que rematou com as seguintes conclusões: «[…] 45. Visto tudo quanto antecede, lícito é formular as seguintes conclusões: i) O Acórdão recorrido omite pronúncia sobre questão-de-direito de conhecimento oficioso da máxima importância no plano da acção em causa, suscitada no requerimento de interposição do recurso em pendência integrante, ex vi legis, da reclamação ali assim julgada. Portanto, ii) é esse acórdão nulo, mercê do disposto na alínea d), 1.ª parte, do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil; iii) O justo suprimento de tal nulidade envolverá o reconhecimento da nulidade pleno jure — em virtude do disposto, em conjugação, nos n.ºs. 1 e 2 do artigo 162.º do Código do Procedimento Administrativo − da deliberação da Ordem dos Advogados sindicada, acto esse implicando a extinção do presente processo, com a condenação da Ré, desde logo, no pedido recursivo; iv) Acresce que, ao julgar que a reclamanda Decisão sumária do Relator «se mantém plenamente atendível nos presentes autos», o Acórdão recorrido, como será bom de verificar, consuma motu proprio toda uma série de nulidades processuais, algumas de extrema gravidade. Com efeito: v) Durante o período de suspensão dos prazos judiciais no primeiro quadrimestre do ano em curso, o Relator proferiu um despacho a convidar as partes para se pronunciarem a respeito duma determinada questão, materializando assim um acto judicial em abuso do direito: de acordo com a lei em vigor, num tribunal administrativo superior apenas podiam então ser proferidas decisões finais dos processos em curso. É claro que uma decisão judicial contra a lei não pode ser mantida na ordem jurídica; vi) Pior ainda, porém, o Relator, no termo do prazo que para aquele efeito havia concedido, julgara precludido o direito da parte reclamante a pronunciar-se sobre a questão proposta, aplicando assim num sentido materialmente inconstitucional a norma da alínea d) do n.º 5 do artigo 6.º-B da Lei n.º 1-B/2020, que, naquele mesmo período, apenas concedia às partes legitimidade processual para recorrer, arguir nulidades ou requerer a rectificação ou a reforma das decisões finais emergentes, e não para responder a convites formais de eficácia suspensa. Nessa senda, vii) quer dizer: nessa base hermenêutica que, de tão aberrante, só pode entender-se como uma interpretação-decisão ad hominem, o Acórdão recorrido julga, no mesmo quadro, inexistente «qualquer violação do direito processual ao contraditório», tirada esta acusando o involuntário mérito de pôr em evidência o cometimento ex novo neste acto firmado já pelo Colectivo da inconstitucionalidade normativa - em sede da exegese da norma temporária supracitada - apontada à Decisão sumária reclamada e, sem embargo, ali mantida plenamente atendível, viii) ou seja: por força do estatuído, em conjugação, nos artigos 3.º, n.º 3, e 204.º da Constituição, o Acórdão recorrido é, nessa parte, outrossim nulo ipso jure; ix) Além disso, ao manter plenamente atendível nos presentes autos a decisão monocrática (travestida de “acórdão”) do Relator de rejeitar a doble reclamação subida da primeira instância por alegada «inadmissibilidade legal» - querendo com esta locução dizer-se que o meio legal para arguir in casu determinada nulidade processual era o recurso jurisdicional, e não a reclamação efectivamente interposta -, o Acórdão recorrido comete em reincidência a nulidade por omissão de pronúncia inexoravelmente assacável à decisão individual que trata de coonestar, x) ou antes, consideravelmente mais grave: reincide na violação do dever legal de convolação do acto da parte patenteando erro na qualificação do meio processual a accionar, prescrito no artigo 193.°, n.º 3, do Código de Processo Civil, ilícito processual que se revela o pecado original capital do decisum singular sob impugnação, xi) com a agravante trina de escamotear o facto jurídico relevantíssimo de que, «se o Reclamante discordava do teor do despacho de 17-11-2020, então [podia impugná-lo] mediante a interposição do competente recurso de apelação» (sic), no prazo de 30 dias, então também podia dele reclamar (ainda que não fosse esse o meio processual idóneo) no prazo de 10 dias, como na realidade fez, ou seja: nunca, à luz da lei, a reclamação em questão poderia ter sido taxada de intempestiva, como viciosamente o foi, pela Decisão sumária reclamada e, em reprise, pelo Acórdão recorrido; xii) Um acto judicial desta desenvoltura só pode, evidentemente, ser conscientemente deliberado - o principal preceito legal preterido encontra-se assinalado no texto da reclamação julganda de forma impossível de não ser notada por quem a tiver de ler -, e o fito de tal deliberação consciente é também duma transparência total: se o Alto Colégio judicante se tivesse dignado obedecer à norma legal que o mandava convolar em recurso jurisdicional (nada na lei o impedia!) a reclamação dessarte rejeitada, sucederia então, forçosamente, que o despacho de 1-11-2020 do T.A.F. teria de ser anulado e, por consequência, o recurso em pendência logo admitido, e, de contínuo, provido ... o que é, exactamente, tudo aquilo que, sob a batuta do Mmo. Relator, a Mma.

Troika judicial dessarte decidente ora recorrida, evidentissimamente, não queria que sucedesse! xiii) Em acúmulo, apontar-se-á que, ao declarar, conclusivamente, verificar-se no caso que «o julgamento de direito se encontra bem realizado na decisão judicial reclamada» (sic), o Acórdão assume plenamente a própria incursão nos vícios de aplicação, que assim reitera, de normativo pré-arguido de inconstitucional assacados à Decisão singular em causa, designadamente, os elencados nas alíneas iv) a vii), ambas inclusive, das conclusões da atinente reclamação, reproduzidas no relatório do aresto recorrido, cujo teor se dá aqui por reproduzido integralmente.

  1. Perante este quadro judiciário assaz insólito, a judiciosa ponderação que de chofre se impõe em sede sindicante será, por certo, a de que a simples hipótese teórica de não admissão do recurso de revista excepcional aqui assim interposto mobilizaria uma interpretação do adrede invocado n.º 1 do artigo 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos significando que uma decisão judicial, como esta sub judice, prenhe de violações da lei ordinária directamente aplicável à matéria fáctica da causa julganda e, sobretudo, fazendo assentar o sentenciado em múltiplas interpretações normativas notoriamente inconstitucionais não acusa, todavia, nem uma relevância jurídica de importância fundamental nem, sequer, uma clara necessidade para uma melhor aplicação do direito justificando a admissão do recurso.

  2. Como será de meridiana evidência, a aplicação in concreto da norma jurídica especificada segundo tal dimensão hermenêutica consumaria, outrossim, nova e mais impressionante inconstitucionalidade normativa: essa decisão, aplicativa daquela interpretação normativa, integraria violação do princípio fundamental jusconstitucional do processo equitativo, mais precisamente, ofensa à garantia de tutela jurisdicional efectiva.

  3. Uma tal decisão, por consequência, resultaria nula de pleno direito, de acordo com as razões atrás expendidas.

    […]».

    3 – A Ordem dos Advogados contra-alegou, rematando com as seguintes conclusões: «[…] I – O presente recurso jurisdicional deve ser considerado improcedente, por não provado, uma vez que o douto acórdão proferido pelo tribunal a quo não merece reparo, encontrando-se bem fundamentado, de facto e de direito.

    II – No entanto, desde logo se diga que o recurso jurisdicional agora interposto não deve ser admitido, uma vez que não preenche os pressupostos plasmados no disposto no artigo 150.º do CPTA.

    III - Ressalta à evidência dos autos que a questão a apreciar no presente recurso se...

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