Acórdão nº 2314/20.4T8ACB-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Dezembro de 2022
Data | 13 Dezembro 2022 |
Órgão | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: ***I – Relatório AA e BB, com os sinais dos autos, vieram, por apenso à execução para pagamento de quantia certa que lhes move “E..., S.A.
”, também com os sinais dos autos, deduzir oposição à execução, mediante embargos de executado, pedindo que sejam «os presentes embargos (…) julgados procedente por provados com as legais consequências».
Alegaram, em síntese: - a falta de legitimidade da Exequente, por não provar que é cessionária dos créditos para com os Executados; - a inexequibilidade/insuficiência dos títulos, por das escrituras juntas aos autos como título não resultar, por si, ou diretamente das suas cláusulas, a obrigação exequenda, sendo que a Exequente não cumpriu a obrigação de interpelação dos executados, nem lhes comunicou a resolução dos contratos; e - a preterição do denominado PERSI, com as suas obrigações legais, implicando o naufrágio da execução.
Contestou a Exequente, pugnando pela improcedência dos embargos e alegando, para tanto, no essencial: - terem as cessões de créditos, formalizadas por escrituras públicas juntas, com a transmissão da hipoteca, sido comunicadas aos Executados; - ter a Exequente demonstrado, no seu requerimento executivo, a liquidação da obrigação exequenda, sendo que procedeu à interpelação dos Executados/Opoentes, razão pela qual inexiste inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação; - impondo-se concluir, ainda, pela existência de início e fim do PERSI, ainda que através de cartas de interpelação prévias à instauração de ação executiva, não passando a alegação de violação do PERSI de uma manobra dilatória ([1]).
Realizada a audiência prévia, com observância do princípio do contraditório, foi depois proferido saneador-sentença, por se considerar que os autos estavam preparados para tanto – conhecimento de mérito –, julgando procedentes os embargos de executado e, em consequência, extinta a execução.
Inconformada, vem a Exequente interpor o presente recurso, apresentando alegação e as seguintes Conclusões: «1. Constitui tema nuclear do presente recurso a questão de saber se, à presente ação executiva, são ou não aplicáveis as regras previstas no Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 Outubro, designadamente as relativas ao Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento, o denominado PERSI.
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Com efeito, a integração dos clientes bancários no supra referido procedimento extrajudicial apenas é obrigatória nos casos em que se verifiquem os respetivos pressupostos de aplicabilidade – cfr. artigos 12.º a 22.º do D.L. 227/2012, de 25 de Outubro.
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Na perspetiva da Recorrente e contrariamente ao que resulta da douta sentença recorrida, não é o caso da execução sub judice, designadamente face ao registo de penhora prévia sobre o imóvel garantia em ação executiva de terceiros com a consequente citação da Recorrente para reclamar os respetivos créditos.
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Não se verificando, consequentemente, qualquer incumprimento de legislação obrigatória por parte da Exequente, suscetível de determinar, como decidido pelo Tribunal “a quo”, a absolvição dos Executados da instância com fundamento na verificação de uma exceção dilatória inominada.
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A sentença recorrida considerou “(…) Consequentemente, no caso concreto, por não preenchida a condição objectiva de procedibilidade ou por verificada a excepção dilatória inominada acima mencionadas, entende-se que a oposição mediante embargos deverá proceder desde já nessa exacta medida, com a consequente extinção da execução (art. 732.º, n.º 4, do CPC), ficando prejudicada a apreciação das demais questões.” 6. Para garantia do cumprimento dos contratos de mútuo, título executivo dos autos, foi constituída a favor da Exequente, ora Recorrente, hipotecas sobre o seguinte bem imóvel: - “Fração” autónoma designada pela letra “F”, correspondente a moradia de rés-do-chão e primeiro andar, do prédio urbano, destinado a habitação, sito em ..., freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o nº ...18..., da freguesia ..., e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o nº ...80º.
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Conforme certidão predial dos autos, o imóvel em causa encontra-se onerado com uma penhora desde 21/04/2012.
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A penhora em causa encontra-se registada sob a AP. ...5 de 2012/04/21 a favor da ação executiva instaurada pelo B...,S.A., no âmbito do processo que sob o nº 122/12.... corre termos na Comarca ... – ... – Juízo de Execução – Juiz ....
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A Recorrente foi aí citada para reclamar os seus créditos nos termos legais, o que fez em 23/03/2015, tendo o respetivo crédito sido graduado e reconhecido por sentença de verificação e graduação de créditos em 28/10/2016, sentença essa, transitada em julgado.
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Ora, sendo a penhora registada sobre o imóvel garantia um incumprimento ao contrato bem como uma causa de exclusão do PERSI, salvo melhor entendimento, não tinha a Recorrente (à data, Banco cedente C...) o ónus de dar início e fim ao PERSI, por inutilidade do procedimento.
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O PERSI sempre estaria condenado ao fracasso nos termos dos artigos 17º nº 2 alínea a) e 22º nº 3 alínea b) do Decreto-Lei 227/2012, de 25 de Outubro.
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Por outro lado, caso não tivesse reclamado os respetivos créditos na supra mencionada ação executiva de terceiro (processo nº 122/12....), estes não seriam reconhecidos nem graduados, com a consequente perda da garantia hipotecária, vulgo, pagamento da dívida através do imóvel dos autos.
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A propósito da inutilidade e por conseguinte inaplicabilidade do PERSI, transcreve-se infra o sumário do Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 11/08/2018 (Proc.º 246/16.0T8MMN-A.E1), disponível em www.dgsi.pt: “Se à partida se sabe que procedimento a iniciar vai ser extinto pelo facto de já existir penhora a favor de terceiro, sobre os bens do devedor, não faz sentido, até, atento o principio de limitação dos actos, a realização de actos inúteis, não devendo a não integração no PERSI ser obstáculo à instauração da execução.” (sublinhado nosso) 14. Acresce que, a Embargada não é uma instituição de crédito e sim uma STC, Sociedade de Titularização de Créditos, cujo regime não encontra enquadramento legal no regime do PERSI, não sendo passível de aplicação por parte da Exequente, pois esta é regida pelo Decreto-Lei n.º 453/99 de 5 de novembro.
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Assim e na senda do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 29-09-2020 (Processo n.º 1827/18.2T8ALMB.L1.7), “só a verificação dos pressupostos para a integração do devedor no PERSI ocorrida em momento posterior à cessão de créditos pela entidade mutuante para uma sociedade de titularização de créditos não é oponível à cessionária.” 16. O cumprimento do PERSI por parte da cessionária, continuaria vertido de inutilidade, uma vez que se mantém a penhora registada sobre o imóvel garantia por via da AP. 45 de 2012/04/21, sendo como vimos, uma das causas de exclusão do PERSI.
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Não obstante, a cessionária, cumpriu com tudo o que estava ao seu alcance para alcançar uma solução extrajudicial.
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Nomeadamente, tentou oferecer inclusive descontos aos Embargantes, caso estes pretendessem uma solução amigável, mas sem sucesso, conforme se poderá comprovar através das cartas remetidas em 27/05/2020 e 01/06/2020, juntas com a Contestação dos autos.
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Face ao exposto, estavam e estão, os Embargantes, bem cientes da situação de incumprimento em que se encontram.
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Salvo melhor entendimento, a alegação de uma eventual violação do PERSI nos termos do DL 272/2012 de 25/10/2012, mais não é do que uma manobra dilatória para perpetuar a situação de incumprimento e permitir aos Embargantes furtarem-se ao cumprimentos das suas obrigações.
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Ao decidir como decidiu o tribunal de 1.ª instância fez errada interpretação e violou o disposto no diploma supra referido, particularmente nos artigos 17º nº 2 alínea a) e 22º nº 3 alínea b) do Decreto-Lei 227/2012, de 25 de Outubro, 551.º, n.º 1, 576.º, n.º 2 e 577.º do C.P.C.
Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a douta decisão recorrida e substituindo-se por uma outra que determine o prosseguimento dos autos.
Assim se fará JUSTIÇA».
Na sua contra-alegação, a parte embargante, invocando que a Recorrente veio, indevidamente, carrear matéria nova para os autos na sua peça recursiva, pugna pelo não provimento do recurso e manutenção da decisão impugnada.
*** O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, tendo então sido ordenada a remessa do processo a este Tribunal ad quem, onde foram mantidos o regime e o efeito determinados.
Nada obstando, na legal tramitação, ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir.
*** II – Âmbito do recurso Perante o teor das conclusões formuladas pela parte recorrente – as quais definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso ([2]), nos termos do disposto nos art.ºs 608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil em vigor (doravante, NCPCiv.) –, cabe decidir ([3]):
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Se a Recorrente pretende a apreciação recursiva com base em factos novos, não constantes da fundamentação de facto da sentença, por não terem sido alegados por ela (nem no requerimento...
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