Acórdão nº 796/20.3T9FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelLAURA GOULART MAUR
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora Relatório No Tribunal Judicial da Comarca ..., Juízo de Competência Genérica ... - Juiz ..., no âmbito do Processo 796/20.... foi o arguido AA submetido a julgamento em Processo Comum (Tribunal Singular).

Após realização da audiência de discussão e julgamento, o Tribunal, por sentença de 2 de junho de 2022, decidiu: - Condenar o Arguido AA pela prática em autoria material, na forma consumada, de um crime de subtracção de menor, previsto e punido pelo artigo 249.º, n.º 1, do Código Penal na pena de 125 (cento e vinte e cinco) dias de multa, à razão diária de € 100,00 (cem euros).

- Julgar procedente, por provado, o pedido de indemnização civil deduzido pela Demandante e, em consequência, condenar o Demandado Civil/Arguido AA, no pagamento à Demandante da quantia de € 3.500,00 (três mil e quinhentos euros), acrescida dos competentes juros moratórios.

*Inconformado com a decisão, o arguido interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões: 1º -Os factos, quando puníveis, deverão conter os elementos objectivo e subjectivo do tipo, e, no caso presente, provados os factos, ficou por provar o dolo, que se não presume, restando concluir pela inverificação da prática imputada.

  1. - O elemento objectivo, por si só, não basta para a verificação de prática de ilícito, e o elemento subjectivo não é presumível, devendo a vontade/dolo, resultar de prova, acima de qualquer dúvida, o que, concretamente, não resulta da prova realizada em julgamento.

  2. - Os depoimentos do Arguido, ora Recorrente, não merecem menos credibilidade do que os da Assistente, resultando evidente que a animosidade constada é recíproca.

  3. - A circunstância de o Arguido ter levado aos autos de Regulação das Responsabilidades Parentais as razões que considerava assistir-lhe, afasta a culpa e o dolo, que não é presumido, pelo que nunca poderia ser condenado, devendo, pelo contrário ser julgada improvada a douta Acusação de Fls.

  4. - A circunstância de, num ano fiscal, o Arguido ter vendido uma casa, e ter declarado tal venda, não integra o conceito de rendimentos, que se devem ter por regulares, nada justificando a condenação de uma Multa, à razão diária de, logo, …€100,00.

  5. - E o douto Tribunal “ a quo” podia ter apurado quais os rendimentos do Arguido, nos anos anteriores, e não o tendo promovido, decidiu contra as regras de experiência, em erro, e sem matéria de facto, ultrapassando os limites da livre apreciação da prova.

  6. - Nunca poderia, o douto Tribunal “a quo”, fundar a sua convicção, com especial relevo nas declarações prestadas pela Assistente, na medida em que é Parte Interessada, sendo, por isso, os seus depoimentos, de reduzida credibilidade, restando, à falta de mais matéria de facto reconhecer a improcedência da Acusação, com a consequente Absolvição, que se espera em sede de Recurso, que temos por merecedor de integral provimento.

  7. acresce que, a animosidade do Arguido, não é diferente da da Assistente, sendo recíprocas, o que não releva para a formação da convicção, designadamente de condenar, não sendo de presumir o dolo, que o ora Recorrente nunca teve.

  8. - O crime imputado é, necessariamente, doloso, que se não presume, e a circunstância de o Arguido ter justificado a sua recusa, afasta a possibilidade de se considerar a existência de dolo.

  9. - O Arguido nunca representou que estava a agir contra a Lei, nunca pretendeu violar a Lei, sempre estando crente das razões que lhe assistiam, e a circunstância de não ter logrado comprovar a sua presumida inocência, não justifica que seja condenado.

  10. A circunstância de o douto Tribunal “a quo” não ter considerado procedentes os argumentos do ora Recorrente, não basta para concluir o contrário, sendo que, com dignidade Constitucional, é como inocente que se deve presumir.

  11. Ao condenar o ora Recorrente, sem bastante matéria de facto, em erro, concluindo-se pela existência de dolo, o douto Tribunal “a quo” violou o Constitucional Princípio ”in dúbio pro reo”.

  12. E, não tendo resultado provado que o Arguido tenha sido aconselhado por um Advogado consultado, ou por Técnico da CPCJ, tal circunstância não significa que não tenha, efectivamente, sido aconselhado a recusar as entregas do menor à mãe, o que afasta o dolo, impedindo que seja condenado, impondo-se a absolvição, que se espera em sede de Recurso, que temos por merecedor de provimento.

  13. é como inocentes, que, com dignidade Constitucional, se presumem os Arguidos, e o ora Recorrente não é excepção, pelo que, não contendo, a douta Sentença ora em Recurso, matéria que permita, sem dúvidas, concluir pela procedência da douta Acusação de Fls,, deveria ter sido proferida douta Sentença absolvendo o Arguido, sem que fosse condenado no pagamento de qualquer indemnização.

  14. Da prova produzida, não se pode retirar a conclusão de que o Arguido agiu de forma deliberada, livre e consciente, sabendo da ilicitude da sua conduta, pois o dolo não se presume, e, dos autos, resulta evidente que o Arguido levou aos autos de Regulação das Responsabilidades Parentais a justificação dos seus actos, que tinha por justificados, pelo que se impõe a absolvição.

  15. Faltando o elemento subjectivo, faltando o dolo, e não sendo o facto punível na forma negligente, nunca poderia haver lugar à condenação, que esta Veneranda Relação não confirmará, com as legais consequências, impondo-se a absolvição do Recorrente.

  16. Da prova produzida, não resulta matéria provada que permita justificar a condenação de Multa, à razão diária de €100,00, e a circunstância de, num ano, o Recorrente ter declarado a venda da casa, não significa que tenha rendimento regular, em tal montante, pelo que a razão diária, a haver condenação, nunca poderia ultrapassar os €7,00, 8,00, ou 10,00 (dez), para além de que o douto Tribunal “ a quo” poderia apurar qual o montante dos rendimentos relativos aos anos anteriores.

  17. Deverão ser dados por NÃO PROVADOS, ou provados de forma diversa os factos de : 20. O Arguido sabia que, face aos seus receios, convicto de que estava a proteger o menor, mesmo assim, estava obrigado a entregar o filho, nos termos supra referidos, da decisão provisória de regulação das responsabilidades parentais relativas ao filho de ambos.

    1. Não obstante ter conhecimento da decisão proferida e da sua obrigação de entregar a criança à guarda da Assistente, o Arguido não o fez, de forma reiterada, ao longo de vários dias, porque manteve a convicção de que, se o fizesse, estaria a comprometer o superior interesse do menos, seu filho.

    2. O Arguido agiu convicto de que estava a agir no superior interesse da criança ao não responder aos contactos da Assistente, supra referidos, na sua residência, e assim não entregar o seu filho menor, para este e a progenitora pudessem usufruir de visitas, crente que não o estava a fazer de forma injustificada.

    3. Bem sabendo que tal resultaria, como resultou, numa absoluta impossibilidade da progenitora, naquelas ocasiões, saber do destino do filho e dele cuidar, e sobretudo o direito da criança de conviver com a mãe, porque, no seu entendimento, se impunha cuidar do superior interesse da criança.

    4. O Arguido não sabia que ao não proceder à entrega da criança ao outro progenitor, durante vários dias, para esta ficar à guarda e cuidados do progenitor guardião, violava o direito ao exercício do conteúdo ínsito às responsabilidades parentais e o superior interesse do próprio menor, sempre estando convicto razão para o efeito.

    5. O Arguido não agiu de forma livre, deliberada e conscientes, não conhecia a ilicitude da sua conduta, nem sabia que, naquelas circunstâncias, que a mesma era proibida e punível por lei, não se tendo, contudo, coibido de a praticar.

  18. O Arguido, ora Recorrente, embora a tanto não esteja obrigado, tentou, sem sucesso, comprovar a sua Constitucionalmente presumida inocência, mas, a circunstância de não ter logrado comprovar, não significa que tenha praticado o crime, designadamente por ausência do elemento subjectivo do tipo, pelo que se impõe a absolvição.

  19. Praticou os factos, mas não praticou o crime, pelo que, perante a ausência do improvado dolo, deverá ser absolvido, por merecer integral provimento o presente recurso.

  20. Ao decidir, como decidiu, o douto Tribunal “ a quo”, condenando o Arguido, na pena de Multa, à excessiva razão diária, sem fundamento resultante da prova, e no pagamento de indemnização à Assistente, violou o disposto nos artigos 249º nº1, 40º nºs 1, 2 e 3, 71º, 47º, todos do Código Penal, decidindo contra as regras de experiência comum, ultrapassando os limites da livre apreciação da prova, em violação do disposto no artigo 127º do Código de Processo Penal, em erro e sem matéria de facto que fundamente a Decisão (art.410 CPP), o que, a não determinar a revogação da douta Sentença ora em Recurso, e a substituir por outra que absolva o Recorrente, poderá justificar o reenvio do Processo.

  21. Devia, o Arguido, ora Recorrente, perante a prova realizada, ter sido absolvido, sem que tivesse que pagar qualquer indemnização, inexistindo fundamento válido para a fixação do excessivo montante da razão diária da Multa, necessária e substancialmente a reduzir, se houver lugar a condenação, no que se não crê, por se justificar a absolvição.

  22. Merece, pois, integral provimento, o presente Recurso, havendo que, consequentemente, revogar-se a douta Sentença de Fls, a substituir por outra que absolva o Recorrente.

    Nestes termos, e nos demais de direito que Vªs Exªs, doutamente suprirão, a não se determinar o reenvio do Processo, deverá a douta Sentença ora recorrida ser revogada e substituída por outra que absolva o ora Recorrente, sem que tenha que pagar qualquer indemnização por danos a que não deu causa, nem resultam provados, nada justificando que a razão diária da Multa tenha que ser tão manifestamente excessiva.

    *O Ministério Público respondeu ao recurso interposto, pugnando pela respetiva improcedência, e...

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