Acórdão nº 067/20.5BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução23 de Novembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA PLENO DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO Acórdão 1. RELATÓRIO 1.1.

“Z…………, LDA” veio, ao abrigo do disposto no artigo 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 119/2019, de 18 de Setembro, interpor para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo Recurso para Uniformização de Jurisprudência.

1.2.

No requerimento de interposição do recurso invocou, sumariamente, que a decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), a 13 de Março de 2020, no processo n.º 357/2019-T, a que se dirige o recurso, está em oposição quanto à mesma questão fundamental de direito com a decisão proferida pelo mesmo Centro de Arbitragem, a 27 de Julho de 2018, no processo nº 598/2017-T, já transitada em julgado (ambas as decisões arbitrais se encontram publicadas em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/).

1.3.

Nas conclusões das alegações que acompanharam aquela interposição, defende a Recorrente que a questão fundamental de direito apreciada em ambas as decisões em confronto é a mesma, que a decisão arbitral recorrida deve ser revogada e que deve ser uniformizada jurisprudência que acolha o sentido perfilhado pela decisão fundamento, nos seguintes termos: «A) A decisão arbitral recorrida e a decisão arbitral fundamento decidiram de forma oposta a mesma questão fundamental, na ausência de alteração da respectiva regulamentação jurídica e em face de situações de facto idênticas, pelo que se verifica a oposição de decisões arbitrais referida no artigo 25°, n° 2 do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, aprovado pelo Decreto-Lei n° 10/2011, de 20.01, com a redacção introduzida pela Lei n°119/2019, de 18.09; B) A instauração do procedimento previsto no artigo 139.º do CIRC é a forma legal de ilisão da presunção consagrada no artigo 64.°, n° 2, do Código do IRC, dado que é através desse procedimento que a lei faculta aos interessados um meio adequado e suficiente para a prova de que o preço efectivamente praticado nas transmissões de direitos reais sobre bens imóveis foi inferior ao valor patrimonial tributário que serviu de base à liquidação do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis.” conforme taxativamente se prevê no n° 1 daquele normativo; C) O objectivo ou a finalidade do procedimento de prova do preço efectivo na transmissão de imóveis é o apuramento desse preço efectivo, e não do valor de mercado do imóvel; D) Não está em causa ponderar ou aferir “valores normais de mercado”, como considera a decisão recorrida, mas apurar o preço efectivo da transmissão de imóveis a preço inferior ao seu valor patrimonial tributário, como se entendeu na decisão fundamento; E) O facto de no n° 6 do artigo 139° do Código do IRC se prever expressamente a obrigação de os sujeitos passivos que quiserem fazer a prova dos preços efectivos da transmissão de imóveis autorizarem o acesso à sua informação bancária, exprime inequivocamente que, na perspectiva legislativa, a documentação bancária é o meio de prova privilegiado dos valores reais das transacções de imóveis; F) Donde se infere que o acesso aos referidos dados bancários oferece-se como mecanismo adequado à comprovação do preço declarado e inscrito na contabilidade do contribuinte alienante; G) No âmbito do regime previsto no artigo 139° do Código do IRC, é irrelevante se os meios financeiros utilizados para pagamento do preço provêm de empréstimo particular, devidamente reflectido nas contas bancárias cujo acesso foi concedido, pois o que importa a este respeito é comprovar se o preço declarado no contrato de transmissão da propriedade corresponde ao que foi efectivamente praticado, [i.e., àquele que foi efectivamente recebido pelo alienante; H) De nada releva, para este efeito, o que os peritos da Autoridade Tributária e Aduaneira consideraram ser o preço justo/de mercado dos imóveis tendo em atenção a sua localização, a capacidade construtiva e outras características dos prédios, pois que, o procedimento em questão visa comprovar, através dos elementos de prova previstos na lei, se o preço declarado nas transmissões corresponde ao efectivamente praticado, e não, se o preço declarado corresponde ao valor justo/de mercado dos imóveis; I) E em nada releva, igualmente para efeitos de apuramento do preço efectivo das transmissões, a circunstância de o acesso à informação bancária expressamente autorizado pela alienante ter evidenciado um empréstimo particular, por parte de um sócio, a uma das sociedades adquirentes dos imóveis, dado que tal não significa que não tenha sido esse o preço efectivamente praticado, nada daí resultando que ponha em causa a efectividade da transmissão e o preço efectivamente praticado; J) O que importa a este respeito comprovar é se o preço declarado no contrato de transmissão da propriedade corresponde ao que foi efectivamente praticado, i.e., àquele que foi efectivamente recebido pelo alienante; K) De igual modo, a circunstância de o valor patrimonial dos imóveis ou até o seu valor de mercado ser superior ao preço declarado na venda, não significa que não tenha sido esse o valor efectivamente praticado se os meios de prova assim o indicam, designadamente, a informação bancária recolhida; L) A não ser assim, haveria violação do princípio da tributação do rendimento real das empresas e da capacidade contributiva, consagrado nos artigos 13° e 104, n° 2, da Constituição, e subversão do regime de ilisão da presunção consagrado no artigo 139° do Código do IRC; M) Tendo a aqui recorrente juntado a cada um dos procedimentos de comprovação do preço efectivo em causa nos autos, cópias de todas as transferências bancárias que recebeu para pagamento do preço de venda e declarações de quitação por força da venda com reserva de propriedade até ao pagamento integral do preço, bem como, as autorizações de acesso à sua informação bancária e à dos seus gerentes com referência aos anos de 2013, 2014 e 2015, correspondentes ao período de tributação em que ocorreram as transmissões e ao período imediatamente anterior, conforme prevê no n° 6 do artigo 239° do Código do IRC, N) Deve considerar-se, como na decisão fundamento, que a recorrente facultou todos os elementos necessários para que a Autoridade Tributária e Aduaneira verificasse que o preço declarado foi o praticado; O) Por essa razão, devia ter sido julgado procedente o pedido de declaração de ilegalidade das liquidações promovidas com fundamento na previsão do artigo 64°, n° 1 e 3 do Código do IRC, formulado pela recorrente ao Centro de Arbitragem Administrativa, por ter sido demonstrado no âmbito do procedimento previsto no artigo 139° do CIRC que o preço efectivamente praticado nas transmissões dos imóveis em causa foi inferior ao valor patrimonial tributário dos mesmos; P) Ao perfilhar entendimento contrário ao aqui exposto, bem como, em sentido contrário ao da decisão arbitral fundamento, a decisão arbitral recorrida violou o disposto nos artigos 73°, da Lei Geral Tributária, 139.º, do Código do IRC, 13.º e 104.º, n° 2, da Constituição e o artigo 9° do Código Civil, motivo por que deve ser revogada.

1.4.

A Autoridade Tributária e Aduaneira, notificada da interposição do recurso, contra-alegou, condensando as suas objecções ao provimento do recurso nas premissas que infra se reproduzem: «A.

Serão requisitos de admissibilidade do recurso, i) a existência de contradição entre uma decisão arbitral e outra decisão arbitral; ii) o trânsito em julgado da decisão fundamento; iii) a existência de contradição sobre a mesma questão fundamental de direito; e, B.

Relativamente àquilo em que se deve concretizar a “questão fundamental de direito” afigura-se essencial a existência de identidade da questão de direito sobre a qual se debruçaram os acórdãos em confronto, que tem subjacente a identidade dos respectivos pressupostos de facto¹ e, ainda, que a oposição decorra de decisões expressas e não meramente implícitas.

¹Como se sumariou no acórdão proferido pelo STA, em 23/03/1993, no processo n.º 028258 «I – Para que se possa reconhecer a existência de oposição de julgados é necessário que se reconheça a unidade da questão jurídica nos acórdãos ditos em conflito. II – A unidade da questão jurídica só verdadeiramente se descobre na perspectiva da específica finalidade deste recurso em contencioso administrativo que é, apenas, a uniformização da jurisprudência do Tribunal no sentido de impedir o tratamento desigual de casos iguais e não a uniformidade na interpretação da lei. III – Não é possível determinar a existência de um conflito de decisões sem uma referência bipolar, "simultânea, às questões de direito e às situações da vida..." (disponível em www.dgsi.pt) C.

O recurso apresentado falha na verificação de qualquer destes pressupostos, não obstante a Recorrente, de forma enviesada, tentar urdir argumentos onde empreende uma pretensão recursiva que assenta numa lógica em que se abstrai em absoluto dos contornos fácticos das situações subjacentes, que tendo embora alguns pontos em comum, apresentam diferenças de relevo.

D.

Com efeito, enviesadamente, a ora Recorrente ensaia uma oposição de decisões do centro de arbitragem, sem que, contudo, comece por identificar a questão jurídica em concreto que entende ter sido decidida de maneira diferente nos dois processos, o fundamento e a decisão recorrida.

E.

Decorre das decisões aqui trazidas pela Recorrente, e com relativa facilidade, que não está aqui em causa uma qualquer diferença interpretativa entre o que é o “preço efectivo” e o preço normal de mercado.

F.

Conforme infra demonstraremos, estipula-se como critério interpretativo e de aplicação ao caso concreto das normas em causa (art.º 64.º e art.º 139.º ambos do CIRC) o apuramento do “preço efectivo” G.

A decisão recorrida: 1. QUESTÕES...

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