Acórdão nº 01251/17.4BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução28 de Outubro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I. RELATÓRIO 1.

MINISTÉRIO da AGRICULTURA, FLORESTAS e DESENVOLVIMENTO e o MINISTÉRIO do MAR, inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF do Porto, datada de 05 de Dezembro de 2018, que julgando parcialmente procedente a Acção Administrativa que havia sido instaurada por AA, residente na Rua da ...

, na qual pedia a anulação do acto administrativo que determinou a aplicação à Autora da pena disciplinar de despedimento, e ainda a condenação do Réu a reintegrar a Autora, ao pagamento das retribuições desde a data do despedimento, acrescida de juros moratórios ou não se entendendo, julgar-se pela não inexigibilidade na manutenção da relação laboral, decidiu assim: - A) Julgar "... verificada a excepção dilatória inominada da falta de interesse processual da Autora e, em consequência, absolvo os Réus da presente instância"; e, - B) Reconhecer "...

a existência de erro na indicação da natureza do meio de impugnação administrativa a utilizar contra o despacho ora impugnado e, em consequência, concede-se à Autora a faculdade de, no prazo de 30 dias contados desde o trânsito em julgado da presente decisão, interpor o respectivo recurso hierárquico necessário".

* Nas suas alegações recursivas, os Recorrentes formularam seguintes conclusões: "1.

O caso respeita a impugnação do despedimento disciplinar e da ordem de reposição da quantia de 81.546,00€ (oitenta e um mil, quinhentos e quarenta e seis euros) determinados por despacho do Director Regional de Agricultura e Pescas do Norte, de 14 de Fevereiro de 2017, no âmbito do processo disciplinar comum n.º 1/2015, instaurado em 24 de Julho de 2015 (Factos F e H).

  1. Não tendo a A. recorrido hierarquicamente da decisão punitiva, julgou o Tribunal verificar-se excepção dilatória inominada de falta de interesse processual da Autora e, em consequência, absolveu os Réus da instância.

  2. A sentença interpreta os artigos 59.º e 60.º do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores da Administração Pública, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro, e os artigos 224.º e 225.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Pública, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de Junho, conjugadamente com os artigos 3.º, 8.º, n.º 1, parte final e 9.º do Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de Janeiro, e os artigos 185.º, n.os 1 e 2, parte final e 189.º, n.º 1 do Código, no sentido de que: “(...) a partir da data de entrada em vigor do DL 4/2015, de 7 de Janeiro – assumem natureza necessária todos os procedimentos administrativos de segundo grau [“impugnações administrativas”] cuja utilização ocasione, provoque, ope legis, a suspensão da eficácia do acto reclamado ou recorrido.”.

  3. Sempre com o devido respeito, contrariamente ao que se sustenta na decisão recorrida da autorização legislativa (L 42/2014 arte. 2º al.

    eee) e do Decreto-Lei nº 4/2015, não resulta, nem expressa, nem inequivocamente que com este diploma o legislador pretendesse derrogar a natureza facultativa das impugnações dos actos proferidos no procedimento disciplinar – recurso hierárquico ou tutelares de actos disciplinares então existentes.

  4. Não há subsídio interpretativo que suporte a ideia de que o legislador do Código tenha querido regular as impugnações dos actos proferidos em processo disciplinar suprimindo, inclusive a possibilidade de ponderação do grave prejuízo ao interesse público da sua não execução imediata (art. 60º nº 4 ED e 225º nº 4,5 LTFP e art. 170.º do CPA1991).

  5. Pelas razões aduzidas no ponto II das alegações do presente recurso, que aqui se dão por integralmente reproduzidas, salvo o devido respeito pela opinião contrária, deve entender-se não ser aplicável ao caso o artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 4/2015.

  6. As impugnações administrativas facultativas, por definição legal não condicionam o accionamento da via judicial (art. 185º nº1 nCPA).

  7. A natureza facultativa dos meios impugnatórios previstos no procedimento administrativo disciplinar dos trabalhadores da Administração Pública decorre de forma clara e expressa do seu regime desde 2008.

  8. Assim sendo, como é, as impugnações facultativas previstas no Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas não se incluem no âmbito de aplicação do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 4/2015, norma transitória cuja ratio é identificar as impugnações administrativas que subsistem como necessárias – só são necessárias – após a entrada em vigor do novo Código do Procedimento Administrativo, pois não faz qualquer sentido prever algo que já era permitido – o acesso imediato e directo aos meios de defesa judiciais.

  9. Aplicar a alínea c) do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 4/2015 ao caso sub judice, por força dos artigos 8º, nº 1, parte final e 9º do Código do Procedimento Administrativo, com a interpretação vertida na Sentença, implica destruir a unidade do sistema jurídico, porquanto, iríamos ter regras processuais claramente violadoras das regras substantivas, o que não corresponde ao pensamento do legislador.

  10. Contrariamente ao que se sustenta na decisão recorrida, não resulta, expressa e inequivocamente da lei de autorização legislativa ou do Decreto-Lei nº 4/2015, que o legislador tivesse pretendido alterar a natureza facultativa dos meios impugnatórios previstos nos citados artigos 59.º e 60.º ED e 224.º e 225.º LTFP.

  11. Entendem os Recorrentes que a interpretação das normas do artigo 3.º acolhida na douta sentença recorrida pressupõe a derrogação do regime especial próprio do procedimento disciplinar sem que para tanto o Governo estivesse munido da necessária autorização legislativa.

  12. A interpretação da alínea c) do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de Janeiro acolhida na douta sentença do TAF do Porto padece de inconstitucionalidade orgânica por violação do princípio da reserva de lei da AR, pois atribui a um Decreto-Lei uma força que não pode ter em função da matéria (regime e âmbito do vínculo de emprego público – art. 3.º nº 1 al. i) LTFP) porque não precedido de autorização legislativa em concreto 14.

    Tal entendimento normativo viola as normas constitucionais constantes dos artigos 112.º, n.º 2 e 165.º, n.º 1, al. t) da C.R.P. o que gera a inconstitucionalidade daquela interpretação normativa.

  13. Os Recorrentes sustentam que a interpretação acolhida na sentença recorrida enferma de erro de julgamento, em violação do disposto nos artigos 7º, nº 3, e 13.º do Código Civil, 59º e 60º n.os 1, 4 e 5 do Estatuto Disciplinar, aprovado pela Lei n.º 58/2008 e os artigos 224º e 225º, nºs 1, 4 e 5 da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, o artigo 2.º, al.

    eee) da Lei 42/2014, os artigos 112º, n.

    os 2 e 165º, nº 1 al. t) da C.R.P., e o artigo 2.º, n.ºs 3 e 5 do C.P.A".

    E terminaram, requerendo "....deve o presente recurso ser admitido e julgado procedente, revogando-se consequentemente a sentença recorrida e substituída por outra que julgue: i) A inconstitucionalidade das normas do artigo 3º do Decreto-Lei n.º 4/2015 quando interpretadas com o sentido acolhido na douta sentença do TAF do Porto de que “o recurso hierárquico previsto nos n.

    os 1, 4 e 5 do artigo 60.º da Lei 58/2008 assume agora natureza necessária e não meramente facultativa, constituindo, por isso, a sua utilização, uma condição indispensável para que os interessados possam recorrer à tutela jurisdicional”, por violação do princípio da reserva de lei da A.R. pois atribui a um Decreto-Lei uma força que não pode ter em função da matéria (norma base definidora do regime e âmbito do vínculo de emprego público – art. 3.º nº 1 al. i) LTFP) porque não precedido de autorização legislativa em concreto em violação das normas constitucionais dos artigos 112.º, n.º 2 e 165.º, n.º 1, al. t) da C.R.P., da alínea eee) do artigo 2.º da Lei n.º 42/2014 e da alínea i) do artigo 3.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, a que se refere o artigo 2º da Lei n.º 35/2014; Subsidiariamente ii) Julgue inaplicável as normas do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 4/2015 aos meios impugnatórios de natureza facultativa previstos nos artigos 59.º e 60.º nos 1, 4 e 5 do Estatuto Disciplinar, aprovado pela Lei n.º 58/2008, e nos correspondentes artigos 224º e 225º nos 1, 4 e 5 da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, por violação dos artigos 7º, nº 3, e 13.º do Código Civil, e do artigo 2º, nos 3 e 5 do novo Código do Procedimento Administrativo".

    * 3.

    A Recorrida AA apresentou contra-alegações, que concluiu do seguinte modo: "1.º Os Recorrentes foram absolvidos da instância pelo TAF do Porto, com base nos artigos 89º nº4 do CPTA e 278º nº1 do Código de Processo Civil, visto ter sido comprovada pelo Tribunal a existência de uma exceção dilatória.

    1. Não podendo, assim, os Recorrentes serem considerados parte vencida na presente lide.

    2. Condição de admissibilidade do recurso, nos termos do disposto no n.º 1 do art.141º do CPTA que estatuiu que tem legitimidade para interpor recurso ordinário “de uma decisão jurisdicional proferida por um tribunal administrativo quem nela tenha ficado vencido e o Ministério Público, se a decisão tiver sido proferida com violação de disposições ou princípios constitucionais ou legais”.

    3. Nesse circunspecto, os Recorrentes não podem obter nenhum benefício imediato, direto e próprio na sua esfera jurídica, bem como o prosseguimento dos seus interesses, tendo já sido absolvidos da instância.

    4. Carecem, pois, os Recorrentes de legitimidade para interpor o presente Recurso".

    E finaliza "....

    não deverá o presente recurso jurisdicional ser admitido, por se considerar que não estão preenchidos os pressupostos a que se refere o artigo 141.º...

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