Acórdão nº 2093/08.3BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 02 de Novembro de 2022
Magistrado Responsável | FREDERICO MACEDO BRANCO |
Data da Resolução | 02 de Novembro de 2022 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I Relatório O Ministério da Justiça, no âmbito da Ação Administrativa Especial intentada por M.....
, tendente a que se : “a. Declare nulo ou anulado o despacho proferido pelo Exmo. Senhor Ministro da Justiça a fls. 345 dos autos que indeferiu o recurso hierárquico necessário interposto pela Autora; b. Declare a prescrição do procedimento disciplinar, a qual acarreta a nulidade de todos os atos subsequentes para todos os efeitos e consequências legais; c. Condene o R. a praticar o ato administrativo de deferimento do recurso hierárquico necessário apresentado, com fundamento na verificação dos vícios assacados não só ao ato punitivo, como também ao subjacente procedimento e processo disciplinar; d. Declare a incompetência do Diretor do Departamento Disciplinar e de Inspeção da PJ para nomear os instrutores do processo de averiguações e do processo disciplinar instaurados contra a A.; e. Declare a nulidade dos despachos de nomeação dos instrutores do procedimento de averiguações e do procedimento disciplinar por terem sido praticados por entidade incompetente, a qual acarreta a nulidade de todos os atos subsequentes, incluindo a acusação e a decisão punitiva proferida; f. Condene o Réu a, num prazo não superior a 15 dias úteis, praticar ato administrativo que defira o recurso hierárquico interposto pela Autora; g. Condene o Réu no pagamento de indemnização à A. por danos não patrimoniais em montante não inferior a €3.000 (três mil euros); h. Condene o Réu na publicação em Ordem de Serviço da Diretoria Nacional da Polícia Judiciária da decisão que julgue procedente a presente ação; i. Condene, ainda, o Réu na publicação em Ordem de Serviço da Diretoria Nacional da Polícia Judiciária o devido pedido de desculpas à A.; Mais se pretende que o Tribunal: j. Especifique e fixe o prazo em 15 (quinze) dias para que o R. pratique os atos e operações materiais necessários ao restabelecimento das situações subjetivas e objetivas que assistem à A.; k. E fixe, ainda, por cada dia de atraso no cumprimento efetivo da douta decisão, uma sanção compulsória ao Réu no valor de €46,00 (quarenta e seis euros), conforme art. 66.º e n.º 1 e 2 do art. 169.º do CPTA, seguindo os autos os seus ulteriores termos até final”, inconformado com a Sentença proferida em 2 de Dezembro de 2019, através da qual foi julgada parcialmente procedente a ação, “e, em consequência, anula-se o ato sancionatório impugnado e o ato de indeferimento do recurso hierárquico interposto daquele ato sancionatório e, absolve-se a Entidade demandada dos pedidos formulados nas alíneas b), c), f), g), h), i), j) e k) das conclusões da PI.”, veio interpor recurso jurisdicional da referida decisão, proferida em primeira instância no Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa.
Formula o aqui Recorrente/Ministério da Justiça nas suas alegações de recurso, apresentadas em 22 de janeiro de 2020, as seguintes conclusões: “1. O presente recurso tem como fundamento a errada interpretação que a sentença impugnada fez dos arts.ºs 51.º do Decreto-Lei n.º 24/84, de 16 de janeiro (ED), dos art.ºs 39.º e 41.º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000, de 9 de novembro (LOPJ) e do art.º 30.º do Decreto-Lei n.º 196/94, de 21 de julho (RDPJ); 2. Fruto de uma interpretação que conduz, inexoravelmente, ao esvaziar de conteúdo dos art.ºs 39.º e 41.º da LOPJ, a decisão recorrida, no que à nomeação de instrutor para processos de natureza disciplinar respeita, entendeu fazer prevalecer o n.º 1 do art.º 51.º do Decreto-Lei n.º 24/84 sobre o disposto naqueles normativos do Decreto-Lei n.º 275-A/2000; 3. A interpretação sufragada pela sentença recorrida desrespeita, de forma evidente, as regras da hermenêutica consignadas no n.º 3 do art.º 9.º do Código Civil 4. A sentença impugnada desvalorizou o facto de a Polícia Judiciária – a par de outros organismos estatais – ter um Gabinete (no caso um Departamento) exclusivamente vocacionado para a área disciplinar; 5. De igual sorte, a sentença recorrida desconsiderou o facto do próprio Estatuto Disciplinar aprovado pelo Decreto-Lei n.º 24/84 alertar para a circunstância da sua disciplina não ser aplicável aos “funcionários e agentes que tivessem estatuto especial”, situação que se verifica na Polícia Judiciária, incorrendo, mais uma vez numa errada interpretação dos normativos aplicáveis; Termos em que, deverá ser dado provimento ao presente recurso, anulando-se a sentença recorrida na parte que condena o Ministério da Justiça, por ser da mais elementar JUSTIÇA!” A aqui Recorrida veio apresentar contra-alegações de Recurso em 19 de fevereiro de 2020, concluindo: “1. O Regulamento Disciplinar da Polícia Judiciária, aprovado pelo DL 196/94, de 21 de Julho, no seu art. 2.º estabelece que “em tudo o que não seja previsto no presente diploma no âmbito da definição e efetivação de responsabilidade disciplinar dos funcionários e agentes da Polícia judiciária é aplicável, como direito subsidiário, o Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, constante do DL n.º 24/84, de 16 de Janeiro”, ditando o art. 30.º do citado Regulamento a aplicação do disposto nos artigos 32.º a 92.º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo DL n.º 24/84, de 16 de Janeiro.
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Ora, nem o Regulamento Disciplinar da Polícia Judiciária, nem a Lei Orgânica, na redação em vigor à data da instauração do procedimento e da nomeação de instrutor, continham qualquer regra relativa ao órgão competente para nomear o instrutor, suscetível de afastar o disposto no art. 55.º n.º 1 do ED.
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Assim, impunha-se que o instrutor fosse nomeado em obediência ao disposto no art. 55.º n.º 1 do ED, ou seja pela entidade que instaurou o processo disciplinar, o que não sucedeu 4. Bem andou, a sentença recorrida ao concluir que “foi o Departamento Disciplinar e de Inspeção que nomeou o instrutor do processo disciplinar, o que determina que este último ato esteja ferido de incompetência relativa, vício que foi arguido em momento anterior à decisão punitiva”, padecendo o processo disciplinar de nulidade não suprida, devendo ser anulado o ato impugnado e o ato que negou provimento ao recurso hierárquico interposto do ato sancionatório.
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Deste modo, a sentença recorrida não merece qualquer censura, devendo ser mantida.
Nestes termos e nos demais de direito aplicáveis, deverá o recurso ser julgado improcedente, confirmando-se a sentença recorrida, como é de LEI e de JUSTIÇA!” Por Despacho de 20 de abril de 2020, foi admitido o Recurso jurisdicional.
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 16 de junho de 2020, nada veio dizer requerer ou promover.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, onde se suscita, designadamente, que a Sentença Recorrida terá feito errada interpretação dos arts.ºs 51.º do Decreto-Lei n.º 24/84, de 16 de janeiro (ED), dos art.ºs 39.º e 41.º do Decreto-Lei n.º 275-A/2000, de 9 de novembro (LOPJ) e do art.º 30.º do Decreto-Lei n.º 196/94, de 21 de julho (RDPJ).
III – Fundamentação de Facto O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade Provada: “A) Em 30.03.2006, a advogada S....apresentou nos serviços da Entidade demandada, um documento com o seguinte teor: “(…) Vem participar disciplinarmente contra funcionário da Polícia Judiciária, o que faz nos termos e com os fundamentos expostos na Participação anexa, e de cujo teor dá conhecimento ao Conselho Distrital da Ordem dos Advogados, na pessoa do seu Presidente. (…).” (dado como provado com base em fls. 2 do processo administrativo junto aos autos em suporte de papel, cujo teor se dá por integralmente reproduzido); B) Em anexo ao documento referido na alínea antecedente consta a Participação com o seguinte teor: “(…) vem participar contra funcionária da Polícia Judiciária, cuja identidade desconhece na presente data, apesar de várias vezes solicitada a sua identificação, mas sabe ser do sexo feminino, e que se encontrava de serviço ao Piquete, no passado dia 25.01.2006, pelas 21.45h, o que faz nos termos e com os seguintes fundamentos: 1.º Pese embora o facto de V. Exa. estranhamente e decorridos que estão 60 (sessenta) dias até à data, não ter vindo ainda ordenar a identificação da funcionária contra quem a signatária participa disciplinarmente, apesar das insistentes solicitações, quer telefónicas quer escritas nesse sentido (vide faxes enviados em 26.01.2006 e 27.01.2006), ainda assim a signatária mantém a expectativa positiva de V. Exa., no exercício das competências disciplinares que lhe estão cometidas, vir prontamente a exercer o poder disciplinar que lhe compete, sob pena de, não o fazendo, proteger coniventemente um sistema corporativo, cujos interesses sectoriais parecem sobrepor-se ao interesse público, no respeito pelos cidadãos em geral, o que a ser verdade, mereceria desde logo o total e absoluto repúdio da signatária (cfr. Doc. 1 e 2).
2.º Quanto aos factos, in casu, os mesmos tiveram lugar no passado dia 25 de Janeiro do corrente ano, quando a signatária, pelas 21.45h, se dirigiu ao Piquete de Serviço da Polícia Judiciária, (…) fazendo-se acompanhar pelo s/ constituinte, no patrocínio dos seus interesses, com vista ao registo de um Autor de denúncia oral.
3.º Depois de identificada na portaria através da Cédula Profissional, que exibiu aos funcionários presentes, a signatária foi então recebida por uma funcionária, que não se encontrando identificada, ordenou que a seguissem, o que quer...
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