Acórdão nº 2318/19.0T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 27 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelANA MARGARIDA LEITE
Data da Resolução27 de Outubro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 2318/19.0T8PTM.E1 Juízo Local Cível de Portimão Tribunal Judicial da Comarca de Faro Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: 1.

Relatório A Direção de Finanças de Faro – Autoridade Tributária e Aduaneira, representada pelo Diretor de Finanças de Faro, intentou contra (…), advogado, a presente ação especial de suprimento, nos termos previstos nos artigos 63.º, n.º 6, da Lei Geral Tributária, e 1000.º do Código de Processo Civil, requerendo o levantamento do segredo profissional invocado pelo requerido e autorização judicial para aceder às contas bancárias do mesmo, relativamente aos anos de 2016 e 2017, de modo a fiscalizar o cumprimento de obrigações tributárias.

A justificar o pedido, alega, em síntese, que decorre desde 13-03-2019 uma ação de inspeção externa de âmbito geral ao requerido, que exerce a atividade de advogado, visando o controlo de operações bancárias suspeitas, bem como a verificação e comprovação do cumprimento das obrigações tributárias, relativas aos anos de 2016 e 2017. Sustenta que detetou, numa situação em que o requerido agiu como representante de cliente em liquidação de IMT/IS relativa a aquisição de imóveis, a inexistência de emissão de fatura-recibo em nome do cliente; mais detetou, em diversas situações relativas à celebração de escrituras por clientes do requerido, que as despesas, nomeadamente com IMT, IS, cartório e registos, foram pagas pelo requerido, não tendo os pagamentos sido efetuados a partir da conta bancária refletida na contabilidade; detetou, ainda, que os pagamentos a que respeitam as faturas-recibo emitidas foram, na maioria das vezes, efetuados através de transferência bancária de uma conta do próprio requerido, não existindo na contabilidade qualquer documento de suporte de tais pagamentos; mais detetou que, nos anos em apreço, não foram emitidas pelo requerido faturas-recibo relativas a verbas de adiantamentos, por conta de honorários ou pagamento de despesas por conta e em nome do cliente, o que não é normal neste tipo de atividade; constatou que foram emitidas faturas-recibo cujo recebimento foi considerado efetuado em dinheiro, tendo alguns desses recebimentos sido depositados na conta bancária constante da contabilidade e não tendo sido verificado o mesmo procedimento relativamente a outras faturas-recibo, desconhecendo-se se terão sido depositados noutra conta; noutras situações as transferências entre contas são efetuadas dias após a emissão da fatura-recibo, como tudo melhor consta do requerimento inicial. Acrescenta que, na sequência de notificação pessoal para autorização de acesso aos documentos bancários de todas as contas por si detidas, referentes aos movimentos realizados nos exercícios de 2016 e 2017, o requerido negou tal autorização, comunicando o seguinte: «(…) não autorizo o levantamento do sigilo bancário referente à conta clientes com o n.º (…) do Banco (…), uma vez que a mesma está abrangida pelo sigilo profissional, decorrente das normas deontológicas que regulam a minha atividade enquanto advogado e à conduta de sigilo que as minhas relações profissionais com os clientes obrigam».

O requerido apresentou contestação, alegando, em síntese, que não foram demonstrados fundamentos de facto ou situações potencialmente enunciadoras de atuação concreta que justifiquem a quebra do segredo profissional para acesso às contas bancárias de que é titular, pugnando no sentido do indeferimento do pedido formulado.

A 1.ª instância, por despacho de 14-06-2022, considerou legítima a escusa e determinou a remessa dos autos a esta Relação, com invocação do disposto no artigo 135.º, n.º 3, do Código de Processo Penal.

Remetidos os autos a esta Relação, determinou-se a audição da Ordem dos Advogados, tendo-se solicitado a emissão de parecer.

O Conselho Regional de Faro da Ordem dos Advogados emitiu parecer a 20-09-2022, no sentido de «não se dever proceder ao levantamento de sigilo profissional, nos termos e quanto aos factos pedidos, no âmbito do Processo 2318/19.0T8PTM, por não se mostrarem preenchidos os pressupostos legais para a quebra do mesmo».

  1. Fundamentos 2.1.

    Fundamentos de facto A 1.ª instância não indicou factualidade tida por assente.

    2.2.

    Fundamentos de direito A Direção de Finanças de Faro – Autoridade Tributária e Aduaneira intentou ação especial de suprimento, ao abrigo do disposto no artigo 1000.º do Código de Processo Civil e invocando o estatuído no artigo 63.º, n.º 6, da Lei Geral Tributária, requerendo autorização judicial para aceder às contas bancárias do requerido, relativamente aos anos de 2016 e 2017, de modo a fiscalizar o cumprimento de obrigações tributárias, sustentando que o requerido é advogado e deduziu oposição à consulta de tais elementos com fundamento no dever de sigilo profissional, defendendo a requerente o levantamento de tal segredo profissional e a concessão da pretendida autorização.

    Sob a epígrafe Suprimento de consentimento no caso de recusa, dispõe o artigo 1000.º do CPC o seguinte: 1 - Se for pedido o suprimento do consentimento, nos casos em que a lei o admite, com o fundamento de recusa, é citado o recusante para contestar. 2 - Deduzindo o citado contestação, é designado dia para a audiência final, depois de concluídas as diligências que haja necessidade de realizar previamente. 3 - Na audiência são ouvidos os interessados e, produzidas as provas que forem admitidas, resolve-se, sendo a resolução transcrita na ata da audiência. 4 - Não havendo contestação, o juiz resolve, depois de obter as informações e esclarecimentos necessários.

    Conforme explicam António Santos Abrantes Geraldes/Paulo Pimenta/Luís Filipe Pires de Sousa (Código de Processo Civil Anotado, vol. II, Coimbra, Almedina, 2020, pág. 454), «este processo tem como pressuposto a existência de norma de direito...

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