Acórdão nº 47/22.6GBASL E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelEDGAR VALENTE
Data da Resolução25 de Outubro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - Relatório

No Juízo Local Criminal de … do Tribunal Judicial da Comarca de … corre termos o processo sumário n.º 47/22.6GBASL e aí, após a realização da audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo (transcrição): “a) – Condeno o arguido AA como autor material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 50 (cinquenta) dias de multa, à razão diária de 7€ (sete euros), ou seja, na multa 350€ (trezentos e cinquenta euros)

  1. – Nos termos do artigo 69º, n.º 1, do Código Penal, condeno o arguido na pena acessória de proibição de conduzir quaisquer veículos motorizados pelo período de 3 (três meses); (…).” Inconformado, o arguido interpôs recurso de tal decisão, extraindo da motivação as seguintes conclusões (transcrição): “A- O ora Recorrente considera que o Tribunal a quo valorou incorretamente o resultado obtido da utilização do aparelho quantitativo Drager Alcotest 7110TKIIIP, apresentado como prova, considerando-o como válido

    B- O Tribunal a quo fundou a sua convicção no resultado do exame de determinação quantitativa da presença de álcool no sangue do ora Recorrente, quanto à T.A.S. de que o mesmo era portador

    C- Não obstante devidamente demonstrada, em sede de audiência de discussão e julgamento, a não observância das determinações legais constantes no Despacho 11037/2007, de 6 de junho, que aprova o alcoolímetro, marca DRAGER, modelo Alcotest 7110 MK IIIP, o Tribunal a quo não entendeu a prova obtida através do referido teste como nula

    D- Tendo considerado que do Despacho não se extraem quaisquer consequências no que tange à falta de cumprimento do tempo de aquecimento do aparelho

    E- O ora Recorrente discorda com a Douta interpretação, uma vez que considera estar perante um procedimento imperativo

    F- Outrossim, considera que o desrespeito pelos procedimentos constantes do despacho n.º 11037/2007, de 6 de junho, do Instituto Português da Qualidade, nomeadamente no que tange ao cumprimento do período que medeia o ligar do aparelho e a realização do teste, 12 (doze) minutos, resulta na nulidade da prova produzida, por violação de uma norma imperativa

    G- Uma vez que tal procedimento que não foi respeitado pelo Senhor Agente da Autoridade fiscalizadora, deveria ter sido suscitado, pelo Tribunal a quo, dúvida sobre qual o verdadeiro valor de taxa de álcool no sangue que o arguido apresentava, especialmente tendo em consideração que, deduzido o erro máximo legalmente admissível, o arguido apresentava uma “suposta” taxa de álcool no sangue de 1,216 g/l

    Não obstante, H- Ao contrário, o Tribunal a quo, não considerou existir qualquer relevância quanto ao tempo decorrido entre o ligar do aparelho, e a sua utilização

    I- Desconsideração que o ora Recorrente discorda totalmente, uma vez que considera que a descrição feita no supra referido Despacho: “Tempo de aquecimento - após ligação, doze minutos à temperatura de 20BC;”, não é meramente indicativa, mas sim imperativa

    Assim, J- Existindo dúvidas, deveria o Tribunal a quo decidir a favor do réu, em obediência ao princípio basilar do direito penal português (Princípio do in dúbio pro reo)

    K- A dúvida resultante da falta de fiabilidade do resultado do alcoolímetro, não pode funcionar em prejuízo do arguido, sob pena de se estabelecer uma presunção de culpa e uma inadmissível subversão do ónus probatório, minando a estrutura acusatória orientadora do nosso processo penal

    L- A incerteza é tanto mais relevante, porquanto o que está em causa são valores próximos do limite legal (1,20 g/l) que criminaliza (se igualou ou é superior à referida taxa), ou não (se inferior), a conduta do arguido, pois apenas deve ser considerado crime quando a taxa de álcool no sangue for igual ou superior a 1,2 g/l (artigo 292.º n.º 1 Código Penal)

    M- In casu, é notória a proximidade entre o valor obtido e o limite mínimo necessário para que se encontre preenchido o tipo objetivo tipificado no artigo 292.º, n.º 1, Código Penal, e a conduta seja penalmente relevante e não uma “mera” contra ordenação

    N- Uma mera variação ou falha do instrumento, face ao não cumprimento das determinações técnico/legais, será suficiente para uma diferente qualificação da conduta do arguido e igualmente, acarretar diferentes (mais benéficas) consequências

    Outrossim, O- Face ao exposto, e encontrando-se a fiabilidade do instrumento, assim como a veracidade dos resultados obtidos em causa, deve a prova recolhida através deste considerada ser nula por violação de norma legal e, Em consequência, P- Por se desconhecer efetivamente qual seria a taxa de álcool no sangue do ora Recorrente, à data da prática dos factos, e em respeito à aplicação do princípio in dubio pro reo, deverá ser determinada a absolvição do ora Recorrente.” Pugnando, em síntese, pelo seguinte: “Nestes termos, e nos demais de direito por V.Excªs Doutamente supridos, deve ser dado provimento ao presente recurso, e, por via dele, ser revogado a Douta Sentença recorrida, substituindo-se a decisão recorrida por outra que determine a absolvição do crime pelo qual foi o ora Recorrente condenado.” O recurso foi admitido

    O MP na 1.ª instância respondeu ao recurso, nos termos que, em síntese, se reproduzem: “Em nosso entendimento, não assiste qualquer razão ao recorrente, não merecendo a douta sentença quaisquer reparos

    No que respeita à questão invocada pelo recorrente, importa referir que o tribunal recorrido, no que respeita à motivação da matéria de facto, elenca que para a decisão quanto à matéria de facto… fundou a sua convicção na análise e valoração da prova produzida em audiência e da prova documental junta aos autos, nomeadamente: - No resultado do exame de determinação quantitativa da presença de álcool no sangue do arguido, quanto à TAS de que o arguido era portador, cujo talão se encontra junto aos autos.” Pugnando, em síntese, pelo seguinte: “Assim, a decisão proferida pelo Tribunal a quo foi a correcta, não assistindo razão ao recorrente, devendo a decisão recorrida ser mantida, negando-se provimento ao presente recurso.” A Exm.ª PGA neste Tribunal da Relação emitiu parecer, exarando que “[n]ão vemos qualquer nulidade na sentença recorrida que leve ao procedimento do recurso, parecendo-nos que o teste de pesquisa de alcóol cumpre com as exigências legais, como mais pormenorizado pelo magistrado do Ministério Público em primeira instância.” Procedeu-se a exame preliminar

    Foi cumprido o disposto no art.º 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal (1), tendo o recorrente respondido ao parecer do MP, mantendo, no essencial, a posição assumida no requerimento de recurso

    Colhidos os vistos legais e tendo sido realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir

    Reproduz-se a decisão recorrida, na parte que interessa: “II Fundamentação 1. Matéria de facto provada Da audiência de discussão e julgamento e com relevo para a decisão do mérito da causa, resultaram provados os seguintes factos: 1. No dia 01-03-2022, pelas 22.30 horas, o arguido conduziu o veículo automóvel de matrícula …, na via pública designada por …, em …, apresentando uma taxa de...

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